Revista Eletrônica Acervo Saúde | ISSN 2178-2091
Malformação dos ductos de Müller com agenesia cervical
Müllerian duct malformation with cervical agenesis
Malformación del conducto de Müller con agenesia cervical
Lavynne Simões Azevedo¹, Mirelly Alves Vitor¹, Tiago da Rocha Araújo¹, Ana Carolina Bezerra
Góes¹, Caio Álvares Bitencourt¹, Marcos Vinícius Almeida Santos1, Juliana Arais Hocevar
Kristoschek2, Bruna Gabriel Heinen³, Maria Eduarda Amaral³.
RESUMO
Objetivo: Relatar o caso de uma paciente portadora de malformação mülleriana com agenesia cervical, cujo
mecanismo resulta da fusão anômala dos ductos mullerianos durante a embriogênese. Detalhamento do
caso: Paciente do sexo feminino, 19 anos, com queixa de amenorreia primária e dor pélvica cíclica há cerca
de 4 anos. Ao exame físico, desenvolvimento de caracteres sexuais secundários normais e vagina curta, de
aproximadamente 4 cm, em fundo cego. Aos exames complementares notou-se presença de duas cavidades
uterinas, separadas completamente, com ausência do canal endocervical em ambas as cavidades. Ademais,
presença de endométrio trilaminar funcionante. Como plano terapêutico, para além das questões psicológicas
abordadas, optou-se por histerectomia com salpingectomia e posterior seguimento com dilatadores vaginais.
Considerações finais: Ressalta-se a necessidade de que o médico saiba como proceder diante uma
amenorreia primária, considerando o diagnóstico de malformação mülleriana. Deve-se evidenciar a
importância da avaliação individualizada para definição terapêutica tendo em vista a grande variedade de
apresentações dessas malformações.
Palavras-chave: Malformação mülleriana, Amenorreia primária, Útero rudimentar.
ABSTRACT
Objective: Presenting a case of a patient with Müllerian malformation and cervix agenesis, which results from
an anomalous fusion of the müllerian ducts during embryogenesis. Case detailing: Female, 19 years old,
complaining of primary amenorrhea and ciclic pelvic pain for 4 years. At physical examination was noticed that
the patient had normal secondary sexual characters and a short blind-folded vagina. Complimentary exams
showed two uterine cavities which were completely divided, but with no endocervical canal in both cavities.
Furthermore, the endometrium was functioning. The terapeutic plan, besides the psychological following, was
perform a hysterectomy accompanied by a salpingectomy followed by treatment with vaginal dilators. Final
considerations: It's imprescindible that physicians know how to procede when in presence of a patient with
a müllerian malformation. It must be evidenced the importance of an individual avaliation to choose the best
therapeutic option, as there are a variable range of how these malformations present themselves.
Keywords: Mullerian malformation, Primary amenorrhea, Rudimentary uterus.
RESUMEN
Objetivo: Reportar el caso de una paciente con malformación mülleriana con agenesia cervical, cuyo
mecanismo resulta de la fusión anómala de los conductos müllerianos durante la embriogénesis. Detalles del
caso: Paciente mujer, 19 años, que consulta por amenorrea primaria y dolor pélvico cíclico. Dolor durante
unos 4 años. Al examen físico se observa desarrollo de caracteres sexuales secundarios normales y vagina
1 Universidade de Brasília (UNB), Brasília - DF
2 Universidade de Brasília (UNB), Brasília- DF.
3 Hospital Universitário de Brasília (HUB), Brasília - DF.
SUBMETIDO EM: 1/2024 | ACEITO EM: 2/2024 | PUBLICADO EM: 6/2024
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corta, de aproximadamente 4 cm, con fondo ciego. Los exámenes complementarios revelaron la presencia
de dos cavidades uterinas, completamente separadas, con ausencia del canal endocervical en ambas
cavidades. Además, presencia de endometrio trilaminar funcional. Como plan terapéutico, además de las
cuestiones psicológicas abordadas, se optó por la histerectomía con salpingectomía y seguimiento posterior
con dilatadores vaginales. Consideraciones finales: Es importante que el médico sepa cómo proceder ante
una amenorrea primaria, considerando el diagnóstico de malformación mülleriana. Hay que destacar la
importancia de la valoración individualizada para la definición terapéutica, dada la gran variedad de
presentaciones de estas malformaciones.
