Movimentos Racionalistas
Razão vs. Fé
História Eclesiástica II
Pr. André dos Santos Falcão Nascimento
Religiosidade pós-Guerra dos 30 anos (1648)
Movimento Denominacionalista surge após ser declarada paz e
tolerância reliogiosa na maioria dos territórios europeus.
Formulação de Confissões de Fé para estruturar o arcabouço
teológico de cada grupo.
A Ortodoxia passou a ser a chave hermenêutica de interpretação
e pregação da Bíblia, levando a um descasamento entre púlpitos
e membresias e a um formalismo religioso.
Duas reações surgiram a esta situação:
Racionalismo: Desvalorização do extraordinário.
Espiritualismo: Valorização do extraordinário.
Facetas do Movimento Racionalista
Racionalismo Filosófico
Deísmo
Alta crítica (Crítica Histórica ou
Literária)
Baixa crítica (Crítica Textual)
Materialismo
Evolucionismo
Comunismo
Racionalismo Filosófico
Mudanças no horizonte
científico
Heliocentrismo (Copérnico, Galileu)
Gravidade (Isaac Newton)
Grandes Navegações
Religiões não-cristãs com moralidades semelhantes
Criação de um Método Científico
Racionalismo (René Descartes)
Empirismo (Francis Bacon, John Locke)
Racionalismo
Ramo filosófico inaugurado por Rene Descartes
(1596-1650), baseado na dúvida de tudo que não
pudesse ser comprovado de forma clara e
indubitável pela razão.
Grande confiança na razão matemática.
Sua filosofia parte da certeza primária: “Penso, logo
existo” (cogito, ergo sum).
Como ser pensante, surge na mente uma ideia de “ser melhor”, algo que
seria impossível à razão se tal figura não existisse. Daí vem a prova da
existência de Deus.
A partir da razão, então, a mente consegue organizar o mundo que a
envolve, usando certos conceitos inerentes, como tempo e espaço.
Empirismo
Ramo filosófico trabalhado por Francis Bacon
(1561-1626) e John Locke (1632-1704), que
publicaram obras em 1620 e 1690,
respectivamente, afirmando que não existem
“ideias inatas”, e que todo conhecimento é oriundo
da experiência sensorial. Deus se prova pela
existência do homem e suas experiências.
Segundo Bacon (Novum Organum, 1620), o conhecimento é extraído a
partir da experimentação repetida, sem ser baseado em autoridade.
Já Locke (Essay Concerning Human Understanding, 1690) afirma que o
homem não possui conhecimento inato, sendo uma tábula rasa quando
nasce e criando conhecimento a partir da provocação dos sentidos à sua
mente. Sobre a fé, por ser baseada na revelação, e não na razão, esta
não é segura, sendo menos provável (tolerância religiosa).
Deísmo
Religião sem revelação escrita
Deus transcendente, conhecido como Causa Primeira de uma criação
marcada pelas evidências de um desígnio.
Deus deixou sua criação reger-se por leis naturais.
Negação de tudo que for extraordinário: Milagres, a Bíblia
como a revelação de Deus, profecia, providência ou Cristo
como homem-Deus.
Cristo era apenas um mestre e, por isso, somente Deus
poderia ser cultuado.
A virtude e a piedade eram o culto mais importante que se podia prestar a
Deus. As leis éticas de Deus estão na Bíblia e na natureza do homem,
descobertas pela razão. O homem deveria se arrepender e viver conforme
as leis éticas, pois a alma é imortal e está sujeita à recompensa ou
castigo depois da morte.
Deísmo – Principais Expoentes
Edward Herbert, Lorde de Cherbury
(1583-1648)
De Veritate (1624): A verdadeira religião
não se baseia em revelações particulares,
nem em acontecimentos históricos, mas nos
instintos naturais de todo ser humano.
Cinco doutrinas essenciais: Deus existe, obrigação de
adorá-Lo, requisitos éticos desta adoração, necessidade de
arrependimento, recompensa e castigo nesta vida e na
próxima.
