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Constitucionalismo

Janeth João Artur1


Universidade Rovuma
[email protected]

RESUMO
O constitucionalismo é uma ideologia política e jurídica que defende a limitação do poder do
Estado por meio de uma constituição. Surgiu como resposta aos abusos de poder dos governantes
absolutistas. As principais características incluem a supremacia da constituição, separação de
poderes, direitos individuais e garantias fundamentais, Estado de Direito e democracia
representativa. Ao longo da história, o constitucionalismo evoluiu em diferentes países, refletindo
as necessidades e valores de cada sociedade.

Palavras-chaves: Constituição, evolução, poder e Estado.


ABSTRACT:

Constitutionalism is a political and legal ideology that advocates for the limitation of state power
through a written constitution. It emerged in response to the abuses of power by absolutist rulers.
Its main features include the supremacy of the constitution, separation of powers, individual rights
and fundamental guarantees, rule of law, and representative democracy. Throughout history,
constitutionalism has evolved in different countries, reflecting the needs and values of each society.

Keywords: Constitution, Evolution, Power, State.


1. Introdução

O constitucionalismo, como conceito essencial no âmbito do direito e da política,


surge como resposta à necessidade de limitar o poder estatal, proteger os direitos
individuais e organizar as instituições de um Estado. Este trabalho aborda sua evolução em
escala global, com foco especial na sua manifestação em Moçambique, desde as origens
até as revisões constitucionais mais recentes.

Constitui o objectivo geral desta pesquisa, compreender e analisar a evolução do


constitucionalismo em Moçambique, destacando sua aplicação e transformações ao longo
do tempo. Portanto, a pesquisa abrange diferentes aspectos do constitucionalismo, desde a
definição de conceitos até a análise comparativa das três constituições moçambicanas,
utilizando uma metodologia que inclui consulta de fontes diversas, como livros, manuais,
artigos académicos e páginas web especializadas.

1
Graduando em Direito pela Universidade Rovuma – Campus de Napipine, Nampula-Moçambique.
Esta pesquisa estrutura-se em três partes principais: Introdução, Desenvolvimento e
Conclusão. Na Introdução, apresenta-se uma contextualização do tema, os objectivos
gerais e específicos do trabalho, além da metodologia adoptada. O Desenvolvimento
aborda detalhadamente cada aspecto do constitucionalismo em Moçambique, desde sua
conceituação até sua aplicação prática, incluindo análises históricas, políticas e sociais das
constituições do país. Por fim, a Conclusão recapitula os principais pontos abordados e
sugere áreas para futuras pesquisas, enquanto as Referências Bibliográficas garantem a
credibilidade e precisão das informações apresentadas.

2. O conceito de Direito Constitucional


No contexto do Direito em geral, o Direito Constitucional pode ser definido como
um sistema de princípios e normas que regula a organização, funcionamento e limites do
poder público do Estado, além de estabelecer os direitos das pessoas que pertencem à
respectiva comunidade política2. Essa definição implica uma tensão dialéctica, reflectindo
um equilíbrio nem sempre fácil e nem sempre calibrado3.

Assim sendo, o Direito Constitucional representa a síntese dos princípios e das


normas que se condensam (pelo menos, maioritariamente) na Constituição enquanto ato
cimeiro do Estado e da sua Ordem Jurídica, podendo ser simplesmente definido como o
“Direito do Estado na Constituição”.

A expressão "Direito Constitucional" teve origem na França e na Itália durante a


elaboração dos primeiros manuais dedicados ao estudo científico desse ramo do Direito,
especialmente durante o período do Constitucionalismo Liberal. Pellegrino Rossi se
destacou nesse esforço3. No entanto, inicialmente, essa expressão competiu com outras
designações, como o “Direito Político”4.

