ECT2402 - Introdução à Física Clássica III
Prof. Rafael Chaves
www.iip.ufrn.br/qiqm
Capítulo 23 - Lei de Gauss
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1- Idéia geral
Como veremos, a lei de Gauss usa a simetria da distribuição de cargas para simplificar o cálculo do campo
elétrico. Relaciona o campo elétrico na chamada superfície Gaussiana à carga elétrica dentro dela. A lei de Gauss
é uma das quatro equações fundamentais do eletromagnetismo, as chamadas equações e Maxwell.
2- Fluxo
O fluxo é uma quantidade escalar definida como
Φ = ~v · A
~ = vA cos θ, (1)
onde φ é o fluxo associado ao vetor ~v (por exemplo, um vetor velocidade) atravessando uma área descrita pelo
~ O vetor área aponta na direção normal à área considerada e tem módulo dado por | A| = A. Veja
vetor área A.
figura 1.
FIG. 1. Figura 1
3- Fluxo de um campo elétrico
Considere uma superfícies Gaussiana (uma superfície fechada) imersa em uma região com campo elétrico não
uniforme. Dividimos a superfície em áreas infinitesimais ∆ A
~ tal que neste elemento de área, o campo elétrico pode
ser considerado uniforme. Veja figura 2.
O fluxo elétrico é definido como
Φ= ∑ ~E · ∆ A,
~ (2)
e este fluxo pode ser Φ > 0, Φ = 0, Φ < para diferentes produtos internos ~E · ∆ A.
~ Veja figura 2.
Tomando o limite infinitesimal obtemos uma integral em uma superfície fechada
I
Φ= ~
~E · dA. (3)
Lembrando que a unidade de campo elétrico é ( N/C ) a unidade de fluxo elétrico é dada por N · m2 /C. Note
que o fluxo elétrico Φ através de uma superfícies Gaussiana é proporcional ao número de linha de campo elétrico
que atravessam a superfície.
2
FIG. 2. Figura 2
Considere por exemplo a superfície fechada mostrada na Figura 3, imerso em uma região com campo elétrico
constante. As únicas duas faces do cubo que tem um fluxo diferente de zero são as faces 1 (da frente) e 2 (a face
~ Na face 1 o fluxo é Φ = ~E · A
traseira). Nas outras faces o vetor ~E é ortogonal ao vetor área A. ~ = EA (os vetores
são paralelos) e na face 2 é dado por Φ = E · A = − EA (os vetores são anti-paralelos). Vemos portanto que o fluxo
~ ~
na face 1 cancela o fluxo na face 2 e como todas as outras faces tem fluxo nulo, o fluxo total também é nulo. Esta é
uma característica geral: qualquer superfície fechada imersa em um campo elétrico constante terá um fluxo elétrico
total nulo.
FIG. 3. Figura 3
Para analisarmos um outro exemplo veja a figura 4. Neste caso queremos calcular o fluxo elétrico de um campo
uniforme através de uma superfície cilíndrica. Podemos dividir a superfície cilíndrica fechada em 3 partes: a tampa
da esqueda, o invólucro cilíndrico e a tampa da direita. O fluxo na superfície fechada pode portanto ser escrito
como
I Z Z Z
Φ= ~ =
~E · dA ~ +
~E · dA ~ +
~E · dA ~
~E · dA (4)
a b c
= − EA + 0 + EA = 0,
onde usamos o fato de que no invólucro cilíndrico (superfície b) os vetores ~E e dA ~ são ortogonais, na tampa da
esquerda (superfície a) eles são anti-paralelos e na tampa direita (superfície c) eles são paralelos. Novamente vemos
que o fluxo total na superfície fechada é zero.
FIG. 4. Figura 4
3
4- Lei de Gauss
A lei de Gauss nos diz que o fluxo elétrico passando por uma superfície fechada que envolve uma carga qenv é
proporcional a esta carga. Matematicamente
qenv
Φ= . (5)
e0
Usando a definição de fluxo Φ = ~ obtemos
~E · dA
H
I
e0 ~ = qenv .
~E · dA (6)
Se qenv > 0 o fluxo é para fora da superfície. Se qenv < 0 o fluxo é para dentro. Note que a localização das cargas
dentro da superfície é irrelevante. Tudo que importa é a carga total envolvida pela superfície. Note também que
qualquer carga fora da superfície não contribue para o fluxo: todas as linhas de campo que entram por um lado
sairão pelo outro. Veja figura 5 para um exemplo.
