1
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM URBANISMO
DOUTORADO EM URBANISMO
GRETE SOARES PFLUEGER
REDES E RUÍNAS:
Apogeu e declínio de uma cidade: o caso de Alcântara-MA
Rio de Janeiro
2011
2
GRETE SOARES PFLUEGER
REDES E RUÍNAS:
Apogeu e declínio de uma cidade: o caso de Alcântara-MA
Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação
em Urbanismo da Universidade Federal do Rio de
Janeiro para a obtenção do título de Doutora em
urbanismo
Orientação: Prof. Ph.D. Rachel Coutinho Marques
da Silva
Rio de Janeiro
2011
3
GRETE SOARES PFLUEGER
REDES E RUÍNAS:
Apogeu e declínio de uma cidade: o caso de Alcântara-MA
Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação
em Urbanismo da Universidade Federal do Rio de
Janeiro para a obtenção do título de Doutora em
Urbanismo
Aprovada em: / /
__________________________________________________
Prof. Ph.D. Rachel Coutinho Marques da Silva (Orientadora)
Universidade Federal do Rio de Janeiro
_________________________________________________________________
Profª. Drª. Denise Barcellos Pinheiro Machado (Examinadora)
Universidade Federal do Rio de Janeiro
__________________________________________________
Prof. Dr. Cristovão Duarte (Examinador)
Universidade Federal do Rio de Janeiro
__________________________________________________
Prof. Dr. Henrique de Paula Borralho (Examinador Convidado)
Universidade Estadual do Maranhão
__________________________________________________
(Examinador)
4
Pflueger, Grete Soares.
Redes e ruínas -apogeu e declínio de uma cidade: o caso de
Alcântara - Maranhão/Grete Soares Pflueger.____Rio de
Janeiro: UFRJ/PROUB, 2011.
xxII, 203p.:il; 29,7 cm.
Orientadora: Rachel Coutinho Marques da Silva.Ph.D
Tese (Doutorado) – UFRJ/PROUB, Programa de Pós
Graduação em Urbanismo, Convênio Dinter Capes UFRJ/
UEMA, 2011.
Referências bibliográficas: f.4
1. Redes e ruínas. 2. Urbanismo. 3. Alcântara - Maranhão.
4. Tese I. Silva, Rachel Coutinho Marques da. II.
UFRJ/PROUB. III.Título.
CDU:711.42.025.21 (812.1)
5
Para Juliana e Luísa, minhas filhas.
Para Ernst Otto Pflueger e José Wilson Farias, in
memorian .
6
AGRADECIMENTOS
A Universidade Estadual do Maranhão (UEMA) pelo programa de
qualificação de docentes que possibilitou o Dinter em Urbanismo.
Ao PROURB da UFRJ, em especial a profa. Dra Denise Pinheiro, que foi
parceira no desafio de realizar primeiro doutorado interinstitucional em urbanismo e
a profa.Ph.D. Rachel Coutinho Marques da Silva pela orientação no projeto e na
tese .
A Capes pela aprovação do projeto do Dinter através do edital “Novas
fronteiras” e pelo apoio financeiro concedido, fundamental a realização do Convênio
e a Fapema pelo apoio concedido em bolsas e editais de apoio a pesquisa para
mestres. .
A todo o grupo de professores do curso de arquitetura e urbanismo da
UEMA, colegas de departamento e de doutorado pelo apoio e incentivo: Bárbara
Irene W. Prado, Célia Regina Mesquita Santos, Érico Peixoto Araújo, Gustavo
Martins Marques, Hermes da Fonseca Neto, José Bello Salgado Neto, Márcia
Tereza Campos Marques, Maria Teresinha de M. Coelho, Marluce Wall de Carvalho
Venâncio, Sanadja de Medeiros Souza, Thaís Trovão dos Santos Zenkner e Alex
Oliveira, nosso coordenador.
Aos pesquisadores que encontrei nos arquivos que facilitaram as
buscas.Luis Mello no acervo da Biblioteca Publica Benedito Leite, Jose Reinaldo no
IBGE e toda a equipe do arquivo Público do Estado do Maranhão. A Vera
Giusti, corretora incansável de português e leitora cuidadosa; a Rosilene pela
normatização e ao Prof.Dr. Henrique Borralho da UEMA pela leitura cuidadosa e
ricas sugestões e a todos que me ajudaram indiretamente com seu trabalho: Eline,
Ricardo e Regiane, toda minha gratidão
A família Pflueger, em especial as mulheres: Theresa, minha mãe; Lidia e
Silvia, minhas irmãs queridas que acolheram minhas filhas nas idas ao Rio e
finalmente as minhas filhas: Juliana e Luísa, fonte de minha energia, pelo apoio e
paciência nestes anos.
A Deus, pois sem fé ninguém ultrapassa barreiras e ao tempo que
organiza tudo.
7
Em Alcântara
o tempo se condensou
em tempo de espera
espera de tudo
e o grande orgulho da cidade
é saber hoje esperar
o passado
que pelo futuro
qualquer cidade espera
Chagas,1994.
8
RESUMO
Esta tese analisa o processo de apogeu e decadência da cidade de Alcântara no
Maranhão a partir do entendimento da teoria de sistema mundo, da evolução da
rede urbana brasileira e das redes globais contemporâneas na dimensão social,
econômica e urbana pontuando os momentos de inclusão e exclusão do Estado e da
cidade de Alcântara das redes urbanas, compreendendo o processo de decadência
e arruinamento de Alcântara no contexto histórico e econômico do Estado do
Maranhão no século XX.
Palavras chave: Urbanismo. Redes urbanas. Ruínas.
9
ABSTRACT
This thesis analyzes the rise and decay of Alcântara city in Maranhão from the
understanding of the world system theory, the evolution of Brazilian urban network
and contemporary global network in socioeconomic and urban dimensions
punctuating moments of inclusion and exclusion State and city networks,
including the process of decay and ruination of Alcântara in historical and
economic context of the state of Maranhão in the twentieth century.
Keywords: Urbanism. Urban network. Ruins.
10
LISTA DE FIGURAS
Capa - Portal do Palácio do imperador
Figura 1 - Mapa do Estado do Maranhão e detalhe do município de Alcântara
............................................................................................................20
Figura 2 - Typus orbis terrarum, Abraham Ortelius, mapa mundi, água
forte, Antuérpia 1587 ......................................................................... 31
Figura 3 - Quadro teórico .................................................................................. 32
Figura 4 - Ondas política econômica e social de São Luís ................................ 53
Figura 5 - Linha do tempo de São Luis .............................................................. 56
Figura 6 - Linha do tempo de Alcântara ......................................................... ...57
Figura 7 - Linha do tempo do desenvolvimento urbano de Alcântara ............... 58
Figura 8 - Vista aérea de Alcântara ................................................................... 59
Figura 9 - Ruína da Matriz ................................................................................. 67
Figura 10 - Rua do giz ........................................................................................ 78
Figura 11 - Imagens das fábricas ........................................................................ 89
Figura 12 - Estatísticas populacionais ................................................................. 97
Figura 13 - Palácio do Comércio (A) e Palácio da educação (B) ...................... 101
Figura 14 - Monumentos modernos, postal de natal ......................................... 102
Figura 15 - Postal da construção da Avenida Magalhães de Almeida em São
Luis ................................................................................................. 103
Figura 16 - Planta de São Luís em 1912 – Justo Jansen .................................. 106
Figura 17 - Planta de São Luís em 1950, detalhe para a diagonal da Avenida
Magalhães ....................................................................................... 107
Figura 18 - mapa do Maranhão em 1631 ........................................................... 110
Figura 19 - Planta da vila de Alcântara em 1755 ................................................ 111
Figura 20 - Sobrado em ruínas na Rua do Giz em São Luís ............................. 124
Figura 21 - Croquis de Renée Lefevre do livro São Luís e Alcântara, de
1969, Rua da Amargura em Alcântara-Ma ...................................... 126
Figura 22 - Croquis de Renée Lefevre do livro São Luís e Alcântara, de
1969, Rua da Grande em Alcântara-MA ......................................... 127
Figura 23 - Croquis do livro Velho Maranhão de Tom Maia, vista parcial do
forte são Sebastião e das ruínas do convento do Carmo em
Alcântara-MA .................................................................................. 128
11
Figura 24 - Ruínas da Matriz ............................................................................. 129
Figura 25 - Intendência: presídio de Alcântara .................................................. 129
Figura 26 - Mapa de Alcântara em 1957 ............................................................ 129
Figura 27 - imagem da Peninteciaria e Igreja Matriz 1957 ............................... 132
Figura 28 - imagem Matriz de S. Mathias em 1957 ......................................... 132
Figura 29 - Igreja da Matriz de Alcântara .......................................................... 139
Figura 30 - Ruína do Palácio Negro .................................................................. 139
Figura 31 - Mapa das ruínas de Alcântara ....................................................... 151
Figura 32 - Estudo da formação de Alcântara no século XVII. Mapa base
1970 ................................................................................................ 152
Figura 33 - Ruínas da Plataforma de Lançamento de foguetes em
Alcântara ......................................................................................... 164
Figura 34 - Ruínas da plataforma de lançamento ............................................. 164
Figura 35 - Planta cadastral cidade de Alcântara, em 1970 .............................. 166
Figura 36 - Imagens de satélite de Alcântara ..................................................... 166
Figura 37 - Avenida de Anel de Contorno sobre mapa de GPS, de Alcântara-
MA, em 2000 ................................................................................... 169
Figura 38 - Croqui esquemático da favelização de Alcântara-MA ...................... 172
Figura 39 - Mapa da área em litígio entre Ciclone e Quilombolas –
Alcântara-MA ................................................................................. 174
Figura 40 - Evolução tecnológica ou empreguismo ........................................... 177
Figura 41 - Duas realidades .............................................................................. 178
Figura 42 - mapa do município de Alcântara e o CLA ........................................ 179
Figura 43 - Planta digital da cidade de Alcântara, em GPS, em 2000 ................ 180
12
LISTA DE FOTOS
Foto 1 - Imagem das ruínas do Imperador, em Alcântara ............................ 108
Foto 2 - Rua da amargura, em 2007 e de Pompéia, em 2008 ..................... 108
Foto 3 - Rua da amargura ............................................................................ 118
Foto 4 - Ruína do interior da Igreja das Mercês (A) e ruína da Rua da
Amargura (B) ................................................................................... 119
Foto 5 - Rua Grande e ruína da Igreja Matriz .............................................. 119
Foto 6 - Igreja e Largo da Matriz (A) e Rua Grande e Igreja do Carmo (B) .. 119
Foto 7 - Rua Afonso Pena atual Rua Direita ................................................ 121
Foto 8 - Igrejas e convento do Carmo – fachada frontal ............................... 121
Foto 9 - Plataforma de lançamento do VLS, em Alcântara ........................... 134
Foto 10 - Centro de lançamento, em 2003 ..................................................... 135
Foto 11 - Ruína da matriz e pelourinho .......................................................... 142
Foto 12 - Ruínas da Matriz de São Mathias ................................................... 153
Foto 13 - Ruínas da Igreja das mercês e da Rua da amargura ...................... 154
Foto 14 - Igreja do Carmo .............................................................................. 155
Foto 15 - Igreja e convento do Carmo ............................................................ 155
Foto 15 - Igreja e convento do Carmo ............................................................ 155
Foto 16 - Igreja e convento do Carmo ............................................................ 155
Foto 17 - Igreja e convento das Mercês ......................................................... 156
Foto 18 - Portal de São Francisco .................................................................. 157
Foto 19 - detalhe do Portal de São Francisco ................................................ 157
Foto 20 - Rua da Amargura ............................................................................ 158
Foto 21 - Ruínas da Rua da Amargura ........................................................... 159
Foto 22 - Ruínas do palácio do imperador ..................................................... 160
Foto 23 - Ruínas do Palácio do Imperador, em Alcântara-MA,
em 2007 .......................................................................................... 164
Foto 25 - Ruínas da Rua da Amargura, Alcântara-MA, em 2007 ................... 164
Foto 26 - Nova plataforma de lançamentos 2011 .......................................... 165
Foto 27 - Favela do Anel de Contorno, em Alcântara-MA .............................. 168
Foto 28 - Baixão do Lobato ............................................................................ 168
13
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Valores de arrecadação dos Municípios em 1936 ........................... 116
Quadro 2 - Comparativo das exportações em 1936 .......................................... 116
Quadro 3 - Resumo populacional ...................................................................... 180
Quadro 4 - Renda per capita e percentual de Indigentes e de pobres no
Município de Alcântara ..................................................................... 181
Quadro 5 - Composição do PIB ......................................................................... 182
-
14
LISTA DE SIGLAS
AEB - Associação do Comércio Exterior do Brasil
ACS - Alcântara Cyclone Space
AIB - Ação Integralista Brasileira
ANPUR - Associação Nacional de Pós Graduação e Planejamento Urbano e
Regional
BPBL - Biblioteca Pública Benedito Leite
CIAM - Congresso Internacional de Arquitectura Moderna
CLA - Centro de Lançamento de Alcântara
CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
CONTAG - Confederação de Trabalhadores na Agricultura
CTA - Centro Técnico Aeroespacial
DPHAP-MA - Departamento de Patrimônio Histórico e Artístico do Estado
EIA-RIMA - Relatório de Impacto Ambiental
ESBAP - Escola Superior de Belas Artes do Porto
GICLA - Grupo de Implantação do Centro de Lançamento de Alcântara
GT - Grupo de Trabalho
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ICOMOS - Conselho Internacional de Monumentos e Sítios
IDH - Índice de Desenvolvimento Humano
IFCHS - Instituto de Filosofia e Ciências Sociais
IHGB - Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro
IMESC - Instituto Maranhense de Estudos Socioeconômicos e Cartográficos
IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
IPHAN-RJ - Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional do Rio de
Janeiro
ISUF - International Seminar of Urban Form
MEC - Ministério da Educação
MHAM - Museu Histórico e Artístico do Maranhão
Minter - Mestrado Inter Institucional
15
PHAN - Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
PIB - Produto Interno Bruto
PROURB - Programa de Pós-Graduação em Urbanismo
UFPE - Universidade Federal de Pernambuco
UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro
UNB - Universidade de Brasília
UNESCO - Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura
VLS-1 - Veículo Lançador de Satélite
16
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................ 19
1.1 Arquitetura da tese ...................................................................................... 24
2 CONCEITOS E REFERÊNCIAS TEÓRICAS .............................................. 31
2.1 Quadro teórico ............................................................................................. 32
2.1.1 O sistema mundo: a visão de Wallerstein .................................................... 33
2.1.2 Conceito de redes em Milton Santos ........................................................... 36
2.1.3 A sociedade em rede: a visão de Castells ................................................... 37
2.1.4 Dimensão econômica das redes urbanas em Prado Junior ........................ 42
2.1.5 Evolução da rede urbana colonial no Brasil: Nestor Goulart Reis Filho e
Paulo Santos ............................................................................................... 44
2.1.6 O Estado do Maranhão nas redes de comércio global ............................... 48
2.1.7 Ideologia da decadência da lavoura ............................................................ 50
2.1.8 Momentos de inclusão e exclusão do estado do Maranhão: ciclos
econômicos ................................................................................................. 54
2.1.9 Momentos de inclusão e exclusão de Alcântara ......................................... 55
2.2 Cidades ....................................................................................................... 59
2.3 Ruínas ......................................................................................................... 66
2.3.1 Significados das Ruínas ............................................................................... 70
2.3.2 Ruínas históricas ......................................................................................... 71
2.3.3 Ruínas nas cartas patrimoniais ................................................................... 75
2.4 Temporalidades: cidade e ruínas ................................................................ 76
3 MARANHÃO NO SÉCULO XX: .......................................................................
Dimensão sócio-econômica ........................................................................ 78
3.1 Contexto histórico ........................................................................................ 79
3.1.1 A Imigração ................................................................................................. 84
3.1.2 A Industrialização ........................................................................................ 86
3.1.3 O Babaçu-esperança do Estado do Maranhão ............................................ 90
3.1.4 O Ciclo econômico contemporâneo .............................................................. 92
Dimensão Política
3.2. O fenômeno do coronelismo e patrimonialismo ............................................ 93
3.2.1 O Estado do Maranhão na República velha ................................................. 94
3.2.2 O Estado do Maranhão no estado novo de Getulio Vargas ......................... 95
17
3.2.2.1 O interventor Paulo Ramos: 1937-1945 ...................................................... 97
3.2.2.2 Renovação urbana de São Luís e o abandono do interior ......................... 100
3.2.3 Vitorino Freire e Sarney ............................................................................ 106
4 ALCÂNTARA : apogeu e declínio .......................................................... 108
4.1 Alcântara antecedentes da decadência ...................................................... 109
4.2 A Elite Alcantarense:Fidalgo e Barões ...................................................... 113
4.3 A não-industrialização/A não-imigração .................................................... 114
4.4 Narrativas da decadência ........................................................................... 117
4.5 O debate da demolição das ruínas de Alcântara e a Renovação urbana
da capital .................................................................................................... 122
4.6 Cidade presídio:a implantação do presidio de seguraça máxima 1950 a
1965............................................................................................................ 129
4.7 Cidade Espacial:do local ao global 1979 a 2010 ....................................... 135
4.7.1 1980 Implantação do Centro de lançamento de Alcântara ....................... 136
4.8 desconexão local ....................................................................................... 137
5 REDES E RUÍNAS .................................................................................... 139
5.1 As tentativas de reconexão de Alcântara nas redes
5.1.1 1948: cidade monumento: tombamento do iphan ..................................... 142
5.1.2 Os relatórios da UNESCO ......................................................................... 144
5.2. Ruínas como testemunho físico e simbólico dos momentos de conexão
e desconexão de Alcântara ....................................................................... 150
5.2.1 Ruínas da Matriz de São Mathias ............................................................... 153
5.2.2 Igreja e Ruínas do Convento do Carmo .................................................... 155
5.2.3 Ruínas da igreja e convento das Mercês.................................................... 156
5.2.4 Ruínas da igreja de São Francisco ............................................................. 157
5.2.5 Ruínas da Rua da amargura. .................................................................... 158
5.2.6 Ruínas Augustas do Palácio do imperador ................................................ 160
5.2.7 Ruínas do futuro ........................................................................................ 163
6 ALCÂNTARA NO SÉCULO XXI ............................................................... 166
6.1 A questão fundiária Centro de lançamentos .............................................. 167
6.2 Projeto Cyclone space ............................................................................... 173
6.3 O Território étnico das comunidades quilombolas: os impactos do
Centro de Lançamento de Alcântara ......................................................... 175
6.4 Alcântara no século XXI ........................................................................... 180
18
7 CONCLUSÕES ......................................................................................... 184
REFERÊNCIAS ......................................................................................... 190
19
1 INTRODUÇÃO
Este trabalho conclui uma etapa de pesquisa realizada sobre a cidade de
Alcântara, que foi iniciada no Mestrado inter institucional (Minter) com a UFPE em
desenvolvimento urbano, realizado nos anos de 1999-2002.O resumo da dissertação
foi publicado no livro organizado pela Professoras Virginia Pontual e Ana Rita de Sá
Carneiro da UFPE intitulado “História e Paisagem: ensaios urbanísticos do Recife e
São Luís” em 2005. Antes disso Alcântara havia sido tema de uma bolsa de
iniciação científica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq) em 1988, sob orientação do arquiteto Antônio Pedro Gomes de
Alcântara do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional do Rio de Janeiro
e objeto de discussões técnicas e acadêmicas no âmbito da Universidade Estadual
do Maranhão como professora e como arquiteta do Departamento de Patrimônio
Histórico e Artístico do Estado (DPHAP-MA),
Entre 2005 o curso de arquitetura buscou dar continuidade a qualificação
profissional com o doutorado. A resposta positiva do PROURB da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) através da Profa. Denise Pinheiro nos transformou
na primeira experiência de Dinter em urbanismo sendo aprovado em 2006 pela
Capes no edital “Novas Fronteiras” materializando o sonho da qualificação de 11
professores da arquitetura da UEMA. Os temas seriam em torno das questões
urbanas da ilha de São Luis e duas cidades seriam consideradas: Alcântara e
Barreirinhas
Alcântara permaneceu como tema sempre com novas questões, novas
abordagens e novos olhares teóricos, pois havia um desafio pendente que era o de
compreender e contextualizar o arruinamento da cidade no final do século XIX e
início do XX. Chamava atenção uma quantidade significativa de ruínas no contexto
urbano e essa especificidade parecia ser observada nos relatórios técnicos, no
discurso dos intelectuais e nos relatos dos viajantes e historiadores preocupados
com o processo de arruinamento da cidade cujos desafios extrapolaram a cronologia
de quatro séculos de sua existência.