2
Jorge Bacelar Gouveia, O estado de excepção no Direito Constitucional – entre a eficiência e a
normatividade das estruturas de defesa extraordinária da Constituição, I, Coimbra, 1998, p. 31, aqui se
lembrando que “Nenhum outro ramo jurídico exprime com maior verdade que o Direito Constitucional a
tensão que se reconhece existir entre a liberdade de atuação da pessoa integrada na sociedade política – de
distanciação frente ao poder público – e a autoridade na direção dos negócios públicos do Estado-aparelho –
de intervir, mais ou menos intensamente, em nome daquela colectividade”.
3
Cfr. também Jorge Miranda, Direito Constitucional, in Pol., II, Lisboa, 1984, p. 434, Direito
Constitucional, in DJAP, IV, Lisboa, 1991, p. 30, e Manual de Direito Constitucional, I, 7ª ed., Coimbra,
2003, pp. 11 e ss.; Armando M. Marques Guedes, Ideologias e sistemas políticos, Lisboa, 1984, pp. 71 e 72;
Marcello Caetano, Manual de Ciência Política e Direito Constitucional, I, 6ª ed., Coimbra, 1989, pp. 10 e
ss.
1.1. Conceito de Constitucionalismo
O Constitucionalismo, para além de uma categoria filosófica ou conceito jurídico, é
um movimento que reflecte uma luta ideológica e política pela limitação do poder estatal
em prol da protecção dos direitos humanos.

Conforme Paolo Comanducci destaca várias tipologias, como o constitucionalismo


amplo e restrito, o débil e o forte, e o reformista e o revolucionário. Presentemente, o
Constitucionalismo mostra uma nova vitalidade, especialmente após as experiências do
fascismo europeu, buscando uma supremacia normativa que vai além do formalismo legal.
Podemos identificar várias etapas em seu desenvolvimento, desde os Antecedentes até o
Novo Constitucionalismo, marcadas por momentos históricos como a Revolução Francesa
e a emergência do Estado social. Essas diferentes abordagens, convergências e
divergências enriquecem o fenómeno constitucional, reflectindo a diversidade de
perspectivas na protecção dos direitos fundamentais e na organização do poder político5.

Portanto, podemos considerar Constitucionalismo refere-se à


valorização da Constituição de um país e à limitação do poder
por meio de um documento legal. É um movimento político e
social que visa garantir direitos e deveres iguais para todos,
existindo desde o século V6.

1.1.1. Modalidade Constitucionalismo


Entre as várias modalidades do constitucionalismo, algumas das mais importantes
incluem:

a) Constitucionalismo Antigo: surgiu entre o povo hebreu (na conduta dos


profetas) e na Grécia antiga (nas práticas públicas). Também são observadas
nuances de constitucionalismo na tentativa de restringir o poder estatal na
Roma Antiga, no Egipto Antigo, na Mesopotâmia e na Índia7.

4
De origem italiana, e refugiado na Suíça por causa do seu ideal liberal e nacionalista, a Pellegrino Rossi
coube o mérito de ter realizado a primeira grande síntese do Direito Constitucional saído da Revolução
Francesa de 1789, não obstante as suas lições só terem sido publicadas em 1866, 18 anos depois da sua
morte.
5
Alarcón, Pietro de Jesús Lora., 2017
6
Medeiros, Rafael, 2023.
7
TAVARES. André Ramos. Curso de direito constitucional. 18. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020, p.
354.
b) Constitucionalismo Medieval: Tem como destaque principal a Magna Carta, de
1215, concedida pelo rei João I (“Sem Terra”) em resposta à pressão dos barões
ingleses, que estabeleceu uma série de direitos para o povo inglês, limitando os
próprios poderes do monarca8.
c) Constitucionalismo Moderno: Tem suas raízes nas Constituições da Córsega
(de 1755), dos Estados Unidos (de 1787) e da França (de 1791). A partir desse
momento, o constitucionalismo busca restringir o poder do Estado por meio de
uma Constituição escrita9.
d) Constitucionalismo Liberal: Surgiu no contexto das revoluções do século
XVIII, como a Revolução Americana e a Revolução Francesa, destacando-se
pela limitação do poder estatal e pela garantia dos direitos individuais. 6
e) Constitucionalismo Social: Caracterizado pela previsão constitucional de
direitos sociais, como saúde, educação e trabalho. Surgiu como resposta às
demandas por justiça social e igualdade no século XX10.
f) Neoconstitucionalismo: Emergiu após a Segunda Guerra Mundial, enfatizando
a força normativa da Constituição e a eficácia dos direitos fundamentais. Busca
uma maior protecção e aplicabilidade dos direitos humanos.
g) Constitucionalismo Democrático: Destaca-se pelo fortalecimento da
participação popular na interpretação e aplicação da Constituição, defendendo
um equilíbrio entre a actuação dos poderes e o protagonismo cidadão.10

