Aula 21, Atas
Aula 21, Atas
CAPÍTULO 2
Para John Wirth, a transição do século XIX para o século XX, em Minas Gerais,
refere-se “tanto ao histórico deslocamento do eixo político e econômico do Norte para o Sul,
mas também [refere-se] às forças de modernização – diferenciação social, urbanização,
crescimento do mercado interno – que os eventos políticos cobrem e escondem”160.
Como poderemos observar em Varginha, foi o grupo de vereadores que conduziu o
município rumo ao seu processo de urbanização, na medida em que os projetos e leis voltados
para organização e urbanização do município – tais como nomeação de ruas e praças,
consertos de estradas e pontes, retirada de animais das ruas, melhorias no serviço
abastecimento de água, instalação da energia elétrica e das linhas telefônicas, dentre outros –
passavam pelas reuniões da Câmara.
Em Varginha, a urbanização foi acompanhada da diversificação dos padrões de
consumo, não apenas referentes a produtos novos numa sociedade, a bens móveis importados,
às mobílias de dentro das casas ou vestimentas diferenciadas. A elite agrária, por meio de seus
investimentos, criava padrões de consumo relacionados também à utilização do espaço
urbano. As empresas de serviços urbanos que chegariam em Varginha, sobretudo na quarta
década de sua formação, instituíam na sociedade varginhense padrões de consumo novos para
a população: utilizar os serviços de energia elétrica ou das linhas telefônicas era algo diferente
no contexto da passagem do século XIX para o século XX. Mas esses padrões de consumo
compatíveis, especialmente, com o espaço urbano, não estavam presentes em todas as famílias
varginhenses, porque não era toda a população que possuía condições de habitar o espaço
urbano.
Assim, a modernização, tendo como uma de suas forças a urbanização, gerou também
diferenciação social. Em Varginha – e não apenas em Varginha – foram os vereadores os
condutores desse processo, porque estavam à frente da administração do município. Mesmo
que, em alguns casos, determinados assuntos precisassem ser repassados ao governador, eram
os vereadores que representavam todos os moradores varginhenses, ainda que formalmente.
Finalmente, a modernização é resultado do crescimento do mercado interno. O fato de
a cidade contar com crescente número de casas no espaço urbano, com casas comerciais e
com a ferrovia, por exemplo, fizeram com que a economia varginhense também crescesse e
160
WIRTH, John. O Fiel da Balança - Minas Gerais na Federação Brasileira (1889/1937). Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 1982, p. 28.
83
que, a partir da primeira década do século XX, tendo uma economia mais dinâmica, se
desenvolvessem outros elementos importantes, como a expansão da atividade da cafeicultura,
as instituições bancárias, as primeiras fábricas e as empresas de serviços urbanos, que aos
poucos iam transformando a economia de Varginha.
Entendemos, portanto, que a elite age de forma a auxiliar uma região em seu processo
de modernização, atuando para intensificar – ou não – as forças do processo e beneficiar-se
dele, como poderemos compreender por meio das análises das atas da Câmara Municipal de
Varginha161.
161
Presentes no Museu Municipal de Varginha (MMV).
162
Sobre a regulamentação das Câmaras Municipais, o artigo 169 da Constituição de 1824 dizia que “O
exercicio de suas funcções municipaes, formação das suas Posturas policiaes, applicação das suas rendas, e todas
as suas particulares e uteis attribuições, serão decretadas por uma Lei regulamentar”. Essa Lei Regulamentar foi
a de 1º de outubro de 1828, que contava com 90 artigos sobre regulamentações direcionadas aos municípios. Os
90 artigos são divididos em cinco partes, com detalhes sobre o funcionamento das Câmaras Municipais. A
primeira parte, sob o nome de Título I, que conta com 23 artigos, descreve a “Fórma de Eleição das Camaras”; a
segunda parte, ou Título II, discursa sobre as “Funcções Municipaes”, contando com 42 artigos; no Título III são
escritas as “Posturas Policiaes”, tendo essa parte 8 artigos; o Título IV, contando com 5 artigos, fala sobre a
“Applicação das Rendas”; a última parte possui o Título V como “Dos Empregados”, contando com 12 artigos.
(Lei Regulamentar das Câmaras Municipais (Império), de 01/10/1828. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LIM/LIM-1-10-1828.htm. Acesso em 02/08/2016). Segundo
interpretação da Constituição de 1824 por Octaciano Nogueira (2012, p. 24), a Lei Regulamentar das Câmaras
Municipais foi complementar à Constituição de 1824, na medida em que regulou a administração municipal
praticamente até 1891, com as pequenas alterações que foram introduzidas pelo Ato Adicional de 1834 e a Lei
de Interpretação do Ato, de 1841.
163
ACMV, 1882, fl. 01.
84
1824, tendo feições específicas e existência constitucional, existência essa que pode ser vista
no artigo 167 da Carta Magna de 1824.
Desde 1824, então, era eleito como presidente da Câmara, em todos os municípios
brasileiros, o cidadão que obtivesse o maior número de votos. “A Constituição de 1824, tendo
criado câmaras eletivas em todas as cidades e vilas existentes ou que viessem a ser criadas,
incumbiu-lhes “o governo econômico e municipal das mesmas cidades e vilas” e determinou
que seria presidente o vereador mais votado”164.
Em Varginha, primeiramente, o presidente da cidade de Três Pontas convidou o
vereador Joaquim Antonio da Silva para ocupar a cadeira da presidência e “presidir a eleição
do Presidente effectivo que tem de servir nesta Camara, pôr reconhecer ser ele o mais velho
dos vereadores presentes conforme precutira a lei a tal respeito”165.
Tendo sido, portanto, iniciada a votação para eleição interna do primeiro presidente da
Câmara Municipal de Varginha,
foi eleito, o Senhor Matheus Tavares da Silva, pôr quatro votos, qual o
Senhor Presidente em mediatamente o convidou a tomar assento: o que
sendo feito foi pôr este posto em votação, por escrutineo secreto, a eleição de
Vice Presidente desta Camara pela qual verificou-se ter sido eleito o Senhor
José Maximiano Baptista166.
164
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto – o município e o regime representativo no Brasil. 7 ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 121.
165
ACMV, 1882, fl. 01.
166
Idem.
167
ACMV, 1882, fl. 02.
168
WIRTH, John. O Fiel da Balança - Minas Gerais na Federação Brasileira (1889/1937). Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 1982, p. 207.
85
169
ACMV, 1882, fl. 02.
170
MONTORO, Eugênio Augusto Franco. O Município na Federação Brasileira. 1974. Tese (Doutorado em
Ciências Jurídicas e Sociais). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 1974, p. 08, nota 4.
171
O presidente da província tinha poder para nomear e excluir pessoas de suas funções, como veremos abaixo,
na segunda seção desse capítulo.
172
A Constituição de 1824, em seu artigo 90, dizia que “As nomeações de Deputados, e Senadores para a
Assembléa Geral, e dos Membros dos Conselhos Geraes das Provincias, serão feitas por Eleições indirectas,
86
mudanças ocorreram em 1881, com a Lei Saraiva, quando instituiu-se em todo Império a
eleição direta. A Lei também elevou o censo ao alistamento e, sendo assim, qualquer cidadão
alistável173, que residisse no município há pelo menos dois anos, poderia ser eleito vereador.
Nos primeiros anos de formação de Varginha, os principais esforços dos vereadores
diziam respeito à infraestrutura e organização do espaço urbano, assim como ocorria com
outras cidades brasileiras em seu período inicial de formação: as ruas e praças da cidade, bem
como as casas que eram construídas, deveriam seguir certo padrão de organização, como
poderemos ver por meio das atas.
Contudo, a expansão do espaço urbano de Varginha dava-se sob o regime jurídico do
aforamento concedido pela autoridade eclesiástica competente, ou seja, Varginha pertencia à
diocese de Campanha e era o bispo da diocese que administrava a cobrança de foros pelo solo
ocupado. A preocupação da Igreja era apenas com a cobrança do imposto territorial, já à
Câmara Municipal, cabia administrar financeiramente os processos de aforamento174.
O poder de conceder terrenos estava inicialmente ligado à Igreja, sobretudo por causa
da cobrança de impostos. Não obstante, a preocupação com a organização do espaço urbano
cabia à Câmara Municipal que, por exemplo, na reunião de 10 de janeiro de 1883, por meio
da proposta do vereador Domingos Teixeira de Carvalho, decidiu que o Fiscal “obrigasse” os
proprietários da cidade a “reconstruírem as ruas em frente das suas propriedades, com
calçamentos e outras providencias que fação disaparecer as ruinas das mesmas ruas, e que o
mesmo Fiscal faça reconstrução nos iscavamentos da Praça deste Edificio”175.
elegendo a massa dos Cidadãos activos em Assembléas Parochiaes os Eleitores de Provincia, e estes os
Representantes da Nação, e Provincia”. O artigo 91 dizia que possuíam voto naquelas eleições primárias os
cidadãos brasileiros que estivessem no gozo de seus direitos políticos e os estrangeiros naturalizados. No artigo
92, as informações eram referentes aos que não poderiam votar. Eram eles: os menores de 25 anos, “nos quaes
não se compreendem os casados, e Officiaes Militares, que forem maiores de vinte e um annos, os Bachares
Formados, e Clerigos de Ordens Sacras”; “os filhos de famílias, que estiverem na companhia de seus pais, salvo
se servirem Officios públicos”; os criados de servir, exceto guardalivros, primeiros caixeiros das casas de
comércio, criados da Casa Imperial e administradores das fazendas rurais e fábricas; os religiosos; e os que não
tivessem renda líquida anual de 100$000 (cem mil réis) por bens de raiz, indústria, comércio ou empregos. O
artigo 93 completava que os que não podiam votar nas Assembleias Primárias de Paróquia, não podiam ser
membros, nem votar na nomeação de alguma autoridade eletiva, nacional ou local. Por fim, o artigo 94 dizia que
poderiam ser eleitos, e votar nas eleições para deputados, senadores, e membros dos conselhos de província,
todos os que pudessem votar nas Assembleias Paroquiais, exceto: os que não possuíssem renda líquida anual de
200$000 (duzentos mil réis) por bens de raiz, indústria, comércio ou emprego; os libertos; e os criminosos
pronunciados em queréla, ou devassa. (CF – 1824, Cap. VI: Das eleições).
