Neuroanatomia e Controle Motor
Olá, pessoal, vamos iniciar uma revisão desse conteúdo. Colocarei um jogo de
imagens para vocês se familiarizarem com os nomes, vejam a localização, e já
tentem lembrar da função de cada estrutura. Após as imagens começamos a
revisão.
Pense que você está sentado e queira pegar um copo na mesa a sua frente. Para
realizar um simples movimento deste, nosso SNC precisou ter à vontade, ter a
voluntariedade de fazer, planejar (quais músculos serão recrutados, analisar a
distância do copo para o corpo, a forma adequada de pegar no copo, força
necessária para erguer e direcionar o copo até você) e no final realizar de fato o
movimento. Além disso, enquanto levamos o copo até nós, contamos com uma
série de estímulos visuais e de tato (temperatura, pressão).
Fica evidente que algo simples já é complexo. Nosso organismo, conta com uma
série de vias e regiões próprias para controlar o movimento. E algo importante para
nós atentarmos é que de algo simples como pegar um copo na mesa até dar várias
piruetas no ar como na ginástica, é necessário um conjunto de conexões entre
essas vias e regiões para que o movimento saia de forma precisa, coordenada e
eficiente. Uma outra coisa é que as áreas responsáveis pelo movimento no nosso
organismo, também recebem influências dos nossos sentidos e de nossas
emoções, ambos podem interferir de alguma forma no movimento.
O Sistema Nervoso Central (SNC) é dividido, num sentido macro, em encéfalo e
medula espinhal. Nosso encéfalo é composto das seguintes regiões: telencéfalo,
diencéfalo, mesencéfalo, ponte, cerebelo e bulbo.
Glossário
Substância branca: termo genérico para referir a uma região com um acúmulo de
axônios.
Substância cinzenta: termo genérico para referir a uma região com um acúmulo
de corpos celulares neuronais.
Trato: acúmulo de axônios do SNC que possuem um local de origem comum e uma
destinação comum.
Funículo: Termo utilizado para as áreas da substância branca da medula espinhal.
Corno: Termo utilizado para se referir as áreas com “formato de borboleta”,
localizado na substância cinzenta da medula.
Via: um feixe de neurônios que conectam 2 ou mais neurônios diferentes.
Via aferentes: vias de neurônios sensoriais que saem da periferia do corpo e
chegam no corno posterior da medula.
Via eferente: formadas por neurônios motores que saem do corno anterior da
medula em direção aos músculos.
Corpo Caloso: estrutura formada de axônios que cruzam de um lado do cérebro
para o outro, interligando os dois hemisférios.
Lobos: nome dado a divisão de um órgão que pode ser a partir de sulcos, fissuras
ou um tecido específico.
Hemisférios: divisão anatômica de um órgão que são ligados um uma porção
central.
Bom, vamos iniciar discutindo sobre os movimentos voluntários e as regiões
corticais responsáveis por eles.
Áreas Motoras Corticais
Para realizar um movimento você precisa de vontade, ela vem da região Pré-
Frontal. A área 6 de Brodmann corresponde a Área Motora Suplementar (AMS) e
Área Pré- Motora (APM). Ambas possuem a função de planejar o movimento. Mais
especificamente, a AMS faz a projeção do movimento, uma imagética da ação
pretendida. A APM, além de planejar, ela guarda o movimento, memória motora. A
Área Motora Primária (AMP), localizada na área 4 de Brodmann no giro sulco pré-
central, onde guarda a principal via do movimento que vai até a medula espinhal.
Como já comentamos, é necessária uma conexão entre as áreas motoras com as
áreas sensoriais. Assim, as áreas do córtex parietal posterior se fazem
importantes para o movimento, em especial as áreas 5 (relacionada com o
processamento de informações somatossensoriais) e 7 de Brodmann.
Além disso, percebe-se uma influência do sistema límbico do movimento
(amígdala e o giro do cíngulo, principalmente).
As principais vias motoras:
Trato Corticospenhal: É dividida em lateral e anterior. Via Corticoespinhal
Lateral (corresponde a 90% das fibras) saí do córtex, passa pela coroa radiada,
passa pela cápsula interna, passa pela região anterior do mesencéfalo, ao chegar
na pirâmide do bulbo, a via decussa (cruza) e chega até o funículo lateral da medula
e depois faz conexão com o motoneurônio no corno anterior. Responsáveis pelas
musculaturas distais.