Observamos ainda que o processo de isolamento ocorreu em diferentes
momentos da formação da cidade, conectando-a e desconectando-a das redes
20
coloniais e contemporâneas.Persistia a necessidade de compreender a exclusão da
cidade, seu apogeu e decadência, sua inserção nos ciclos econômicos do Estado do
Maranhão e do País, a conexão e a desconexão das redes urbanas existentes na
perspectiva de compreender como se deu este processo nas dimensões sociais,
econômicas e urbanas.
Mais uma vez a escolha do tema para o projeto de tese foi Alcântara e
seus desafios no século XX, suas ruínas e o processo de decadência em diferentes
dimensões, na perspectiva de um entendimento da rede urbana regional e global. O
projeto foi examinado e aceito pela Profa. Rachel Coutinho ganhou um corpo teórico
com a perspectiva do estudo das redes urbanas e dos processos de apogeu e
decadência de cidades nas diferentes dimensões econômicas, sociais e urbanas.
Objeto
O objeto de estudo justifica o projeto. Alcântara foi a segunda cidade em
importância histórica do Estado, depois da capital São Luís e tem sido tema de
estudos e pesquisas no curso de arquitetura e urbanismo, assim como as cidades
históricas de Caxias e Viana e o novo pólo de turismo dos lençóis maranhenses-
Barreirinhas.
O município de Alcântara está situado no litoral norte maranhense na
microrregião da Baixada Ocidental; limita-se geograficamente ao norte com o
oceano atlântico, ao sul com o município de Cajapió, a leste com a Baía de São
Marcos e a oeste com a Baia de Cumã. A extensão territorial é de 114 mil hectares,
apresentando configuração peninsular, recortada por braços de mar e igarapés,
vastos campos naturais e algumas ilhas como a do Cajual, das Pacas e a do
Livramento, em frente à cidade histórica.
A cidade de Alcântara é uma ponta de continente, delimitada pela baía
de São Marcos e pelos igarapés do Puca e do Jacaré, causando a impressão de
tratar-se de uma ilha. Está implantada sobre um promontório, destacada, 4 metros
acima do nível do mar e dista 22 km em linha reta pelo mar da capital do Estado do
Maranhão, São Luís. Seu principal acesso é feito através das embarcações
tradicionais de madeira e barcos de turismo que saem de São Luís. A travessia dura
cerca de 1 hora. Há acesso por estrada (700 km de São Luis) e por linhas regulares
de “ferry boats” que interligam o porto do Itaqui, em São Luís, ao porto de Cujupe, no
município de Alcântara.
21
Figura 1 Mapa do Estado do Maranhão e município de Alcântara
Fonte: Viagem (2010)
Hoje o município de Alcântara possui de acordo com o censo 2010 21.851
habitantes distribuídos da seguinte forma: na sede ou zona urbana tem 5.908
habitantes e na zona rural tem maior parte de sua população, em torno de 15.452
habitantes. Além da “Sede”, como é chamada popularmente a cidade de Alcântara,
o município possui 207 povoados e pequenos sítios de características bem
diferentes; são povoados formados por comunidades negras remanescentes de
quilombos; remanescentes das aldeias indígenas, das antigas fazendas de algodão
e engenhos de açúcar, das terras da igreja, antigas propriedades das ordens
religiosas; colônias de pescadores situadas á beira-mar; e três cidades de porte
médio: São João de Cortes, Oitiua e o Porto de Cujupe. A maioria dos povoados
conserva nomes de origem indígena como Oitiua, Tamatatiua, Canelatiua e
Raimundo Sú ou o nome das antigas fazendas como fazenda das Pedras e Nazaré,
A maioria deles ainda hoje está sem luz e água, com estradas de terra e com
indicadores de extrema pobreza e analfabetismo.
22
Breve histórico
Alcântara foi a antiga aldeia tupinambá Tapuitapera, ponto estratégico de
passagem para o ouro do Perú no século XV, no circuito das grandes navegações
ocupada e visitada por franceses, portugueses e holandeses. Foi fundada como Vila
portuguesa religiosa de Santo Antônio de Alcântara em 1648, e foi, posteriormente
no século XVIII, a sede da aristocracia rural agro exportadora do algodão quando
viveu d seu apogeu econômico. No século XIX sofreu um processo brutal de
decadência com a abolição dos escravos e as mudanças do mercado do algodão.
Durante o início do século XX, Alcântara foi totalmente excluída do ímpeto
têxtil ocorrido no Estado do Maranhão, excluída também das reformas urbanas
promovidas durante a interventoria de Paulo Ramos da Era Vargas, e ainda no
ímpeto das renovações urbanas, as ruínas quase foram demolidas. Até a promessa
do Babaçu como redenção econômica do Estado não a alcançou.
Em sua trajetória histórica percebe-se que as decisões políticas
influenciaram sua exclusão e inclusão e que o processo de arruinamento se deu a
partir da desconexão das redes econômicas, sociais e políticas que fundamentam o
dinamismo urbano, com a dissolução da elite local sem reações ou surgimento de
uma elite empreendedora para a superação do isolamento. Este processo não era
apenas da cidade, mas do Estado. Autores como: Gaioso (1970), Tribuzi (1981) e
Almeida (2008) demonstram como eram frágeis as bases da prosperidade onde a
decadência já se instalava e alertavam para a existência do discurso recorrente no
Estado do maranhão da decadência da lavoura, da fragilidade da prosperidade e
dos entraves ao desenvolvimento
Na perspectiva de sua preservação em 1948, Alcântara foi eleita pelo
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (PHAN) como cidade monumento na
esperança de que a cidade se inserisse na rede do turismo cultural, pois estava
economicamente estagnada. Mas, a decisão política em 1950 de sediar na praça
central, na antiga casa de câmara e cadeia, o presídio estadual de segurança
máxima logo após o reconhecimento como monumento nacional contribuiu para sua
exclusão do cenário turístico nacional. Estas contradições fazem parte da história da
cidade.
Com o isolamento econômico, político e social, o processo de
arruinamento, a obsolescência econômica e abandono transformaram-na numa
23
cidade decadente na metade do século XX. Este discurso foi reforçado pela
narrativa de políticos e intelectuais.
O intelectual maranhense Odylo Costa filho denominou Alcântara: a
cidade que se recusa a morrer e Josué montello no seu livro “Noite sobre Alcântara”
ilustrou bem o abandono com a metáfora da chave .A aristocracia jogava as chaves
de seus sobrados fora ao abandonar a vila de barco com destino à capital.
No contexto de um Estado regido pelas oligarquias, Alcântara reproduziu
esta forma de governo autoritária, alternando governantes que pouco contribuíram
para a transformação dos indicadores econômicos e sociais.
Os movimentos urbanos são dinâmicos e contraditórios e as iniciativas do
patrimônio histórico na década de 1980 reanimaram a cidade, mesmo ano em que
mais da metade do seu território foi desapropriado, através de Decretos estaduais e
federais para implantação do Centro de Lançamentos de Alcântara (CLA1). A
ausência de Relatório de impacto ambiental (EIA RIMA) e de discussões para a
implantação de um projeto tão grande, de características militares, elaborado no
período da ditadura militar causou efeitos devastadores na cidade.
Este processo, que incluiu remanejamento e deslocamento compulsório
de centenas de famílias de comunidades rurais remanescente dos escravos para
agrovilas inadequadas à tradição cultural, gerou desagregação social e urbana,
provocando, na década de 90, um êxodo para o centro histórico, sede do município.
O resultado foi uma crescente favelização do entorno do mangue e a explosão da
malha urbana da sede.
A percepção desse processo foi possível durante um ano de experiência
profissional em Alcântara em 1998, trabalhando com a 3ª SR do Iphan na
recuperação da igreja do Carmo e na construção com a municipalidade da proposta
de zoneamento urbano que impedisse o processo de favelização de apagar as
ruínas históricas.
Inclusão e exclusão se misturam com as ruínas antigas e modernas,
metáfora do grave acidente em 2004 na plataforma de lançamento, que transformou
as instalações da plataforma de lançamento de foguetes VLS em ruínas, matando
uma elite de 21 cientistas brasileiros. Confrontavam-se, a partir daí, o local e o
global, as ruínas antigas e as contemporâneas.
1
Centro de Lançamento de Alcântara, base militar para lançamento de foguetes.
24
1.1 Arquitetura da tese
O trabalho divide-se em seis capítulos, sendo que o primeiro é a
introdução. O segundo constrói um quadro teórico que busca estabelecer uma
relação entre a teoria de Immanuel Wallerstein e a sua compreensão do mundo em
sistemas, na perspectiva do sistema capitalista mundial com raízes na Europa e
América do século XVI como subsídio para o entendimento da formação das redes
urbanas.
A Visão do mundo como um sistema é seguida da compreensão das
redes urbanas do período colonial no Brasil formada pelas cidades interligadas e
pela dimensão econômica das trocas realizadas pelas Companhias de Comércio
como nos propõem Reis Filho (1968; 1983; 2000) e Santos (1968) e pela visão das
redes urbanas de Geiger (1963), com clara influência da geografia francesa e da
metodologia do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE); posteriormente
pela formação das redes contemporâneas por Castells, ressaltando os diferentes
processos de inclusão e exclusão e de conexão e desconexão das cidades das
redes, em diferentes temporalidades na composição de novos centros e das
periferias referenciada também por Sassen (1998).
Neste movimento de inclusão e exclusão tornou-se fundamental a
compreensão do conceito de cidade em Rolnik (1995), Munford (1998) e Weber
(1999) em suas diferentes dimensões para delimitar que o processo de desconexão
e conexão das cidades, ou seus processos de decadência e crescimento, como o de
Alcântara geraram fragilidade urbana e depois um crescimento desordenado ou
favelização que, não necessariamente, configuram uma cidade em seus aspectos e
dimensões essenciais.
O terceiro capítulo tem por objetivo compreender e contextualizar a
história do Estado do Maranhão no século XX nas dimensões sócio econômico e
políticas, na perspectiva de reconstituir os diferentes momentos de inclusão e
exclusão do Estado do Maranhão nas redes global, regional e local resgatando as
razões da decadência econômica e social do Estado como também pretende
analisar todas as tentativas e os planos para alavancar a economia do Estado.
O quarto capitulo trata do apogeu e declínio da cidade de Alcântara com
recorte no século XX, pontuando os momentos de apogeu no século XVIII , na
perspectiva de construir uma cronologia para compreender as temporalidades
25
históricas, organizando as informações coletadas na pesquisa empírica que se
iniciam com o relato de 1904 dos médicos Victor Godinho e o Adolpho Lindenberg
que comparam o abandono da Rua da Amargura de Alcântara às ruas de Pompéia,
devastada pelo Vesúvio na Itália. Mesmo considerando as diferentes causas e
temporalidades, a metáfora utilizada serve para ilustrar o arruinamento visto pelo
viajante. Entre 1904 e 1906 há as imagens inéditas das ruínas de Alcântara que
ilustram os textos da “Revista do Norte”; assim como as seis fotografias do álbum de
Gaudêncio Cunha de 1908 (Cunha, 1987), imagens essas que foram produzidas
para mostrar apenas os monumentos que restavam da cidade já decadente,
omitindo as ruínas, na Exposição Nacional do Rio de Janeiro em 1908; em 1912
encontramos o relato das impressões do viajante francês Paul Walle; em 1927 os
debates no jornal sobre a possibilidade de demolição das ruínas entre intelectuais
maranhenses e os artigos do jornal de 1936 - onde Alcântara passa a ser então
sinônimo de ruínas. Trata ainda do tombamento em 1948 e da implantação do
presídio de segurança máxima em 1950 , que configuram momentos de inclusão e
exclusão da cidade .
Os relatórios dos consultores da UNESCO sobre a fragilidade urbana ,
social e a desconexão de Alcântara nas redes assim como as alternativas para sua
revitalização seguidos de um entendimento das ruínas como testemunho físico e
simbólico dos momentos de conexão e desconexão de Alcântara são contemplados
no capitulo cinco .Percorremos ainda alguns exemplos simbólicos de ruínas e de sua
apropriação pela cidade informal .
A questão da implantação do centro de lançamentos de Alcântara
implantado pelos militares na década de 80 é motivo de reflexão no sexto capitulo,
pois representou um fator de conexão da cidade na esfera global e também um fator
de exclusão da comunidade despreparada para interagir com o empreendimento. O
município despreparado para um empreendimento global ficou excluído. A demora
do relatório de impacto ambiental e das ações mitigadoras dos impactos causados
pela implantação deste imenso projeto que desapropriou 51% das terras gerando
fortes transformações sociais, urbanas, econômicas e territoriais Também foram
fatores de exclusão.
Utilizamos Castells (2002; 2005) em sua trilogia como referência teórica
para compreender o surgimento da sociedade em rede e da tecnologia da
informação nos anos 80 e da importância dos movimentos comunitários no processo
26
global para compreender o impasse entre comunidades quilombolas e Cyclone
space – novo projeto ucraniano de uso do espaço aéreo alcantarense. Por fim,
situamos os dados da cidade com seus baixos indicadores sociais e humanos.
Na conclusão retomamos algumas questões relativas à formação urbana
ao reafirmar a existência de diferentes momentos do planejamento urbano
considerando as dimensões econômicas e os ciclos de desenvolvimento do Estado.
Confirmando a hipótese de que as bases da decadência do Estado do Maranhão
estavam presentes na fragilidade do período do apogeu e que os entraves
colocados em diferentes ciclos permanecem na contemporaneidade .
A pesquisa
A pesquisa histórica consistiu em examinar acervos de São Luís e do Rio
de Janeiro, em busca do material de fontes primárias e secundárias como livros
raros, documentos, jornais antigos, almanaques administrativos e relatórios técnicos
com intuito de resgatar a narrativa de historiadores, técnicos, intelectuais
maranhenses e dos viajantes sobre os ciclos econômicos do Estado do Maranhão
na perspectiva de reconstituir a história de Alcântara do ponto de vista econômico e
social, para entender as conexões econômicas e sociais da cidade com a região e
com o mundo. Analisa a cartografia, mapas e as imagens [fotografias e gravuras]
para compreender a formação do Estado e da cidade de Alcântara na dimensão
econômica e urbana.
Nesta pesquisa utilizamos o método histórico em um período de média
duração (século XX) na busca das especificidades cronológicas e das
temporalidades do Estado do Maranhão e da cidade de Alcântara em seus
diferentes momentos de exclusão e inclusão das redes colonial e global.
No método histórico, o primeiro passo inclui a pesquisa de documentos,
para conhecê-los e classificá-los. Nesta primeira etapa realizamos um levantamento
de dados nos acervos existentes em São Luís, Alcântara e Rio de Janeiro. O
objetivo era proceder a uma busca inicial de documentos, relatórios e imagens sobre
o objeto de estudo: o arruinamento da cidade de Alcântara no Maranhão. Desta
forma, o levantamento das fontes primárias (arquivisticas, iconográficas e
bibliográficas) e das fontes secundárias bibliográficas foi realizado em acervos de
Instituições das três cidades citadas.
27
Em São Luís do Maranhão foram realizadas pesquisas em vários acervos,
destacamos aqui o acervo da Biblioteca Pública Benedito Leite (BPBL) no setor de
obras raras pesquisamos a narrativa dos viajantes dos séculos XIX e XX como o
livro “A Peste” de autoria de Victor Godinho e Adolpho Lindenberg, médicos
sanitaristas que vieram ao Maranhão em 1904 e ao visitarem a cidade de Alcântara
fazem um importante relato no livro “Viagem ao norte do Brasil”, comparando
Alcântara a Pompéia na Itália.
Encontramos ainda o livro raro, do viajante Walle (1912) 2, a coleção de
“Almanaques Administrativos e Mercantis” do ano de 1866 e 1923, a coleção da
Revista do Norte de 1901 a 1906, o álbum de Miércio Jorge de 1950 e relatórios do
interventor do Estado Paulo Ramos entre 1930 e 1947.
Nestes documentos, obtivemos imagens inéditas das ruínas de Alcântara,
como a ruína da igreja das Mercês ate então desconhecida de pesquisadores
maranhenses. Entre os vários livros de historiadores maranhenses citamos os irmão
Lopes, Marques e Viveiros sobre a história do comércio do Maranhão e a história da
cidade de Alcântara citamos Meireles , Lima e Tribuzzi sobre a formação
econômica do Estado do Maranhão .
No setor de jornais antigos microfilmados da Biblioteca Pública Benedito
Leite em São Luis localizamos diversos artigos sobre ruínas, com a ajuda do
pesquisador Luís de Mello, grande conhecedor dos microfilmes e que nos prestou
excelente auxílio, localizando os artigos que listamos: “Ruínas augustas” (Conde,
1927), “Prata de Alcântara” (Viveiros, 1954), “Ruínas de Alcântara” (Lopes, 1927) e
“Príncipe de Orleans visita a cidade de Alcântara” (jornal imparcial, 1927).
No acervo da Casa de Cultura Josué Montello3 tivemos acesso à
pesquisa histórica realizada pelo autor como subsídio ao seu livro “Noite sobre
Alcântara” (Montello, 1984) e as críticas escritas nos jornais dos anos de 1978 e
1979 por diversos intelectuais brasileiros e europeus relativos ao livro. É importante
ressaltar o suporte fundamental para analisar o arruinamento de Alcântara que
encontramos na literatura e poesia maranhense.
A decadência da cidade foi assunto de vários livros e poemas e a questão
da decadência foi muito bem retratada pelos poetas e escritores do final do século
2
Livro original está no setor de obras raras da Biblioteca Pública Benedito Leite, em São Luís-MA.
3
Casa de Cultura Josué Montello, no centro de São Luís, reúne todo acervo do escritor, inclusive as
pastas relativas a cada livro escrito com criticas, documentos, anotações e material de pesquisa.
28
XIX até o século XX tais como os irmãos pesquisadores Antonio e Raimundo Lopes,
o poeta José Chagas, os escritores Josué Montello e Ferreira Gullar dentre outros.
Na Biblioteca e livraria da Academia Maranhense de Letras adquirimos
reedições de importantes livros sobre a história do Maranhão.
Na Biblioteca da Unidade executora do Prodetur - Maranhão,
encontramos todos os relatórios da UNESCO sobre Alcântara entre os anos de 1960
-2000.
No Museu Histórico e Artístico de São Luís tivemos contato com as
pranchas originais do álbum de fotografias “Maranhão 1908” Cunha (1987). Este
importante fotógrafo elaborou, a pedido do Governo do Estado, um álbum para a
exposição de 1908 no Rio de Janeiro. Nesse álbum constam seis imagens da cidade
de Alcântara. As imagens selecionadas pelo fotógrafo mostram a cidade e seus
monumentos, omitindo as ruínas. O olhar de fotógrafo privilegiou os monumentos
em estado de conservação razoável, como a “Casa de Câmara e Cadeia”, a Igreja
do Carmo e a Rua Direita, mostrando apenas a bela cidade omitindo as ruínas da
Matriz e da Rua da Amargura excluindo da exposição a face decadente da vila.
No Museu de artes visuais, encontramos uma biblioteca de livros raros e
almanaques administrativos e fotos do século XX, além das imagens e fotografias
encontramos um importante registro nos desenhos feitos em 1969 sobre a cidade
como os que ilustram a obra de Lefèvre e Costa Filho (1971). Os croquis em preto e
branco de Lefèvre contêm uma expressão de dramaticidade que reflete a situação
de arruinamento da cidade.