173
Conforme o que foi citado na nota anterior.
174
A legitimação da posse e dos títulos de propriedades, tanto municipais como particulares, só tornaram-se
possíveis após sucessivas negociações entre o poder público municipal e a Igreja. Essas negociações duraram
décadas e foi em 04 de novembro de 1922 que foi fixado um acordo entre a prefeitura e a diocese de Campanha,
em que a diocese concedeu à municipalidade a gleba patrimonial delimitada por volta do ano 1806, quando foi
construída a primeira igreja na cidade de Varginha (ÁVILA, 1983, p. 10).
175
ACMV, 1883, fl. 05.
87
Todavia, a nova cidade precisava não apenas manter-se organizada, deveriam ser
arrecadadas rendas para o município. Naquele mesmo ano de 1883, na reunião seguinte, de 11
de janeiro, foi criado o primeiro imposto municipal, pois deveria ser cobrado por cada carro
que atravessasse o município com carregamentos para as estações da estrada de ferro de Dom
Pedro ou mercados de qualquer ponto da província, o imposto no valor de dois mil réis por
cada um176. Para os carros que atravessassem Varginha partindo das estações da estrada de
ferro Dom Pedro, o valor do imposto seria de quatro mil réis. Quem atravessasse a cidade e
vendesse nela todo o carregamento, bem como os carros varginhenses, seriam isentos do
imposto177.
No ano de 1888 já havia melhor sistematização da forma de cobrança de impostos, e a
ata de 09 de janeiro daquele ano dizia que:
A Camara Municipal da Cidade da Varginha, de acordo com o artigo 194 do
seo actual codigo de Posturas, resolveo o seguinte: Artigo 1º - Fica fixado o
imposto de passagem para cada carro que transpuser este Municipio, com
quaisquer carregamentos, pôr ida e volta, em um mil reis. (Paragrapho 1º). A
cobrança deste imposto será effectuada por mais de agentes de livre
nomeação do Presidente da Camara. (Paragrapho 2º). Estes agentes
entregarão mensalmente ao Fiscal desta Cidade, as sommas arrecadadas,
deduzida sua porcentagem que será de 15% quinse por cento. (Paragrapho
3º). O Presidente da Camara, poderá encarregar da arrecadação deste
imposto aos respectivos Fiscaes. (Paragrapho 4º). Este imposto será exigivel
desde já e seo produto applicado em melhoramentos das estradas e pontes do
Municipio178.
176
Sobre a questão das rendas dos municípios, a Lei Regulamentar de 1828 dizia, em seu título sobre a aplicação
das rendas, no artigo 74 que “Não despenderão as rendas dos Conselhos senão em objectos proprios de suas
attribuições, nem darão aos Juizes, ou outros empregados senão o que por Lei estiver determinado, ou no futuro
fôr ordenado pelo Poder Legislativo”. O artigo 75 dizia que “O Procurador não fará despeza, que não seja
autorizada por postura, ou determinada por deliberação da Camara”. O artigo 76 falava sobre a urgência da
utilização das rendas, assim “Não podendo prover a todos os objectos de suas attribuições, preferirão aquelles,
que forem mais urgentes; e nas cidades, ou villas, aonde não houverem casas de misericordia, attentarão
principalmente na criação dos expostos, sua educação, e dos mais orphãos pobres, e desamparados. No artigo 77
estava escrito que “Geralmente proporão ao Conselho Geral de Provincia, tanto os meios de augmentar suas
rendas, como a necessidade, ou utilidade de fazer dellas alguma extraordinaria aplicação”. (Lei Regulamentar
das Câmaras Municipais (Império), de 01/10/1828. Disponível
em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LIM/LIM-1-10-1828.htm. Acesso em 02/08/2016).
177
ACMV, 1883, fl. 06.
178
ACMV, 1888, fl. 84.
179
Em cidades como Diamantina e Pouso Alegre, que nos séculos XIX e XX configuraram-se como importantes
centros comerciais, era comum a cobrança de impostos de cidadãos que desejassem manter negócios em
funcionamento no espaço dos mercados. Esses impostos iam para os cofres das Câmaras Municipais, para
melhorias nas cidades. Sobre Diamantina, cf.: ANDRADE, Marcos Ferreira de. “Quintais, chácaras, intendências
e abastecimento alimentar em Diamantina: séculos XIX e XX”. In: XIV Seminário sobre a Economia Mineira.
Anais do evento. Diamantina: Cedeplar, 2010. Sobre Pouso Alegre, cf.: VALE, Fernando Henrique do; SAES,
88
animais, que deveriam ser limitados ao espaço rural, às fazendas. Naquela mesma reunião,
ficou decidido que os proprietários de éguas, cabras e cabritos deveriam retirar seus animais
do patrimônio da cidade180. Podemos, portanto, perceber que ao espaço urbano não poderia
ser misturado práticas comuns do espaço rural, como a criação de animais.
As andanças de porcos pelas ruas de Varginha também eram frequentes e, no dia 09 de
outubro de 1883, foi lido um requerimento pedindo à Câmara que tomasse providências a
respeito da andança de porcos, pois era visto no novo espaço urbano estragos causados pelos
animais181. No começo do ano de 1884, “pondo em discução, á Camara deliberou o seguinte:
E, pôr enquanto fique sustada qualquer providencia relativamente a retirada de pórcos das
ruas e praças desta Cidade, até que se tome deliberação de acordo com as posturas de que se
espera aprovação”.182
Podemos observar que Varginha passava por um processo ainda tímido de
urbanização, e que a principal preocupação dos vereadores e da maioria dos moradores da
cidade era vê-la organizada, tomando a forma urbana de uma cidade.
Assim, a novo espaço urbano de Varginha precisava também de uma escola. Na
primeira década de atas da Câmara não há nenhum registro sobre projetos para construção de
escolas, isto é, não foi possível observar sobre o trâmite de aquisições de terrenos ou prédios
para o funcionamento de escolas, mas no dia 21 de abril de 1884, a ata dizia o seguinte:
Não havia menção a projetos de construção física de escolas, mas a ata indicou que
elas já existiam. As relações entre a Câmara Municipal e o presidente da província, porém,
serão mais frequentes a partir da segunda década de formação de Varginha.
Além da organização do novo espaço em que desenvolvia Varginha, as contas do
município também deveriam ser organizadas. A partir de 1883, em todos os anos se
apresentava o orçamento das receitas e despesas para o próximo ano e, quando foram criadas
as comissões permanentes, havia uma específica para a averiguação dos orçamentos. Nos
Alexandre Macchione; CARVALHO, Rafaela Rodrigues da Silva. “Pouso Alegre: uma economia de
abastecimento numa sociedade exportadora (1880-1920)”. In: SAES, Alexandre Macchione; MARTINS, Marcos
Lobato; GAMBI, Thiago Fontelas Rosado (Orgs.). Sul de Minas em Urbanização – Modernização Urbana no
início do século XX. São Paulo: Alameda, 2016. P. 287-311.
180
ACMV, 1883, fl. 06.
181
ACMV, 1883 fl. 15.
182
ACMV, 1884, fl. 19.
183
ACMV, 1887, fl. 22.
89
primeiros anos de formação da cidade, as comissões eram criadas de acordo com o que
demandava Varginha, mas sem organização formal. No dia 05 de novembro de 1884, por
exemplo,
Havendo numero legal, o Presidente declarou aberta a sessão. Foi lida a acta
do dia antecedente, posta em discução, foi aprovada. Pelo Vereador Silva,
foi proposto que se nomiassem uma comissão, composta dos Cidadãos
Francisco Horacio Nogueira, e Olympio Gonçalves de Araujo, para
examinar a estrada que segue desta Cidade, athe o lugar denominado porteira
das Perobas, e darem seos pareceres sobre o concerto da mesma. O
Presidente pondo em discução, foi aprovada184.
A commissão nomeada para dar seo parecer sobre o terreno que o Cidadão
Marcirio Jose de Andrade requereo, troxe a mesa seo parecer que, é de
parecer que o terreno lhe seja dado porque alem de ser um beneficio para o
embelesamento da Cidade, tem tambem a vantagem de melhorar a rua que se
acha bastante deteriorada, e que não ha utilidade alguma em conservar
188
ACMV, 1887, fl. 61.
189
ACMV, 1888, fl. 86.
190
ACMV, 1888, fl. 101.
191
ACMV, 1889, fl. 98.
91
aquella praça, por não estar em condições de receber aquelle título, pois
parece mais um erro de alinhamento do que praça publica, devido á ella ser
triangular e muito pequena, e para sujeitão-se apreciação da ilustrissima
Camara. O Presidente pondo em discução, a Camara deliberou que lhe fosse
dado o terreno e ordem para mural-o192.
Podemos observar que os trabalhos das comissões, nos primeiros anos de Varginha
como cidade, estavam relacionados ou a averiguação de ruas e praças, ou a vistoria de um
terreno de algum particular, ou consertos em pontes e estradas, ou seja, assuntos burocráticos
de coordenação de uma cidade. Contudo, faltava disciplina de alguns membros em relação à
presença nas reuniões.
A falta de disciplina não estava presente apenas na primeira década de formação da
cidade, em que os vereadores ainda se acostumavam com a nova rotina, pois durante todo o
período em que analisamos Varginha, observamos o cancelamento de reuniões por falta de
número necessário de vereadores. Caso faltassem, deveriam pagar uma multa, sendo que o
dinheiro serviria para as obras da Câmara193.