Trato Corticoespinhal Anterior: (corresponde a 10% das fibras- não decussa no
bulbo) saí do córtex, passa pela coroa radiada, passa pela cápsula interna, passa
pela região anterior do mesencéfalo, continua ipsilateralmente e chega até o
funículo anterior da medula (ocorre a decussação a nível medular). Responsáveis
pela musculatura da região central, do tronco e dos membros proximais.
Trato Rubroespinhal: saí do núcleo rubro (localizado no mesencéfalo) que recebe
informações da via corticoespinhal e do cerebelo. Ao sair do núcleo rubro, a via
rubroespinhal decussa no bulbo e chegam na medula (imediatamente anterior a via
corticoespinhal lateral). Faz conexão com os motoneurônios para inervar a
musculatura distal.
Trato Reticuloespinhal: possui duas vias a Reticulo Pontinha (localizada na
formação reticular pontinha medial, chega no funículo anterior da medula e faz
conexão com interneurônios mediais) e a Reticulada Bulbar (localizada na região
medial do bulbo e cega no funículo lateral anterior da medula). Essas vias recebem
várias aferências e possuem várias funções. De forma geral, na função motora,
ajuda na preparação do movimento (principalmente do tronco). Inervam
musculaturas do tronco (sustentação à postura).
Trato Vestibuloespinhal: possuem uma via Lateral e Medial, ambas descem pelo
funículo anterior e terminam nos interneurônios associados ao grupo dos
interneurônios mediais. O Trato Vestibuloespinhal Lateral, origina-se no núcleo
Vestibular Lateral (conhecido como núcleo de Deiters) no bulbo. O Trato
Vestibuloespinhal Medial, origina-se no núcleo Vestibular Medial (bulbo). Eles têm
função de equilíbrio, enviar informações sobre o equilíbrio, a partir do
posicionamento da cabeça e do pescoço, auxiliam nos ajustes posturais durante a
mudança de posicionamento da cabeça. Portanto, inervam musculaturas do
tronco e da cabeça.
Trato Tectoespinhal: origina-se no colículo superior (no mesencéfalo), recebendo
aferência da retina (visual). Além disso, também possui uma região de aferência
pelo sistema auditivo, no colículo inferior auditivo. Com essas aferências, o
colículo superior consegue criar um mapa do mundo a nossa volta, fazendo com
que um barulho ou um percebendo um objeto estranho, a via tectoespinhal recebe
essas informações e direciona para a fonte do estímulo. Controlam musculaturas
do pescoço (movimenta a cabeça com base em estímulos visuais e auditivos) e do
tronco.
Núcleos da Base
Região, majoritariamente, diencefálica (com alguns localizados no mesencéfalo)
que não é conectada com a medula espinhal. Participa do controle do movimento,
mais precisamente ele regula o movimento voluntário, também contribuem para a
função afetiva e cognitiva.
São eles: caudado, putâmen, Globo pálido interno, globo pálido externo,
subtalâmico, talâmicos (ventral anterior e ventral lateral) e substância negra (parte
reticulada e compactada).
Para entendermos o funcionamento da via direta e indireta, vamos compreender
como é o funcionamento em repouso primeiro. Nesta condição como estamos sem
realizar um movimento, o globo pálido interno inibe os núcleos do tálamo -ventral
anterior (VA) e ventral lateral (VL). Portanto, não há transmissão de informação do
tálamo para o córtex. Além disso, nessa mesma condição, o globo pálido externo
inibe o núcleo subtalâmico (por meio de GABA).
Via Direta
Nessa via, o contexto é que, há uma necessidade da participação dos núcleos da
base para contribuir com o controle motor, ou seja, intensificar o movimento. Então,
é preciso que aconteça a excitação do tálamo, para que assim forneça informações
para o córtex.
A via começa quando há estimulação, através de glutamato, da Área Pré- Motora,
Área Motora Associativa e do córtex Sensorial Primário para o núcleo estriado
(putâmen e caudado). Além disso, é preciso que haja dopamina no núcleo estriado,
secretada e enviada pela substância negra compactada. Na presença desse
neurotransmissor, o núcleo estriado possui o receptor de dopamina (D1) que
desencadeia uma resposta excitatória para ele. Assim, o estriado projeta-se para o
globo pálido interno e para substância negra reticulada, por GABA
(neurotransmissor inibitório). Se em repouso, o globo pálido interno inibia o tálamo,
agora ocorrerá a inibição do globo pálido interno, ocorrendo uma desinibição os
núcleos VA e VL. Estes irão enviar glutamato para as áreas do córtex. Dando
continuidade ao movimento.