No Arquivo público do Estado pesquisamos com ajuda dos técnicos da
casa, de uma bolsista de iniciação científica da Fapema do curso de história e do
pesquisador Luis Mello em jornais da década de 1950-60 e nos documentos inéditos
da Coletoria Federal de Alcântara além de livros relatórios e teses sobre a economia
do Babaçu.
Na Biblioteca do IBGE de São Luís encontramos importantes documentos
de 1950 como a “Enciclopédia dos municípios brasileiros” (Ferreira, 1959). Este
material foi muito precioso, pois forneceu uma contextualização do processo de
decadência da década de 1950 e juntamente com os recenseamentos dos anos
1940, 1950 e 1960 nos forneceram os dados necessários para referenciar os
momentos de exclusão econômica da cidade.
29
No Rio de Janeiro, as pesquisas foram feitas nos acervos da Biblioteca
Nacional, Acervo da iconografia, cartografia e obras raras; Instituto Moreira Salles-
RJ – acervo técnico de fotografias; Real Gabinete de Leitura Portuguesa e IHGB-RJ.
Biblioteca do MEC e IPHAN,onde localizamos as pesquisas do arquiteto Pedro
Alcântara, documentos do tombamento das ruínas de cidades históricas.
Pesquisamos ainda nos acervos do Arquivo Nacional – documentos e fotografias e
na Biblioteca do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCHS) da UFRJ.
Em sistemáticas visitas ao setor de iconografia e obras raras da Biblioteca
Nacional, tivemos a oportunidade de conhecer o acervo de gravuras sobre ruínas ,
de autoria de Giovanni Battista Piranesi, o maior expoente das gravuras italianas.
Piranesi retratou de forma expressiva as ruínas de Roma e Pompéia. Para nossa
surpresa, encontramos no acervo da coleção de gravuras do teatrólogo maranhense
Arthur Azevedo, hoje sob a curadoria do Palácio dos Leões em São Luís do
Maranhão, cinco gravuras de ruínas de autoria de Piranesi.
Na Biblioteca Nacional, setor de microfilmes encontramos muitos jornais
maranhenses como “O Imparcial”, que já havíamos pesquisado em São Luís.
Conhecemos também o acervo de fotografias da coleção da imperatriz Teresa
Cristina sobre as viagens e sobre a escavação de ruínas da cidade italiana de
Pompéia. Buscamos imagens sobre Alcântara e São Luis, mas não obtivemos êxito.
No acervo geral, pesquisamos também no catálogo de teses e
dissertações onde encontramos trabalhos sobre as ruínas das missões do Rio
Grande do Sul e vários livros sobre a economia do Maranhão.
No acervo técnico do Instituto Moreira Salles, na Gávea, não encontramos
nenhuma imagem sobre Alcântara de fotógrafos que viajavam com o Imperador pelo
Brasil como Marc Ferrez. Havia apenas o acervo do fotógrafo francês Gautherot com
fotos de pessoas da comunidade de Alcântara.
Consideramos nesta pesquisa, com recorte temporal que tem foco no
século XX, mas pontua importantes momentos do apogeu e decadência nos séculos
XVIII e XIX necessários a delimitação dos momentos de conexão e desconexão do
Estada do Maranhão o e da cidade de Alcântara nas redes urbanas e econômicas ,
regionais e globais
Como fontes primárias bibliográficas foram utilizados livros raros,
documentos, jornais antigos, almanaques administrativos, relatos de viajantes e
relatórios técnicos. Dentre as fontes pesquisadas destacamos os jornais antigos
30
como fonte fundamental na construção das temporalidades. No século XX , o jornal
e as fotografias são documentos de grande importância para a pesquisa. Importante
referência que utilizamos, foi a pesquisa realizada na década de 70, sobre Alcântara,
pelo arquiteto do IPHAN do Rio de Janeiro, Antonio Pedro Gomes de Alcântara e os
relatórios dos consultores da UNESCO sobre a cidade feitos entre 1960 e1980.
Todo o material da pesquisa empírica foi reunido com intuito de montar
uma cronologia dos processos de exclusão e inclusão, de identificar a narrativa de
historiadores, técnicos, intelectuais maranhenses e dos viajantes sobre a
decadência econômica e social do Estado do Maranhão e da cidade de Alcântara.
Vários textos foram produzidos ao longo do doutorado com as reflexões
preliminares da tese e foram apresentados nos seminários da Associação Nacional
de Pós Graduação e Planejamento Urbano e Regional (ANPUR) realizado em Belém
em 2007; no Internacional seminar of urban form (ISUF) realizado em Ouro preto em
2009; no seminário internacional de história medieval na UEMA em 2008. Três
bolsas de iniciação científicas concedidas pela UEMA e FAPEMA para os
doutorandos do dinter foram desenvolvidas sobre o tema entre 2008 e 2010 como
suporte a pesquisa. E obtivemos aprovação no edital Universal de 2009 de apoio ao
pesquisador mestre da FAPEMA para conclusão da tese, tanto as bolsas como o
edital foram instrumentos fundamentais à conclusão da pesquisa.
Considerando a inexistência de estudos sobre a formação urbana da
cidade de Alcântara seu apogeu e declínio e suas conexões e desconexões nas
redes locais e globais esperamos que a tese contribua como instrumento para o
planejamento urbano e para preservação da cidade.
31
2 CONCEITOS E REFERÊNCIAS TEÓRICAS
Figura 2 - Typus orbis terrarum, Abraham Ortelius, mapa mundi, água forte, Antuérpia 1587
Fonte: Acervo da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro
A noção de sistema mundo e o conceito de rede urbana foram essenciais
a compreensão do processo ocorrido em Alcântara no Maranhão. Nesta perspectiva
a construção do quadro teórico buscou estabelecer uma relação entre a teoria de
Immanuel Wallerstein e a sua compreensão do mundo em sistemas, como subsídio
ao entendimento da formação das redes urbanas no contexto do sistema capitalista
mundial com raízes na Europa e América do século XVI.
A visão do mundo como um sistema é seguida da compreensão das
redes urbanas do período colonial no Brasil formada pelas cidades interligadas e
pela dimensão urbana e econômica das trocas realizadas pelas Companhias de
Comércio como nos propõem Reis Filho (1968; 1983; 2000) e Santos (1968) e pela
32
visão das redes urbanas de Geiger (1963), com clara influência da geografia
francesa e da metodologia do IBGE.
Complementa este quadro teórico o argumento de Castells (2002a; 2005)
no que se refere a redes contemporâneas, ressaltando os diferentes processos de
inclusão e exclusão e de conexão e desconexão das cidades das redes. Em
diferentes temporalidades na composição de novos centros e das periferias. Essa
conceituação é também referenciada por Sassen (1998).
Neste movimento de inclusão e exclusão das cidades nas redes globais,
regionais e locais tornou-se fundamental a compreensão do conceito de cidade em
Rolnik (1995), Munford (1998) e Weber (1999) em suas diferentes dimensões para
delimitar como aconteceu o processo de desconexão e conexão das cidades, ou
seus processos de estagnação urbana e econômica, crescimento desordenado ou
favelização que, não necessariamente, configuram uma cidade em seus aspectos e
dimensões essenciais propostos por Weber (1999).
2.1 Quadro teórico
De acordo com a figura 3, apresento o quadro teórico:
SISTEMA
MUNDO
REDES
CIDADES
RUÍNAS
Figura 3 – Quadro teórico
Fonte: Grete Pflueger, 2009
33
2.1.1 O sistema mundo: a visão de Wallerstein
O mundo pode ser observado de várias formas, o sociólogo americano
Immanuel Wallerstein (2001; 2002; 2007) o vê como um sistema. Como teórico e
critico da globalização, ele sempre resistiu a usar o termo teoria dos sistemas-
mundo, preferindo chamar seu trabalho de análise do sistema mundo. Essa análise,
segundo afirma, tomou forma em 1970 porque as condições do seu surgimento
estavam maduras no interior do sistema. O autor explica que eventos como a
revolução de 1968, a descoberta da realidade do terceiro mundo após 1945 (pois
anteriormente só estudavam a Europa e América do Norte), resultou num trabalho
coletivo da análise dos sistemas a partir de quatro desdobramentos:
a) A noção de globalidade: a teoria da modernização com caráter
internacional insistia em ver toda a parte do sistema mundo como parte de um
mundo, sendo impossível entendê-las separadamente. Wallerstein (2001; 2002;
2007) considera que a noção de globalidade é diferente de globalização, pois
globalização se refere a processos recentes;
b) A historicidade: a história era um elemento crucial para o entendimento
do estado presente do sistema, pois os processos eram sistêmicos;
c) A unidisciplinaridade: os processos historicamente emergentes e em
evolução no sistema mundo poderiam ser separados em correntes distinguíveis e
segregadas com lógicas particulares;
d) O holismo: uma visão que leva a repensar a grande divisão
historicamente construída e agora consagrada entre ciências e humanidades, e,
quem sabe, igualmente descartá-la.
O sistema mundial, de acordo com Wallerstein (2001), tem suas raízes na
Europa e na América do século XVI, quando o mercado mundial começou a se
formar, estabelecendo, portanto, a divisão mundial do trabalho. A capacidade de
acumulação de capital na Inglaterra e na França possibilitou a expansão global das
relações de intercâmbio econômico e no século XIX tanto as potências industriais
como as nações agrícolas, já estavam virtualmente integradas neste sistema.
Em sua obra publicada originalmente em três volumes entre 1974 e 1989,
Wallerstein (1980) defendeu a tese de que não existe um terceiro mundo, pois há
unidade no sistema capitalista mundial, caracterizado pela contradição entre
34
trabalho e capital, cuja acumulação se processa principalmente entre os estados
nacionais.
A economia mundial capitalista para Wallerstein (2001) é um sistema
dinâmico que muda ao longo do tempo. No sistema capitalista mundial existem
vários estágios de civilização. Bandeira (2007) afirma que Wallerstein sustenta que
tais diferenças não decorrem do atraso de certas regiões com relação a outras, mas
do próprio caráter do sistema mundial que é inerente à desigualdade entre centro,
periferia e semiperiferia.
Nesta perspectiva, Wallerstein (2001; 2002; 2007) propõe um quadro
teórico para compreender as mudanças históricas do mundo moderno. O moderno
sistema mundial de natureza capitalista foi amadurecendo durante a crise do
sistema feudal. No período medieval, a crise do feudalismo foi causada pela
diminuição da produção agrícola, mudança nas condições climáticas e aumento das
epidemias. O capitalismo surge dentro do período feudal, como uma superação
gestada de dentro para fora da nova economia mundial que dirigiu o fluxo
econômico da periferia para os centros. O novo sistema mundial capitalista foi
baseado na divisão internacional do trabalho, determinando novas relações entre as
diferentes nações, bem como os tipos de condição de trabalho.
Wallerstein (2001) propõe categorias diferentes em que todas as regiões
do mundo podem ser colocadas: o núcleo, a periferia e a semiperiferia:
a) O núcleo ou coração seria formado pelo noroeste da Europa, países
como a Inglaterra, Holanda e França com fortes governos centrais, grandes
exércitos onde a burguesia exerceu forte controle sobre o comércio internacional e
extraiu benefícios deste comércio. A ascensão dos Estados Unidos à hegemonia
global começou com a recessão mundial de 1873. Neste período os Estados Unidos
e a Alemanha começaram a controlar os mercados globais, graças ao declínio da
economia britânica.
b) A periferia, situada no outro extremo da escala onde estavam as zonas
periféricas que careciam de governos fortes centrais exportando matérias primas
para o centro com práticas coercitivas de trabalho. Na America Latina, espanhóis e
portugueses conquistaram territórios com a dominação dos indígenas, importação
de escravos da África e exportação de matéria prima para a Europa. Diferente das
práticas do período medieval, estas áreas foram criadas para produzir bens para a
economia mundial capitalista e não apenas para seu consumo interno. A
35
aristocracia, tanto na Europa como na América Latina enriqueceu com a economia
mundial e recorreu à força dos núcleos centrais para manter o controle.
c) Semiperiferia - Entre os dois extremos - núcleo e periferia encontra-se
a semiperiferia formada por países que eram explorados pelos núcleos. No caso dos
impérios americanos de Espanha e Portugal, muitas vezes, eram exploradas pela
própria periferia. No caso a importação de ouro e prata pelos espanhóis de suas
colônias, ou de madeira no Brasil, obtidas através de práticas coercitivas de trabalho
serviu de pagamento para produtos manufaturados de países centrais como
Inglaterra e França, evitando a criação de um setor produtivo local. Bom exemplo de
ser citado é a Rússia, cujo trigo abasteceu seu mercado interno, tornando-se mais
importante que o externo, o que garantia certa resistência e fortalecia o grande
estado russo que regulava sua economia, limitando a influência externa.
Se por um lado Wallerstein (2002, p. 236) analisa a ascensão do sistema
mundo em sua trilogia. Ele também questiona a extinção do sistema através das
contradições da análise do sistema mundo. O autor afirma: que “as teorias antigas
nunca morrem, mas, em geral, tampouco se dissipam, antes se escondem, mudam”.
Assim, para ele, o trabalho de criticar velhas teorias pode parecer nunca ter fim. Sua
análise não é uma teoria ou um modo de teorização, mas uma perspectiva e uma
critica de outras perspectivas.
A visão de sistemas proposta pelo autor, no conjunto de sua obra, nos
proporciona o suporte teórico para entendimento da formação das redes em nível
mundial ao longo da história. A análise de sistemas mundo é uma importante
introdução para compreensão das conexões do mundo em redes, possibilitando
assim, o entendimento da inserção do Brasil nas redes europeias, no circuito das
grades navegações do século XV e o posterior desenho da rede no período colonial
e mesmo o desenho das redes no mundo contemporâneo.
O Brasil e, por conseguinte o Estado do Maranhão e a cidade de
Alcântara se inserem na categoria de periferia, tendo sido explorados pelos
governos centrais, no caso Portugal. A aristocracia maranhense era ligada ao
núcleo, a corte européia portuguesa, fornecendo matérias primas e enriquecendo a
economia mundial. Alcântara, sede da aristocracia rural, também estabelecia
conexões diretas com Portugal, onde os filhos da elite estudavam e de onde vinham
os produtos de luxo para consumo. Vale ressaltar que o Maranhão foi o ultimo
Estado a aderir a independência do Brasil.
36
2.1.2 Conceito de redes em Milton Santos
Santos (2006) aborda alguns conceitos de rede a partir de duas grandes
matrizes: a que apenas considera o seu aspecto e a sua realidade material e a outra
que leva em conta a realidade social. Admite também que a história do meio
geográfico pode ser dividida em três etapas: o meio natural, meio técnico e meio
técnico científico-informacional, que dividem a produção e vida das redes.
No primeiro, o meio natural, há a predominância de dados naturais em
que o engenho humano era limitado e subordinado às forças da natureza e as redes
então tinham um forte componente de espontaneidade e serviam a uma pequena
vida de relações, pois as trocas eram pouco frequentes, com competitividade
inexistente e o tempo era mais lento. No segundo momento, já na modernidade o
desenvolvimento das técnicas constitui uma nova etapa, o consumo se amplia, o
progresso tem utilização limitada e os mercados coloniais são limitados (SANTOS,
2006).
Na verdade quanto mais avança a civilização material mais se impõe o
caráter deliberativo na constituição das redes que assumem identidade própria. No
terceiro momento, da pós-modernidade técnico cientifica informacional as redes
assumem o progresso da ciência e tecnologia com novas possibilidades de
informação, em um tempo mais rápido e novas regras de gestão.
No capitulo “Por uma geografia das redes”, Santos (2006) explica que as
redes são meras abstrações, pois são também sociais e políticas, formadas pelas
pessoas, mensagens, valores que a frequentam. As redes seriam incompreensíveis
se apenas as enxergássemos a partir de manifestações locais ou regionais. Na
verdade, elas se superpõem, não são uniformes, dependem dos fluxos e da
circulação.
As redes, segundo Santos (2006), são um veiculo de um movimento
dialético que, de uma parte, ao mundo opõe o território e o lugar; e, de outra parte,
confronta o lugar ao território tomado como um todo.
Através das redes, Santos (2006) reconhece três níveis de totalidades:
a) A primeira totalidade situa-se o nível mundial: o mundo aparece como
primeira totalidade, empiricizada por intermédio das redes;
37
b) a segunda totalidade é o territórios, um Estado, um país, uma formação
sócio-espacial, limitada por fronteiras;
c) na terceira e última vem o lugar, o nível local, onde os fragmentos de
rede ganham uma dimensão única e socialmente concreta.
Santos (2000) questiona: para quem é real a rede urbana? Nas
extremidades estão os que têm acesso e os que estão excluídos, mas para estes a
rede é uma realidade onírica. Distorções que, ele afirma, poderiam ser resolvidas
pelo exercício da cidadania.
A partir dos conceitos de Santos (2006) tentamos compreender e
contextualizar nosso objeto de pesquisa que é a cidade Alcântara em seus
diferentes momentos e processos de conexão e desconexão, desde o período
colonial ate a contemporaneidade no rebatimento dos três meios propostos pelo
autor.
No primeiro, o meio natural, consideramos o lugar estratégico que
Alcântara ocupou nas redes das grandes navegações, onde a aldeia “Tapuitapera”
foi ponto de passagem da navegação francesa, portuguesa e holandesa em busca
do eldorado do Perú, como importante ponto de passagem no processo de
ocupação dos territórios no contexto da colonização do continente.
No segundo, o meio técnico científico, consideramos o período do apogeu
da lavoura do algodão no Maranhão, onde Alcântara foi a sede da aristocracia rural
agro exportadora. E no terceiro e ultimo meio, na contemporaneidade consideramos
o momento em que o território do município, pela sua situação em relação ao
equador, sedia um empreendimento global - O centro de lançamento de foguetes,
conectando a cidade ao mundo informacional e global.
2.1.3 A sociedade em rede: a visão de Castells
O sociólogo espanhol Castells (2002a; 2005) em sua trilogia sobre a era
da informação trata do surgimento de uma nova estrutura social manifestada sob
várias formas conforme a diversidade de culturas e instituições em todo o planeta.
Esta nova estrutura social está associada ao surgimento de um novo modo de
desenvolvimento, novas estruturas e processos que caracterizam a sociedade
informacional, as novas tecnologias e a globalização. Ele parte do pressuposto que,
como tendência histórica, as funções e os processos dominantes na era da
38
informação estão cada vez mais organizados em torno das redes e que estas
constituem uma nova morfologia social.
Dessa morfologia social deriva uma nova economia, no século XX,
motivada pela revolução da tecnologia da informação que forneceu o material
indispensável para sua criação e tomou uma escala global. Daí por diante passam a
ser vistos dois aspectos que são relevantes na nova economia:
a) É informacional porque a produtividade e competitividade de unidades
dependem da capacidade de gerar, processar e aplicar de forma eficiente a
informação baseada em conhecimentos;
b) É rede: porque nas novas condições históricas, a produtividade é
gerada e a concorrência é feita numa rede global de interação entre redes
empresariais.
No entanto, Castells (2002) ressalta que o surgimento da sociedade
informacional neste final de milênio está entremeado de desigualdade e exclusão
social crescente em todo o mundo. Isto significa que na contemporaneidade nem
todos estão em rede e muitos estão excluídos. Lembremo-nos, por exemplo, das
aldeias indígenas, cidades esquecidas no sertão brasileiro ou cidades históricas
estagnadas economicamente, como Alcântara.
Em “Fim de Milênio”, último livro de sua trilogia, Castells (2002), define
exclusão social como o processo pelo qual determinados grupos e indivíduos são
sistematicamente impedidos de acesso a posições que lhes permitiriam uma
existência autônoma dentro dos padrões sociais determinados por instituições e
valores inseridos em um dado contexto. Nesse caso, ela afeta tanto pessoas como
territórios, de modo que sob determinadas condições, países, regiões, cidades e
bairros inteiros são excluídos, relegando a tal exclusão a maioria ou a totalidade de
sua população.