De salientar que essas modalidades representam algumas das abordagens mais


significativas do constitucionalismo ao longo da história, reflectindo diferentes ideais
políticos, sociais e jurídicos em suas respectivas épocas.

8 8
SILVA. José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25º. ed. São Paulo: Malheiros
editores, 2005.

9
PADILHA. Rodrigo. Direito Constitucional. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2020.

10
LENZA. Pedro. Direito Constitucional esquematizado. Coleção esquematizado® / coordenador Pedro
Lenza – 24. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2020.
1.1.2. Causas de surgimento do constitucionalismo
As causas do surgimento do constitucionalismo remontam à Antiguidade 11. Na
Idade Antiga, evidencia-se que o constitucionalismo teve suas origens no povo hebreu,
através da conduta dos profetas, e na Grécia antiga, onde cidadãos realizavam acções
públicas, como as graphes em Atenas, para fiscalizar os actos dos governantes,
antecipando assim o conceito de controlo de constitucionalidade.

No processo inicial, podemos notar que ao longo da história, a humanidade


sempre buscou direccionamentos comuns nas escrituras, um conjunto de regras e
ensinamentos que guiassem toda a sociedade. No entanto, foi apenas em 1215, durante a
Idade Média, que surgiu a Magna Carta Libertatum. Outorgada pelo rei inglês João
Primeiro, conhecido como João-sem-Terra, este documento previa uma série de direitos
para o povo inglês, limitando os poderes do próprio rei, resultado da rebelião dos barões
ingleses. Embora não tenha sido efectivamente aplicada, a Magna Carta representa o
marco histórico para vários direitos, incluindo o devido processo legal.

O embate entre o rei e o parlamento na Idade Moderna, no século XVII, resultou


em documentos importantes na Inglaterra, como a “Petition of Rights” e a “Bill of
Rights”, delineando as lutas pelo poder e os limites desse poder.

No final do século XVIII, emerge o Constitucionalismo Moderno com três


Constituições fundamentais: a Constituição da Córsega de 1755, a Constituição dos
Estados Unidos da América de 1787 e a Constituição da França de 1791. A Constituição
da Córsega, também conhecida como Constituição Paolina, foi a primeira a prever a
separação dos poderes. A Constituição dos Estados Unidos estabeleceu a tripartição de
poderes e um sistema de freios e contrapesos, além de prever a supremacia constitucional
sobre as demais leis. Já a Constituição da França tinha como objectivo principal
transformar a monarquia absolutista em monarquia constitucional e eliminar os
privilégios do clero e da nobreza.

Na Idade Contemporânea, surge o Neoconstitucionalismo após a Segunda Guerra


Mundial, fruto do pós-positivismo, com o objectivo principal de buscar maior eficácia da
Constituição, especialmente dos direitos fundamentais. Este movimento é exemplificado
pelas Constituições da Itália de 1947, da Alemanha de 1949 (Lei Fundamental de Bonn)
11
Loewenstein, Karl. Nascimento da Constituição. s/d. https://unieducar.org.br/artigo/nascimento-da-
constituicao (acedido em 04 de Maio de 2024).
e do Brasil de 1988. O Neoconstitucionalismo destaca-se pela valorização dos princípios
constitucionais, pela eficácia dos direitos fundamentais e pelo maior protagonismo do
Poder Judiciário, muitas vezes caracterizado pelo “activismo judicial”.