Via Indireta
Aqui há o efeito antagônico da via direta, é preciso inibir o movimento.
A via começa quando há estimulação, através de glutamato, da Área Pré- Motora,
Área Motora Associativa e do córtex Sensorial Primário para o núcleo estriado
(putâmen e caudado). A via indireta também conta com a participação de
dopamina (enviada pela substância negra compactada) que é enviada para o
núcleo estriado, porém o tipo de receptor é do tipo D2 que desencadeia uma
resposta de inibição (envia GABA) do globo pálido externo. Esse núcleo inibido
(relembre a condição em repouso), faz com que o núcleo subtalâmico seja ativado,
liberando glutamato (estimulando) para os núcleos do globo pálido interno e
substância negra reticulada. Assim, o globo pálido interno libera GABA para os
núcleos VL e VA fazendo com que os neurônios do tálamo diminuem sua atividade
(enviando informação para o córtex).
Cerebelo
Não basta apenas sabermos quais músculos serão recrutados, além disso, é
necessário saber a força adequada, a sequência detalhada das contrações,
precisamente no momento certo. Tudo isso é função do cerebelo. Uma lesão
nessas estruturas não está relacionada com paralisias, mas gera movimentos
descoordenados e imprecisos (condição chamada ataxia). Função de tônus
muscular e coordenação motora. Outra função que podemos observar é quando
sentados, colocamos as mãos sobre as pernas e de olhos abertos olhando à frente,
tentamos alcançar o nariz com a ponta do dedo. Se fizermos isso com os olhos
fechados, também faríamos com grande precisão e sem dificuldade (pelo menos é
o esperado). Pessoas com lesões nas áreas cerebelares podem apresentar
dissinergia, ou seja, ao invés de movimentar ao mesmo tempo o ombro, cotovelo e
pulso para alcançar a ponta do nariz com um movimento suave, a pessoa
decompões o movimento: primeiro movimenta o ombro, depois o cotovelo e depois
o pulso, perdendo a suavidade e a sincronização dos músculos para o movimento.
Falando da anatomia do cerebelo, se localiza na região posterior do crânio,
imediatamente abaixo do lobo occipital, conectando- se ao tronco encefálico, por
meio de três pedúnculos (superior, médio e inferior). Se divide em 3 lobos (anterior,
posterior e floconodular) responsáveis por receber as informações, contém as vias
aferentes. Também é divido em 3 hemisférios (verme, hemisfério intermédio e
hemisfério lateral) regiões que enviam informações do cerebelo para outras regiões
(vias eferentes). Profundamente a esses hemisférios encontram núcleos que fazem
suas conexões: fastigial (verme), interposto (hemisfério intermédio) e denteado
(hemisfério lateral).
Algumas aferências do cerebelo:
- Vestibulocerebelar: o aparelho vestibular sensorial, enviam informações para o
lobo floculonodular, depois manda informação para o verme e depois transmite
para o núcleo vestibular (localizado no tronco encefálico), influenciando a via
vestíbuloespinhal. Manda informações visuais, posturais.
- Espinocerebelo: chega informações até o verme e ao hemisfério intermédio. O
verme faz conexão com o núcleo fastigial e influência no sistema motor medial. A
informação do hemisfério intermédio vai até o núcleo interposto, influenciando no
sistema motor lateral.
- Cérebrocerebelo: a informação chega no Lobo Superior e Inferior vai até o
hemisfério lateral, passa para núcleo denteado que envia para o córtex,
informações sobre coordenação motora.
OBS: o cerebelo pode tomar decisões motoras primeiro que a via corticoespinhal.
Movimentos balísticos em que não há tempo de interpretar informações sensoriais
a tempo de realizar um movimento, o cerebelo com conexões com a medula e
outros núcleos conseguem produzir o movimento.
Medula Espinhal
Também faz parte do SNC. É o ponto de chegada de várias vias (motoras, sensoriais
e outras). Capta as informações que chega, modula e envia para os músculos.
Num corte transversal, a medula é formada pela substância cinzenta (região do H
medular/asas de borboleta) e substância branca. A região do H medular se divide
em corno anterior e corno posterior. A região anterior se encontra os
motoneurônios (neurônio que se projeta para as células musculares), essa região
é alvo das vias descendentes. Já o corno posterior se encontra uma grande
quantidade de receptores que integram as informações sensoriais vinda da
periferia.
Vamos aprofunda um pouco no motoneurônio.