Nos últimos vinte e cinco anos do século XX, Castells (2005) informa que
uma revolução tecnológica com base na informação transformou o modo de pensar,
de produzir, de consumir, de negociar, de administrar, de comunicar e de viver. Foi
sendo constituída uma economia global dinâmica no planeta, que liga pessoas e
atividades importantes de todo o mundo ao mesmo tempo em que vai
desconectando das redes de poder e riqueza as pessoas e territórios considerados
não pertinentes sob a perspectiva dos interesses dominantes. O espaço e o tempo,
bases materiais da experiência humana, foram transformados à medida que o
39
espaço de fluxos passou a dominar o espaço dos lugares, e o tempo atemporal
passou a substituir o tempo cronológico da era industrial
A reestruturação do capitalismo nos anos 70 e 80 demonstrou a
versatilidade de suas regras operacionais e sua capacidade de utilizar a lógica do
sistema de redes e da era da informação com eficiência para promover um enorme
avanço nas forças produtivas e no crescimento econômico, mas expôs também a
lógica excludente do capitalismo, excluindo milhões de pessoas dos benefícios do
informacionalismo. O surgimento do informacionalismo esta entremeado de
desigualdade e exclusão social crescente em todo o mundo.
Castells (2005) estabelece uma distinção entre os vários processos de
diferenciação social, de um lado, os termos desigualdade, polarização, pobreza e
miséria se enquadram no domínio das relações de distribuição/consumo ou
apropriação do diferencial da riqueza gerada pelo esforço coletivo. Do outro,
individualização do trabalho, superexploração dos trabalhadores, exclusão social e
integração perversa são características de processos da relação de produção.
Segundo Castells (2002, p. 98), “a exclusão social é um processo, não
uma condição!”. Excluídos e incluídos podem se revezar no processo ao longo do
tempo. Os limites são móveis, e dependem dos fatores externos como grau de
escolaridade, práticas e políticas governamentais e qualificação. Além disso, o
processo de exclusão afeta tanto pessoas como territórios, de modo que sob
determinadas condições, países, regiões, cidades e bairros inteiros são excluídos
relegando, nessa exclusão, a maioria ou a totalidade de sua população.
Na América Latina o nível de desigualdade na distribuição de renda
sempre foi elevado. Para países em desenvolvimento como o Brasil, Castells (2002)
afirma que a disparidade corresponde à taxa de migração do campo para a cidade,
uma vez que o principal fator referente à desigualdade na distribuição de renda é a
diferença abissal entre os níveis de renda na área rural e nas aglomerações
urbanas. Em suas estatísticas, o autor apresenta dados de 1990 relativos ao que era
considerada a linha de pobreza extrema e o nível de consumo equivalente a um
dólar por dia. Isso significa dizer que 1.3 bilhões de pessoas, 33% da população em
desenvolvimento, encontram-se em estado de miséria, 550 milhões na Ásia, 215
milhões na África e 150 milhões na América Latina.
A globalização atua de forma seletiva, incluindo e excluindo segmentos de
economia e sociedades de redes de informação, riqueza e poder que caracterizam o
40
novo sistema dominante. A individualização do trabalho deixa os trabalhadores à
mercê da própria sorte, tendo de negociar seu destino em vista das forças de
mercados e mudanças constantes.
Dados recentes do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (2010)
demonstram a situação de extrema pobreza ainda existente no País. O documento
afirma que no Brasil entre 1995 e 2008, 12,8 milhões de pessoas saíram da
condição de pobreza absoluta (rendimento médio domiciliar per capita de até meio
salário mínimo mensal), permitindo que a taxa nacional dessa categoria de pobreza
caísse 33,6%, passando de 43,4% para 28,8%. Na Região Nordeste a Taxa de
pobreza absoluta caiu 28,8% e a Taxa de pobreza extrema caiu 40,4%.
O documento do IPEA demonstra a situação de baixos indicadores
existente no Maranhão do século XXI. Na conclusão do documento há uma
perspectiva positiva, que considera que nesta segunda década do século XXI, o
Brasil poderá eliminar uma das principais chagas resultantes da condição de
subdesenvolvimento.
E na conclusão ressalta que:
[...] várias décadas após as nações desenvolvidas terem superado os
problemas de pobreza absoluta e extrema, a economia brasileira prepara-se
para passar a viver esta nova realidade. Para isso, a combinação do
crescimento econômico com avanços sociais observada no período recente
precisa ser aprofundada, com o necessário aperfeiçoamento de políticas
públicas de alcance nacional, sobretudo daquelas voltadas ao atendimento
das regiões e estados menos desenvolvidos (INSTITUTO DE PESQUISA
ECONÔMICA APLICADA, 2010).
O Brasil tem 16,2 milhões de pessoas vivendo em condições extremas de
pobreza. Isso representa 8,5% dos 191 milhões de habitantes do país. O Ministério
do Desenvolvimento Social estabeleceu em 2011 o valor de R$ 70 per capita ao mês
como referência para definir quem são os brasileiros mais carentes. Estes dados
foram divulgados pelo IBGE (2011) e neles o Maranhão figura como o Estado que
tem proporcionalmente a maior concentração de pessoas em condições extremas de
pobreza. Da população de 6,5 milhões de habitantes, 1,7 milhão está abaixo da linha
de miséria (ganham até R$ 70 por mês). Isso representa 25,7% dos habitantes,mais
que o triplo da média do país, que é de 8,5%.
Os indicadores demonstram fatores de exclusão que podem ser
esclarecidos pelos estudos de Sassen (1998, p. 17) que considera que:
41
[...] ao lado das novas hierarquias globais e regionais há um vasto território
que se tornou cada vez mais periférico e cada vez mais excluído dos
grandes processos econômicos que alimentam o crescimento econômico na
nova economia global.
Uma multiplicidade de centros manufatureiros, cidades portuárias outrora
importantes, perderam suas funções e encontram-se em declínio. É o caso particular
de alguns estados brasileiros e de algumas cidades históricas, como Alcântara.
Sassen (1998) trabalha ainda o conceito de cidades periféricas que se
transformaram em secundárias ou marginais devido às transformações na economia
mundial. Para a autora, elas perderam a importância, pois os produtos que
exportavam ou produziam caíram em desuso, subtraindo seu lugar privilegiado para
as novas cidades. Algumas cidades decadentes, provavelmente jamais recuperarão
a importância que tiveram, portanto terão dificuldades de se reconectar em rede de
cidades importantes hoje.
Sassen (1998) nos relata a nova geografia dos centros e margens,
ressaltando que três fatores importantes nos últimos 20 anos estabeleceram as
bases de análises das cidades na economia mundial:
a) A dispersão territorial das atividades econômicas das quais a
globalização é uma das formas contribuiu para o crescimento das funções e
operações centralizadas;
b) O gerenciamento e controle centralizados sobre um conjunto
geograficamente disperso de operações econômicas não ocorrem inevitavelmente
como parte de um sistema mundial, pois requerem a produção de um conjunto de
serviços especializados;
c) A globalização econômica contribuiu para uma nova geografia da
centralidade e da marginalidade.
Desta forma surge o “lócus” da periferia resultante da dualidade existente
entre países desenvolvidos e menos desenvolvidos que gerou esta geografia da
centralidade e da marginalidade, repleta de desigualdades representando a
transformação da geografia do centro e da periferia. A condição de ser periférico
instala-se em diferentes terrenos geográficos, e, dependendo da dinâmica
econômica, presenciamos hoje novas formas de periferização do centro de algumas
grandes cidades gerando processos de exclusão e inclusão de regiões e de cidades.
O processo de exclusão pode ser entendido, segundo Castells (2005),
através da nova lógica dominante do espaço de fluxos. As áreas consideradas sem
42
valor na perspectiva do capitalismo informacional e que não sejam objeto de
interesse político significativo são ignoradas pelos fluxos de riqueza e de informação.
Este é o caso de cidades que, por razões econômicas, se desconectaram da rede
global e tornaram-se despreparadas e excluídas da rede.
2.1.4 Dimensão econômica das redes urbanas em Prado Junior
Prado Junior (1987) classifica varias etapas no processo de formação do
país:
a) 1640 a 1770: a ocupação efetiva do território brasileiro;
b) 1770 e 1808-apogeu da colônia.
c) 1808 a 1850-era do liberalismo;
d) 1850 a 1889 - o império escravocrata e aurora burguesa
e) 1889 a 1930-a república burguesa.
No capitulo “O império escravocrata e a aurora burguesa: 1850-1889”
Prado Júnior (1987) afirma que das transformações ocorridas no século XIX
nenhuma contribuiu mais para modificar a fisionomia do país como a revolução que
se operou na distribuição das atividades produtivas. Essa revolução foi constituída
por dois fatos, um de natureza geográfica: o deslocamento da primazia econômica
das velhas regiões agrícolas do norte para as do centro-sul e o outro foi a
decadência das lavouras tradicionais do Brasil – da cana de açúcar, do algodão e do
tabaco e o desenvolvimento paralelo da produção de café.
Desta forma, o centro sul foi progressivamente tomando a dianteira das
atividades econômicas do país. As culturas tiveram diferentes razões para a
decadência, a cultura da cana caiu em função da produção de beterraba, a produção
do algodão local foi substituída pela norte americana e oriental e pelo deslocamento
do mercado internacional e o tabaco caiu, com as restrições opostas ao tráfico
africano.
Neste contexto de mudanças, Prado Junior (1987) enfatiza que a cultura
do café cresceu e se aclimatou no sul e que o ciclo normal das atividades produtivas
no Brasil viveu fases de intensa e rápida prosperidade seguidas de estagnação e
decadência. Assim aconteceu na lavoura da cana e do algodão no norte; nas minas
43
de ouro e diamantes do centro sul. A causa é sempre a mesma: os esgotamentos
das reservas naturais por um sistema de exploração extensivo.
A lavoura do café marcou na evolução econômica do Brasil um período
bem caracterizado, pois durante três quartos de século concentrou-se nela toda a
riqueza do país. “O Brasil é café”, Prado Junior (1987, p. 167) afirma, “o rei café
destronador do açúcar, do ouro e diamantes, do algodão, que lhe tinham ocupado o
lugar no passado.”
A segunda metade do século XIX assinala o momento de maior
transformação econômica no Brasil. Após a abolição do tráfico africano acontece um
período de prosperidade econômica. Prado Jr relata que em 1850 foram fundadas:
62 empresas industriais, 14 bancos, três caixas econômicas, 20 companhias de
navegação a vapor, 23 de seguros, 4 de colonização, 8 de mineração, 3 de
transporte urbano, 2 de gás e 8 estradas de ferro.
Instala-se no Brasil, segundo Prado Junior (1987), um capitalismo
incipiente, que seria mais tarde abalado durante a guerra do Paraguai (1865-1870)
comprometendo assim as finanças do país. Mas houve avanços com as construções
de estradas de ferro, a expansão das redes telegráficas, da navegação a vapor e um
certo progresso industrial. A economia brasileira, no entanto, estava presa num
círculo vicioso de que somente transformações futuras seriam capazes de livrá-la,
fundamentando no que se constituiu a sua fraqueza: a grande lavoura produtora de
gêneros de exportação. Era nela que se baseava a riqueza e produtividade nacional
e ela era responsável por acanhadas perspectivas para o País. Prado Junior (1987)
ressalta que o monopólio disfarçava momentaneamente esta profunda contradição.
A industrialização foi um fator precípuo na expansão dos núcleos urbanos
brasileiros e na formação das grandes metrópoles. Geiger (1963) diz que existiu
uma estrutura urbana para o Brasil colonial, outra para o Brasil independente agrário
e ainda outra para o atual Brasil industrial. As modificações na organização das
redes urbanas e na posição hierárquica de cidades também se ligam ás
modificações estruturais e a influência do processo de industrialização.
44
2.1.5 Evolução da rede urbana colonial no Brasil: Nestor Goulart Reis Filho e Paulo
Santos
Desta forma, após a visão do mundo em sistemas e diante da perspectiva
de compreensão de que as cidades estão conectadas em redes e que seus
processos econômicos e sociais de apogeu e decadência configuram novos
desenhos na geografia das redes através de movimentos de conexões e
desconexões, buscamos então, analisar alguns conceitos de rede urbana em Geiger
(1963), Reis Filho (1968; 1983; 2000) e Santos (1968), observando a dimensão
econômica em Prado Junior (1987), confrontando com o conceito de rede
contemporânea em Santos (2000; 2006) e em Castells (2002a; 2005), de periferias e
centralidades em Sassen (1998), observando a moldura teórica de Freitag (2002;
2006) para as cidades brasileiras, na perspectiva de evidenciarmos as redes em
temporalidades diversas e assim compreendermos a conexão e desconexão das
cidades destas estruturas.
Geiger (1963) e Prado Junior (1987) reforçam o papel da economia nas
construções e manutenções das cidades nas redes. Geiger (1963) explica que a
pesquisa estatística foi importante para a determinação da hierarquia dos centros
urbanos segundo o grau de centralidade dos mesmos dentro da rede e a relação
destes com a quantidade de população e as atividades econômicas ali exercidas. A
manipulação dos dados demográficos do censo de 1950, segundo as zonas
fisiográficas dos Estados, permitiu a organização de um quadro no qual o fenômeno
urbano foi apresentado de acordo com as regiões geográficas dos agrupamentos
urbanos.
Ressaltamos que na década de 60 houve uma grande influência de
geógrafos franceses no Brasil que foi fundamental na construção de um novo olhar
sobre o processo urbano. A metodologia utilizada pelo IBGE nos censos da década
de 50 e 60 foi influenciada pela geografia Francesa.
Mesmo nas regiões mais adiantadas, segundo ressalta Geiger (1963), a
escolha de novos sítios para a localização da produção e da população resultou na
decadência de numerosas localidades antigas, ao lado das quais prosperavam
45
novos núcleos urbanos. Esta evidência comprova, de acordo com o autor, que há
uma relação entre os fatos da história urbana e os fatos da história econômica.
As transformações que ocorrem na estrutura urbana brasileira
acompanham a substituição do sistema econômico colonial por um sistema
econômico nacional e por sua vez, o crescimento da população urbana é um fator de
expansão do mercado interno, causando transformações na economia brasileira.
Cada ciclo econômico correspondeu ao aparecimento de uma quantidade de
núcleos urbanos.
A mineração foi um ciclo povoador de imensas áreas, fomentando a
aparecimento de cidades; o ciclo do gado foi um fator de abertura de caminhos pelo
interior do continente. Desta forma explica Geiger (1963, p. 198): “diversas cidades
fundadas no período colonial vinculadas a um ciclo econômico muitas vezes eram
aproveitadas pelo ciclo seguinte.”
As grandes cidades não sofreram processo de decadência profunda
quando determinado produto recuava justamente por não dependerem da
monocultura. As principais cidades conseguiram sobreviver ao processo de
mudança de ciclo em detrimento às cidades menores apoiadas num produto só.
Tomamos como exemplos cidades como Recife, que dependia do açúcar,
mas exportava também o algodão, ou Salvador que dependia do açúcar, do fumo,
da farinha e do gado e depois do cacau.Tais cidades sobreviveram melhor à crise do
que Alcântara, no Maranhão, apoiada apenas na exportação do algodão.
A posição ocupada por Belém na rede urbana dependia da borracha;
Salvador do cacau e Alcântara do algodão. Mas outros fatores também eram
preponderantes na economia como a navegação fluvial, que permitiu trocas entre
cidades ou a introdução das estradas de ferro, que também causou uma revolução
no setor de transportes no século XIX. Certo é que as cidades progridem ou recuam
de acordo com a situação do produto no mercado externo, das possibilidades de
trocas, do transporte e da circulação.
No período colonial, de acordo com Geiger (1963), a atividade econômica
restringia-se ao quadro rural, pois o comércio dos mascates refletia da fragilidade a
vida urbana, dentro da estrutura econômica e social da colônia. As raízes do atual
processo de industrialização se iniciam em 1850.
46
Neste período, que vai até 1889, os fatos econômicos resultam de uma
evolução industrial, da abolição da escravatura; da formação de capitais resultantes
do mercantilismo do império; das medidas protecionistas; do desenvolvimento das
plantações de algodão, da formação de mercados urbanos com destaque para a
indústria têxtil, seguida da indústria de alimentos e da influência da imigração
europeia estimulando os pequenos estabelecimentos comerciais.
O movimento industrial cresce entre 1880 e 1924 apesar da crise mundial
e da primeira guerra 1914-1918; mas foi a segunda guerra, em 1945, um fator
decisivo para o surto industrial e surgimento do complexo industrial de Volta
Redonda e das indústrias de base. Áreas antigas como o vale do Paraíba recebem
um sopro de rejuvenescimento urbano por terem sido escolhidas como sede para as
indústrias.
Há, portanto, uma fase dominada pela produção de bens de consumo,
pela importância do setor manufatureiro e pela dispersão dos estabelecimentos
têxteis por todo País.
A temporalidade da construção social e urbana no Brasil teve seu início
no século XV com o circuito das grandes navegações e descoberta do continente
pelos Portugueses e intensas disputas do território pelos franceses e holandeses.
Autores como Reis Filho (1968; 2000) e Santos (1968) afirmam que a
consolidação do projeto de urbanização português demorou dois séculos devido à
fragilidade do sistema de capitanias hereditárias, da dispersão e da centralidade da
coroa portuguesa. A política urbanizadora, segundo Reis Filho (1968), iniciou com a
ocupação regular do território do Brasil no litoral com base no sistema de capitanias
que era ao mesmo tempo feudal e mercantil com resultados modestos. Para dar
impulso à colonização, o Governo português promoveu a criação de um governo
geral articulando vilas e cidades em redes com projetos dos engenheiros militares de
acordo com os critérios e orientações das ordenações filipinas.
Moreira (2004), pesquisador da Universidade Livre de Lisboa, considera
que o processo de urbanização brasileira configura uma rede desde o século XVI até
a época pombalina, ressaltando que havia uma rede de cidades centrais com
vocação à capitalidade próximas ao porto, em boas condições de defesa, em lugar
alto e arejado e com um “hinterland” capaz de garantir seu abastecimento. O autor
47
defende que a rede urbana existiu e funcionou em três momentos diferentes: a fase
pré-colonial dos primeiros contatos com a terra; a fase proto-urbana em que se
ensaiam as primeiras fixações e a fase urbana em que se estabelece uma colônia
oficial. Seu texto fez parte de um conjunto de publicações em comemoração aos 500
anos do descobrimento do Brasil, dentro de um colóquio em Portugal que se dedicou
a estudar os fatores e influências que estruturaram as cidades brasileiras nos
séculos XVI ao XIX na perspectiva de que esta estruturação foi a gênese do
urbanismo brasileiro.
Para Reis Filho (1968) o processo de urbanização brasileiro correspondeu
a um plano complexo de organização de uma rede ou sistema urbano, onde as
cidades estavam articuladas entre si e conectadas a Portugal e aos mercados
europeus, através das Companhias de Comércio como a Grão Pará Maranhão,
exportadora de matérias primas para toda a Europa, especialmente no período
áureo do algodão.
Na perspectiva de constituir uma rede, a Coroa Portuguesa, entre os anos
de 1532 a 1650, implantou 37 povoações ao longo do litoral entre vilas e cidades
com responsabilidades dos donatários, apenas as “Cidades Reais” como Salvador,
Rio de Janeiro, Belém, São Luís e Recife, localizadas, em pontos estratégicos e que
seriam as cabeças da rede urbana eram financiadas por Portugal e contavam com a
presença de engenheiros militares, revelando a tendência centralizadora da Coroa.
A partir de 1650 houve uma expansão da rede urbana até 1720 foram fundadas
trinta e cinco vilas elevando-se duas delas à categoria de cidade, Olinda e São
Paulo.