No dia 15 de janeiro de 1884, um dos membros faltantes da reunião escreveu “pedindo
para ser aliviado da multa por se achar com encomodos em casa, pôr isso não podia
comparecer na presente sessão. Posto em discução, foi aliviado da multa”194.
Não obstante, em 25 de agosto de 1886, a reunião precisou ser cancelada, pois
“achando-se presente o Vice-Presidente alferes José Maximiano Baptista, e os vereadores
Tavares da Silva, e José de Carvalho, faltando os demais vereadores; não havendo numero
para os trabalhos da Camara, foi adiada para a manhã as horas do custume”195. Assim também
ocorreu na sessão do dia 2 de julho de 1888, em que não havendo o número suficiente de
vereadores para a realização da reunião,
o Presidente [major Evaristo Gomes de Paiva] adiou esta sessão para o dia
vinte e trez de Julho do corrente anno, e para isso, convidava os vereadores
presentes a comparecerem neste dia, e que se officiasse aos Vereadores
ausentes este acontecimento196.
192
ACMV, 1889, fl. 99.
193
Na Lei Regulamentar de 1º de outubro de 1828, que tratava das Câmaras Municipais, no “Título II –
Funcções Municipais”, o artigo 28 dizia que “O Vereador que tiver impedimento justo o fará constar ao
Presidente; e se faltar sem justificado motivo, pagará nas cidades por cada falta 4$000 e nas villas 2$000 para as
obras do Conselho, que o Secretario carregará logo em receita. Faltando os Vereadores actuaes, chamar-se-hão
os immediatos em votos, quando o impedimento passar de 15 dias, ou a urgencia, e importancia dos negocios
exigir o numero completo de Vereadores”. (Lei Regulamentar das Câmaras Municipais (Império), de
01/10/1828. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LIM/LIM-1-10-1828.htm. Acesso em
02/08/2016).
194
ACMV, 1884, fl. 19.
195
ACMV, 1886, fl. 55.
196
ACMV, 1888, fl. 93.
92
Mas se, por um lado, faltava disciplina dos vereadores para comparecer às reuniões,
por outro, faltava disciplina também por parte deles para o pagamento dos funcionários da
Câmara, e estes precisavam cobrar, como ocorreu em 07 de abril de 1886, em que “leo-se um
requerimento do Fiscal desta Cidade, Bernardino José Paulino, pedindo o pagamento de seus
ordenados vencidos neste trimestre, como empregado da mesma”197. Ou como ocorreu em 04
de abril de 1889, em que “leo-se dous requerimentos do Secretario e Continuo desta Camara,
pedindo o pagamento de seus ordenados vencidos de primeiro de Janeiro ao ultimo de Março
do corrente anno, que pondo em discução, a Camara deliberou o pagamento dos mesmos”198.
Vemos, por um lado, que os vereadores almejavam uma organização interna da
Câmara e da cidade, na medida em que criavam impostos199 ou organizavam comissões para
melhorias urbanas. Apesar disso, por outro lado, esses vereadores ainda esbarravam em
falhas, como a falta de disciplina nas reuniões e o atraso nos pagamentos dos funcionários.
Além dos primeiros projetos de infraestrutura e organização da cidade, a primeira
década de formação de Varginha seria marcada por dois acontecimentos importantes para o
Brasil, e que se fizeram presentes nas atas da Câmara.
O primeiro deles, que não foi tratado com tanta relevância na nova cidade, foi a
abolição da escravidão. Nas atas da Câmara, a única menção a respeito do assunto dizia, no
dia 20 de abril de 1888, o seguinte:
197
ACMV, 1886, fl. 49.
198
ACMV, 1889, fl. 99.
199
Sob a Constituição de 1891, as fontes de receitas dos municípios eram: impostos sobre prédios urbanos; de
indústrias e profissões (em alguns Estados, esse imposto era fonte de receita tanto do município como do
Estado); impostos sobre veículos terrestres e fluviais; sobre ambulantes, placas de anúncios, incluindo os
impostos de publicidade e empachamento, etc; taxas remuneratórias (água, esgoto, iluminação pública,
funerárias, mercados, matadouros); rendas dos bens dominicais; multas por infração de posturas e regulamentos
ou inobservância de contratos; indenizações, restituições, dívidas passivas prescritas, eventuais, etc. (CASTRO
NUNES, 1920, apud LEAL, 2012, pp. 150-151). Uma melhor sistematização sobre os impostos que ficariam a
cargo dos Municípios foi elaborada na Constituição Federal de 1934. A partir da Constituição, passou a ser “da
exclusiva competência dos Municípios decretar impostos prediais e de licenças, bem como taxas de serviços
municipais, além de outros que as leis estaduais lhes atribuírem”. (CF – 1934, Seção VII: Da defesa nacional,
Título V: Dos municípios, artº 89).
200
ACMV, 1888, fl. 92.
93
Pelo que dizia a ata, o presidente da Câmara estava mais preocupado com o possível
“desastre” para a lavoura do que com a situação social dos escravos. O grupo de vereadores
do município parecia não pensar na importância do fim da escravidão para o Brasil, um dos
últimos países do mundo a abolir o sistema: abolir a escravidão significava libertar os
escravos daquele sistema opressor (apesar de não terem sido inseridos de forma ativa na
sociedade capitalista logo quando houve a troca de sistema), mas também deixar que a
sociedade crescesse econômica e socialmente sob o capitalismo. No ano de 1887, Campanha e
Pouso Alegre, por exemplo, já haviam criados seus livros de ouro para a libertação dos
cativos201.
Além disso, o presidente da Câmara deixou claro que Varginha não oferecia proteção
para os escravos que, logo que pudessem, buscariam proteção em outros lugares. O apelo para
reunião com os fazendeiros e “passividores” pode ter sido feito, mas no dia marcado para a
reunião (03 de maio de 1888), não houve nenhum registro no livro de atas da Câmara.
Outro marco nacional que teve repercussão interna foi a proclamação da República: no
dia 22 de novembro de 1889 foi realizada uma reunião extraordinária, festiva, em que o
presidente Rocha Braga começou a reunião “fazendo o historico dos ultimos
acontecimentos”202.
Ele afirmou que “chegando ao auge da desmoralização”, se tornava urgente uma
resolução, e que “graças ao bom senso e criterio do povo brasileiro, do exercito e da armada,
essa resolução [a proclamação da República]” ocorreu de forma tranquila, “não tendo havido,
como em todos os paizes, as offuzões de sangue”203.
Em voz alta, o presidente leu a comunicação que a Câmara de Varginha enviaria aos
municípios e distritos vizinhos, em que dizia: “Já devis ser conhecedores da transformação
pela qual passou, ao dia 15 do corrente, o Governo de nossa pátria”204, pois o acontecimento
havia se dado dentro da ordem e tranquilidade, uma prova do patriotismo do povo brasileiro.
“A hora do perigo, passou”, “Viva a Republica Federal dos E. U. do Brasil!” e “Viva o
Estado de Minas Gerais!”205 eram algumas das frases da comunicação escrita. Aquela reunião
foi marcada apenas para a comemoração da proclamação da República, tendo sido encerrada
assim que o presidente terminou de ler a comunicação.
201
Sobre o tema da escravidão em Campanha e Pouso Alegre, cf.: SAES, Alexandre Macchione; AVELINO
FILHO, Antoniel. “Escravidão e trajetórias das elites locais: Campanha e Pouso Alegre no ocaso da escravidão”.
In: Cultura Histórica & Patrimônio, Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG), vol. 1, n. 1, p. 65-90,
2012.
202
ACMV, 1889, fl. 106.
203
Idem.
204
Idem.
205
ACMV, 1889, fl. 107.
94
206
MONTORO, Eugênio Augusto Franco. O Município na Federação Brasileira. 1974. Tese (Doutorado em
Ciências Jurídicas e Sociais). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo, 1974, p. 15.
207
Na Lei Regulamentar das Câmaras Municipais, na parte sobre as funções das Câmaras, havia atribuições
minuciosas a respeito do funcionamento das Câmaras Municipais. O primeiro artigo dessa parte, artigo 24 da
Lei, dizia que “As Camaras são corporações meramente administrativas, e não exercerão jurisdicção alguma
contenciosa”. No decorrer da parte sobre as funções das Câmaras, estava escrito sobre os procedimentos para
reuniões ordinárias, sobre a convocatória de reuniões extraordinárias, sobre a hora que as reuniões deveriam
começar a por quanto tempo deveriam durar, sobre a falta de vereadores, com ou sem justificativa. Dos 42
artigos dessa parte, destacamos os seguintes: “Art. 40. Os Vereadores tratarão nas vereações dos bens, e obras do
Conselho do Governo economico, e policial da terra; e do que neste ramo fôr á prol dos seus habitantes; Art. 42.
Não poderão vender, aforar, ou trocar bens immoveis do Conselho sem autoridade do Presidente da Provincia
em Conselho, emquanto se não installarem os Conselhos Geraes, e na Côrte sem a do Ministro do Imperio,
exprimindo os motivos, e vantagens da alienação, aforamento, ou troca, com a descripção topograptica, e
avaliação por peritos dos bens que se pretendem alienar, aforar, ou trocar; Art. 47. Poderão ajustar de empreitada
as obras que se houverem de fazer, mettendo-as primeiramente em prégão, para preferirem aquelles, que se
offerecerem por menor preço, precedendo vistoria legal, publicação do plano, e sua avaliação; e na falta de
empreiteiros, as poderão fazer por jornal. E quando as obras forem de grande importancia, e alguns socios, ou
emprehendedores se offerecerern a fazel-as, percebendo algumas vantagens para sua indemnização, enviarão as
propostas aos Conselhos Geraes da Provincia; Art. 48. Farão pôr em boa guarda todas as rendas, fóros, coimas, e
mais cousas que á Camara pertençam em arca forte de tres chaves, das quaes uma estará em poder do Presidente,
95
Era dessa forma que funcionava na formação dos municípios brasileiros, não sendo
diferente em Varginha. “A eleição da Câmara assegura – afora os afluídos e indefinidos
ajuntamentos populares, ou as juntas locais – o vínculo entre o povo e a administração
pública”209. O que desejavam os moradores da cidade passava pelas reuniões da Câmara.