Palabras clave: Malformación mülleriana, Amenorrea primaria, Útero rudimentario.
INTRODUÇÃO
As malformações uterinas congênitas ou malformações müllerianas, compreendem uma série de
anormalidades estruturais decorrentes de alterações na fusão dos ductos de Müller, durante o período
embrionário. Tais alterações podem estar presentes em maior ou menor grau, nos órgãos que se
desenvolvem a partir dos ductos müllerianos/paramesonéfricos (MOORE, KL, et al., 2020). A prevalência
dessa condição é incerta, uma vez que muitas mulheres são assintomáticas ou oligossintomáticas, chegando
ao diagnóstico apenas quando há manifestação de problemas ginecológicos/obstétricos, como amenorreia
primária e abortos de repetição (SARAVELOS SH, et al., 2008).
De acordo com Saravelos, et al. em um estudo realizado entre os anos de 1950 a 2007, a incidência das
malformações uterinas congênitas é de aproximadamente 6,7% na população geral, sendo maior nas
mulheres inférteis (LAUFER M e DECHERNEY A, 2022). Quando se trata de agenesia cervicovaginal, estima-
se uma ocorrência ainda menor, de 1 para cada 80-100 mil habitantes (BHAGAVATH B, et al., 2017). A
etiopatogenia das alterações uterinas congênitas não é completamente esclarecida, mas acredita-se que
diferentes genes estejam envolvidos na sinalização defeituosa e consequente alteração da embriogênese
(BAGNOLI VR, et at., 2010).
O desenvolvimento do sistema reprodutor feminino se inicia a partir da sexta semana de vida intra-útero,
a partir da degeneração dos ductos mesonéfricos e formação dos ductos paramesonéfricos a partir do celoma
da crista urogenital (PASSOS IMPE e BRITTO RL, 2020; LAUFER MARC, 2022). Os ductos müllerianos são
lateralizados inicialmente, sua porção cranial é responsável pela formação das tubas uterinas, enquanto, a
porção caudal segue um percurso longilíneo até alcançar a pelve. Na localização adequada, os ductos
paramesonéfricos são fundidos para dar origem ao primórdio do útero e os dois terços superiores da vagina.
Entretanto, a descontinuação da formação embriológica dos ductos müllerianos, se manifesta por alterações
congênitas do sistema reprodutor feminino, como falhas de fusão lateral, vertical e agenesia (HERLIN MK, et
al., 2020).
O desenvolvimento ovariano por sua vez, ocorre independentemente das outras estruturas do trato
reprodutor, bem como as trompas uterinas, são formadas a partir de linhagens celulares distintas, garantindo
dessa forma, que mulheres com malformações müllerianas possuam níveis hormonais fisiológicos e trompas
pérvias (MOORE, KEITH L, et al., 2020). Ademais, o sistema urinário apresenta correlação anatoembriológica
com o trato genital. Dessa forma, anomalias congênitas uterovaginais podem ser associadas a malformações
do trato urinário, em especial alterações renais, como agenesia, rim pélvico ou em ferradura (FERNANDES
CE e SILVA DE SÁ MF, 2019). A apresentação clínica é variável e depende de qual mecanismo embrionário
foi afetado, podendo dar origem desde queixas mais brandas à mais severas, a exemplo da síndrome de
Mayer-Rokitansky-Kuster-Hauser, onde há obstrução total dos ductos müllerianos levando a agenesia uterina-
vaginal.
De forma geral, os sinais e sintomas mais comuns na prática clínica são amenorreia primária, dispareunia,
dor pélvica cíclica, infertilidade, abortos de repetição, dentre outros (PFEIFER SM, et al., 2021). O diagnóstico
é dificultado, uma vez que não existe uma classificação aceita universalmente, sendo a classificação proposta
pela American Society for Reproductive Medicine desenvolvida em 1988 e atualizada em 2021, a mais
utilizada na prática (KUMAR S, et al, 2008). Após suspeita clínica, são utilizados como métodos diagnósticos
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iniciais, a ultrassonografia e a ressonância magnética da pelve, que por sua vez, é considerada o padrão ouro
para o diagnóstico (LAUFER M, 2022). As pacientes com malformações müllerianas, por vezes necessitam
de tratamento, mas devido a diversidade das alterações congênitas, ainda não há um protocolo específico
para solucionar as demandas, visto que cada caso é individualizado. Um aspecto importantíssimo é fornecer
auxílio psicológico a essas pacientes, visando uma melhor qualidade de vida, aceitação e autocuidado, cujo
objetivo é reduzir possíveis danos psicológicos (PASSOS IMPE e BRITTO RL, 2020).