FIG. 5. Figura 5
O fluxo só depende das cargas envolvidas qenv mas é importante ressaltar que o campo elétrico dentro da
superfície Gaussiana pode depender de cargas fora da superfície. Por exemplo na figura 6, o fluxo é o mesmo em
ambas as superfícies Gaussianas mas o campo elétrico é obviamente diferente.
FIG. 6. Figura 6
4
5- Lei de Gauss e Lei de Coulomb
Veja figura 7. Queremos computar o campo elétrico gerado por uma carga pontual a uma distância r desta
carga. Note que a distribuição de carga (no caso uma carga pontual) tem um simetrial esférica. Isso quer dizer que
podemos rotacionar a carga por qualquer ângulo e em torno de qualquer eixo que teremos a mesma distribuição
inicial (novamente uma carga pontual). Por essa simetria o campo ~E tem que apontar radialmente (qualquer outra
direção para o campo elétrico que não radial quebraria a simetria esférica). Temos que escolher uma superfície
Gaussiana que reflita esta simetria. Obviamente, escolheremos uma superfície Gaussiana esférica. Como estamos
interessados no campo elétrico à uma distância r da carga, esse também será o raio da esfera Gaussiana. Isso
~ (normal à superfície Gaussian esférica).
implica que ~E é paralelo ao vetor área dA
FIG. 7. Figura 7
Usando a lei de Gauss
I
Φ = q/e0 = ~ = EA = E4πr2 ,
~E · dA (7)
onde A = 4πr2 é a área da superfície Gaussiana.
q
O módulo do campo elétrico é dado portanto por E = 4πe0 r2
e o vetor campor elétrico é dado por
~E = 1 1
r̂, (8)
4πe0 r2
que é justamente o que nós esperaríamos pela Lei de Coulomb.
6- Condutor carregado
O campo elétrico dentro de um condutor em equilíbrio eletrostático tem que ser nulo. Se ele não fosse nulo,
os elétrons de condução (que são livres) se movimentariam e gerariam uma corrente (e portanto não teríamos
equilíbrio).
O campo elétrico ~E deve portanto ser zero dentro do condutor e também sob qualquer superfície Gaussiana den-
tro do condutor, em particular na superfície Gaussiana acompanhando a borda interna da superfície do condutor
(veja figura 8). Como Φ = ~E · dA~ e E = 0, isso implica que o fluxo dentro do condutor também deve ser nulo.
H
Se o fluxo dentro do condutor é nulo, a lei de Gauss nos diz que a carga dentro também tem que ser nula. Ou
seja, qualquer carga presente no condutor deve se concentrar em sua superfície externa.
Caso haja um cavidade no condutor (veja figura 8), a configuração de cargas não muda. Como ~E é nulo dentro
do condutor o fluxo em qualquer superfície Gaussiana em torno da cavidade também deve ser nulo. E novamente
a lei de Gauss implica que nenhuma carga deve estar envolvida por essa Gaussiana. Ou seja, toda carga resultante
presente em um condutor deve se concentrar em sua superfície externa
Vimos que o campo elétrico dentro do condutor deve ser nulo. Mas qual é o campo elétrico fora do condutor?
Vamos nos focar aqui no campo imediatamente exterior à superfície do condutor. Veja a figura 9. Note que nessa
figura, o campo elétrico dentro do condutor deve ser nulo e fora dele ele deve ser normal à superfície (paralelo ao
vetor área) pois se houvesse uma componente perpendicular haveria uma corrente.
5
FIG. 8. Figura 8
O fluxo é dado portanto somente pela tampa superior da superfície cilíndrica na figura 9. Assim o fluxo total
é dado por Φ = EA (lembre que os vetores ~E e A ~ são paralelos neste caso). Usando que qenv = σA, onde σ é a
q
densidade superficial de cargas na superfície obtermos pela lei de Gauss Φ = EA = eenv0
= σA
e0 e assim o módulo
do campo elétrico é E = σ/e0 e como a direção do campo é normal à superfície.
~E = σ n̂. (9)
e0
Vemos portanto que o campo logo fora do condutor, quanto maior for a densidade de carga σ maior será o campo
elétrico.
FIG. 9. Figura 9