1.2. Evolução do constitucionalismo no mundo;

De salientar que a história do constitucionalismo pode ser compreendida em quatro


ciclos:

1.2.1. Constitucionalismo na Antiguidade


Na antiguidade, o constitucionalismo era assentado sob os conceitos do estado teocrático,
momento em que os profetas fiscalizavam os actos do governo regulado pelos limites
estabelecidos nos textos da bíblia.

Segundo Marcelo Novelino afirma que:


A sociedade vivia sob jugo da autoridade divina e os direitos
tinham uma forte influência da religião. As normas supremas que
deveriam nortear a vida em comunidade, bem como a estrutura
jurídica daqueles povos, eram representados pelos deuses na
terra, assim como os sacerdotes12.

1.2.2. Constitucionalismo na Idade Média

Na Idade Média, o constitucionalismo foi representado pela Carta Magna de 1215,


que garantiu certos direitos individuais, como o direito a um julgamento justo antes da
prisão, e redefiniu os poderes da monarquia, incluindo limitações sobre a cobrança de
novos impostos.

Portanto, o constitucionalismo norte-americano, inspirado em Locke e


Montesquieu, é fundamental para entender esse conceito. Suas características incluem a
criação da primeira Constituição escrita e rígida, a supremacia da Constituição, a separação
de poderes, o controle judicial de constitucionalidade, o federalismo, o presidencialismo, a
república, a democracia, a separação de poderes, o fortalecimento do Judiciário e a
declaração dos direitos humanos13.

12
NOVELINO, Direito Constitucional, 5º Edição, 2011, p. 54.
13
LENZA, Direito Constitucional, 22ª, edição, 2018, p. 67,
1.2.3. Constitucionalismo na Idade Moderna

Quanto ao constitucionalismo na idade moderna, conforme lecciona pedro lenza:

Dois são os marcos históricos e formais do constitucionalismo moderno: a Constituição


Norte-americana de 1789 e a francesa de 1791(que teve como preâmbulo a Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão de 1789), movimento este deflagrado durante o
iluminismo e concretizado como uma contraposição ao absolutismo reinante, por meio do
qual se elegeu o povo como titular legítimo do poder14.

Durante a Idade Moderna, após a Primeira Guerra Mundial em 1918, surgiram pactos
como o Petition of Rights, o Habeas Corpus e o Bill of Rights. Embora tenha havido uma
participação social limitada, os direitos individuais não eram universais, sendo aplicados
apenas a alguns. As Constituições Brasileiras de 1824 e 1891 foram elaboradas sob os
ideais do liberalismo. LENZA afirma que:

A concepção de constitucionalismo liberal, abarcava os seguintes


valores:” individualismo, absenteísmo estatal, valorização da
propriedade privada e protecção do indivíduo”15.

1.2.4. Constitucionalismo Contemporâneo


Após a Segunda Guerra Mundial, em 1945, o mundo ficou chocado com as
atrocidades ocorridas e a extrema pobreza generalizada. Nesse contexto, o
constitucionalismo contemporâneo adoptou novos conceitos sociais agrupados em três
categorias: constituições da democracia social, constituições socialistas e constituições
de países em desenvolvimento. Essas constituições tendiam a ser extensas, programáticas
e abrangentes, reflectindo uma abordagem mais ampla e inclusiva. 14

Quanto as questões totalitária, LENZA, entende que:

Fala-se em “totalitarismo constitucional” na medida em que os textos sedimentam um


importante conteúdo social, estabelecendo normas programáticas (metas a serem atingidas
pelo Estado, programas de governo) e realçando o sentido de Constituição Dirigente
defendido por Canotilho16.