O objetivo deste estudo foi relatar o caso de uma paciente com malformação mülleriana com defeito total
de fusão, manifestada por úteros rudimentares e septados, agenesia cervical e vaginal proximal, cujo sintoma
principal foi a amenorreia primária. Justifica-se a importância deste relato por se tratar de uma condição de
ocorrência rara nos consultórios de ginecologia, sendo crucial para o médico, o manejo correto da condição,
visando minimizar repercussões clínicas e principalmente psicológicas, considerando que para muitas, a
percepção de sexualidade está intrinsecamente relacionada com o adequado funcionamento fisiológico e
anatômico do sexo feminino. Por envolver situação clínica real, o seguinte artigo foi submetido a análise do
Comitê de ética da Faculdade de Medicina, aprovado sob o número CAAE 71528223.40000.5558, número
do parecer 6.274.946.
DETALHAMENTO DO CASO
Paciente do sexo feminino, 19 anos de idade, sem comorbidades, se apresenta ao setor de ginecologia
endócrina de um hospital terciário, com queixa de amenorreia primária. Refere desenvolvimento de caracteres
sexuais secundários aos 15 anos de idade e que desde então, apresenta de forma cíclica mensalmente, dor
pélvica de forte intensidade, sem melhora significativa com o uso de analgésicos orais. Possui vida sexual
ativa e nega queixas ginecológicas. Relata não possuir histórico familiar de doenças ginecológicas e que não
faz uso de drogas ilícitas. Ao exame físico, consta desenvolvimento sexual secundário fisiológico, M5P5
segundo a classificação de Tanner, sem alterações externas. Ao exame especular, vagina de
aproximadamente 4 cm, com fundo cego, não sendo observado colo uterino. Os exames hormonais não
evidenciaram alterações.
Foi submetida a ultrassonografia pélvica endovaginal e a ressonância magnética da pelve, que revelaram
cavidade vaginal de dimensões reduzidas, com terço proximal ausente, presença de duas cavidades uterinas,
separadas completamente, com ausência do canal endocervical em ambas as cavidades. O volume dos
cornos uterinos direito e esquerdo são de 14,5 cm³ e 13,5 cm³, com endométrios medindo 0,6 cm e 0,5 cm,
respectivamente. Os ovários possuem morfologia normal, com presença de cistos foliculares sem sinais de
complexidade. Foi visualizado também, pequena quantidade de líquido livre na cavidade pélvica (Figuras 1A
e 1B).
Figura 1 - Ressonância magnética da pelve nas sequências axial e sagital.
A B
Nota: A - Evidência dois remanescentes uterinos unidos por prega de peritônio; B -
Aparelho reprodutor, com destaque para remanescentes uterinos e vagina encurtada.
Fonte: Azevedo LS, et al., 2024.
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Foram solicitados exames de imagens para visualização das vias urinárias, que não evidenciaram
alterações. Os achados são compatíveis com mal formação dos ductos müllerianos com agenesia cervical e
defeito total de fusão. A presença das dores pélvicas cíclicas sugere a ocorrência de ciclos ovarianos,
confirmados pelo endométrio de aspecto trilaminar demonstrado em ultrassom endovaginal e na seção dos
cornos rudimentares após-histerectomia (Figura 2 e 3).
Figura 2- Ultrassom endovaginal.
Nota: Evidência de endométrio trilaminar. Fonte: Azevedo LS, et al., 2024.