No final deste período a rede urbana colonial estava consolidada com 63
vilas e oito cidades. A rede urbana brasileira tinha uma situação econômica peculiar,
uma vez que todos os núcleos maiores tinham por objetivo a criação de condições
para implantação de uma economia de exportação, sendo que os núcleos menores
eram dependentes dos maiores.
Para Santos (1968), em seu estudo sobre a formação das cidades no
Brasil colonial, as cidades da rede urbana brasileira do século XVI ao XIX
respondem as seguintes categorias diferenciadas:
48
a) Cidades de afirmação de posse e defesa e cidades do litoral em geral,
fundadas no primeiro século com base no açúcar;
b) Cidades de conquista do interior, que incluem os bandeirantes e a
conquista do interior com a mineração, ouro e diamantes - fixando o homem no
interior do primeiro ao terceiro século;
c) Cidades da penetração rumo às fronteiras oeste e sul, no terceiro
século atendendo aos tratados de limites da Espanha;
d) Cidade do café, do quarto século como vale do Paraíba, na região
fluminense, em São Paulo e no Paraná;
e) Cidades da borracha, na região amazônica, finais do século XIX;
f) Cidades da indústria, do século XX em regiões centrais, Minas, São
Paulo e Rio.
O apogeu deste processo de formação urbana no Brasil, alcançado no
século XVIII, foi resultante da dinamização econômica da colônia a partir das
companhias de comércios e da exportação de matéria primas para a colônia,
motivada pelos ciclos da cana, algodão e café e posteriormente ouro e diamantes
das Minas Gerais. Todo este dinamismo era totalmente baseado na força do
trabalho escravo impulsionando uma elite aristocrata de barões emergentes que se
destacariam no cenário político e social da corte portuguesa, criando cidades
dotadas de todas as urbanidades com elementos arquitetônicos que traduziam os
requintes europeus.
2.1.6 O Estado do Maranhão nas redes de comércio global
Na segunda metade do século XVIII, o comércio no Maranhão estava em
situação muito precária. Viveiros (1992, p.68) relata que o então governador
Francisco Xavier de Mendonça Furtado escreveu a seu irmão o Ministro Carvalho e
Melo o Marques de Pombal pedindo como solução a criação de uma companhia de
Comércio para desobstruir os canais de exportação e consumo.
Assim surgiu em 1755 a Companhia de Comércio Grão Pará Maranhão
que inseriu o Maranhão na rede europeia exportadora. A fundação desta companhia
49
que detinha o monopólio em todo o Estado deu ao Estado êxito comercial com a
exportação de algodão mas afetou os pequenos comerciantes locais e os jesuítas.
A empresa tinha um corpo político composto de provedor, oito
deputados, um secretario e três conselheiros. Viveiros (1992, p.70) afirma que ela
detinha o monopólio da navegação, do trafico de negros, da venda de mercadorias e
compra de gêneros coloniais pelo espaço de vinte anos , além do direito de construir
navios mercantes e de guerra em qualquer parte das marinhas do reino e das
capitanias do Maranhão.
O capital inicial foi de quatrocentos e oitenta contos de reis divididos em
ações e que não chegou a ser totalmente integralizado em virtude do terremoto de
Lisboa em novembro de 1755.
Ressaltamos que a reconstrução promovida pelo Marques de Pombal em
Lisboa depois terremoto exerceu enorme influência na tipologia arquitetônica do
Maranhão pois o padrão construtivo conhecido como alçado pombalino , utilizado na
reconstrução do bairro do chiado , foi o mesmo padrão seguido na construção dos
sobrados em São Luis e Alcântara .
Esta companhia de acordo com Viveiros (1992, p.74) criou e desenvolveu
as fontes da economia maranhense, transformando a pobreza do Estado em
riqueza. A companhia foi extinta em 1777, por provisão de D Maria I, depois de
prestar relevantes serviços ao Estado. Após a extinção da companhia o comércio
obteve liberdade de importar diretamente da metrópole e posteriormente com a
abertura dos portos, o Maranhão passou a exportar para a França e Inglaterra.
No século XIX, de acordo com Von Spix e Von Martius (1981), São Luís
era uma das principais expressões urbanas da colônia e a quarta cidade em
importância depois das capitais: Rio de Janeiro, Salvador e Recife.
O Rio de Janeiro, segunda capital do Brasil, depois de Salvador, com a
chegada da família real em 1808 alcançou ares de cidade européia com criação de
bancos, biblioteca, jardim botânico e museus, mas para tanto recebeu grandes levas
de escravos para proporcionar a construção e manutenção das estruturas
tradicionais. As mudanças de mercados diante das crises internacionais nos países
como Inglaterra, França e Alemanha, além das guerras de secessão nos EUA e
entre Brasil e Paraguai (1864), as falências das firmas tradicionais e a abolição dos
50
escravos (1888) formaram um conjunto de fatores que levaram a maioria das
pequenas cidades a um processo de decadência especialmente no norte, somente
as capitais e as cidades do sul e sudeste, área de maior dinamismo econômico,
encontraram formas de se inserir no processo de industrialização e na retomada do
crescimento.
2.1.7 Ideologia da decadência da lavoura
No entrelaçamento do quadro teórico com o nosso objeto de estudo, que
é a cidade de Alcântara no Maranhão, observamos que algumas questões
emergiram da pesquisa empírica e dos dados coletados sobre o arruinamento da
cidade e sua desconexão das redes regionais e locais, que nos fez perceber, no final
da pesquisa a existência de uma narrativa recorrente sobre a decadência do Estado
e da cidade. Esta narrativa construída por técnicos e intelectuais sempre reforçou o
abandono da cidade muito embora ela apresentasse pequenos níveis de
crescimento populacional, apesar dos índices de estagnação econômica.
O antropólogo Almeida (2008, p. 61) desenvolveu uma importante
investigação em seu livro nesta obra, sobre a crise da lavoura no Maranhão,
afirmando que a mesma é decorrente da construção de um discurso e de um padrão
de explicação, no final do século XIX recorrente nos relatórios oficiais e nas obras
dos patronos. Estes documentos reproduziam teorias sobre a ausência de
determinadas qualificações tidas como necessárias à prosperidade da lavoura do
Estado: “a falta de conhecimentos profissionais, a falta de capitais, a falta de braços,
a falta de comunicações apropriadas e a falta de terras por causa do gentio.”
Almeida (2008) afirma que a “decadência da lavoura” configura-se num
elemento relevante e primordial para a explicação e entendimento das condições
econômicas e sociais da província, que perpassa comumente as diversas
interpretações feitas pelos patronos, autores fundamentais à história do Estado do
Maranhão. Os patronos consideravam Bernardo Pereira Berredo e Castro, que
publicou o famoso livro “Annaes históricos do Maranhão” em 1779, como um autor
fonte, que era citado por todos para o entendimento do Maranhão no século XVII e
inicio do XVIII.
51
Um destes Patronos é Gaioso (1970) que identifica nesta obra o estado
de decadência da lavoura e aponta os entraves ao desenvolvimento e prosperidade
da mesma:
a) a falta de terras por causa do gentio pois as terras estavam cansadas e
as terras indígenas eram sempre as mais férteis, chamadas de terras da mata em
oposição as terras ditas infrutíferas utilizadas para plantar o algodão;
b) o elevado preço do escravo que levava os lavradores a contraírem
dividas junto aos traficantes de escravos . A lavoura não podia prosperar sem
escravatura e as remotas possibilidades de realizar a colonização com europeus
livres já estavam esgotadas;
c) as flutuações do preço do algodão no mercado como responsável pela
ruína dos lavradores.
Gaioso (1970) enfatiza que dentro do período de prosperidade, firmada
em bases pouco sólidas estava potencialmente a origem da própria decadência. A
sociedade aristocrata rural não se preparou para o período de crise que se seguia e
não estruturou em bases sólidas e técnicas o período da prosperidade do Algodão.
Compartilham essa afirmativa, outros pesquisadores contemporâneos, como o
arquiteto Alcântara (1971, p. 42) que analisou a formação urbana de Alcântara para
o IPHAN em 1970 e ressaltou que “esse período de esplendor, no entanto trazia em
si a semente de sua própria destruição.”
O economista Tribuzzi (1981, p. 15) pontua alguns impasses ao
desenvolvimento do Estado, tais como: a questão fundiária, a intermediação
comercial e a deficiência dos transportes e o déficit tecnológico. Em sua análise
ressalta que: “no período do Boom econômico colonial estavam implícitas as raízes
da própria ruína.”
A ideologia da decadência teve reflexos em Alcântara nas decisões
políticas e nas práticas urbanas dos gestores, que ora lutavam pela sua preservação
em 1948 com o tombamento federal pelo IPHAN e ora tomavam decisões de
implantar um presídio em 1950 que isolariam Alcântara do Estado. Ora lutam para
implantação do Centro de lançamentos de foguetes em 1980 e ora lutam pelas
ações mitigadoras e inclusão das comunidades quilombolas envolvidas neste
processo.
52
Estas decisões levaram a cidade a ciclos alternados de isolamento,
estagnação econômica, e posteriormente a uma explosão urbana com crescimento
desordenado que se processou em forma de favelização e ocupações irregulares
tornando Alcântara uma cidade que cresceu sem as dimensões sociais e
econômicas colocadas por Weber (1999) em seu conceito de cidade.
Para Foucault (2001), não há sociedade onde não existam narrativas
maiores que se contam, se repetem e se fazem variar, fórmulas, textos, conjuntos
ritualizados de discursos que se narram conforme circunstâncias bem determinadas;
coisas ditas uma vez e que se conservam, porque nelas se imagina haver algo como
um segredo ou uma riqueza.
Sobre a construção de um discurso Foucault (2001) afirma que em toda a
sociedade a produção do discurso é ao mesmo tempo controlada, selecionada,
organizada e redistribuída por certo número de procedimentos que tem por função
contratar o poder e perigo deste discurso e dominar o acontecimento aleatório e
esquivar sua materialidade. Pode-se supor que há muito regularmente nas
sociedades, uma espécie de desnivelamento entre os discursos.
Sobre esses pressupostos, de que além dos dados sociais, dos ciclos
econômicos e políticos houve uma narrativa da decadência da cidade, construímos
as seguintes questões na perspectiva de estabelecer um diálogo entre o urbanismo
e a história, observando as temporalidades da cidade diante da análise das
narrativas, relatos e transformações urbanas ocorridas na cidade de Alcântara.
Elencamos abaixo as principais questões que surgiram ao longo da
pesquisa:
a) Estariam os processos de apogeu e decadências das cidades atrelados
necessariamente aos momentos de inclusão ou exclusão nas redes urbanas
regionais e globais?
b) As diferentes temporalidades observadas na pesquisa empírica desde
a gênese da formação da cidade, ao período do apogeu colonial e decadência
econômica até o acidente da base espacial que deixou ruínas contemporâneas
configurariam vários momentos de inclusão e exclusão?
c) A construção do discurso da decadência, a narrativa de gestores,
intelectuais, escritores e poetas sobre a decadência do Estado e da cidade de
53
Alcântara-MA, contribuiu para sua exclusão e dificultou uma eventual possibilidade
de reconexão às redes regionais e globais?
d) Porque os ciclos econômicos do Estado do Maranhão como a cultura
do algodão, da indústria têxtil e a do babaçu não foram suficientes para alavancar a
economia?
e) Porque a elite dominante, os fidalgos e barões, ou aristocracia rural
não se mobilizou em torno de um projeto de recuperação ou inserção da economia
de Alcântara nos novos ciclos do Estado, deixando a cidade abandonada?
Foi a partir destas questões que a pesquisa foi estruturada. Utilizamos
também o trabalho do cientista social Corrêa (2008), que desenvolveu uma
interessante abordagem para os ciclos econômicos do Estado do Maranhão que
consta no acervo do Instituto Maranhense de Estudos Socioeconômicos e
Cartográficos (IMESC). Ele utiliza o conceito de ciclos e os representa pelas ondas.
O que confere uma síntese dos principais momentos do Estado nos dimensões
política, econômica e social (figura 4):
Figura 4 – Ondas política, econômica e social
Fonte: Corrêa (2008)
54
Diante das temporalidades destacadas na pesquisa empírica, analisando,
portanto os diferentes momentos de exclusão e inclusão das redes coloniais e
contemporâneas na perspectiva de compreender os ritmos históricos e econômicos
do Estado do Maranhão e de Alcântara, elaboramos duas linhas do tempo , através
do registro dos momentos de conexão e desconexão do Estado do Maranhão e
cidade de Alcântara e uma outra linha do tempo relacionada ao desenvolvimento
urbano de Alcântara relacionada a cartografia .
2.1.8 Momentos de inclusão e exclusão do Estado do Maranhão: ciclos econômicos
(figura 5)
a) Século XVIII: Rede urbana colonial - conexão direta do Maranhão com Lisboa
– 1755 - Cia de Comércio Grão Pará-Maranhão - Ciclo do algodão - modelo
primário exportador - 1755-1889;
b) Século XIX: Revolta popular “A Balaiada” em 1838;
c) a “Ideologia da decadência”: a decadência da lavoura;
d) Industrialização: São Luís “a Manchester Brasileira” - a Imigração libanesa;
Desarticulação do sistema “plantation” e o surto de crescimento das indústrias
- 1950 - fechamento das fábricas de tecido de algodão;
e) Século XX: Interventoria de Paulo Ramos na era Vargas 1937-1945;
Integralismo e renovações urbanas. O babaçu surge como promessa
econômica do Estado.
f) Oligarquias políticas: Interventor Paulo Ramos (1940-50); - Vitorino Freire
(1950-1960); Jose Sarney (1966-2011);
g) 1955: tombamentos de São Luís pelo IPHAN;
h) 1970-80-90: integração comercial do Estado aos grandes projetos Nacionais
como o minério de ferro/Carajás – Alcoa – Companhia Vale do Rio Doce -
Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) e Pólo graneleiro em Balsas.
55
2.1.9 Momentos de inclusão e exclusão de Alcântara (figura 6 e 7)
a) 1755 Séc. XVIII: inclusão na rede colonial com o apogeu econômico da
colônia através da CIA de Comercio Grão Pará-Maranhão exportadora de algodão;
b) 1890 - Século XIX: exclusão ou desconexão da rede colonial com a
decadência econômica e a mudança dos mercados produtores de algodão e da
abolição da escravatura;
c) 1948: inclusão na rede de cidades históricas monumentos pelo
tombamento federal do IPHAN - valor histórico e cultural como Patrimônio Federal;
d) 1937-45: interventoria de Paulo Ramos na era Vargas; Integralismo e
renovações urbanas na Capital e abandono do interior;
e) 1950: exclusão-Implantação do presídio de segurança máxima do
Estado na sede do município no principal prédio da cidade “a casa de câmara”
afastando investimentos e marginalizando a cidade como vila presidiária;
f) 1980 /1986: inclusão - o ponto estratégico do território de Alcântara,
próximo á linha do equador, é escolhido para a implantação do Grupo de
Implantação do Centro de Lançamento de Alcântara (GICLA), como um momento de
oportunidades e perspectivas para o município.
g) 2000: exclusão, do global ao local, século XXI após a implantação do
CLA a cidade já decadente e despreparada, por ter desapropriado e desagregado
51% do território num empreendimento que não absorveu a comunidade local.
Figura 5- linha do tempo de São luís
fonte : Pflueger, G
- Tombamento
de São Luís.
- Industrialização.
- Ciclo do algodão. - Imigração.
- Modelo primário agro-exportador. - São Luís - Manchester Brasileira. - Fechamento das
- Conexão direta com Portugal. - São Luís - Athenas Brasileira. fábricas.
1755 1838 1844 1889 1890 1900 1937 1945 1950 1955 1960 1966 2010
APOGEU ECONÔMICO IDEOLOGIA DA DECADÊNCIA ERA VARGAS VITORINISMO PERÍODO SARNEY
- Revolta Balaiada. - Adesão tardia - Interventoria de - Oligarquias.
do Maranhão à Paulo Ramos. - Projetos de integração
independência. - Renovação urbana nacional.
- Desarticulação do de São Luís.
sistema plantation. - Abandono do interior
56
Figura 6- Linha do tempo de Alcântara
fonte: Pflueger, G.2011
Inclusão in c lu s ã o
in c lu s ã o
exclusão exclusão exclusão
Ciclo do algodão.
- Modelo primário agro-exportador. Alcântara Pompéia Brasileira. Tombamento Implantação do CLA
- Conexão direta com Portugal. - São Luís - Athenas Brasileira. de Alcântara centro de lançamentos
de foguetes Quilombolas X
Cyclone Space
1755 1838 1844 1889 1890 1900 1937 .
1948 1950 1960 1980 2003 2010
APOGEU ECONÔMICO IDEOLOGIA DA DECADÊNCIA ERA VARGAS VITORINISMO PERÍODO SARNEY
Período colonial
explosão da plataforma de lançamentos
Abandono do interior Presidio Estadual de foguetes -ruínas do futuro
demolição das ruínas em Alcântara -exclusão
- Revolta Balaiada.
adesão tardia do Maranhão à independência
desarticulação do sistema plantation
57
Figura 7-Linha do tempo do desenvolvimento urbano de alcântara
fonte: Pflueger, G
Quilombolas x
Tombamento Cyclone space
de Alcântara -Iphan
Alcântara Im p la n ta çã o d o C L A
Fundaçãodavilareligiosaportuguesa
sede da aristocracia ce n tro d e la n ça m e n to s
de SantoAntôniodeAlcântara rural - . d e fo g u e te s
antiga aldeia -TAPUITAPERA
1648 1755 1890 1948-1950-65 1970 1980 2003 2011
CATEQUESE E POSSE APOGEU URBANO E ECONÔMICO DECADÊNCIA ECONÔMICA ERA VARGAS -VITORINISMO PERÍODO SARNEY
Decadência Favelização
C o m p a n h ia d e C o m e rcio
G rã o P a rá M a ra rn h ã o
Presidio Estadual Explosão da Plataforma de lançamentos
emAlcântara -exclusão de foguetes- Ruínas do Futuro
P e q u isa d e P e d ro A lcâ n ta ra
IP H A N 1 9 7 0
Mapa da tríade religiosa -sec XVI
fonte : Pflueger, 2002
Planta da vila de Alcântara 1755 mapa cadastral de Alcântara ,1970
fonte :Reis, Nestor Goulart. fonte : Alcântara, Pedro.Iphan.
Imagens das vilas e cidades do Brasil.USP,2000.
58
59
2.2 Cidades
Figura 8– Vista aérea de Alcântara
Fonte: Acerto do DPHAP-MA
Como veremos adiante, a discussão ao final desta tese é se a cidade de
Alcântara possui os elementos constitutivos de uma cidade ou se apenas trata-se de
um aglomerado de população sem necessariamente ter as atividades e dimensões
que caracterizam uma cidade. As cidades, tal qual organismos vivos, tem seus ciclos
de vida, nascem,crescem, morrem em fragmentos ,amadurecem,renascem e se
consolidam em suas funções tradicionais num processo contínuo motivado pelas
razões econômicas, políticas, geográficas, sociais e culturais ou, como observamos
no caso de Alcântara, passam por um processo de estagnação e decadência
econômica.
60
A cidade é como um organismo dinâmico que cresce e se transforma
continuamente, portanto torna-se um desafio conceituá-la. Weber (1999) em seu
capitulo sobre "Conceito e Categorias da Cidade" diz que pode se tentar definir
cidades de formas muito diversas. Apenas uma coisa tem em comum todas as
definições, que se trata, em todo caso, de um assentamento fechado, um povoado e
não de moradias isoladas. Ele observa os vários tipos de cidade que existiram no
passado e mostra suas diferentes origens, enfatizando a importância do mercado
para seu desenvolvimento.
Para Weber (1999, p. 408), do ponto de vista sociológico, a cidade
significaria
[...] um povoado, Isto é, um assentamento de casa contíguas, as
quais representam um conjunto tão extenso que falta o conhecimento
pessoal mútuo dos habitantes, específico da associação de vizinhos,
portanto somente povoados relativamente grandes seriam cidades e,
dependendo das condições culturais gerais e do tamanho, se
aplicaria estas características.