14
LENZA, Ob., cit., p. 66.
15
NOVELINO, Direito Constitucional, 5º edição, pág, 60, 2011
16
LENZA, Direito Constitucional, 22ª, edição, pág 67, 2018
1.2.5. O Constitucionalismo do Futuro
O Constitucionalismo do Futuro ainda está por vir e não pode ser considerado
historicamente. No entanto, é concebido como um constitucionalismo social,
fundamentado nos direitos humanos de terceira geração. Deve incorporar valores como
verdade, solidariedade, consenso, participação, integração e universalização dos direitos
fundamentais e da dignidade humana. Espera-se que abranja os direitos de quarta
dimensão, como democracia, informação e pluralismo, além de lidar com questões
relacionadas à genética humana.

1.3. Constitucionalismo Moçambicano


O Constitucionalismo de Moçambique deve ser entendido pela análise da sua
evolução histórico-política, na qual se evidenciam quatro períodos: (i) o período colonial
da ocupação portuguesa; (ii) o período da I República, com a Constituição de 1975, de
influência do modelo da democracia popular; (iii) o período da implantação da II
República, com a aprovação da Constituição de 1990 e a celebração do Acordo Geral de
Paz de 1992; (iv) o período de consolidação do Estado de Direito Democrático através da
substituição da Constituição de 1990 pela Constituição de 2004, já aprovada por um órgão
parlamentar multipartidário17.

A actual Constituição da República de Moçambique de 2004 aprofunda o programa


político-constitucional da II República, correspondendo à sua plenitude, sendo notórios
como traços fundamentais do Constitucionalismo Moçambicano, observando o texto
constitucional vigente, os princípios fundamentais de um Estado de Direito, republicano,
unitário e autárquico, democrático e social.

1.3.1. Evolução do movimento constitucional Moçambicano


A primeira Constituição de Moçambique entrou em vigor em simultâneo com a
proclamação da independência nacional em 25 de Junho de 1975. Nesta altura, a
competência para proceder a revisão constitucional fora atribuída ao Comité Central da
Frelimo até a criação da Assembleia com poderes constituintes, que ocorreu em 1978.
Considerando a importância da constituição como a “lei-mãe” do Estado moçambicano, e

17
GOUVEIA, José Bacelar, 2004.
daí a necessidade do seu conhecimento pelos cidadãos, de seguida é feita uma breve
menção sobre a evolução constitucional de Moçambique.

CONSTITUIÇÃO DE 197518: um dos objectivos fundamentais desta constituição


foi “a eliminação das estruturas de opressão e exploração coloniais... e a luta contínua
contra o colonialismo e o imperialismo” 19. Sendo instalado na República Popular de
Moçambique (RPM) o regime político socialista e uma economia marcadamente
intervencionista, onde o Estado procurava evitar a acumulação do poderio económico e
garantir uma melhor redistribuição da riqueza

Entretanto, o sistema político sob a Constituição de Moçambique era caracterizado


pela existência de um partido único, a FRELIMO, que desempenhava um papel dominante.
Esse sistema apresentava restrições às liberdades públicas e uma forte compressão
ideológica, com ênfase nas proclamações de massa e na recusa da separação de poderes20

A Constituição passou por seis alterações entre 197621, em 197722, em 197823, em


198224, em 198425 e em 198626. Destas, merece algum realce a alteração de 1978 que
incidiu maioritariamente sobre os órgãos do Estado (sua organização, competências, entre
outros), retirou o poder de modificar a Constituição do Comité Central da Frelimo e retirou
a competência legislativa do Conselho de Ministro (uma vez criada a Assembleia Popular
que teria estas competências) e a de 1986 que fora motivada pela institucionalização das
funções do Presidente da Assembleia Popular e de Primeiro-Ministro, criados pela 5ª
Sessão do Comité Central do Partido Frelimo.