Cabia à Câmara consentir ou não o que pediam os munícipes.
Em 02 de outubro de 1890, por exemplo, foi lido o requerimento “feito por Thomaz
José da Silva pedindo ao Governador do Estado um privilegio com garantia de juros para
montar uma fazenda zoothechinica neste município”210. O pedido passava pela reunião de
vereadores primeiro, para depois ser encaminhado ao governo do Estado. O requerimento de
Thomaz José da Silva, então, “foi remethido ao seu destinatario”211. Contudo, não houve
menções nas atas a respeito do atendimento do pedido.
Na primeira sessão de janeiro de 1891, o apelo era para que a Câmara vistoriasse
algumas estradas importantes para moradores de Varginha. Dessa forma, foi lido:
O que seria feito a respeito desse pedido não consta nas atas da Câmara, mas o comum
era a nomeação de comissões para a averiguação de assuntos relacionados a consertos de
pontes e estradas.
outra do Fiscal, e outra do Secretario”. (Lei Regulamentar das Câmaras Municipais (Império), de 01/10/1828.
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LIM/LIM-1-10-1828.htm. Acesso em 02/08/2016).
208
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto – o município e o regime representativo no Brasil. 7 ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 87.
209
FAORO, Raymundo. Os Donos do Poder: formação do patronato político brasileiro, vol. 1. 10 ed. São
Paulo: Globo; Publifolha, 2000, p. 208.
210
ACMV, 1890, fl. 26.
211
Idem.
212
ACMV, 1891, fl. 30.
96
Com a elevação da cidade à sede de Comarca, uma novidade para Varginha, como
veremos mais abaixo, as funções dos vereadores também se estenderiam a outras localidades
vizinhas. Varginha passaria a contar com um juiz de direito, que serviria também cidades
próximas.
Mas a primeira diferença para a década que iniciava-se dizia respeito à própria
definição de município. Com a proclamação da República, foi promulgada uma constituição
provisória, enquanto se preparava para a convocação de uma Assembleia Constituinte. Assim:
221
ACMV, 1890, fl. 19.
222
Na época, Varginha, além de ser responsável pelos assuntos de seus distritos, Pontal e Carmo da Cachoeira,
também possuía relações com o povoado de São Bento do Campo Bello, no sentido de auxílio de abastecimento
de água e construção de prédios públicos, como cadeia e escola. Atualmente, estão sob a jurisdição da Comarca
de Varginha as cidades de Carmo da Cachoeira e Monsenhor Paulo.
223
ACMV, 1890, fl. 28.
224
Idem.
225
ACMV, 1891, fl. 34.
99
Pela leitura da citação acima, podemos ver que as questões de organização urbana
eram sempre presentes nas reuniões da Câmara Municipal, o que era comum para um
município em formação num período em que o Brasil como um todo passava por momento de
modernização de padrões de consumo, com um processo de urbanização sendo conduzido
pela elite nacional.
Na mesma reunião de 10 de dezembro de 1891, “foi lido um requerimento do Cidadão
Joaquim Alves Moreira solicitando licença para continuar com os concertos de uma sua casa
nesta cidade, visto ter sido embargada essa obra pelo Fiscal”228. O cidadão foi atendido, mas
deveria obedecer o alinhamento na parte da frente da casa.
Os requerimentos, porém, também eram enviados para a cobrança de deveres
monetários que a Câmara possuía, como ocorreu na mesma reunião de 10 de dezembro, onde:
226
ACMV, 1891, fl. 35.
227
ACMV, 1891, fl. 40.
228
ACMV, 1891, fl. 40.
229
Idem.
230
Idem.
100
231
ACMV, 1890, fl. 18.
232
ACMV, 1890, fl. 21.
233
ACMV, 1890, fl. 25.
234
ACMV, 1891, fl. 34.
235
ACMV, 1894, fls. 08 e 10.
236
ACMV, 1894, fl. 07.
101
A Câmara de Varginha atendeu ao pedido dos moradores de Pontal, mas só por causa
das “insinuações” do vigário do distrito: “resolveu-se attender a essa reclamação pondo de
parte as insinuações do Vigario d’aquella freguezia que diz ser de mais conveniencia que a
Intendencia mande illuminar a freguezia em vez prohibir animaes soltos andarem pelas
ruas”239.
Não se sabe ao certo quando a iluminação chegou à freguesia de Pontal, mas em
Varginha, as primeiras menções acerca da iluminação pública240 são de 1893, quando em 05
de setembro daquele ano “resolveu o Concelho fazer um apello aos proprietarios para
auxíliarem com os póstes de madeira de lei, que serão preparados conforme o typo
apresentado pelo Concelho, ficando designado o dia 15 de Novembro para a installação da
dita iluminação”241.
Na reunião de 08 de setembro daquele ano, deliberou-se que o presidente da Câmara
estava autorizado a colocar em hasta pública os serviços necessários para a execução das
obras com a iluminação pública, visto já ter se arrecadado a verba necessária 242. Mas o valor
que poderia ser gasto, que era de seis contos de réis, diminuiu para quatro contos de réis, “em
vista da verba que foi distribuida a este Conselho pela Camara Municipal” 243. Os serviços de
237
ACMV, 1890, fl. 29.
238
ACMV, 1891, fl. 32.
239
Idem.
240
Não sabemos ao certo se a iluminação em Varginha era feita com base a óleo ou a gás. Segundo Silva (2006,
pp. 10-14), num primeiro momento, a iluminação pública brasileira era feita a óleo vegetal (o caso, por exemplo,
do Rio de Janeiro, em meados do século XVIII) e depois, à base de querosene e a gás. Mais detalhes sobre a
iluminação pública no Brasil, cf.: SILVA, Lourenço Lustosa Fróes da. Iluminação Pública no Brasil: Aspectos
Energéticos e Institucionais. 2006. Dissertação (Mestrado em Planejamento Energético) – Programa de Pós-
Graduação em Engenharia, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2006.
241
ACMV, 1893, fl. 02.
242
ACMV, 1893, fl. 03.
243
Idem.
102
energia elétrica, entretanto, chegaram em Varginha no ano de 1914, como poderemos ver na
seção referente à quarta década de formação da cidade.
As relações que Varginha possuía com outras localidades se estendiam até às finanças,
pois na reunião de 15 de fevereiro de 1892:
Era preciso que Pontal e Carmo da Cachoeira apresentassem suas finanças porque
eram distritos de Varginha. Não obstante, as finanças dos municípios deveriam ser
examinadas também pelo estado, porque “(...) cumpre observar que muitas das Constituições
estaduais estabeleceram um sistema de fiscalização da administração das finanças municipais
por parte do Estado”245.
Assim, antes do ano de 1892, a ata da sessão de 08 de janeiro de 1891 dizia que “foi
feito e remethido ao Governador do Estado o orçamento da receita e despeza desta
Intendencia para o anno de 1891”246.
Na segunda década de formação de Varginha, as relações entre a Câmara e o governo
do estado passaram a se intensificar mais. No dia 14 de junho de 1890, logo depois da
elevação à sede de Comarca “foi lida uma circular do Governador, de vinte e sete de Junho
proximo passado, erguido um quadro de todos os impostos anexados desde mil oitocentos e
oitenta até mil oitocentos e oitenta e nove, de acordo com o modelo que foi remetido”247.
Na reunião de 19 de maio de 1891, “deliberou o conselho: 1º que se officiasse ao
governador pedindo de novo a sua approvação á redução de alguns impostos, proposta em
officio de 27 de dezembro do anno passado”248.
Na mesma reunião de 19 de maio de 1891, o Conselho deliberou também:
244
ACMV, 1892, fl. 42.
245
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto – o município e o regime representativo no Brasil. 7 ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 91.
246
ACMV, 1891, fl. 31.
247
ACMV, 1890, fl. 21.
248
ACMV, 1891, fl. 33.
103
Para finalizar está seção, vamos descrever o pequeno embate entre a Câmara dos
vereadores e a classe comercial da cidade de Varginha, que havíamos mencionado
anteriormente. Começaremos esse assunto nessa seção e terminaremos na última parte deste
capítulo.
No ano de 1893, na reunião de 08 de setembro, “o Conselho Distrital da Cidade do
Espírito Santo da Varginha, decretou e seu Presidente [Pedro A. da Rocha Braga] sancionou”
que o fechamento das casas comerciais, aos domingos e dias santos, seria às 16h, sendo
isentos da lei as farmácias, botequins, confeitarias, hotéis e bilhares. Os que descumprissem a
medida pagariam multa de 20 mil réis e o dobro nas reincidências254.
249
ACMV, 1891, fl. 33.
250
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto – o município e o regime representativo no Brasil. 7 ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 124.
251
ACMV, 1890, fl. 15.
252
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto – o município e o regime representativo no Brasil. 7 ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 118.
253
ACMV, 1891, fl. 36.
254
ACMV, 1893, fl. 03.
104
Essa decisão dos vereadores causou insatisfação na classe dos comerciantes, que
resolveu reivindicar. Dessa forma, na reunião de 26 de outubro de 1893, parte da ata dizia:
Passando a tratar-se dos trabalhos ordinarios desse conselho, entrou em
discussão a resolução n: 1 que determina o fechamento das portas, resolveu o
conselho suspender a execução desta medida até ulterior deliberação, em
virtude do descontentamento que a mesma medida causou á maioria dos
comerciantes desta praça255.
255
ACMV, 1893, fl. 04.
256
A descrição dessa Lei, tal como foi descrita no trecho acima, foi encontrada na Ata de 07/07/1913, fl. 61.
257
Descrito no Almanach Sul-Mineiro para 1884, dentre outras profissões, como comerciante.