Ainda segundo Weber (1999), do ponto de vista puramente econômico, a
cidade seria um povoado cujos habitantes em sua grande maioria não vivem do
produto da agricultura, mas sim da indústria e do comércio. Neste caso, a cidade é a
localidade de mercado ou é um assentamento de mercado permanente.
Em princípio uma cidade pode basear-se em dois fundamentos: um deles
se configura pela existência da sede senhorial territorial, como centro, para cujas
necessidades econômicas ou políticas trabalham as indústrias. O outro é que a
realização das trocas de bens não são apenas ocasionais, mas regulares na
localidade como componente essencial das atividades aquisitivas e da satisfação
das necessidades dos moradores.
A relação entre cidade, como portadora da indústria e do comércio, e o
campo como fornecedor de alimentos, constitui apenas uma parte de um complexo
de fenômenos que se denominou econômica urbana e se diferenciou como etapa
econômica, no entanto Weber (1999) afirma que a satisfação regular das
necessidades cotidianas do mercado em si não define suficientemente o conceito de
cidade. Além da dimensão econômica, o conceito de cidade deve ser incluído em
outra série de conceitos, como os de categoria econômica, social e política.
61
Em síntese para Weber a existência da cidade implica a existência de
uma comunidade com alto grau de autonomia, tanto no nível objetivo (mercado,
fortificação, exército e tribunal), quanto no nível subjetivo, como um conjunto de
valores culturais.
Weber (1999) afirma ainda que a cidade é pré-condição da existência do
capitalismo e pressuposto de seu desenvolvimento. Diante dessa afirmação Marx
em "O Capital" pontua que o desenvolvimento do modo de produção capitalista
aconteceu com o comércio e com as transformações que ocorreram nas cidades e a
economia urbana requer um processo prévio de divisão social do trabalho. A
convergência entre Weber e Marx é que a cidade é o lócus da política e que habitar
é participar.
Apesar das divergências entre Marx e Weber serem profundas e
fundamentais, os dois analisaram a cidade historicamente demonstrando de formas
diversas que a cidade tem sido o ponto de convergência de processos. Eles
mostram que historicamente "cidade e política nasceram, na tradição ocidental,
como conceitos e realidades inter-relacionadas civitas e polis são as raízes em
distintos idiomas para expressar, ao mesmo tempo, um modo de habitar e uma
forma de participar: civismo e política" (Cardoso, 1975)
O ingrediente cultural pode ser acrescentado pelas idéias da escola de
Chicago ,em 1938 , representada por Louis Wirth que considerava que o
estabelecimento das cidades implicava no surgimento de uma nova forma de
cultura, levando em consideração a relação entre o ambiente natural e os valores
espirituais da comunidade humana.
Mumford (1998) afirma que: não há definição que se aplique sozinha a
todas as manifestações nem descrição isolada que cubra todas as suas
transformações, desde o núcleo social embrionário até as complexas formas de sua
maturidade e desintegração corporal da sua velhice.
Do ponto de vista da cidade enquanto parte de uma rede, o geógrafo
Geiger (1963) afirma que na verdade não existe uma formula para definir cidade. Um
pontilhado de cidades no mapa mundi não representa unidades idênticas ou
semelhantes entre si: cidades são fruto de civilizações distintas, são formadas em
condições históricas diversas e pertencem a sistemas econômicos diferentes. Em
62
cada fase histórica, a gente do povo tem consciência do significado comum da
palavra cidade.
Geiger (1963, p. 11) considera importante o conceito colocado pelo
geógrafo e urbanista Frances Michel Rochefort4; “que a cidade moderna é a que tem
um centro de funções de relações ao mesmo tempo em que é suporte de atividades
industriais” e nesta perspectiva utiliza a classificação de Pierre George nas “grandes
séries urbanas” inspirado na consideração dos tipos históricos do processo de
urbanização:
a) Cidades de uma economia rural, de trocas pouco desenvolvidas onde a
cidade é um pequeno mercado que acumula funções de centro defensivo,
administrativo e religioso;
b) Cidades de comércio, nascidas de diversas fases do desenvolvimento
das trocas e das tentativas de concentração política, antes do capitalismo;
c) Cidades do comércio ou de indústrias, resultantes da revolução
industrial e do capitalismo;
d) Cidades de colonização e cidades de países subdesenvolvidos,
resultantes das necessidades e expressão da economia capitalista;
e) Cidades socialistas. Como organismos policêntrico hierarquizado.
A distribuição geográfica dos núcleos urbanos brasileiros permitiu outra
classificação de espaço segundo categorias de cidade. De acordo com Geiger
(1963) estavam assim distribuídos: As grandes cidades; os centros industriais; os
grandes centros comerciais médios e pequenos centros de comercio ativo das
regiões agrícolas, os centros administrativos, as cidades decadentes e os centros de
áreas estagnadas ou pouco desenvolvidas e finalmente a grande massa dos
pequenos centros de função administrativa ou comercial estritamente local.
Na categoria de cidades decadentes e centros de áreas estagnados ou
pouco desenvolvidas figuram: centros de regiões que outrora tiveram um papel
relativamente mais importante no quadro nacional e hoje jazem estagnadas: cidades
que no passado sobressaíam na estrutura urbana do País, como algumas que se
4
A influência de geógrafos franceses no Brasil na década de 60 foi fundamental para a construção de um novo olhar sobre o
processo urbano. O geógrafo Frances Rocheford que introduziu o método de pesquisa indireta para determinação da
hierarquia dos centros urbanos segundo o grau de centralidade dentro da rede e a relação desta com a quantidade de
população e as atividades econômicas ali exercidas.
63
situavam nas antigas zonas de mineração (Diamantina); cidades do Vale do São
Francisco; cidades de áreas não rejuvenescidas como no Vale do Paraíba, algumas
destas localidades chegam a ultrapassar cinco mil habitantes e Pequenos centros
coletores de áreas muito pouco desenvolvidas, que apresentaram em comum o
aspecto inerte; a pouca diferenciação visível, das partes das cidades, segundo as
atividades ou classes sociais; a pobreza do comércio, restrito quase que somente a
produtos de subsistência, parcos recursos na educação e assistência médica e falta
de conforto urbano.
Em contraponto com a categorização de Geiger (1963) encontramos uma
pesquisa realizada sobre cidades históricas no projeto “Itinerância urbanas”
desenvolvido pela UNB coordenado pela antropóloga Freitag (2003).
Freitag (2003) defende a tese da itinerância das cidades brasileiras,
partindo da constatação de que é corriqueiro na história das vilas e cidades
brasileiras desde os primórdios da colônia o abandono de núcleos criados para
fundação de outros paralelos, transferindo as funções do antigo para o novo, deste
modo à cidade abandonada pode viver um período de estagnação ou ate mesmo
“cair no esquecimento”, enquanto a cidade nova passa a assumir as funções
políticas e administrativas e concentra riqueza e prestigio. A partir desta moldura
teórica, ela cria uma “tipologia” das cidades brasileiras, utilizando a metodologia
proposta por Weber (1999) e identifica cinco tipos de cidades, tomando como
referência sua formação histórica (colonial):
a) Cidades históricas abandonadas, descuidadas, em ruínas, “mortas”.
Exemplos: Alcântara no Maranhão e Missões dos sete povos no RS;
b) Cidades históricas esquecidas, no sonho da bela adormecida que
sobrevivem intocadas ás intempéries do tempo e á margem da fúria modernista. Sua
beleza e originalidade são revalorizadas na década de 20. Ex: Parati, Tiradentes e
Olinda;
c) Cidades históricas, construídas no período colonial, sitiadas, invadidas
e revitalizadas pela modernidade tomando como critério a higienização, o
embelezamento e a funcionalidade. Ex: Salvador, Recife, Fortaleza, Rio, São Paulo,
Porto Alegre, Curitiba;
64
d) Cidades sem história projetadas na prancha segundo a carta de
Atenas, seguindo a política da terra arrasada; Ex. Belo Horizonte, Goiânia, Brasília,
Marília, Londrina;
e) Cidades utópicas, que não saíram do papel, concebidas por lunáticos e
sonhadores como os projetos de Le Corbusier para Paris, Rio, São Paulo, Buenos
Aires e Montevidéu.
Em relação as cidades alguns autores examinam o fenômeno sob
diversas óticas. Rolnik (1995) atribui três conceitos à cidade: o primeiro é que a
cidade como ímã iguala-se a um campo magnético que atrai, reúne e concentra; o
segundo, a cidade como mercado, lugar onde acontece o espaço das trocas
comercias, do trabalho coletivo e, finalmente, a cidade como escrita, ressaltando que
os fenômenos da escrita e cidade ocorrem de modos simultâneos, impulsionados
pela necessidade de memorização, onde a arquitetura urbana cumpre o papel de
fixar a memória, pois construir cidades é uma forma de escrita e, neste caso, as
ruínas seriam textos abandonados, fragmentos da escrita da cidade, como peças de
um quebra-cabeça.
Históricas e carregadas de significados simbólicos, as cidades de acordo
com Rykwert (2006), não se assemelham a nenhum fenômeno natural e, por esta
razão, as associações com fenômenos da natureza ou imagens como árvores, ou
folhas ou tecidos epiteliais não correspondem, pois a cidade é uma criação artificial.
As cidades são erguidas gradativamente pelos seus habitantes, ou, numa escala
maior, pelos especuladores. As cidades, na visão do autor, não são apenas uma
solução racional para os problemas da produção, comercialização e distribuição,
circulação e higiene ou uma resposta automática à pressão de certas forças naturais
e de mercado, por isso, elas deveriam igualmente cultuar as esperanças e os
temores de seus cidadãos.
Em “A cidade entre metáfora e conceito” Jeudy (2005) explica que a
cidade abandonada ensejaria a aventura dos deslizes metafóricos. Quanto mais ela
parece um cartão postal, mais ela evoca o principio de uma parada sobre a imagem,
de uma suspensão do tempo. Quando ele observa o centro histórico, o espaço
urbano vazio e monumental, de cores variáveis, tornado inquietante com sua sombra
cujo movimento parece suspenso e oferece ao olhar a visão de símbolos imutáveis
65
da conservação patrimonial ele pensa na cidade petrificada, ou petrificante. Ela não
é idêntica à cidade fantasma, pois ainda apresenta sinais de eclosão.
Diante dos conceitos trabalhados e retomando a Mumford (1998) que nos
coloca que não há definição que dê conta de um organismo dinâmico e de tamanha
complexidade, concluímos que a cidade deve ser compreendida em todas as suas
dimensões como coloca Weber (1999), em seus significados simbólicos como nos
explica Rykwert (2004) ou ainda realizando suas funções como ímã, mercado e
escrita como traduz Rolnik (1995).
É importante compreender que há momentos na dinâmica de um
aglomerado urbano em que ele perde suas características fundamentais,
arruinando-se ou explodindo em favelas e periferias transformando-se em outro
organismo que nem sempre realiza as funções de uma cidade. No caso de
Alcântara, o processo de decadência e arruinamento transformou aquilo que era a
cidade no período colonial em vestígios e ruínas engolidos pela cidade informal que
atualmente nasce nas encostas e mangues.
66
2.3 Ruínas
Não se pode ver Alcântara
A olho nu
Alcântara requer
uma lente memorial
para ampliar
o que se contempla por trás
ou por detrás de nossas ruínas
humanas
ou para além do nosso
esquecimento
através dos muros
endurecidos
de séculos
José Chagas, 1994
Figura 9 – Ruína da Matriz
Fonte: Lefèvre e Costa Filho (1971)
67
Diante dos conceitos trabalhados sobre as cidades no capitulo anterior e
considerando que a cidade de Alcântara, nosso objeto de estudo, transformou-se em
uma cidade parcialmente em ruínas trataremos agora da dimensão simbólicas das
ruínas em diferentes campos disciplinares
A história da arquitetura nos seus vários momentos demonstra a
importância das ruínas como testemunho e documento. O primeiro deles seria a
Antiguidade clássica Greco-romana do século V e todo seu repertório formal; o
segundo diz respeito ao Renascimento no século XV e toda a redescoberta do
classicismo revisitando a experiência clássica com os tratadistas; o terceiro seria o
Neoclássico no século XIX e todo movimento das descobertas arqueológicas e o
quarto situa-se na contemporaneidade, tendo as ruínas como documento de guerras
e fragmentos da história. As ruínas são também testemunhas de cidades que um dia
tiveram uma função importante nas redes sociais e econômicas devido a fatores que
serão explorados neste estudo e perderam o significado.
Argan (1993) explica que as cidades ideais e utópicas do Renascimento
não excluíam a conservação dos monumentos. O Papa Nicolau V achava que a
Roma cristã deveria ressurgir das ruínas da Roma antiga. O Arquiteto Alberti
preocupava-se com o significado dos monumentos. Para ele ruínas eram
testemunhos de uma antiga grandeza, mas também da decadência sobrevinda,
quase do regresso das formas arquitetônicas ao estado de natureza, a rocha e a
floresta.
Por possuírem diferentes significados, as ruínas documentam as guerras,
as destruições, o abandono de antigas cidades ou de civilizações perdidas em todos
os continentes. Isso acontece pelos diferentes contextos e momentos vividos e
apropriados por parte da história e da comunidade.
Segundo o arquiteto italiano Gionata Rizzo (2007, p. XIX),
Ruins are everywhere, they form a considerable part of our
architectural heritage and actually, even of the world heritage list:
they are preserve as ruins, maintained as ruins and visited by a
growing number of people who, in ruins see values, significance and
meaning in spite condition.
Ruínas realmente estão em toda parte, como coloca o italiano Rizzo
(2007). Elas fazem parte das estruturas urbanas tradicionais e mesmo das
68
contemporâneas como fragmentos da cidade. Constituem, assim, uma parte do
tecido urbano que morreu, mas que permanece como documento silencioso da
destruição, decadência ou mesmo da permanência.
Etimologicamente, o dicionário Houaiss indica que o verbete provém do
latim ruína, de ruere, ruir, que significa queda, ruína, destruição, desgraça. Em
francês escreve-se ruine; em italiano rovina. No Aurélio, o verbete, ruína tem sete
significados: 1. Desmoronamento; 2. Ato ou e feito de ruir; 3. Restos de construções
desmoronadas, ruinaria; 4. Aniquilamento destruição e extermínio: 5. Perda de bens
materiais ou morais, 6. Decadência material ou moral. Decadência completa queda e
derrocada, 7. Causa de perda e destruição (FERREIRA, 1986).
Segundo Choay e Merlin (1988, p. 740),no dicionário de urbanismo as
ruínas significam:
Débris ou restes, impropres à l‟usage d‟un édifice, d‟un ensemble ou d‟une
ville. Objet de l‟archéologie, les ruines ont, depuis le XV siècle, joué un rôle
essentiel dans la connaissance des villes et de l‟archicteture de l‟Antiquité
d‟abord, puis progressivement de toutes les époques et cultures.Connus et
popularisées par l‟oeuvre des peintres, graveurs et archictetes qui ne
cessèrent de les reproduire de la renaissance `a l‟époque de Piranesi, les
ruines des antiquité- neuves ou rapportées – devinrent, dans l‟Europe du
XVIII siècle, partie integrante du jardin paysager. Le romantisme devrait
ensuite consacrer la valeur esthéthique (pittoresque) des ruines au trésor
desquelles s‟adjonignirent celles du Moyen Âge. Aujourd‟hui, les ruines,
antiques ou médiévales, posent une serie de problémes: -a la conservation,
celui du manitien de leur integreté face à la polluition et au tourisme. -a
L‟urbanisme, celui de leur integration dans le cadre de la vie contemporaine
où elles sont susceptibles de remplir trois fonctions: didactique, esthetique,
psychologique ou politique.
Le Goff (1984, p. 107), em verbete cita que “ruína” significa:
Testemunho do poder destrutivo do tempo e do triunfo da natureza sobre a
cultura as ruínas conferem, todavia à paisagem uma marca humana que as
contêm, abrindo-se para a dimensão histórica. Tal como peças de coleção
com as quais se assemelham pela falta de utilidade, as ruínas podem na
maior parte dos casos desempenhar seu papel graças a imaginação que vê
nelas um signo de acontecimentos do passado. Investido-as de valores
particulares, as ruínas tornam-se, portanto fontes para o conhecimento
histórico que através de um processo de pesquisa que as leva a atribuição,
extrai os dados relativos a seus artífices. A ruína pode por um lado evocar o
passado glorioso e a caducidade de todas as coisas. Pode ser objeto de
reflexão histórico filosófica por um lado e pode dar lugar a um sentimento
sutilmente crepuscular; pode ser uma ruína clamorosa, eloqüente, com uma
massa obstrutiva ou, pelo contrario um efêmero bastidor visual, um frio
contraste, uma ironia irrisória.
Como objeto de estudo elas podem ser analisadas em diversos campos
disciplinares como a arqueologia, arquitetura e urbanismo, poesia, filosofia e arte,
69
pois constituem uma temática extremamente interessante e peculiar. Quando
pensamos em ruínas imaginamos as ruínas das antigas cidades gregas e romanas,
cidades persas ou italianas ou ruínas contemporâneas, fragmentos das guerras,
igrejas bombardeadas como as ruínas alemãs ou ainda mais recentemente as
ruínas do mundo árabe, em constante destruição.
Essa noção de campo, de acordo com Bordieu (2004, p. 64)
[...] é em certo sentido uma estenografia conceitual de um modo de
construção do objeto que vai comandar ou orientar todas as opções práticas
da pesquisa, lembrando que o objeto não está isolado de um conjunto de
relações do qual retira o essencial de suas propriedades.
Impossível analisá-las sem dialogar com vários campos na complexidade
de um tema que possui muitos significados. O filósofo francês Morin (2007) nos
ensina que a complexidade conduz à transdisciplinaridade e esta não pode ser feita
senão a partir do pensamento complexo e do diálogo entre campos.
No campo das artes, por exemplo, Le Goff (1984) considera a importância
delas na obra de pintores do século XVIII como Poussin e Mantegna onde a ruína é
o suporte essencial da obra por estabelecer uma relação dialética entre ruína e
paisagem, entre os elementos naturais e os fragmentos dos edifícios, exemplificando
o esplendor da vida e a inevitável fatalidade do arruinamento.
As ruínas tiveram sua mais importante interpretação nas gravuras do
italiano Giovanni Batista Piranesi5 (1720-1778) artista, arquiteto, arqueólogo e
teórico que inovou a veduta6 até ultrapassar o próprio gênero. Piranesi foi um dos
maiores expoentes da gravura europeia. A sua abordagem da Antiguidade, em
termos estéticos e teóricos, teve uma imediata e duradoura influência no
Neoclassicismo em toda a Europa e o seu gênio criativo impactou e ultrapassou o
século XVIII perdurando assim até hoje. De acordo com Ficacci (2006), ele se
ocupou das ruínas de Roma e o seu método revelou plenamente uma originalidade
visionária. São gravuras de uma beleza sem equivalência e produzem no expectador
uma emoção sem precedentes, pois ele consegue fazer com que a difícil técnica da
5
Piranesi produziu em 1748a primeira edição consagrada aos monumentos antigos, demonstrando um
interesse arqueológico.
6
O termo veduta refere-se a uma pintura, desenho ou gravura representando uma cidade, um monumento ou
um lugar (FERREIRA, 1986).
70
água forte transmita fielmente os diferentes materiais dos monumentos
representados, inclusive os efeitos do envelhecimento.
2.3.1 Significados das ruínas
Percebemos os diferentes significados das ruínas nos campos da arte, da
arquitetura e da filosofia. A percepção bucólica das ruínas na arte, em alguns
momentos, se entrelaça com a arqueologia, como observamos em alguns autores
anteriormente citados.