18
Publicada no BR n.º1, I Série, Quarta-feira, 25.06.1975.
19
Art. 4 da CRPM de 1975.
20
Jorge Miranda, Direito Constitucional, Tomo I, 6ª Edição, Coimbra Editora, 1997, pg. 237
21
8ª Reunião do Comité Central da Frelimo, publicada no BR n.º42, I Série, Sábado, 10.04.1976
22
2ª Sessão do Comité Central da Frelimo, publicada no BR n.º100, I Série, Terça-feira, 30.08.1977.
23
Lei n.º11/78 de 15 de Agosto, publicada no BR n.º97, I Série, Terça-feira, 15.08.1978
24
Resolução n.º11/82 de 01 de Setembro, publicada no BR n.º34, I Série, Suplemento de Quarta-feira,
01.09.1982.
25
Lei n.º1/84 de 27 de Abril, publicada no BR n.º17, I Série, Suplemento de Sexta-feira, 27.04.1984.
26
Lei n.º4/86 de 25 de Julho, publicada no BR n.º30, I Série, 2ºSuplemento, Sábado, 26.07.1986.
CONSTITUIÇÃO DE 199027: A revisão constitucional de 1990 promoveu
mudanças substanciais em diversos aspectos da vida do país, reflectindo transformações
que já estavam em curso na sociedade desde 1984, especialmente no campo económico.
Essas mudanças foram oficialmente consolidadas com a aprovação da nova Constituição.
Alguns aspectos significativos dessa revisão incluem:

 Introdução de um sistema multipartidário na arena política, deixando o


partido Frelimo de ter um papel dirigente e passando a assumir um papel
histórico na conquista da independência;
 Inserção de regras básicas da democracia representativa e da democracia
participativa e o reconhecimento do papel dos partidos políticos;
 Na área económica, o Estado abandona a sua anterior função basicamente
intervencionista e gestora, para dar lugar a uma função mais reguladora e
controladora (previsão de mecanismos da economia de mercado e
pluralismo de sectores de propriedade);
 Os direitos e garantias individuais são reforçados, aumentando o seu âmbito
e mecanismos de responsabilização;
 Várias mudanças ocorreram nos órgãos do Estado, passam a estar melhor
definidas as funções e competências de cada órgão, a forma como são
eleitos ou nomeados;
 Preocupação com a garantia da constitucionalidade e da legalidade e
consequente criação do Conselho Constitucional; entre outras.

Portanto, a Constituição da República de Moçambique de 1990 passou por três


alterações pontuais, ocorridas em 199228 e 199629. Destaca-se a revisão de 1996, que
introduziu princípios e disposições relacionadas ao Poder Local, descentralizando o poder
por meio da criação de órgãos locais com competências e poderes de decisão próprios,
superando assim o princípio da unidade do poder.

CONSTITUIÇÃO DE 2004: Esta é a última revisão constitucional ocorrida em


Moçambique. Fora aprovada no dia 16 de Novembro de 2004. Não se verifica com esta
nova Constituição uma ruptura com o regime da CRM de 1990, mas sim, disposições que
27
Publicada no BR n.º44, I Série, Suplemento de Sexta-feira, 02.11. 1990.
28
Lei n.º11/92 de 08 de Outubro, publicada no BR n.º41, I Série, Suplemento de Quinta-feira, 08.10.1992 e
Lei n.º 12/92 de 09 de Outubro, publicada no BR n.º41, I Série, 2ºSuplemento de Sexta-feira, 09.10.1992.
29
Lei n.º9/96 de 22 de Novembro, publicada no BR n.º47, I Série, Suplemento de Sexta-feira, 22.11. 1996.
procuram reforçar e solidificar o regime de Estado de Direito e democrático trazido em
1990, através de melhores especificações e aprofundamentos em disposições já existentes e
também pela criação de novas figuras, princípios e direitos e elevação de alguns institutos
e princípios já existentes na legislação ordinária à categoria constitucional. Um aspecto
muito importante de distinção desta constituição das anteriores é o “consenso” na sua
aprovação, uma vez que ela surge da discussão não só dos cidadãos, como também da
Assembleia da República representada por diferentes partidos políticos (o que não se
verificou nas anteriores).