258
Proprietário de estabelecimento de bilhar em Varginha. Sobre as profissões para a cidade na época, cf.:
VEIGA, Bernardo Saturnino da. Almanach Sul-Mineiro para 1884. Campanha: Typographia do Monitor Sul-
Mineiro, 1884, pp. 186-189. No próximo capítulo da dissertação serão detalhadas mais profissões presentes no
município de Varginha na transição do século XIX para o século XX.
105
Por meio de atas dos anos de 1903 e 1905, poderemos compreender um pouco sobre o
funcionamento das mesas eleitorais que ocorriam na cidade de Varginha logo nos primeiros
anos do século XX.
As atas das eleições ocorriam em dois momentos. Primeiramente, era formada a mesa
eleitoral, com os membros que a comporiam e, depois, era realizada a eleição. Assim, o
primeiro momento da ata da eleição de fevereiro de 1903 foi descrito da seguinte forma:
Aos dezoito dias do mes de Fevereiro do anno de mil novecentos e tres pelas
nove horas da manha, na sala das secções da Camara Municipal, (...), afim
de se proceder a eleição de tres deputados federais por este districto, de um
senador federal e do Vice presidente da Republica, de accordo com a lei e as
communicações recebidas, reuniram-se os cidadãos Dr. Presciliano Pinto de
Oliveira, Manoel Jovem Xavier de Resende, Manoel Joaquim da Silva
Bittencourt, não comparecendo José Joaquim de Miranda e Joaquim Eugenio
de Araujo, tendo sido convidados os mesarius supplentes em substituição
dos faltosos, os Cidadãos José Umbelino Freire e Domingos José Cirio e
Silva, tendo sido todos em tempo nomeados na conformidade do artigo 3º da
Lei de 26 de Janeiro de 1892, para a constituir a mesa eleitoral da referida
secção. Logo em seguida, tendo cada um dos referidos mesarius dado os
seus votos, e depois destes apurados dereitamente, verificou-se que haviam
sido eleitos, á pluralidade dos mesmos votos, o Cidadão Dr. Prisciliano Pinto
de Oliveira, para presidente, e o Cidadão Manoel Joaquim da Silva
Bittencourt, para Secretario, os quaes immediatamente tomaram os assentos
que lhe competiam, bem como os outros mesarius. Então o presidente
nomeou o mesario Daniel Jovem Xavier de Resende, para faser a chamada
dos eleitores, o mesario Domingos Jose Cirio e Silva para examinar os
259
A respeito da valorização da área urbana, por exemplo, veremos no próximo capítulo que, no período de 1900
a 1909, foram criados dois bairros novos em Varginha, fazendo-se ampliar o espaço urbano, cf.: ÁVILA,
Affonso. “Varginha: formação e evolução”. In: Fund. J. P, Belo Horizonte, 13 (7/8), pp. 02-18, jul./ago., 1983,
p. 10.
106
titulos dos mesarius e o mesario José Umbelino Freire para receber as listas.
Em acto continuo declarou o presidente da mesa, instalada a segunda secção
eleitoral federal (...)260.
Mesmo constado na Constituição de 1891 que uma parte da população brasileira podia
fazer parte das eleições por meio do alistamento, não eram todos os cidadãos que obtiveram o
260
ACMV, 1903, fls. 08-09.
261
No caso das eleições para presidente da República, por exemplo, nas primeiras eleições de forma direta, em
1894, tendo sido eleito Prudente de Morais, foi cerca de 2,2% da população brasileira que participou do
processo. Para mais detalhes sobre as estatísticas eleitorais, no que diz respeito a porcentagem de participação do
povo nas eleições, de Prudente de Morais a Júlio Prestes, cf.: CARVALHO, José Murilo de. “Os três povos da
República”. In: REVISTA USP, São Paulo, n.59, p. 96-115, set./nov., 2003, p. 104.
262
CF – 1891, Cap. V, Seção I: Das qualidades do cidadão brasileiro.
263
ACMV, 1903, fl. 09.
107
direito de votar que o exerciam. No caso de Varginha, naquela eleição de 1903, havia 250
eleitores alistados, presentes na lista de chamada, mas os que efetivamente compareceram
foram 200.
Como o voto passou a ser obrigatório depois de 1930, muitos eleitores ainda não
participavam do processo por opção. Além dos próprios políticos, eram apenas as pessoas
mais ricas, os fazendeiros e comerciantes mais poderosos que se interessavam pelas eleições,
ou seja, as elites.
Por um lado, havia restrições quanto ao alistamento eleitoral, sendo excluída parte da
sociedade. Por outro lado, dentro do grupo que poderia participar das eleições, não havia
obrigatoriedade do alistamento e de participação nas eleições.
Em relação às falhas no sistema eleitoral da Primeira República, afirmou Victor Nunes
Leal:
264
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto – o município e o regime representativo no Brasil. 7 ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 223.
108
A organização do processo não garantia que ele ocorresse de forma segura. No Brasil,
em muitos casos, “o número de votos depositados nas urnas era de pouca significação do
reconhecimento, desde que houvesse interesse político em conservar ou afastar um
representante”266. No caso de Varginha, a reunião para a eleição dos membros que
representariam o distrito continuava, com detalhes sobre quem foram os eleitos:
Affonso Augusto Moreira Penna foi vice-presidente do Brasil no período de 1903 até
1906. No final de 1902, Rodrigues Alves foi eleito presidente da República, sendo o vice-
presidente Francisco Silviano de Almeida Brandão. Silviano Brandão faleceu dois meses
antes de sua posse e, para ocupar seu lugar, Affonso Penna foi eleito vice-presidente,
ocupando o cargo a partir de 1903.
Mas antes de ter se tornado vice-presidente da República, Affonso Penna havia sido
governador de Minas Gerais entre 1892 e 1894 e se elegeu senador por Minas, no ano de
1899268.
Terminando o mandato de vice-presidente da República, Affonso Penna foi eleito
presidente do Brasil, no ano de 1906. Segundo Viscardi, o governo de Affonso Penna mostrou
265
ACMV, 1903, fl. 09.
266
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto – o município e o regime representativo no Brasil. 7 ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 214.
267
ACMV, 1903, fls. 09-10.
268
ROCHA, Daniela; RAMOS, Thailissa Letícia Andara. “Afonso Pena e Nilo Peçanha: estudo embrionário da
trajetória política de dois presidentes e um mandato”. In: Encipecom – Comunicação e Política Disponível em:
http://encipecom.metodista.br/mediawiki/index.php/AFONSO_PENA_E_NILO_PE%C3%87ANHA:_estudo_e
mbrion%C3%A1rio_da_trajet%C3%B3ria_pol%C3%ADtica_de_dois_presidentes_e_um_mandato. Acesso em
14/02/2016.
109
um caráter mais técnico que o dos demais governantes que o Brasil já havia tido. No campo
econômico, Affonso Penna implantou medidas fiscais para benefício do crescimento
industrial. Sua equipe de governo buscou apoiar a produção para o mercado interno, visando
diminuir as necessidades de importação269.
Em Varginha, uma escola do estado recebeu o nome da autoridade. A Escola Estadual
Afonso Pena foi construída no ano de 1924270.
Além de serem as principais regiões de Minas Gerais nas questões econômicas e em
tamanho populacional, a Zona da Mata e o Sul, acompanhados da Zona Metalúrgica, eram as
regiões de onde mais saíram os representantes políticos estaduais e federais. Wirth escreveu
que “dois terços de todos os governadores vieram da zona da Mata e do Sul (...) O apogeu do
poder mineiro (1898-1929) foi dominado por governadores das zonas de café (...)”271.
Do período de 1890 até 1933, 22,2% dos presidentes do estado eram da Zona da Mata,
assim também como 22,2% eram da região Metalúrgica; da região do Sul de Minas Gerais,
saíram 38,9% dos presidentes eleitos. Para o mesmo período, os vice-presidentes do estado
também eram em maior número para as três regiões: 10% dos vice-presidentes eram
originários da área Metalúrgica, 20% da região Sul e 30% da Zona da Mata. Em relação aos
deputados eleitos, 19,8% eram do Sul de Minas, 25% da Zona da Mata e 31% da região
Metalúrgica272.
Os dados mostram, então, que dessas três regiões de Minas Gerais saíram cerca de
83% dos governadores do estado, 60% dos vice-governadores, e cerca de 76% dos deputados
federais. Durante a Primeira República, a elite política do estado se concentrava naquelas três
localidades.
No falho sistema eleitoral da Primeira República, a ampliação da participação popular
ocorreu apenas no ano de 1904, quando a Lei nº 1.269, de 15 de novembro daquele ano,
conhecida também como Lei Rosa e Silva, estendeu ao povo o processo de alistamento nas
269
VISCARDI, Cláudia Maria Ribeiro. O Teatro as Oligarquias – uma revisão da “política do café com leite”.
Belo Horizonte: C/Arte, 2001, p. 182.
270
Memórias das Catanduvas: Varginha e seu Patrimônio Cultural. Disponível em:
http://www.fundacaoculturaldevarginha.com.br/arquivos/patrimoniocultural/cartilha_memorias_das_catanduvas.
pdf. Acesso em: 15/02/2016.
271
WIRTH, John. O Fiel da Balança - Minas Gerais na Federação Brasileira (1889/1937). Rio de Janeiro: Paz
e Terra, 1982, p. 206.
272
FLEISHER, David D. “A cúpula mineira na República Velha: Origens sócio-econômicas e recrutamento de
presidentes e viça-presidentes do Estado e de deputados federais”. In: MONTEIRO, Norma. (org.). V Seminário
de Estudos Mineiros: A República Velha em Minas. Belo Horizonte:UFMG/PROED: 1982, p. 48.
110
eleições municipais e estaduais. “Essa lei favoreceu realmente a representação das minorias,
mas não tardou a ser frustrada nos seus objetivos”273.
Vale ressaltar que desde a proclamação da República até a elaboração da Lei, muitas
alterações foram feitas no código eleitoral brasileiro. Mas ainda assim, como o voto não era
obrigatório, não eram todos os cidadãos que votavam nas eleições que selecionavam os
membros para concorrer nas eleições de deputados, senadores e vice-presidentes da
República.