Foi prescrito progestágeno injetável trimestral, sem melhora significativa da dor e a paciente foi
encaminhada à avaliação da equipe da genética médica e da cirurgia ginecológica. Após avaliação cirúrgica,
foi submetida a histerectomia com salpingectomia e após recuperação, seguirá tratamento médico com o uso
de dilatadores vaginais. Ademais, questões psicológicas foram abordadas durante o manejo do caso, uma
vez que se trata de um diagnóstico delicado, paciente referiu queixa de dispareunia pela alteração anatômica,
porém, o maior impacto estava relacionado com o fato de não poder gestar futuramente. Nesse sentido, a
paciente foi conduzida por equipe multiprofissional, composta por médicos e psicólogos.
Figura 3 - Imagem de pós-cirúrgico.
Nota: Secção dos cornos uterinos rudimentares pós-histerectomia, evidenciando
uma pequena porção corresponde ao endométrio funcionante. Imagem adquirida no
pós-cirúrgico, com devida autorização da paciente.
Fonte: Azevedo LS, et al., 2024.
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DISCUSSÃO
A Agenesia mülleriana (AM) é a segunda causa mais comum de amenorreia primária, sendo caracterizada
pela ausência congênita do útero, colo do útero e/ou parte superior da vagina em mulheres com cariótipo 46
XX e de fenótipo normal. Essas anomalias envolvendo os ductos de Müller ocorrem em cerca de 0,5% a 5%
das mulheres (PFEIFER SM, et al., 2021). Em 1988, a American Fertility Society estabeleceu um comitê de
classificação liderado por Buttram. O comitê dividiu as anomalias müllerianas em sete grupos com base em
anomalias uterinas anatômicas coexistindo com anormalidades estruturais da vagina, colo do útero, ovidutos,
ovários e sistema urinário. Mais recentemente, em 2021, a American Society for Reproductive Medicine
(ASRM) publicou uma atualização dessa classificação, em que as alterações dos ductos de Müller agora são
divididas em 9 categorias.
Isso porque esses defeitos congênitos representam um contínuo de desenvolvimento e muitas vezes
acabam tendo elementos combinados, o que pode tornar a classificação mais desafiadora. Para anomalias
difíceis de classificar ou para as quais há discordância sobre a que grupo pertencem, essa nova classificação
permite o cruzamento e a comparação entre as categorias. De acordo com esta, as malformações müllerianas
podem ser agrupadas em agenesia mülleriana, agenesia cervical, útero unicorno, útero didelfo, útero bicorno,
útero septado, septo longitudinal transverso, septo vaginal transverso e anomalias complexas (KUMAR S, et
al., 2008). A paciente do caso relatado acima parece se enquadrar como uma agenesia mülleriana com cornos
uterinos rudimentares e endométrio funcionante.
A presença das dores pélvicas cíclicas sugere a presença de ciclos ovarianos confirmados pelo endométrio
de aspecto trilaminar demonstrado em ultrassom endovaginal do útero remanescente direito. Como não há
canal cervical, o fluxo menstrual era incapaz de deixar os cornos uterinos rudimentares. Assim, poderia haver
acúmulo do fluxo menstrual dentro dos remanescentes uterinos, originando um hematometra. Um
hematometra pode ser descrito como uma massa pélvica que, por vezes, pode ser observada no exame físico
e, dependendo de seu tamanho, pode causar obstrução mecânica do trato urinário, culminando em retenção
urinária, hidronefrose ou até mesmo lesão renal aguda (ABDELRAHMAN HM e FELONEY MP, 2022; GASIM
T e AL JAMA FE, 2013).
Portanto, deve-se considerar a presença de uma anomalia dos ductos de Müller entre os diagnósticos
diferenciais de dor pélvica cíclica, que responde pouco ou não responde a analgésicos (ADOLESCENT
HEALTH CARE COMMITTEE, 2018). Atualmente, o diagnóstico de uma possível agenesia mülleriana se
inicia a partir das queixas da paciente, para as quais devem ser feitas uma anamnese detalhada e um exame
físico completo, sendo o exame ginecológico de extrema importância. O momento do diagnóstico geralmente
depende de quando ocorrem as manifestações clínicas, assim, mulheres que apresentam amenorreia
primária, podem acabar por procurar serviços de saúde em idades mais jovens do que aquelas com queixas
de infertilidade ou abortos de repetição. Com a formulação de hipóteses diagnósticas, inclusive a de
malformação mülleriana, levantadas pelos achados clínicos, o diagnóstico conta com a realização de exames
complementares, dentre os quais estão os exames de imagem, que são essenciais, e os exames laboratoriais,
que podem ser solicitados, como níveis de FSH, testosterona, progesterona e LH, e cariótipo (LAUFER
MARC, 2022; LUDWIN A E PFEIFER SM, 2019).