A nova Constituição da República de Moçambique (CRM) trouxe inovações


positivas tanto no aspecto formal quanto no substancial. No aspecto formal, destaca-se a
nova organização do texto, com cada artigo tratando de um assunto específico e precedido
por um título que facilita sua localização, o que não ocorria nas constituições anteriores.
Em termos de conteúdo, a CRM reforçou as directrizes estabelecidas para o Estado
moçambicano, expandindo o número de títulos para 12 e o total de artigos para 306, em
comparação com os 7 títulos e 212 artigos da constituição anterior de 1990.

Em fim, outras alterações são trazidas com a nova CRM que apenas com uma
exposição mais detalhada poderíamos deixar registadas. No entanto, não sendo este o
intuito do presente artigo, deixou-se ficar algumas linhas que nos permite uma visão geral
sobre a evolução constitucional em Moçambique, testemunhando desse modo o
crescimento político, social e económico da nossa sociedade.

1.3.2. Factores que influenciaram a revisão da constituição de 1975 e 1990


As Constituição de 1975 sofreram seis alterações pontuais, designadamente: em
1976, em1977, em 1978, em 1982, em 1984 e em 1986. Destas, merece algum realce a
alteração de 1978 que incidiu maioritariamente sobre os órgãos do Estado (sua
organização, competências, entre outros), retirou o poder de modificar a Constituição do
Comité Central da FRELIMO e retirou a competência legislativa do Conselho de Ministro
(uma vez criada a Assembleia Popular que teria estas competências) e a de 1986 que fora
motivada pela institucionalização das funções do Presidente da Assembleia Popular e de
Primeiro-Ministro, criados pela 5ª Sessão do Comité Central do Partido FRELIMO30.

30
CHICAVA, Augusto, s/d.
1.3.2.1. Factores que determinaram a sua alteração
A CRM de 1990 sofreu três alterações pontuais, designadamente: duas em 1992 e
uma em 1996. Destas merece especial realce a alteração de 1996 que surge da necessidade
de se introduzir princípios e disposições sobre o Poder Local no texto da Constituição,
verificando-se desse modo a descentralização do poder através da criação de órgãos locais
com competências e poderes de decisão próprios, entre outras (superação do princípio da
unidade do poder)31.

1.3.3. Determinação política, social e económica da lei de revisão (2004)


A determinação política, social e económica da Lei de Revisão de 2004 da Constituição
da República de Moçambique reflecte uma série de mudanças e aprofundamentos no
regime de Estado de Direito democrático estabelecido em 1990. Esta revisão foi
impulsionada pelo objectivo de fortalecer e consolidar os princípios democráticos e os
direitos fundamentais dos cidadãos. Entre os aspectos destacados estão:31

a) Maior ênfase nos princípios fundamentais, incluindo a descrição do Estado


moçambicano como democrático, social e de justiça, além do reconhecimento do
pluralismo jurídico e o incentivo ao uso das línguas locais.
b) Ampliação dos direitos e deveres fundamentais dos cidadãos, abrangendo questões
como direitos dos portadores de deficiência, direitos da criança, restrições no uso
da informática e direito de acção popular.
c) Reconhecimento constitucional da importância da autoridade tradicional na
sociedade moçambicana, além da inclusão de novos temas como a terceira idade, o
ambiente e a qualidade de vida.
d) Criação de novos órgãos políticos e de representação democrática, como o
Conselho de Estado e as Assembleias Provinciais, bem como o fortalecimento da
actuação da Administração Pública com a criação do Provedor da Justiça e do
Conselho Superior da Magistratura Judicial Administrativa.
e) Tratamento mais detalhado das disposições relativas aos tribunais, com destaque
para o Tribunal Administrativo.
f) Abordagem cuidadosa das garantias constitucionais em caso de estado de sítio e
estado de emergência, garantindo a protecção dos direitos fundamentais mesmo em
situações excepcionais.
31
Hans e NILSSON Anders, (1994).
Neste contexto, podemos concluir que essas alterações reflectem o compromisso
político de fortalecer o regime democrático, promover a participação cívica e garantir a paz
e a estabilidade no país.