De acordo com Lei nº 1.269, as comissões responsáveis pelo alistamento seriam
constituídas, em cada município, por três cidadãos – eleitos pelos membros efetivos da
Câmara Municipal – e pelos quatro maiores contribuintes: dois do imposto predial e dois do
imposto sobre a propriedade rural (nos lugares onde não fosse tributada a propriedade rural,
este seria substituído pelo imposto de indústria e profissões). O presidente da comissão
deveria ser um juiz de direito, ou, nos municípios que não fossem comarcas, a autoridade
judicial mais graduada ou, ainda, o ajudante do procurador da República, onde não houvesse
autoridade judiciária274.
Em 1905, o ano em Varginha começava com a instalação de mais uma mesa eleitoral,
daquela vez, para a escolha de um senador. Portanto, a parte da ata que dizia respeito à
composição da mesa começava assim:
Com a Lei nº 1.269, aumentou para cinco o número de deputados de cada distrito276.
Pela Lei, a apuração final das atas das votações foi atribuída aos presidentes das Câmaras ou
dos distritos eleitorais, sob a presidência, apenas com voto de qualidade, do substituto do juiz
273
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto – o município e o regime representativo no Brasil. 7 ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 213.
274
Ibidem, p. 325, nota 28.
275
ACMV, 1905, fl. 11.
276
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto – o município e o regime representativo no Brasil. 7 ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 213.
111
federal ou de seus suplentes, com exceção das capitais dos estados e do Distrito Federal, onde
a composição da junta apuradora apresentava particularidades277. Em 1903, na eleição que
ocorreu em Varginha, o presidente da mesa eleitoral era um cidadão escolhido pelos mesários
presentes – não necessariamente o presidente da Câmara de vereadores – e era ele quem
coordenava a votação, assim como ocorreu na instalação da mesa em 1905.
A Lei nº 1.269, por fim, mantinha a contagem dos votos em poder das mesas
eleitorais. A organização das mesas, entretanto, com a Lei colocada em prática, foi alterada:
comporiam as mesas eleitorais cinco membros efetivos e cinco suplentes. Cada grupo de
trinta eleitores da sessão poderia indicar um mesário. Não havendo indicação ou se ficassem
lugares vagos, a escolha seria feita por uma junta especial, constituída dos membros efetivos
da comissão de alistamento e seus respectivos suplentes278.
Dessa forma, as eleições de 1905 em Varginha deveriam ocorrer sob novas bases. A
Lei nº 1.269 parecia tentar estabelecer maior controle sobre os processos eleitorais. Todavia,
tanto em 1903 como em 1905 a composição das mesas ocorreu da mesma forma, não sendo
observadas as orientações da nova Lei de 1904: eram três mesários mais o presidente e o
secretário. Para aqueles cinco membros havia cinco suplentes. Contudo, entendemos que os
cinco membros que comporiam as mesas, de acordo com a Lei nº 1.269, eram apenas os
mesários, com os seus suplentes, mais o presidente e o secretário, totalizando 12 pessoas,
diferentemente de como ocorria em Varginha, que totalizava a mesa 10 pessoas, contando
com os suplentes.
A segunda fase da reunião continuava da seguinte forma:
277
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, Enxada e Voto – o município e o regime representativo no Brasil. 7 ed.
São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p. 213.
278
Ibidem, p. 326, nota 32.
112
Votaram para senador naquela ocasião 54 pessoas, mas havia muito mais inscritos no
alistamento, pois era de 253 o número de alistados para a eleição:
Antes de ter sido eleito senador da República naquele ano de 1905, João Pinheiro da
Silva havia sido presidente de Minas Gerais nos anos de 1890 e 1906281. No ano de 1903,
participou do Congresso Agrícola, Industrial e Comercial, ocupando o cargo de presidente do
congresso282.
No seu plano de governo, deu prioridade para o crescimento econômico,
concentrando-se nos campos agrário e industrial, mas não deixando de lado os investimentos
na educação do trabalhador. A preocupação do governador com a educação fez com que se
criasse em 1909, logo após sua morte, o Instituto João Pinheiro. Na escola, ministrava-se
ensino técnico-agrícola para pessoas oriundas de famílias pobres283.
Ao final daquela reunião de 1905 em Varginha, “o Presidente mandou organizar uma
lista geral contendo o nome do votado e o numero de votos que recebeu, a qual foi affixada
em edital na porta do edificio e vae ser publicada pela imprensa”284.
279
ACMV, 1905, fl. 12.
280
ACMV, 1905, fl. 13.
281
COSTA, Guilherme Meirelles da. A formação política de João Pinheiro da Silva. 2006. Dissertação
(Mestrado em História) – Departamento de História da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas,
Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2006, pp. 67-68.
282
Ibidem, p. 06.
283
Ibidem, p. 64.
284
ACMV, 1905, fls. 13-14.
113
A ata não ficaria apenas no distrito, mas deveriam ser enviadas cópias às autoridades
competentes, assim como ocorreu na eleição de 1903:
Desta acta serão extrahidas seis copias e outras tantas da installação da meza
e do termo e assignaturas dos eleitores, que todas depois de assignadas pelos
mesarius e devidamente auferidas, serão enviadas ao vice-Presidente do
Senado federal, outra do Presidente da Junta apuradora em Bello Horizonte,
outra ao Presidente da Junta apuradora da Séde deste districto eleitoral, outra
ao Juiz Seccional na Capital do Estado, outra ao Secretario da Camara dos
Deputados federal e outra ao Secretario do Senado federal285.
Victor Nunes Leal afirmou que as duas falsificações mais recorrentes que dominavam
as eleições da Primeira República eram o bico de pena e a degola ou depuração. A primeira
era praticada pelas mesas eleitorais: inventavam-se nomes que fossem de importância para a
junta apuradora. Na segunda falsificação, a obra era das Câmaras Legislativas no
reconhecimento dos poderes: diplomas eram caçados na provação final, sem que fosse
necessário.
Entretanto, as fraudes nas mesas eleitorais não impediram que os políticos eleitos
conduzissem Minas Gerais e o Brasil em seu processo de crescimento econômico e
urbanização.
Pela ata de 1903, vimos a eleição de Affonso Penna para vice-presidente do Brasil,
mas também notamos que antes ele já havia sido governador de Minas Gerais, estando à
frente de um projeto de urbanização para a região. No ano de 1905, João Pinheiro da Silva foi
eleito senador e em seu cargo, também realizou ações para o desenvolvimento de Minas
Gerais. Da mesma forma que a elite agrária varginhense conduzia a cidade no seu processo de
urbanização e crescimento econômico, ocorria também com a elite estadual e nacional.
A quarta década de nossa análise, finalmente, mostrará intervenientes
importantíssimos para a consolidação do processo de urbanização em uma região: a chegada
dos serviços urbanos. As atas relataram as melhorias no serviço de abastecimento de água;
destacaram a Câmara dos vereadores em festa com a inauguração da energia elétrica;
descreveram a chegada das linhas telefônicas; e, por fim, mostraram como se chegou à
construção do prédio do mercado municipal.
285
ACMV, 1905, fl. 14.
114
Crear o imposto de 50 reis por arroba de café que fôr exportado pelas
Estações de Fluvial Varginha, bem como pela estação da Flóra quando o
café por ella exportado fôr produzido neste município. § 1º O imposto será
pelos exportadores e por intermedio dos funccionarios da Rêde Sul-Mineira
mediante contracto de porcentagem que a Camara estabelecerá com a
Directoria da referida via-ferrea, a porcentagem paga a essa via-ferrea não
excederá de 20%. § 2º O imposto arrecadado entrará para o cofre municipal
no fim de cada mez286.
286
ACMV, 1912, fl. 26.
287
ACMV, 1911, fl. 12.
288
Idem.
115
289
ACMV, 1913, fl. 65.
290
ACMV, 1913, fl. 61.
291
Idem.
292
ACMV, 1913, fl. 64.
293
Idem.
116
A “Lei do Descanso Dominical” foi aprovada em primeira discussão, mas dois anos
após a medida ter entrado em vigor (e houve algumas alterações nesse período), os
comerciantes, mais uma vez, discordaram da decisão, e na reunião de 04 de janeiro de 1916,
“foi lido em expediente uma representação firmada por quarenta e um negociantes pedindo
para revogar a lei que ordena fechar as casas commerciaes aos domingos a uma hora da tarde,
a Camara tomou conhecimento do mesmo”294.
Dessa forma, a Câmara resolveu o seguinte:
Sendo posta em discussão, a proposta não foi aprovada apenas pelo major Silva
Bittencourt, que havia apresentado à Câmara o projeto convertido na Lei Nº 101, que
mandava fechar o comércio aos domingos, inicialmente, às 12 horas.
Essa mudança em relação ao fechamento das casas comerciais não agradou a maioria
dos comerciantes da cidade e, mais uma vez, eles apresentaram uma reivindicação, já na
reunião do dia 05 de janeiro de 1916:
294
ACMV, 1916, fl. 28.
295
ACMV, 1916, fl. 29.
296
ACMV, 1916, fl. 32.
117
297
ACMV, 1916, fl. 24.
118
Portanto, vemos que, apesar de cada década contar com uma especificidade, havia
questões comuns a todas elas. No entanto, não se deve negar que a década de 1910 mostraria
grande evolução urbana e econômica para a cidade, com três serviços de grande importância
para Varginha: os melhoramentos na rede de água, a chegada da energia elétrica e a instalação
das linhas telefônicas, além da construção do mercado municipal, fazendo reforçar-se ainda
mais a importância do comércio varginhense.