Diferentes exames de imagem podem ser utilizados para se realizar o diagnóstico e a classificação. Para
a escolha do método deve-se considerar as particularidades de cada método e a estrutura a ser analisada, já
que há exames que permitem a exploração apenas externa do útero (caso da laparoscopia) e exames que
permitem apenas a exploração interna dele (caso da histeroscopia e histerossalpingografia) (LEIS LB, et al.,
2012). A ultrassonografia é o método de imagem inicial, podendo ser feito o bidimensional ou tridimensional,
sendo importante considerar que o ultrassom 2D tem baixo custo e boa disponibilidade, porém tem baixa
sensibilidade e especificidade, sendo dependente da experiência do examinador. Já o ultrassom 3D acaba
por possibilitar a análise do colo do útero e da vagina, e gera imagens mais confiáveis, entretanto trata-se de
um exame com menor disponibilidade e que requer maior especialização. (LAUFER MARC, 2022; LUDWIN
A e PFEIFER SM, 2019). A ressonância magnética é o padrão ouro, podendo ser a escolha em qualquer
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caso. (LAUFER MARC, 2022; WU CQ, et al., 2021). Em pacientes com agenesia mülleriana, a RNM identifica
estruturas müllerianas rudimentares em 90% dos casos. Com ela é possível ver a estrutura anatômica da
pelve e períneo, fornecendo imagens dos órgãos genitais, além de avaliar se há atividade endometrial nessas
estruturas. Apesar disso, ela não permite visualização das tubas uterinas e trata-se de um exame mais caro.
É necessário destacar a importância da avaliação também de rins e vias urinárias das pacientes, visto que,
nas malformações müllerianas, até 40% desses pacientes apresentam malformações renais, vesicais e
ureterais associadas, 14 sendo a presença de um, uma indicação para investigação da outra (LAUFER
MARC, 2022).
Em relação ao tratamento, a escolha vai depender das alterações anatômicas decorrente das
malformações müllerianas, os procedimentos cirúrgicos são o tratamento de escolha para algumas delas.
(LAUFER MARC, 2022). Graças aos métodos de imagem, hoje, é possível realizar o planejamento cirúrgico
de uma melhor forma e os procedimentos contam com abordagens minimamente invasivas, visto que
anteriormente o próprio diagnóstico era feito por laparoscopia combinada com a histeroscopia (LEIS LB, et
al., 2012). Em casos de agenesia vaginal, uma possibilidade é a utilização de dilatadores vaginais, como na
técnica de Frank, ou a técnica de McIndoe, com uso de enxertos autólogos. A conduta para alterações uterinas
é baseada no tipo de alteração presente, podendo ser feita uma metroplastia, histeroscopia, histerectomia ou
uso de medicamentos hormonais, caso seja viável a concepção. (PASSOS IMPE e BRITTO RL, 2020).
O desejo reprodutivo da paciente deve ser abordado e é necessário fornecer suporte, aconselhamento e
apoio psicossocial. (LUDWIN A e PFEIFER SM, 2019). Comumente, a capacidade de gestar está associada
com a construção da identidade feminina, bem como com a sua percepção da sexualidade. Estudos
demonstram que a prevalência de queixas relacionadas à vida sexual, são maiores em mulheres inférteis.
Dentre os problemas citados, estão: visão autorreferente negativa, menor frequência sexual, anorgasmia,
dispareunia, etc (LEIS LB, et al., 2012).
Por essa razão, questões reprodutivas das pacientes também são levadas em conta diante da eleição do
procedimento cirúrgico e o acompanhamento psicológico faz-se necessário durante todo o processo de
acompanhamento (WU CQ, et al., 2021). Diferentemente de uma agenesia vaginal, que pode ser tratada com
dilatação ou vaginoplastia, ou de um útero septado, que pode ser tratado com metroplastia por histeroscopia,
o tratamento de escolha para a agenesia mülleriana, que é a condição da paciente deste relato, é a
histerectomia. Uma possibilidade revolucionária para os casos de agenesia mülleriana seria o transplante de
útero, a fim de tratar a questão da infertilidade nessas pacientes, podendo ser adquirido de um doador vivo
ou falecido.