Há motoneurônios somáticos (inervam os músculos estriado esquelético) e os
autônomos (inerva outras musculaturas e regiões específicas). Falaremos do
Motoneurônio somático. Podem ser divididos em: alfa e gama.
O motoneurônio alfa(α), saem do corno anterior e chegam até as células
musculares pelos nervos periféricos. A região da sinapse do neurônio com a fibra
extrafusal é chamado de junção neuromuscular ou placa motora. Um axônio de
cada neurônio inerva apenas um músculo e seus ramos inervam várias fibras.
Define-se unidade motora, o motoneurônio α e todas as fibras que ele inerva.
OBS: Princípio do tamanho.
O motoneurônio gama (ϒ) também saem do corno anterior, seus axônios possuem
menor diâmetro e inervam as fibras musculares intrafusais. Quando falarmos de
reflexo, falaremos mais sobre o fuso muscular.
Reflexos Espinais: entende-se como um movimento involuntário e
estereotipado realizado a nível medular. Arco reflexo: nome dado pelo
circuito que inicia de uma via aferente (axônios sensoriais), ao chegar na
medula ocorre uma sinapse com um interneurônio e, por fim, uma via
eferente (motora) que levará ao recrutamento das fibras musculares para
realizar o movimento.
1- Reflexo Miotático/ Estiramento
Fuso Muscular: é um órgão fusiforme que se localizam próximo à região tendínea.
Se conecta em paralelo com as fibras musculares, capazes de detectar alteração
do comprimento do musculo. É um órgão proprioceptor (percebe o corpo no
espaço). Há mecanismo que permite que o fuso, sempre mande informação sobre
o “grau” de estiramento do músculo, chamamos de coativação alfa-gama, quando
há ativação dos dois tipos de motoneurônios, as fibras intrafusais (inervadas pelo
motoneurônio gama) acompanha tanto no alongamento quanto na contração das
fibras extrafusais (motoneurônio alfa).
Falando do reflexo propriamente, o fuso muscular possui alta sensibilidade a
movimentos bruscos, nesses casos ele envia uma informação para evitar uma
lesão do músculo. Ao detectar um estiramento que pode ser danoso, ele envia uma
mensagem aferente para o corno posterior da medula; faz conexão com
interneurônios (Renshaw), que por sua vez faz uma conexão com os motoneurônios
alfa enviando a informação de contrair o agonista (proteger do estiramento) e inibir
o antagonista (permitir o reflexo).
Ex: exame do martelo no joelho.
2- Reflexo Miotático Inverso
A estrutura chave para esse processo se chama Órgão Tendinoso de Golgi,
localizado na junção do tendão com o músculo, disposto em série (de forma
perpendicular) às fibras musculares. É um detector da força, monitora a força
realizada pelo tendão.
O reflexo se dá quando o sujeito realiza uma força muito grande, podendo causar
alguma lesão, fazendo com que o Órgão Tendinoso de Golgi faça uma aferência
chegando até a medula; fazendo conexão com duas classes diferentes de
interneurônios: um que irá inibir o músculo agonista (que está fazendo a força) e
outro irá excitar o antagonista para que o indivíduo se afaste do ponto da força
aplicado ou soltar o peso que está levantando. É, portanto, um arco reflexo
bissináptico.
Ex: pegar um peso muito grande na academia
3- Reflexo de Flexão
O reflexo começa com uma aferência sensorial (pode ser pelo nociceptores),
chegando até a medula. Lá faz conexão com um interneurônio que irá mandar a
informação para o motoneurônio alfa ative a musculatura flexora ipsilateral (pode
ser que outras articulações também flexionem), visando retirar o musculo de perto
da fonte onde foi captado a sensação. Ao mesmo tempo, um outro interneurônio
estimula outro motoneurônio alfa para que ocorra o padrão de movimento oposto
dos membros contralaterais (reflexo de extensão cruzada), visando manter o
equilíbrio do corpo, dando a possibilidade de suportar a carga enquanto ocorre o
reflexo de flexão.
Ex: pisar num prego
4- Padrão Central de Marcha
A marcha é em parte, uma ação reflexa. Há um comando vindo de regiões
encefálicas, mas também é conduzido como reflexo. Um conjunto de neurônios na
medula espinhal, capazes de gerar uma atividade motora sem a necessidade de
uma aferência sensorial. O estímulo de se locomover é recebido interneurônios que
levam a um padrão de excitação flexora e inibição extensora de um lado e a ação
contrária do lado contralateral. Esse jogo de cintura entre esses interneurônios faz
surgir um padrão de locomoção.