As melhorias no tratamento de água em Varginha começaram após 1910, quando nas
atas das reuniões podemos observar maiores preocupações com relação ao serviço prestado à
sociedade. Na reunião de 09 de junho de 1910, sob presidência do coronel João Urbano de
Figueiredo:
A energia elétrica seria instalada no ano de 1914, e de 1910 até a data da inauguração,
muitas reuniões a respeito do tema ocorreriam. Novamente na reunião de 11 de outubro de
1910, “resolveu-se sobre luz, agua, esgotos e força eletrica”299.
Com a evolução do processo de urbanização, também evoluíam as demandas da
cidade. O melhor tratamento à água não estava dentre as primeiras preocupações da Câmara
Municipal, surgindo o assunto na quarta década de nossa análise. No dia 30 de abril de 1910:
298
ACMV, 1910, fl. 04.
299
ACMV, 1910, fl. 09.
300
ACMV, 1913, fl. 55.
301
No período da quarta década de nossa análise, os bancos passavam por uma fase de não realizar empréstimos.
Escreveu Wirth que “o banco de Crédito Real do estado estava atolado em rotina burocrática e o Banco
Hipotecário, a outra instituição semi-oficial fundada em 1911 com capital francês, não satisfez às expectativas”.
Continuou o autor que “os bancos comerciais preferiam operar em centros populacionais maiores”, que
garantiam juros maiores. Foi em 1930 que as agências oficiais de empréstimo mudaram de postura. O Banco do
Café (mais tarde Banco Mineiro da Produção), por exemplo, começou a conceder empréstimos em 1934,
119
Com o aumento da população de Varginha, era comum que fosse necessário aumentar
a quantidade de água. Apesar disso, as melhorias no novo serviço seriam acessíveis apenas a
uma pequena parte da população varginhense. Naquela mesma sessão:
expandindo-se para outros setores, não apenas o da produção agrícola (WIRTH, 1982, p. 102). Se por um lado os
bancos estavam reduzindo seus empréstimos, por outro lado, o Estado mantinha em seu orçamento as categorias
de operação de dívida, educação, força pública, judiciário, obras públicas, apoio a ferrovias e apoio ao café.
Entre 1910 a 1919, o orçamento destinava 5.000:000$000 para obras públicas. (WIRTH, 1982, p. 291).
302
ACMV, 1913, fl. 64.
303
ACMV, 1914, fl. 76.
304
Idem.
305
Idem.
120
Não se sabe ao certo quanto tempo duraram aquelas obras, mas depois de mais de um
ano do início dos trabalhos, a Câmara ainda devia ao encarregado do serviço, pois na reunião
de 17 de agosto de 1915, “pelo Capitão Antonio Rebello da Cunha foi apresentado um
projecto auctorizando o Presidente da Camara a despender até a quantia de sete contos e
quinhentos mil reis para saldar as contas do encarregado do serviço do tunel do encanamento
d’agua”307.
Como Varginha possuía distritos, também precisava dar assistência àquelas
localidades. No dia 13 de setembro de 1915:
Foi lido em expediente um abaixo-assignado dos residentes e visinhos do
povoado de S. Bento do Campo Bello pedindo a esta Camara para abastecer
aquelle logar com agua potável: a Camara tomando em consideração tão
justo pedido resolveu auxiliar com a importancia de um conto de reis
(1:000$000) este serviço, verba que deverá ser retirada do saldo do districto
do Carmo da Cachoeira308.
306
ACMV, 1914, fls. 76-77.
307
ACMV, 1915, p. 08.
308
ACMV, 1915, pp. 09-10.
309
ACMV, 1915, p. 10.
121
No outro dia, 02 de agosto, ficou decidido que o agente executivo teria um prazo breve
para apresentar à Câmara o orçamento para a instalação do serviço. Sendo impossível o
empréstimo e, no caso do ser contratada uma empresa (a que fizesse a instalação pelo preço
mais baixo possível), era necessário estabelecer-se os prazos de início e término do serviço,
assim como o preço das lâmpadas das iluminações públicas e particulares e estabelecer multas
caso a empresa não cumprisse o que fosse combinado312.
Varginha passava por um crescimento urbano, ainda que gradual, a já contava com
escolas, a ferrovia, comércios, pequenas fábricas, imprensa – que publicava editais, por
exemplo, de quando abria-se concorrência para melhorias em estradas ou em obras de
calçamento das ruas –, o abastecimento de água havia passado por melhorias. Assim, era
notável que a energia elétrica fosse uma demanda necessária.
Na reunião extraordinária de 10 de fevereiro de 1912, sob presidência do major Silva
Bittencourt, foram analisadas as propostas para a instalação da energia elétrica. Foram levadas
à Câmara oito propostas, e os vereadores analisaram alguns requisitos para a escolha da
melhor. Os requisitos eram:
economico, conciliando o interesse publico com o particular, energia eletrica
sob o ponto de vista de sua importancia, encampação, condições de
pagamento da Camara Municipal, favores extraordinarios pedidos pelos
proponentes e vantagens extraordinarias pelos mesmos offerecidos313.
310
ACMV, 1910, fl. 04.
311
ACMV, 1911, fl. 17.
312
ACMV, 1911, fl. 19.
313
ACMV, 1912, fl. 30.
122
314
ACMV, 1912, fl. 30.
315
Idem.
316
Idem.
317
Idem.
318
Idem.
319
Idem.
123
Finalmente, “depois de ter sido lido o parecer o Senhor Presidente ordenou [ao
secretário] que convidasse o proponente Vivaldi & Cia [proposta número 3] para assignar o
contracto”325. O proponente era uma empresa do Rio de Janeiro.
Nos registros de imóveis, encontramos algumas transações de bens envolvendo o
nome da companhia: no total, são quatro registros envolvendo a empresa na cidade de
Varginha, dois de 1912 e dois de 1914. O primeiro deles, de 03 de fevereiro de 1912, era
referente à compra de parte de um terreno da Fazenda Pontal, no valor de 500$000. Nas
condições do contrato estava especificado que a companhia deveria fornecer lâmpadas para a
casa de morada da Fazenda do Pontal, fazer uma ponte ligando a ilha ao continente e o fecho
320
ACMV, 1912, fl. 30.
321
Idem.
322
Idem.
323
Idem.
324
ACMV, 1912, fl. 31.
325
Idem.
124
da faixa cedida com cerca de arame. No segundo registro, de 05 de junho de 1912, a Vivaldi
& Cia adquiriu mais terras da Fazenda Pontal, no mesmo valor da primeira compra.
Em fevereiro 1914 as obras para instalação da energia elétrica deveriam estar sendo
finalizadas, mas a Vivaldi & Cia precisava de mais alguns dias para o término total do
serviço. No dia 03 de fevereiro daquele ano:
Foi lido perante a Camara um requerimento da Companhia Mercantil e
Industrial Casa Vivaldi, no qual pede sessenta dias de prazo para dentro delle
inaugurar a installação eletrica, justificando este pedido o incidente ocorrido
no canal o qual obrigou a Companhia fazer novas obras de segurança, a
Camara mandou que para ser a suplicante attendida erá necessario que
enviasse o original da planta que foi approvada para collocação dos postes
da illuminação que lhe foi fornecida pela mesma, enviar a tabella dos preços
da illuminação particular e informar se as duas lampadas de mil vellas cada
uma que a empreza comprometheu se a colocar em logares determinados
pelo Agente Executivo poderam ser subdivididas a juizo do mesmo e se isso
mesmo convocasse a Companhia326.
326
ACMV, 1914, fl. 70.
327
ACMV, 1914, fl. 72.
328
Idem.
329
Wenceslau Braz Pereira Gomes foi importante membro da sociedade política sul-mineira e, entre 1914 e
1918, foi presidente do Brasil. No ano de inauguração da energia elétrica em Varginha, residia em Itajubá.
Delfim Moreira da Costa Ribeiro também foi importante membro da sociedade política sul-mineira, tendo
presidido o Brasil do final de 1918 até meados do ano de 1919. No ano de inauguração da energia elétrica em
Varginha, residia em Santa Rita do Sapucaí.
125
O novo serviço que chegava à Varginha não beneficiaria a população toda. Devemos
destacar que seriam iluminadas as áreas centrais da cidade, o espaço urbano de Varginha, e os
serviços de iluminação chegariam, primeiramente, aos proprietários de comércios e fábricas, à
minoria da população, ou seja, à elite agrária varginhense.
Na reunião que se seguiu, dia 27 de abril, o principal assunto tratado dizia respeito às
despesas com os festejos da iluminação elétrica. O presidente da Câmara foi autorizado a
pagar o banquete que “a mesma Camara ofereceu aos Excelentissimos Senhores Doutores
Wenceslau Braz Pereira Gomes, Delfim Moreira e suas comitivas no dia 12 do corrente na
importancia de oito contos de reis”334. Ainda, a Câmara deveria pagar mais “dois contos e
seiscentos mil reis de despezas para o mesmo fim, sendo julgado objecto de deliberação foi
posto a votos e approvado em primeira discussão”335. As outras despesas “feitas com a
inauguração da luz electrica” deveriam ser pagas “pelas verbas do orçamento”336.
No dia 19 de maio, uma reunião extraordinária ocorreu porque a Câmara havia
deixado de cumprir uma das partes do acordo com a Companhia Vivaldi. A reunião era:
330
ACMV, 1914, fls. 72-73.
331
ACMV, 1914, fl. 73.
332
Idem.
333
ACMV, 1914, fl. 73.
334
ACMV, 1914, fl. 74.
335
Idem.
336
Idem.
126
337
ACMV, 1914, fl. 75.
338
ACMV, 1914, fl. 75.
339
ACMV, 1920, fl. 12.
340
SAES, Alexandre Macchione. Conflitos do Capital: Light versus CBEE na Formação do Capitalismo
Brasileiro (1898 – 1927). 2008. Tese (Doutorado em Desenvolvimento Econômico) – Instituto de Economia,
Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 2008, p. 385.
127
comissão de obras publicas o parecer da mesma sobre uma petição do Senhor José Lisbôa de
Paiva pedindo privilegio para estabelecer linhas telephonicas no município”341.