1.3.4. Análise comparativa das três de 1990 e 2004


Como foi anteriormente referenciado, a CRM, sofreu sérias modificações ao longo
dos anos, e foi cada vez, se ajustando à realidade e às necessidades de cada época. É
pretensão deste trabalho mostrar com um pouco de detalhes como e quais foram os pontos
que se foram abrangidos pelas revisões constitucionais e sem fugir do nosso foco que são
as Constituições de 1990 e 2004, importa fazer, sempre, menção daquela que foi a primeira
de todas, neste caso, a Constituição da República de Moçambique de 1974 pela simples
razão de ela ser a base de evolução das posteriores e ser um bom ponto de partida para
analisarmos a Constituição de 1990 e vermos em que ela evoluiu e quais temas foram
objectos de revisão. Confiramos a seguir uma tabela discriminatória e comparativa das
constituições de 1990 e 200432.

Portanto, a comparação entre as constituições de Moçambique em 1975, 1990 e


2004 mostra uma transição do regime político de democracia popular para democracia
democrática, com ênfase na justiça social em todas as versões. Houve uma mudança
significativa no sistema político, passando de um partido único para um multipartidarismo.
A separação de poderes foi introduzida na constituição de 1990, enquanto a economia
mudou de um sistema centralizado para o capitalismo. Vários órgãos e instituições foram
introduzidos ou reformulados nas constituições posteriores para fortalecer a democracia e
os direitos individuais, incluindo a Assembleia da República, o Conselho Constitucional, o
Provedor de Justiça e as Autarquias Locais.

Considerações Finais

Chegando ao final da pesquisa sobre o Direito Constitucional, é possível fazer


algumas considerações importantes. Primeiramente, fica evidente que o Direito
Constitucional é um ramo do Direito que regula a organização, funcionamento e limites do
poder público do Estado, bem como estabelece os direitos das pessoas que pertencem à

32
MIRANDA, Jorge, 1997
respectiva comunidade política. Essa definição implica uma constante tensão entre a
liberdade individual e a autoridade do Estado na direcção dos negócios públicos.

O Constitucionalismo, por sua vez, não se restringe apenas a um conceito jurídico,


mas representa um movimento político e social pela limitação do poder estatal em prol da
protecção dos direitos humanos. Ao longo da história, o constitucionalismo evoluiu através
de diversas modalidades, desde o constitucionalismo antigo até o constitucionalismo
contemporâneo, reflectindo as demandas por justiça social, igualdade e democracia.

No contexto específico de Moçambique, a evolução do Constitucionalismo pode ser


compreendida através da análise dos diferentes períodos históricos, desde o colonialismo
até a actual Constituição de 2004. Essa evolução reflecte as transformações políticas,
sociais e económicas do país, passando de um regime de democracia popular para uma
democracia democrática, com ênfase na justiça social e na protecção dos direitos
individuais.

As revisões constitucionais ao longo dos anos demonstram o compromisso político


de fortalecer o regime democrático, promover a participação cívica e garantir a paz e
estabilidade no país. Essas alterações reflectem as demandas da sociedade e a necessidade
de adaptação do ordenamento jurídico às mudanças sociais e políticas.

Portanto, a pesquisa realizada permite compreender a importância do Direito


Constitucional como instrumento fundamental para a organização e funcionamento do
Estado, bem como para a protecção dos direitos fundamentais dos cidadãos. A análise da
evolução do Constitucionalismo em Moçambique destaca os avanços e desafios
enfrentados pelo país na construção de uma sociedade democrática e justa.

Referencias bibliograficas

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Abril de 2023. https://blog.grancursosonline.com.br/constitucionalismo/ (acedido
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11. TAVARES. André Ramos. Curso de direito constitucional. 18. ed. São Paulo:
Saraiva Educação, 2020.

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