Diante de uma paciente com idade superior a 15 ou 16 anos, com presença de desenvolvimento de
caracteres sexuais secundários (indicando bom funcionamento ovariano e do sistema nervoso central), deve-
se realizar exame físico ginecológico para avaliação da anatomia do sistema reprodutor. A ausência de
vagina, ou vagina curta, indica a presença de malformação desse órgão. Nessa situação, entre os dois
principais diagnósticos a serem considerados (agenesia mülleriana e síndrome de Morris, que podem ser
diferenciados laboratorialmente por meio de cariótipo), o mais comum é a agenesia (HERLIN MK, et al., 2020).
Percebe-se, então, a importância do conhecimento a respeito da síndrome, mesmo para o médico generalista,
quando investigando um caso de amenorreia primária, já que sua consideração como hipótese diagnóstica
deve acontecer logo após anamnese e exame físico adequados.
No caso em questão, a paciente enquadra-se no diagnóstico sindrômico de amenorreia primária, além de
possuir caracteres sexuais secundários M5P5 na classificação de Tanner e história e laboratório compatíveis
com presença de ciclos ovulatórios e endometrial funcionante. Em seguida, o exame físico localizou a causa
da ausência do sangramento em compartimento endometrial. Foi indicada uma ressonância magnética, a
qual mostrou as alterações descritas acima, que fortaleceram a hipótese de agenesia mülleriana. A
ressonância magnética é considerada o exame padrão ouro na investigação desses casos e pode ser usada
em todos os casos, já que é capaz de avaliar eficientemente malformações em todas as estruturas com origem
nos ductos de Müller, com exceção das trompas uterinas.
Outros exames úteis são a ultrassonografia em modalidade 3D e em modalidade 2D. Histeroscopia e
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laparoscopia se limitam a investigar apenas a superfície interna e externa do útero, respectivamente, mas
podem ser úteis na definição da abordagem cirúrgica. Ademais, exames de imagem devem ser realizados
para investigação de malformações de vias urinárias, presentes em até 40% das pacientes com agenesia
mülleriana. (LAUFER MARC, 2022; FONTANA L, et al., 2017).
O screening de outras malformações (cardíacas, esqueléticas, dentre outras) não é realizado de forma
rotineira, no entanto, deve ser considerado caso haja sinais ou sintomas que possam estar correlacionadas
com tais alterações. (HERLIN MK, et al., 2020). É fundamental o papel dos exames de imagem na
investigação dessa condição e, apesar de não haver classificação universalmente aceita, diferentes
sociedades médicas fornecem diferentes classificações, cada uma com determinadas vantagens. Sabe-se
que o correto entendimento da anatomia da paciente, com elucidação das estruturas não formadas é fator
que define a modalidade de tratamento a ser realizada. Dessa forma, a avaliação e elucidação da anatomia
das pacientes com agenesia mülleriana podem ser facilitadas pelas classificações, mas a avaliação
individualizada para definição terapêutica ainda é indispensável.
Contudo, cabe ressaltar que, com a inclusão de mais anomalias na classificação da American Fertility
Society, surgem perspectivas de tratamentos mais especializados para o futuro mesmo para quadros mais
incomuns, o que antes da nova atualização não ocorria para determinadas condições.Como citado, o
tratamento depende da malformação encontrada. Em virtude do diagnóstico ser realizado, na maioria das
vezes, durante a adolescência, período de vulnerabilidade e alterações físicas e emocionais, torna-se
necessário que o médico responsável demonstre cuidado quanto às reações e emoções da paciente. Muitas
pacientes experienciam depressão, ansiedade e até luto em decorrência de sua infertilidade. Por tanto, deve
ser fornecido suporte psicológico a todas as pacientes diagnosticadas, além de encorajá-las a ingressar em
grupos de apoio em pares. Observa-se também que pais e responsáveis se beneficiam de aconselhamento,
pois permite que eles ofereçam uma melhor assistência às pacientes. (LUDWIN A e PFEIFER SM, 2019).
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