Deísmo – Principais Expoentes
John Toland (1670-1722)
O cristianismo não é misterioso ou um tratado
que mostra que nada existe no evangelho
contrário à razão ou acima dela, e que
nenhuma doutrina cristã recebe corretamente o
título de mistério (1694)
Mateus Tindal
O cristianismo é tão antigo como a criação, ou o evangelho é
uma nova edição da religião natural (1730)
Queda do Deísmo – David Hume (1711-1776)
Embaixador otimista e alegre, Hume contestou
os conceitos de causa/efeito e substância,
afirmando serem hábitos mentais de caráter
irracional, e não verdades absolutas.
Com esta afirmação, Hume contesta a
existência de Deus como a causa primeira de
todas as coisas, notando também que Deus e a
alma não possuem “substâncias” aparentes.
Criticou também a noção de “senso comum” da humanidade, os
milagres e a religião, afirmando que esta desvia o homem da
realidade e está baseada em algo que não tem fundamento, a fé.
Deísmo – Legado
Surgimento natural do Estado, em oposição a um legado divino
Rousseau: O Estado se origina num contrato social entre o povo e o rei,
soberanamente escolhido pelo povo. Se fracassarem em suas tarefas, os reis
podem ser retirados do poder pelo povo.
Conceito de bondade e perfeição essenciais leva à crença em uma
evolução humana que produzisse uma ordem mais perfeita na Terra.
Defesa da liberdade religiosa
Cooperação com cristãos ortodoxos em ações humanitárias.
Uso da gramática e da história para correta exegese da Bíblia.
Iluminismo
Movimento continental paralelo ao deísmo inglês e com
noções semelhantes, como cristianismo não-dogmático,
centralidade da experiência humana, leitura histórica da Bíblia
e orientação para o futuro.
Surgiu na França de meados do séc. XVIII e se espalhou pelo
continente conforme a perseguição dos reis e da igreja
francesas aumentou e os estudantes de universidades
francesas retornaram a suas pátrias.
A riqueza das cidades mercantis e o desejo de aplicar
critérios racionais e não-religiosos em sua economia também
ajudou na propagação dos valores iluministas.
Iluminismo – Principais Expoentes
Voltaire (1694-1778)
Inimigo de todo fanatismo, por ter presenciado a
perseguição dos protestantes por Luís XIV,
defendeu a tolerância religiosa e política ao travar
contato com os escritos de Locke.
A história da humanidade é a história do progresso que os seres
humanos iam alcançando em relação ao entendimento de si mesmos e
de suas instituições.
Deus é um pressuposto importante para a preservação da moral, dos
bons costumes e ajuda a prevenir a anarquia. “Se Deus não existisse,
seria necessário inventá-lo”.
Acreditava que a monarquia tinha valor, mas apenas se com o
propósito de servir ao bem de seus governados.
Iluminismo – Principais Expoentes
Montesquieu (1689-1755)
Aplicou os princípios da razão à teoria do governo, propondo
o governo republicano como superior à monarquia e ao
despotismo, pois se baseia na virtude dos cidadãos. Como o
poder corrompe, propõe um modelo triplo de poderes que se
limitariam mutuamente: Executivo, Legislativo e Judiciário.
Jean Jacques Rousseau (1712-1778)
A pessoa é boa ao nascer, porém a sociedade, a cultura, a religião e o Estado a
pervertem. Apresenta, no Contrato Social, um ideal: o Estado, baseado na
ordem natural de uma democracia para servir aos governados, dando-lhes a
garantia de liberdade. A religião precisa voltar à primitiva natural, consistindo na
crença em Deus, imortalidade da alma e ordem social.
Iluminismo Alemão –
Principais expoentes
Gottfried Leibniz (1646-1716)
Buscou comprovar a compatibilidade entre fé e razão, razão
e revelação, filosofia e teologia, corpo e alma.
Existem verdades eternas (geometria, sabedoria, bondade e
poder de Deus) nas quais revelação e razão não se
contradizem, pois são necessárias à razão.
Pecado é apenas o bem imperfeito, um simples erro.