Qual o significado das ruínas no contexto urbano? Que impactos causa
ao espectador? Dependendo do enfoque e do campo disciplinar, cada profissional
tem um olhar diferente sobre o significado das ruínas. O historiador de arte, o
arqueólogo ou o arquiteto provavelmente as vêem de diferentes maneiras, assim
como filósofos e artistas. É necessário considerar as tradições culturais, técnicas e
abordagem científica de cada disciplina e de cada contexto onde elas se inserem. As
ruínas, portanto, tem múltiplos significados.
Para Starobinski (1994), as ruínas têm a capacidade de expressar a
ausência e a qualidade dilacerante das coisas perdidas. Ele considera que a poética
da ruína é sempre um devaneio diante da invasão do esquecimento e que a poesia
da ruína é a poesia do que sobreviveu parcialmente à destruição, permanecendo
imerso na ausência.
Starobinski (1994) coloca que a integração da ruína com a natureza,
ocorre de modo indissociável, por isso transmite uma sensação de paz e este
sentimento é, no seu entender, o somatório do esforço da vontade humana com a
força inexorável da natureza, fazendo aparecer uma nova forma.
Starobinski (1994) conclui dizendo que para uma ruína parecer bela a
destruição deve ser bastante longínqua e que se tenha esquecido suas
circunstâncias. Por esta razão ressalta a dificuldade que encontramos em
compreender o significado das ruínas contemporâneas que ainda estão latentes.
Na década de 60 os irmãos alemães Schreiber e Schreiber (1960, p. 10)
publicam o livro “ruínas celebres”. Esta obra7 sobre as cidades malditas, cidades
santas, cidades italianas, sobre as ruínas da guerra e do ouro como Angkor-vat,
7
Ruínas celebres de Hermann e Georg Scheiber foi publicado da década de 60 pela Ibrasa, São Paulo e tem
como autores dois irmãos austríacos, um arqueólogos e outro professores de latim e filosofo.
71
Palmira, Pompéia, Tróia, Óstia, Cidades dos etruscos, Traquinia, Sibaris, Ofir,
Zimbábue traz a visão romântica das ruínas, na introdução afirmam que:
[...] nada na face da terra é tão romântico, tão atraente, tão comovente
como os vestígios de uma cidade desaparecida, quer esses restos
persistam em pedras ou artefatos, quer se encontrem em livros ou histórias
guardadas pelo povo.
Em Huyssen (2000) compreendemos as ruínas contemporâneas como
fragmentos da guerra. Ele trata as ruínas e os vazios de Berlim pós-holocausto com
um enfoque especial. Como crítico literário, trabalha a noção de cidade como um
texto, no sentido de ler a cidade como um conglomerado de signos. Em seu livro
reúne ensaios que apontam o surpreendente nascimento de uma cultura e de uma
política da memória e sua expansão global a partir da queda do muro de Berlim, do
fim das ditaduras latinas e do apartheid na África.
Em Huyssen (2000), a globalização da memória funciona também em
dois outros sentidos relacionados, que ilustram um paradoxo na Alemanha, pois o
holocausto se transformou em cifra para o século XX como um todo e para falência
do projeto iluminista. O autor mostra a prova da incapacidade da civilização
ocidental de praticar a anamenese e de refletir sobre sua inabilidade constitutiva
para viver em paz com diferenças e alteridades.
2.3.2 Ruínas históricas
No campo da arquitetura podemos compreender as ruínas antigas
utilizando as categorias de análise propostas por Alois Riegl (1984) em “O Culto
Moderno dos Monumentos”, obra escrita em 1903 e de fundamental importância
para conservação dos monumentos históricos.
Riegl (1984) trata dos valores subjacentes ao conceito de monumento
histórico e que estão divididos em valor histórico, valor artístico, valor de
rememoração intencional e valor de antiguidade e sua evolução histórica, trata ainda
dos valores de rememoração e sua relação com o culto dos monumentos e dos
valores de contemporaneidade e sua relação com o culto dos monumentos onde
estabelece princípios para a preservação histórica com base nos “valores” dos
monumentos. .
72
No caso das ruínas, observa-se que o valor de antiguidade reside na
oposição à contemporaneidade, no defeito à integridade, na tendência à dissolução
das formas e das cores. O autor considera as ruínas como atributos de obras,
depoimentos das grandezas do passado frente à decadência do presente e ressalta
que estes sintomas de degradação produzem efeitos negativos sobre o observador.
Para Riegl (1984, p. 35) monumento “é uma obra criada pela mão do
homem com o intuito preciso de conservar presente e viva na consciência das
gerações futuras a lembrança de uma ação ou destino.” O monumento histórico é
para o autor uma criação da sociedade moderna, um evento histórico localizado no
tempo e no espaço.
Choay (2001) explica que a noção do patrimônio urbano histórico é
resultante de uma dialética da história e da historicidade que se processa em três
figuras ou abordagens sucessivas na cidade antiga, a figura memorial, histórica e
historial (papel museal) onde se incluem as cidades. A figura memorial surge com
John Ruskin na Inglaterra, que alertava a opinião pública contra as intervenções que
lesavam a malha e a estrutura das cidades antigas, recusando-se a compactuar com
as transformações do espaço urbano.
A figura histórica (papel propedêutico) tem expressão na obra de Camillo
Sitte (1843-1903) onde a cidade pré-industrial aparece como objeto pertencente ao
passado, e a historicidade do processo de urbanização, que transformam a cidade
contemporânea, é assumida em toda sua extensão e positividade.
É uma visão, explica Choay (2001), contrária à de Ruskin (1992), mas
que conservava o interesse pela cidade histórica, pois “a cidade antiga pode dar
lições”, por isso os estudos morfológicos das cidades antigas constituem
instrumentos para os urbanistas.
A compreensão das cidades e seus problemas complexos foi possível
com surgimento da nova ciência denominada urbanismo no século XIX que se
dedicou ao tema. Choay (1985) afirma que somente a partir do século XIX é que o
discurso fundador, do espaço enunciou suas pretensões cientificas e designou seu
campo de aplicação com o termo urbanismo, pontuado pelo arquiteto espanhol
Cerdá em 1867. A partir de então várias correntes formadoras destinaram-se a
explicar o crescimento das cidades após a revolução industrial. Choay (1979) explica
que a idéia de modernidade influenciou o modelo progressista que recusou as
73
heranças do passado para submeter-se as leis da geometria e em contraponto ao
modelo culturalista que se opôs ao progressista e percebeu o agrupamento urbano e
seu fenômeno cultural.
Em suas conclusões do livro “Urbanismo” Choay (1979) afirma que o a
idéia de um urbanismo científico é um dos mitos da sociedade industrial. O
urbanismo desconheceu a natureza da cidade, pois a cidade não é um objeto, ela é
um quadro de relações, com significados múltiplos. Para ela a metáfora do poeta
Victor Hugo, que era um obcecado pelo tema da cidade e verdadeiramente
apaixonado pela arquitetura é muito coerente, a cidade é comparada com um livro
com sua escrita particular, linguagem própria e seu estilo, que remete a uma língua
que evolui no tempo com suas estruturas. Ela afirma que o velho modo de
planejamento tornou-se obsoleto e ninguém sabe qual o futuro da cidade do
amanhã, talvez haja a proliferação de aglomerados urbanos que farão o conceito de
cidade perder o seu significado
A cidade tem seu valor histórico e há neste sentido, de acordo com Choay
e Merlin (1988), uma definição especial na “Carta internacional de salvaguarda”
adotada em 1986 pelo Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (ICOMOS),
que considera que todas as vilas do mundo são expressões materiais da diversidade
das sociedades na história e são todas históricas, do ponto de vista da conservação
e da proteção às vilas grandes e pequenas que preservam sua qualidade de
documento histórico e exprimem ainda o valor da civilização tradicional, mas estão
sujeitas à degradação, à destruição, pois estes são os efeitos de um modo de
urbanização da era industrial que atinge hoje todas as sociedades
Choay (2001) explica no item preparação romântica; o pitoresco, o
abandono e o culto a arte que a sensibilidade romântica descobriu nos monumentos
do passado são um campo de deleite. A imagem pitoresca pode também gerar um
sentimento de perturbação ou de angústia, em que se compraz a alma romântica. A
ruína medieval, ela explica, é uma testemunha mais dramática que a ruína antiga. O
castelo fortificado reduzido as suas muralhas, a igreja gótica da qual resta apenas o
esqueleto revelam, mais do que se estivessem intactos, o poder fundador que os
mandou construir. Mas os musgos corrosivos,as ervas daninhas que desmantelam
os telhados e arrancam as pedras das muralhas, os rostos erodidos dos apóstolos
74
no pórtico de uma igreja românica lembram que a destruição e a decadência são o
término desses maravilhosos inícios.(Choay,2001,pag .)
Desta forma Choay (2001) afirma que a emoção estética gerada pela
qualidade arquitetônica ou pelo pitoresco sentimento de abandono imposto pela
percepção da ação corrosiva do tempo. A ascensão desses valores afetivos integra
o monumento histórico ao novo culto da arte.
Em teoria do restauro, Brandi (2004) trata das proposições fundamentais
ao restauro, compreendendo-o como um ato crítico que deve privilegiar a instância
estética e entender a obra de arte em sua totalidade mais ampla, visto que a
restauração de monumentos assim como das obras de arte recaem sob as
instâncias estéticas e históricas. Ele ressalta que a ruína não se define por uma
mera realidade empírica, mas como algo que deva ser pensado de modo simultâneo
sob o ângulo da história e da conservação, na sua consistência presente, no seu
passado e no futuro para o qual deve ser assegurada com vestígio ou testemunho
da obra humana.
Brandi (2004) afirma que só se poderá chamar de ruína algo que
testemunhe um tempo humano. No capítulo “A restauração segundo a instância
estética”, o autor diz que o conceito de ruína do ponto de vista artístico apresenta
complicações que não podem ser desconsideradas, ou seja, contempla a
eventualidade de que a ruína se integre a um determinado complexo: monumental
ou paisagístico. Foram assim compreendidas a utilização das ruínas romanas na
jardinagem e na paisagem dos seiscentos. O “templo de Castor e Polux” no fórum
romano é um caso típico de monumentos que adquiriram uma “fácies” indissolúvel
na sua mutilação. É por isso que considera um erro crer que toda coluna
despedaçada possa ser reerguida ou recomposta de modo legítimo. O fragmento do
templo nada representa de forma isolada, mas, visto no conjunto do fórum romano
tem outro significado e expressão.
75
2.3.3 Ruínas nas cartas patrimoniais
Na prática, a conservação e os processos de intervenção nas ruínas são
esclarecidos pelas cartas patrimoniais. Destacamos aqui duas referências
importantes contidas na “Carta de Atenas”: “§ Art. 6 - A história está inscrita no
traçado e na arquitetura das cidades. Aquilo que subsiste forma o fio condutor que
juntamente com textos gráficos permite a representação de imagens sucessivas do
passado” (CARTA..., 1933, não paginado).
Na “Carta de Veneza”, 1964 que trata a questão da preservação.
§ Art. 15 – Devem ser asseguradas a manutenção das ruínas e as medidas
necessárias à conservação e proteção permanente dos objetos
descobertos. Além disso, devem ser tomadas as iniciativas para facilitar a
compreensão do monumento trazido à luz sem jamais deturpar seu
significado (CARTA..., 1964, não paginado).
A preocupação com as ruínas, expressa nas duas cartas patrimoniais,
revela o quanto elas são importantes para o entendimento da história das cidades.
Geralmente associadas ao abandono e à decadência pela degradação de seus
elementos construtivos ou estéticos, as ruínas são, por outro lado, reminiscências do
passado, fragmentos da arquitetura, peças de um quebra-cabeça que necessitam de
complemento para compreensão.
Em texto sobre patrimônio e memória Fortuna (2010, não paginado)
questiona:
Serão as ruínas, os monumentos e os museus manifestações espaciais e
artefatos que decoram a cidade que habitamos, ou ao contrário, serão eles
elementos históricos, artísticos e culturais que atualizam o passado e lhe
dão vida? Com eles temporalizamos o espaço ou espacializamos o tempo?
Consideramos deste modo, que as ruínas são como as peças de quebra-
cabeça que necessitam de complemento para a compreensão ou podem ser vistas
isoladas em sua resistência, permanência e valor intrínseco ou no contexto urbano
como fragmentos do passado e da memória física dos monumentos.
76
2.4 Temporalidades: Cidades e Ruínas
A matéria fundamental da história é o tempo e a cronologia desempenha
um papel importante como fio condutor e ciência auxiliar da história (LE GOFF,
2003).
Desta forma a oposição entre passado e presente é essencial à aquisição
da consciência do tempo, pois a história é feita segundo ritmos diferentes e a tarefa
do historiador, assegura Le Goff (2003), é reconhecer estes ritmos.
Neste sentido tentamos construir um ritmo cronológico na pesquisa
empírica respeitando as temporalidades do Estado do Maranhão e da cidade de
Alcântara com o objetivo de identificar os diferentes momentos de sua formação.
É importante ressaltar que vários níveis de tempo organizam a história
conforme explica Braudel (1995). O primeiro tempo é o do ambiente onde as
mudanças são lentas, quase imperceptíveis com um senso de repetição e ciclos, é o
tempo geográfico. O segundo tempo é o da história social e cultural, com mudanças
mais rápidas no ambiente, pois se processa nos grupos e agrupamentos, com a
queda ou ascensão de impérios e civilizações cuja extensão pode ser de dois ou
três séculos para se estudar apenas um fenômeno. O terceiro nível de tempo é o de
eventos que diz respeito a história dos homens individuais. É o tempo da superfície
e dos efeitos enganosos, é, portanto o tempo de curta duração, pois trata de
acontecimentos políticos e de pessoas. Além dele, há provavelmente um quarto
tempo o do momento ou conjuntura, em que uma situação especifica é estudada em
diferentes ângulos.
Segundo Lecht (2003), em vez de dispensar a complexidade e tentar uma
única abordagem em que as variáveis são mais ou menos controláveis, Braudel e a
“Escola dos Annales” abraçavam a complexidade. A história seria escrita
simultaneamente de varias posições e perspectivas diferentes.
Em Burke (1997), aprendemos que a “Escola francesa dos Annales”
[1929- 1989] foi uma resposta aos anseios da humanidade que vivia momentos de
convulsões e rupturas com o passado, pois a história convencional não correspondia
mais e nem conseguiu satisfazer às exigências de um novo homem que surgia, de
acordo com o núcleo central formado por historiadores como Bloch, Braudel, Duby,
Le Goff e outros.
77
O conceito de história para Le Goff (2003) traz em si alguns problemas e
questionamentos:
1. Que relações existem entre a história vivida, a história natural,
senão o esforço científico para descrever, pensar e explicar esta
evolução a ciência histórica?
2. Que relações têm a história com o tempo, com a duração, tanto
com o tempo natural e cíclico quanto com o tempo vivido e
naturalmente registrada das sociedades e dos indivíduos?
3. A dialética da história parece resumir-se numa oposição ou
diálogo? – passado e presente e ou presente e passado? Será a
história capaz de predizer o futuro?
Para Le Goff (2003), a crítica da noção de fato histórico tem provocado o
reconhecimento de realidades históricas negligenciadas por muito tempo pelos
historiadores. Junto à história política, econômica, social e cultural, nasceu uma
história das representações. Essa assumiu diversas formas: história das concepções
globais da sociedade ou história das ideologias; história das estruturas mentais
comuns a uma categoria social, a uma sociedade, a uma época ou história das
mentalidades; história das produções.
Para Foucault (1999, p. 27), escrever a história do passado é vê-lo como
novo; o passado assume novos sentidos á luz de novos eventos. No capítulo
“Genealogia e a História” ele afirma que a história tem o compromisso com as
questões do presente. Para o autor a história deve ser escrita na perspectiva do
presente.
Desta forma recuperamos a história do século XX para compreendermos
o contexto histórico do Estado do Maranhão e dentro dele contextualizarmos a
decadência econômica e social de Alcântara com um olhar na contemporaneidade e
nos diferentes momentos e atores do processo.
Nesse sentido, estudar os vários níveis de tempo e como eles organizam
a história de Alcântara, possibilitam compreender os momentos chaves de inclusão
e exclusão da cidade nas redes globais e locais e entender o arruinamento do que
um dia foi uma cidade verdadeira.
78
3 MARANHÃO NO SÉCULO XX: Dimensões socio-econômica e política.
Figura 10 - Rua do giz, de Gaudêncio Cunha 1908
Fonte: Original no Museu Histórico do Maranhão
Este capítulo tem por objetivo compreender e contextualizar a história do
Estado do Maranhão e da cidade de Alcântara no século XX, nas dimensões
política, econômica e social, pontuando os processos de inclusão e exclusão do
Estado do Maranhão e da cidade de Alcântara nas redes global, regional e local em
diferentes temporalidades. Resgatando as razões da decadência econômica e social
do Estado e do arruinamento de Alcântara,pretende, também, analisar as tentativas
e planos para alavancar a economia do Estado.
Ressaltamos a utilização da cronologia adotada por Prado Junior (1987)
que categoriza as diferentes etapas do processo de formação do país: 1889 a 1930-
a república burguesa e a crise do sistema, enfatizando aspectos como a
industrialização juntamente com a cronologia da coleção de Viveiros (1992b) e
79
Meireles (1992); para pontuar de forma sintética os momentos de apogeu e
decadência do Estado, com recorte temporal no século XX.
A pesquisa histórica foi feita em acervos do Rio de Janeiro (IHGB e
Biblioteca Nacional) e em acervos em São Luís do Maranhão (Biblioteca Pública
Benedito Leite, na Associação comercial do Maranhão, arquivo Público do Estado do
Maranhão e IBGE-MA). Inicialmente tomando como fontes primárias os almanaks
ilustrados e almanaques administrativos (1898-1923-1950), relatórios do interventor
Paulo Ramos (1937 a 1945), dados da coletoria federal de Alcântara – 1938 a 1940;
documentos relativos ao presídio de 1952; dados do IBGE como anuários
estatísticos (1930-1990) e enciclopédia dos municípios 1950, jornais e revistas e
fotografias de 1905, 1908, 1930 e 1950 e também nas fontes secundárias como os
livros de historiadores maranhenses relativos a história do comércio como Jerônimo
Viveiros, Antonio Lopes, Raimundo Lopes Mario Meireles e Carlos Lima, além de
crônicas criticas dos maranhenses Dunshee de Abranches e Nascimento de Moraes.
Dimensão sócio-econômica
3.1 Contexto histórico
De acordo com Prado Junior (1987), foi entre 1770 e 1808 que ocorreu o
período de apogeu da colônia portuguesa no Brasil, resultante do
desenvolvimento econômico decorrente do renascimento da agricultura,
especialmente pelo cultivo do algodão, arroz, açúcar, anil e café.
Dentre as várias culturas, o algodão era exportado em pequenas
quantidades e, na falta da moeda cunhada em Portugal os novelos de fio ou rolos de
pano eram utilizados como valores monetários ou moeda para pagamento de
dividas. Segundo Prado Junior (1987, p. 81), “É somente quando se torna
mercadoria de grande importância que começa a parecer, tornando-se uma das
principais riquezas da colônia.” A cultura do algodão se disseminaria em todo
território da America portuguesa até o declínio do preço no século XIX e o aumento
da produção norte americana.
Toda essa atividade agrícola era baseada na força do trabalho escravo
que impulsionava a elite aristocrata de barões emergentes que teve destaque no
cenário político e social da corte portuguesa, instalada em cidades dotadas de todas
as urbanidades com elementos arquitetônicos que traduziam os requintes europeus.
80
Neste modelo agrário-exportador, a economia colonial brasileira teria sido
organizada em grandes latifúndios, de modo a exportar matérias-primas a baixo
preço e transferir riqueza para a Metrópole. Como resultado, o mercado interno seria
mínimo e a sociedade, escravista.
Em contraponto ao latifúndio, Caldeira (2009) acrescenta à historiografia
colonial um novo olhar sobre essa sociedade trazendo a figura do empreendedor
para o centro das discussões. Esta figura ligada à produção independente e à
pequena propriedade gerou uma economia dinâmica e paralela a figura do latifúndio
agrário-exportador.