A Câmara aprovaria, mas algumas condições foram dadas. Assim:
Naquela mesma reunião, logo em seguida, “foi posto em segunda discussão o projecto
que considera caduco o contracto com a Companhia Telephonica Bragantino por não ter
cumprido as clausulas, foi aprovado”343.
Nas atas da Câmara não houve mais descrições a respeito da petição do senhor José
Lisbôa de Paiva, mas linhas telefônicas foram instaladas em Varginha. No açougue do senhor
Manoel Caetano de Oliveira, que entrou em funcionamento no prédio do mercado em 1916,
faria parte das instalações do cômodo “um telephone e uma lampada electrica”344.
As linhas telefônicas não atenderiam apenas a população urbana, mas também a que
residia na zona rural. Todavia, ainda assim, era apenas a elite que utilizaria o novo serviço, de
imediato. A elite proprietária de terras, dona de fazendas importantes, mas também possuidora
de bens imóveis nas áreas centrais da cidade e com mais recursos financeiros que a maioria da
população.
Destacamos, por fim, a criação do mercado municipal nesse tópico do texto porque
acreditamos que o mercado se constituiu numa importante construção para o fortalecimento
do comércio varginhense, bem como, fazia com que aumentassem as rendas do município.
O mercado municipal foi inaugurado em Varginha no ano de 1915, mas as menções à
construção começaram no ano de 1910345. Depois de um primeiro registro em 1910, foi na
reunião de 11 de novembro de 1911 que foi oferecido à Câmara Municipal, por meio de
ofício, um terreno localizado na Praça São José para a construção do mercado municipal. O
terreno era de um morador da cidade (Augusto Lopes de Vasconcellos) e foi oferecido pelo
341
ACMV, 1913, fl. 56.
342
Idem.
343
ACMV, 1913, fl. 56.
344
ACMV, 1916, p. 39.
345
Um prédio próprio para o mercado municipal foi inaugurado no ano de 1915, mas antes disso, Varginha já
contava com comércios espalhados pela cidade. No ano de 1893, Varginha possuía uma Praça do Mercado
(ACMV, 1883, fl. 06) onde entendemos que os comerciantes expunham seus produtos para venda. Considerando
as culturas e mantimentos existentes em Varginha, que poderão ser melhor conferidas no capítulo 4 dessa
dissertação, sobre os inventários post-mortem, acreditamos que em Varginha comercializava-se, tanto em 1893
como em 1915, na inauguração do prédio do mercado, especialmente, café, cana de açúcar, açúcar, aguardente,
milho, arroz, feijão, mandioca, polvilho, sal, amendoim, fumo e algodão.
128
valor de três contos de réis, aceitando-se como pagamento apólices a juros de 10% ao ano.
Contudo “a Camara não ia construir actualmente o mercado”346.
O assunto retornou no ano de 1913, quando em janeiro daquele ano, o presidente da
Câmara, major Evaristo Soares, “nomeou uma comissão dos vereadores Capitães Rebello da
Cunha, Maximiano Baptista e Major Silva Bittencourt para darem pareceres sobre o local
mais apropriado para ser construido o mercado”347.
No dia 25 de junho de 1913, “pelo vereador Capitão Rebello foi appresentado um
projecto que aucthoriza o Presidente da Camara a mandar levantar uma planta do mercado
sendo julgado objecto de deliberação foi approvado em primeira discussão”348.
Depois dessa autorização, demorou mais de um ano para realização de um empréstimo
a fim de começarem as obras. Foi na reunião de 13 de outubro de 1914, numa sessão
extraordinária que o presidente da Câmara, Evaristo de Souza Soares, “disse que tinha
convocado a presente sessão para se tratar de contrahir um emprestimo para construcção do
mercado desta cidade”349.
Então, ele foi autorizado, pelo projeto do vereador capitão Rebello da Cunha, a fazer
um empréstimo de até vinte contos de réis, por meio de escritura pública, sendo os juros
nunca superiores a 10% ao ano. Assim, pelo mesmo vereador foi apresentado “outro projecto
que auctoriza o Presidente da Câmara a pôr em hasta publica a construcção total e esgottado
mercado publico de conformidade com o orçamento apresentado”350. O prédio do mercado
seria construído na Praça do Mercado.
Depois de decididas as questões de orçamento e de localização do mercado, abriu-se
um período para recebimento de propostas para a construção do prédio. No dia 14 de
novembro de 1914, em reunião extraordinária, “o Senhor Presidente [major Evaristo de Souza
Soares] disse que tinha convocado a presente reunião para apresentar a Camara o parecer da
Comissão de Obras Publicas”351. O parecer da comissão, sendo analisado pela Câmara, foi
aprovado. A proposta escolhida foi “a do Senhor Antonio Alves Ribeiro com a condição de
fazer os passeios em volta do mesmo edificio352”.
A inauguração do mercado não foi descrita nas atas da Câmara, mas o prédio entrou
em funcionamento entre o fim de 1915 e o começo de 1916. No ano de 1915, no dia 13 de
346
ACMV, 1911, fl. 22.
347
ACMV, 1913, fl. 48.
348
ACMV, 1913, fl. 56.
349
ACMV, 1914, fl. 81.
350
ACMV, 1914, fl. 82.
351
ACMV, 1914, fl. 83.
352
Idem.
129
setembro, “pelo Capitão Rebello da Cunha foi aprezentado um projecto para o regulamento e
tabella de impostos do mercado a vigorar logo que o mesmo seja inaugurado”353.
Em março de 1916 o mercado já estava em funcionamento, porque foi marcada uma
reunião extraordinária para tratar-se de assuntos específicos do mercado, tais como ajustes na
tabela de impostos, regulamentação interna e questões referentes a comerciantes que
desejavam transferir seus estabelecimentos para o prédio do mercado.
A construção do mercado gerou efeitos positivos não só para os comerciantes, mas
também para os compradores. Os comerciantes que tinham condições de pagar o aluguel de
um espaço no mercado estariam todos juntos num mesmo lugar, o que atraía mais
compradores e estes, encontrariam concentrados os produtos que demandavam. Ainda,
considerando a classe comercial, com a ferrovia, seus produtos poderiam ser enviados a outras
localidades do Sul de Minas Gerais e, da mesma forma, eles poderiam receber produtos de
outras localidades, para revenderem no mercado.
Assim, os comerciantes de Varginha passaram a querer ocupar o mercado municipal,
como mostrou a ata de 01 de março de 1916. Naquela reunião, foi lido o requerimento do
proprietário de um açougue da cidade, Manoel Caetano de Oliveira, “desejando transferir o
seu açougue para um dos departamentos do “Mercado Municipal” desta cidade”354.
O proprietário poderia transferir seu estabelecimento para o prédio, desde que “fosse
montado a capricho, com luxo, estylo moderno” e de acordo com normas de higiene. O
comerciante poderia utilizar o cômodo por cinco anos, com isenção do pagamento do aluguel
do cômodo, mas depois de passado o período, deveria devolver à Câmara toda a montagem do
açougue, “que poderá ser alugado ao mesmo proponente, que terá preferencia, ou a quem
melhores vantagens offerecer”355.
O mercado municipal, porém, logo foi vendido a particulares, três anos depois da
reunião que regulamentou seu funcionamento. No dia 15 de março de 1919:
353
ACMV, 1915, p. 10.
354
ACMV, 1916, pp. 38-39.
355
ACMV, 1916, p. 39.
356
ACMV, 1919, fl. 72.
130
Na reunião seguinte, dia 17 de março de 1919, “foi lida uma proposta do Senhor
Joaquim Eugenio de Araujo para a compra do mercado publico, premiado para pol-o em hasta
publica pois garantia a offerta de 20:000$000 pelo predio e mais cinco metros nos fundos”357.
O mercado pode ter sido colocado à venda porque não gerava a renda que a Câmara
dos vereadores desejava e por isso decidiu-se deixá-lo nas mãos de um particular. No entanto,
estando o prédio do mercado nas mãos da Câmara dos vereadores ou de um proprietário
particular, seu funcionamento não cessava. O prédio do mercado funciona atualmente em
Varginha, no mesmo lugar que foi construído no ano de 1915.
Ao longo de 38 anos, podemos observar que Varginha passou por importantes
transformações em sua estrutura urbana. As atas da Câmara detalham bem essas
transformações, e as informações são muitas. Assim, selecionamos os projetos, as leis e os
acontecimentos que julgamos terem sido importantes para a formação da cidade.
Traçamos um perfil específico para cada década, mas alguns assuntos, como as obras
de infraestrutura e as relações com o governador do estado, dentre outros, perpassam o tempo.
Conseguimos entender como Varginha passou de uma cidade onde as preocupações
iniciais eram as relacionadas com a organização de ruas e praças, consertos de pontes e
estradas etc, em fins do século XIX, para uma cidade em que as empresas de serviços urbanos
chegavam e ofereciam à sociedade – ou à minoria dela – novos padrões de consumo, voltados
para a valorização do espaço urbano.
A introdução de novos padrões de consumo nas sociedades, consequência da Segunda
Revolução Industrial, ocorria em Varginha, embora com menor intensidade que em cidades
maiores, como São Paulo, mas de forma parecida com o padrão de crescimento urbano do Sul
de Minas. O tratamento da água, a chegada da energia elétrica e do telefone, a construção do
mercado municipal foram elementos que deram nova forma ao município, juntamente com o
processo de urbanização conduzido pela elite agrária que, no fundo, era a camada da
sociedade que mais se beneficiava.
Observamos esse processo de evolução urbana somente pelas atas da Câmara, para
mostrar os anseios dos vereadores. Em nosso próximo capítulo, vamos nos utilizar dos
registros de imóveis para entendermos a valorização do espaço urbano. Tentaremos mostrar
que os imóveis urbanos passavam por um aumento de transações e de preço com o passar dos
anos, pequeno, mas em constante movimento, enquanto os imóveis rurais, também de forma
gradual, passavam a se desvalorizar.
357
ACMV, 1919, fl. 72.