Gotthold Lessing (1729-1781)
Publicou obra de Samuel Reimarus, partidário do deísmo
inglês, que levanta a tese de uma origem fraudulenta do
cristianismo, com a invenção da ressurreição para cobrir a
falha do messianismo político de Jesus.
Iluminismo Alemão –
Afirmou que os testemunhos históricos acerca da revelação não produzem
certezas ou garantias e que não há como identificar a religião correta entre
judeus, árabes e cristãos.
Principais
Expoentes
Immanuel Kant (1724-1804)
Estudou desde os 8 anos em uma escola pietista,
onde foi confrontado pelo aspecto negativo do
pietismo: legalismo e hipocrisia. Daí veio sua
aversão a emoção religiosa e distanciamento de
oração, cultos religiosos e cânticos sacros.
Iluminismo Alemão –
Para criticar racionalistas e empiristas, afirma na Crítica da Razão
Pura (1781) que não há ideias inatas, e sim estruturas fundamentais
da mente, dentro das quais temos que colocar tudo o que os sentidos
nos comunicam (tempo, espaço em primeiro lugar; depois doze
categorias:
casualidade, existência, substância, dentre outras).
Para pensar acerca de algo, devemos colocá-lo dentro desses moldes.
Com a experiência, acontece o mesmo, pois os sentidos nos dão uma
multidão caótica de sensações que são organizadas pela mente.
Iluminismo Alemão –
Principais
Expoentes
Immanuel Kant (1724-1804)
Como, para Kant, a existência era uma categoria
da mente, era impossível provar a existência de
Deus ou da alma através do argumento racional.
Isso não é uma negação de Deus, e sim da
possibilidade de serem alcançados pela razão.
Deus, desta forma, se compreende como o juiz da ação moral (Crítica
da Razão Prática, 1788), premiando o bem e castigando o mal. A
religião, portanto, passa a ser um sistema moral, regido pela máxima
Iluminismo Alemão –
“Eu devo, por isso posso”.
Com isso, Kant inverte o paradigma soteriológico: Se para os
reformadores, as boas obras nascem da graça, Kant parte das obras.
Jesus não é redentor, mas um arquétipo moral da vida divina, que
deve ser imitado pelas pessoas, livres em sua autonomia.
A Crítica Bíblica
Ramo da ciência que trata a Bíblia como um livro
literário antigo como outro qualquer, sujeito a uma
análise científica de sua formatação e de seu conteúdo.
A evolução religiosa na história deve substituir as
explicações sobrenaturais do fenômeno bíblico por
naturais.
A Bíblia deve ser encarada como um livro histórico, escrito por autores
humanos, eliminando a função do Espírito Santo na inspiração dos
autores da Bíblia.
Pode ser dividida em Alta Crítica, que compreende a análise literária do
texto bíblico, em busca de composições redacionais e camadas históricas
de redação textual, e Baixa Crítica, que busca chegar ao texto original
elaborado pelo autor através da análise dos diversos manuscritos atrás do
texto mais fidedigno possível.
Alta Crítica do AT – Principais expoentes
Jean Astruc (1684-1766)
Dividiu o livro de Gênesis em duas partes, baseando-se nos trechos com o
nome de Deus como “Iavé” e “Elohim”.
Johann Eichhorn (1752-1827)
Hexateuco (Gênesis a Josué) dividido em duas partes (“Iavé” e “Elohim”)
Hupfield (1853): Dois autores distintos para o Pentateuco.
Karl Graf (1815-1869) e Julius Wellhausen (1844-1918)
Quatro fontes de diferentes autorias para o Pentateuco, reunidas
provavelmente por Esdras (o “Redator”), com apoio de Ciro, imperador da
Pérsia:
Javista (950 a.C., do reino do Sul),
Eloísta (850 a.C., do reino do Norte),
Deuteronomista (600 a.C., em Jerusalém, em período de reforma religiosa),
Sacerdotal (500 a.C., por sacerdotes judaicos no exílio babilônico).
Alta Crítica do NT – Principais expoentes
Hermann Reimarus (1694-1778): Negou a possibilidade dos
milagres históricos e afirmou que os livros do NT eram
fraudes sagradas.
Ferdinand Baur (1792-1860): Duas visões do Cristianismo:
Petrina e Paulina, unidas pela Igreja Católica no séc. II em
livros como Lucas e as Epístolas Pastorais.
David Strauss (1808-1874): Negou os milagres e a
integridade do NT, bem como a divindade de Cristo, a quem
considerava um homem que pensava ser o Messias.
Alta Crítica do NT – Principais expoentes
Albrecht Hitschl (1822-1889): Temas clássicos da dogmática
(pecado, juízo, ira de Deus, trindade, cristologia) e as
expressões dos credos e confissões são cascas que
encobrem o cerne ético do evangelho.
Adolf von Harnack (1851-1930): Cristianismo não-dogmático,
livre de acréscimos doutrinais feitas pelas gerações
posteriores à primeira, que transformaram uma religião de
Jesus, acerca do reino do amor de Deus, para uma religião
sobre Jesus, envolta em lixo metafísico.
Ernst Troeltsch (1865-1923): Tudo é historicamente
condicionado, não há verdade eterna por trás das cascas
doutrinais.
Alta Crítica - Legado
Crítica das Fontes:
Divisão de Isaías em 2 ou 3 livros distintos.
Datação de Daniel no período intertestamentário.
Formação dos Evangelhos em ordem específica e com fontes em
comum (Teoria da Fonte Q).
Crítica das Formas:
Análise das diversas formas literárias presentes nos textos bíblicos.
Crítica da Redação:
Analisar a maneira e significado das diferenças entre os evangelistas.
Datação das cartas paulinas (teoria das Deuteropaulinas).
Materialismo
Ramo filosófico que ignora a razão como fonte do
conhecimento, voltando-se ao mundo material e o que ele pode
oferecer.
Ludwig Feuerbach (1804-1872):
“O ser humano é o que come”.
A religião é uma forma de alienação que projeta os
conceitos do ideal humano em um ser supremo.
A essência verdadeira da religião é a antropológica, e
não a teológica.
A matéria precede a ideia. Entende que Hegel deve
ser lido de “ponta-cabeça”.
Comunismo (Materialismo Prático)
Karl Marx (1818-1883): “A realidade é somente matéria
em movimento”.
Aplicou a dialética hegeliana para compreender a história como
uma evolução, afirmando que o futuro do capitalismo (tese) é o
regime do proletariado (antítese e nova síntese), a quem se
devia os lucros do trabalho.
A religião é o ópio do povo, pois o entorpece e impede de lutar.
Não há lugar para Deus, Bíblia ou padrões absolutos no
sistema comunista.
Friedrich Engels (1820-1895)
Wladimir Lenin (1870-1924)
Evolucionismo
Teoria composta por Charles Darwin (1809-1882) que
afirma que as espécies foram formadas pela evolução
das populações, mediante adaptação ao ambiente a que
se inserem.
Afirmou em 1871 (A Descendência do Homem) que o
ser humano passou pelo mesmo processo, sendo
descendente do macaco.
A teoria, aplicada à religião, levou as pessoas a crerem que Deus e a
Bíblia foram produtos evolutivos da consciência religiosa do homem.
O pecado e a perfeição escatológica dá lugar a uma doutrina de melhoria
contínua do mundo através do esforço humano.
Rejeição da conotação de pecado original e da necessidade de um
Salvador.
Fontes
Texto base: CAIRNS, Earle E. O Cristianismo através dos séculos: uma
história da igreja cristã. 3 ed. Trad. Israel Belo de Azevedo e Valdemar
Kroker. São Paulo: Vida Nova, 2008.
Textos auxiliares:
DREHER, Martin N. Coleção História da Igreja, 4 vols. 4 ed. São Leopoldo:
Sinodal, 1996.
GONZALEZ, Justo L. História ilustrada do cristianismo. 10 vols. São Paulo:
Vida Nova, 1983