A mistura de relações pessoais com trocas de mercadorias criou no Brasil
a figura daquele que queria enriquecer, não tinha dinheiro, mas tinha capacidade de
organizar a produção e expandir o mercado: trata-se da figura do empreendedor.
Numa sociedade onde poucos homens livres tinham escravos (apenas
9% deles eram proprietários, no início do século XIX), e na qual formavam a maioria
da população (62% do total, no mesmo momento), o empreendedor organizava o
trabalho e buscava enriquecer. Migrantes portugueses, índios livres, escravos
libertos e filhos miscigenados compunham o grupo que, em todos os setores da
economia, corria riscos, mas ganhava na forma de lucros. O mercado crescia porque
não paravam de chegar novos empreendedores, que através de casamentos, se
fixavam na sociedade colonial.
Essa visão nos ajuda a compreender melhor a dinâmica econômica da
colônia em seu apogeu e declínio, compreendendo também quem era a classe
dominante que ergueu e abandonou cidades no Brasil em nome das dinâmicas
mercantis, das redes e dos ciclos econômicos.
Essa classe dominante era chamada de burguesia comercial, ou
pequenos empreendedores que à margem dos políticos e representantes da Coroa
movimentavam a economia local com pequenos comércios e negócios, inclusive o
de escravos, formando uma rede de trocas informais que produzia uma economia
dinâmica interna. Do ponto de vista econômico, o tráfico era uma operação que
exigia uma base de capital e investimento em transporte marítimo, Caldeira (2009)
calcula que em um século, algo em torno de 1, 4 milhão de escravos foram trazidos
da África para o Brasil.
Neste contexto, a economia do Estado do Maranhão foi profundamente
alterada pela criação da Companhia Geral de Comércio do Grão-Pará e Maranhão,
81
fundada em 1755 pelo Marquês de Pombal, Sebastião José de Carvalho e Melo
poderoso ministro do Rei. A Companhia detinha o monopólio do algodão e fornecia
crédito, escravos e ferramentas aos lavradores, estimulando o cultivo do produto.
Esta companhia monopolista impediu no caso do Maranhão a figura do pequeno
empreendedor mencionado por Caldeira (2009).
Todo o apogeu econômico deu impulso à estruturação das vilas e cidades
em todo o Estado do Maranhão. São Luís foi uma das principais expressões urbanas
da colônia e a quarta cidade em importância do país.
Este período de franco progresso traduziu-se de acordo com Meireles
(2001) no enriquecimento material e no aprimoramento intelectual da sociedade que
culminou no surgimento de uma elite latifundiária e de uma nobreza rural que
conferiu à província uma posição de primeiro plano no cenário nacional.
Alcântara era a segunda cidade em importância depois da capital São
Luis. Por sua importância econômica e social foi o entreposto comercial da cidade
de São Luis, celeiro do Estado. Como sede da aristocracia emergente rural agro-
exportadora de algodão, configurou uma formação urbana de ruas e quadras
espontâneas em torno dos elementos originais, conformando posteriormente no
século XVIII um traçado regulador que envolveu os três principais conjuntos
religiosos em torno dos quais a arquitetura civil se consolidou num belo conjunto
barroco.
O economista maranhense Bandeira Tribuzi (1981) em seus estudos
sobre a formação econômica do Estado afirma que o Maranhão só teve expressão
no contexto colonial português com a Companhia de Comércio Grão-Pará Maranhão
contingenciada pela expansão das terras e aumento do numero de escravos e pela
ênfase ao cultivo do algodão, a pecuária e exportação de couros.
Tribuzi (1981) ressalta que neste “boom” econômico colonial estavam
implícitas as raízes da ruína econômica do Estado, pois o crescimento se fazia de
fora para fora, era dirigido pela Companhia Grão Pará e visava criar excedentes
para o Reino de Portugal e o sistema escravagista impedia o surgimento de um
mercado interno significativo. Explorada da metrópole, a economia maranhense que
se expandiu em 1756 à abertura dos portos (1808), sofreu os danos infligidos ás
economias periféricas pelo imperialismo da fase mercantil, inclusive a elevada
vulnerabilidade a nível de preços e mercados para sua produção tendente à
monocultura. A reação contra o monopólio da Companhia de Comércio foi intensa,
82
levando-a a extinção em 1777. O comércio passou então, a importar direto para a
metrópole, mas o monopólio e os impostos cerceavam os pequenos
empreendedores.
Raimundo Gaioso (1970), que publicou seu compendio da lavoura em
1818, já ressaltava que vários entraves prejudicaram os lavradores: a falta de
terrenos para a lavoura que se achavam reduzidas e ocupadas pelos “gentios
bravos”; o horroroso preço da escravidão e o ínfimo preço do algodão devido o
monopólio. Estes entraves, reflete o autor, foram a razão da decadência do Estado e
motivo da perda da sua antiga opulência.
Em seus estudos o arquiteto Pedro Alcântara do Iphan (1971) concordava
com os pesquisadores afirmando que o período do esplendor do Maranhão trazia
consigo as sementes da destruição. O algodão era um excelente negócio devidos
aos altos preços no mercado internacional, pois sua produção era simples e pouco
dispendiosa. A cultura algodoeira cresceu rápida, mediante extensiva utilização de
terras virgens e importação de mão de obra africana.
Estas formas extensivas, no entanto, obrigavam a buscar terras novas e
penetrar no interior. Dessa forma o algodão foi subindo pelas margens do Rio
Itapecuru e neste caminhar ia abandonando terras esgotadas por uma agricultura
rudimentar e predatória. Esta interiorização tomou outro ritmo com a navegação a
vapor, pelo sistema fluvial dos vales dos rios Mearim e Pindaré, deixando para trás
as cidades com as terras esgotadas, como foi o caso do eixo de produção de
Alcântara que foi deslocado para outras cidades do interior do Estado.
Pesquisadores como Gaioso (1970), Tribuzi (1981), Almeida (2008) e
Alcântara (1971) em seus escritos são unânimes em afirmar que estavam nas bases
frágeis da prosperidade do Estado do Maranhão as razões de sua ruína e
decadência econômica, além das fragilidades houve também a construção do
discurso oficial sobre a decadência da lavoura, repetido e reforçado pelos relatórios
dos governantes e pelos historiadores.
Não houve, portanto, na cultura do algodão, o cuidado de criar uma
racionalização e diversificação da produção agrícola para manter o equilíbrio
econômico interno no Estado. Soma-se a isso as mudanças de mercados, pois ao
iniciar a produção de algodão em grande escala para os EUA, o produto passou a
ser a principal matéria-prima do mercado mundial e os preços reduziram-se a terça
parte, tornando a rentabilidade nula no Brasil. Desta forma o algodão brasileiro
83
encerrou sua curta trajetória e o Maranhão, um dos principais produtores atravessou
grandes dificuldades.
O ciclo tardio da cana de açúcar no Maranhão foi uma nova tentativa
econômica pela qual a aristocracia rural, lutou em 1846 em favor da recuperação da
lavoura. Com melhoria técnica e meios de transporte os engenhos se multiplicaram
no interior do estado em Guimarães, Alcântara e Viana.
Em 1860 havia 410 engenhos movidos a vapor hidráulico e a produção
maranhense, em 1882, era de 16.000 toneladas. Mas, tal qual o algodão, a
produção de açúcar perdeu o mercado internacional entrando novamente o Estado
do Maranhão em recessão.
A extinção do tráfico africano acentuou as contradições do regime
escravagista, a escassez de braços e o desequilíbrio demográfico entre as regiões
brasileiras criaram para a região norte dificuldades, pois eram desviados os
escravos para as regiões do café no sul. Esta situação desfavorável foi uma das
causas que fez amadurecer, no norte, as idéias emancipacionistas mais cedo que no
sul (Prado Junior, 1987).
No período das regências (1831-1840) muitas revoltas eclodiram pelas
províncias do Brasil, decorrentes da crise econômica e do descontentamento com a
situação política geral. Estas reações ocorreram em diversos Estados conhecidas
como revoltas populares, das elites dominantes e dos escravos. A revolta dos Malés
em 1835 na Bahia foi uma das únicas que reinvidicava a abolição dos escravos, as
outras revoltas se caracterizaram por inicialmente por conflitos entre elites e depois
revoltos populares, como a Cabanagem no Pará (1835-1840) que foi uma revolta
popular contra a miséria e injustiça; a revolução Farroupilha no Rio Grande do Sul
(1835-1845) motivada por problemas econômicos da classe dominante gaúcha; a
Sabinada (1837-1838), na Bahia, motivada pela formação de uma Republica baiana
enquanto o imperador Pedro II, ainda criança, não podia governar, e a Balaiada no
Maranhão (1838-1841).
No caso da Balaiada, a desorganização da produção do algodão criou
condições para a eclosão que envolveu no Maranhão uns 31 mil homens armados
dos quais 3.000 eram escravos foragidos e devastou todo o vale do Itapecuru e a
baixada maranhense.
Diante deste quadro a imigração européia surgia então como uma
solução mais ampla e radical para resolver o problema da escassez de braços, a
84
corrente imigratória intensificada em 1850 foi feita para coexistir nas lavouras de
café trabalhadores escravos e europeus livres. As características negativas da
escravidão seriam acentuadas também pelo início da indústria manufatureira.
3.1.1 A Imigração
Entre 1890 a 1930 chegaram ao Brasil cerca de 3, 5 milhões de
imigrantes em busca de oportunidades de trabalho de acordo com Cotrim (1999). Os
italianos representavam 33% desta população, portugueses 29%, espanhóis 15%
além de grupos menores como os alemães, japoneses, sírio e libanês, russo, lituano
e austríaco. As oportunidades de trabalho se concentraram nos Estados do sul e
sudeste.
De acordo com dados do Anuário estatístico do IBGE8, o movimento da
população de estrangeiros no país entre 1884-1949 apresenta alguns picos de
grande entrada e entre os anos de 1888-1897 houve um grande número de
imigrantes chegando ao Brasil. Os principais grupos eram de alemães, espanhóis,
italianos, japoneses, portugueses, russos entre outros grupos menores.
Sobre a imigração estrangeira no Maranhão, consta no Dicionário
Histórico e Geográfico de Cesar Marques (2008) um verbete sobre as tentativas de
implantação de colônias agrícolas estrangeiras.
Marques (2008) afirma que além da presença portuguesa houve
iniciativas como as do inglês Guilherme Welstood, em 1817, de buscar famílias de
artífices e de trabalhadores rurais na Inglaterra e Irlanda para que juntamente com
as máquinas mostrassem o método de incremento a agricultura. Esta colônia
instalada às margens do rio Pindaré não logrou êxito.
Marques (2008) ressalta ainda que entre os anos de 1853 a 1856 foram
importados 887 colonos, sendo 847 portugueses e 40 chineses, com destino a
colônias no interior do Maranhão: de Arapapaí, de Maracaçumé, de Santa Isabel, de
Santa Teresa, de Pericuau e de Petrópolis, de todas estas colônias apenas a Santa
Isabel prosperou. As demais colônias desapareceram por razões diversas, os
colonos ficaram doentes, morreram com as epidemias ou abandonaram o trabalho
levando-as a extinção. O autor conclui que a:
8
Compilações de dados sobre imigração, buscadas no site do IBGE.
85
[...] província não conseguiu atrair a imigração estrangeira apesar da
fertilidade do solo e da salubridade do clima e de tantas riquezas
naturais, pois o imigrante europeu preferia as províncias do sul do
império pela semelhança do clima com a Europa e pela riqueza e
progresso material do Sul (Marques, 2008, p. 353).
Em 1889 houve outra proposta de trazer 200 americanos da Filadélfia
para a colônia “Nova Polônia”, mas com as chuvas os colonos adoeceram e ela ficou
reduzida e foi extinta em 1890. Outras tentativas isoladas e menores são citadas por
Marques (2008) como a chegada de famílias em 1894 da cidade do Porto em
Portugal para a fábrica de tecidos do Rio Anil em São Luís, alguns poucos Italianos
que viviam no Piauí chegaram ao Maranhão para trabalharem em fábricas na cidade
de Codó, assim como algumas famílias alemãs chegaram à cidade de Rosário.
Apesar das iniciativas acima citadas a maior predominância da imigração
no Estado do Maranhão foi da colônia síria e libanesa. O sociólogo Corrêa (2009)
indica que alguns estudos se dedicaram a questão da imigração libanesa na
Maranhão, como por exemplo: o texto do Prof. Olavo Correia Lima: Sírios e
Libaneses no Maranhão (1950); o texto de Salomão Fiquene intitulado ”Os
Palestinos”, algumas citações no livro “Torrão Maranhense” de Raimundo Lopes,
fazem referência a esse grupo étnico-cultural na formação do Estado e de São Luís
e o historiador Viveiros (1992b) dedica um capitulo desta obra ao estabelecimento
desta colônia no Estado.
De acordo com Viveiros (1992b) esses imigrantes escolheram os Estados
Unidos e o Brasil para se estabelecerem preferencialmente no comércio. Esse
movimento que se iniciou a partir de 1900, foi caracterizado por uma imigração
espontânea e não colonizadora como a dos italianos, do espanhol e do japonês, que
vieram “fazer o Brasil”.
Os sírios e libaneses não eram operários industriais ou agrícolas, eram,
sobretudo comerciantes ambulantes, mascates com liberdades de viajar e vender
seus produtos nas diversas cidades. Eram humildes e modestos dando a impressão
de inferiores aos demais imigrantes, mas foram acumulando riquezas a ponto de se
tornarem, posteriormente, proprietários de usinas de beneficiamento de arroz, de
fábricas de tecidos, de óleo e sabão e ainda dominaram o comércio da principal rua
da cidade, a Rua Grande.
86
Na crônica maranhense intitulada “Vencidos e degenerados”, de autoria
de Nascimento Moraes, há uma análise sobre a história política do Maranhão na
virada do século XIX para o século XX, após a abolição no contexto de esperanças
de renovação da sociedade. O autor ressalta a paralisação das principais fontes
produtoras do Estado devia-se à falta da de mão de obra, principalmente as
dificuldades de imigração;
[...] porque falta quem venha ensinar os modernos métodos. Os pequenos
agricultores e criadores que possuímos pouco a pouco abandonaram o
trabalho, vexados por impostos exorbitantes, taxação que paralisa e
desanima o espírito (Moraes Filho, 2000, p. 78).
Estabelece ainda uma critica à presença dos imigrantes:
O Maranhão não foi bafejado pela imigração estrangeira, nem em grande
nem em pequena escala. Só a estas plagas continuam a chegar
portugueses trabalhadores, mas que de modo algum auxiliaram o nosso
progresso e, depois principiaram a entrar chusmas de sírios e turcos... Mas
os sírios e turcos não fazem parte da sociedade maranhense como os
portugueses, não se aplicam à indústria, à criação de gado e à lavoura.
Vivem do comercio, mas do comercio misterioso, incompreensível, a que a
perspicácia de ninguém alcança, e do qual só se diz que é na sua maior
parte prejudicial à praça (Moraes Filho , 2000, p. 203)
Desta forma observamos que os entraves como a falta de braços e de técnicas
colocados por Raimundo Gaioso (1970) permaneceram na virada do século quando
o Maranhão não recebeu imigrantes, nem novas técnicas agrícolas para o
incremento de sua economia e sociedade.
3.1.2 A Industrialização
Prado Junior (1987) afirma que das transformações ocorridas no século
XIX nenhuma contribuiu mais para modificar a fisionomia do país como a revolução
que se operou na distribuição das atividades produtivas. Essa revolução foi
constituída por dois fatos: um de natureza geográfica, que foi o deslocamento da
primazia econômica das velhas regiões agrícolas do norte para as do centro sul e o
outro foi a decadência das lavouras tradicionais do Brasil – da cana de açúcar, do
algodão e do tabaco e o desenvolvimento paralelo da produção de café.
O fomento à indústria brasileira data de 1846, e o seu desenvolvimento,
afirma Viveiros (1992b) se deu entre os anos 1855 a 1895. Dentre os Estados mais
87
promissores destacavam-se Minas Gerais com trinta e sete fabricas e o Maranhão
com dezesseis, numero este acima da capital federal, da Bahia e de São Paulo.
Viveiros (1992a) enfatiza que o surto industrial de estabelecimentos fabris
no Estado no período de 1880 a 1895, logo após a abolição, tentou transformar o
Maranhão agrícola em industrial, esgotando todas as possibilidades financeiras.
O sonho da industrialização que fez atribuir a São Luís o precoce e
frustrado cognome de “Manchester brasileira”, durou pouco e foi levando, “[...] na
torrente de desastrosas falências, a maior parte do parque fabril instalado com muito
açodamento nos últimos anos do século XIX” (Moraes, 1987).
A maioria dos estabelecimentos fabris eram sociedades anônimas
(dezessete) e algumas eram particulares (dez) quase todas de fiação e tecelagem
de tecido do algodão, mas havia também fábricas de fósforo, chumbo, prego,
cerâmica e sabão.
Destacamos de acordo Marques (2008) e com o almanaque
administrativo (Jorge, 1950) as fábricas mais importantes, por ordem cronológica
(figura 11):
a) Companhia de Fiação e Tecidos Maranhense: Criada em 1888/1890;
faliu em 1970. Era a mais antiga fábrica do Maranhão possuia 300 teares com
produção de 1.800.000 metros de riscados anual;
b) Companhia de Fiação e Tecelagem de São Luis: Criada em 1894; faliu
em 1960. Empregava 55 operários; 55 teares para uma produção anual de 350.000
metros de tecidos;
c) Companhia Lanifícios Maranhenses ou Fábrica Santa Amélia, integrava
o grupo cotonifício Candido Ribeiro; faliu em 1969; produzia 440.000 metros/ano
empregando 50 operários;
d) Companhia Progresso Maranhense: Criada em 1892; tinha 150 teares
para uma produção anual de 70.000 metros/ano com 160 operários;
e) Companhia Manufatureira e Agrícola do Maranhão: Fábrica de tecido
de Codó, criação em 1893. Produzia 750.000 metros/ano, 250 operários na fiação e
tecelagem;
f) Companhia Fabril Maranhense: Criada em 1893; tinha uma produção
anual de 3 milhões de metros; 600 operários; faliu em 1971;
88
g) Companhia de Fiação e Tecido do Rio Anil: Criada em 1893, faliu em
1966; pertenceu ao grupo Jorge & Santos com uma produção 1 milhão metros/ano;
100 operários;
h) Companhia de Fiação e Tecido do Cânhamo foi criada em 1891; faliu
em 1969; possuia uma produção anual 1.500.000 metros/ano com 250 operários;
i) Companhia Industrial Maranhense: Criada em 1894, 22 teares para 50
operários; 120 t/ano;
j) Cotonière Brasil Ltda.: Criada na década de trinta, empresa de origem
francesa subsidiária da LILI; tinha por objetivo abastecer aquela indústria de algodão
de alta qualidade; desativada após 1945.
Mas, ao contrário do Estado do Maranhão que permaneceu em letargia
econômica com tentativas fracassadas de industrialização, o Estado de São Paulo
conseguiu superar o abandono criando uma rede urbana na fronteira noroeste do
Estado através da rede ferroviária. De acordo com Coutinho da Silva (1998), a rede
de cidades formadas na fronteira noroeste do Estado de São Paulo entre 1890 e
1950 deu origem a uma rede de 100 pequenas cidades desenvolvidas em função de
quatro importantes fatores: a existência de terras férteis e desocupadas, a expansão
da cafeicultura, a presença da classe média rural e o desenvolvimento de uma rede
viária baseada no transporte ferroviário.
Figura 11 - Imagens das fábricas em 1908
Fonte: Cunha (1987)
89
Figura 11b - Imagens das fábricas em 1908
Fonte: Cunha (1987)
Na perspectiva de enfrentar a crise do Estado do Maranhão ocasionada
pela abolição da escravatura e pelo frustrado sonho industrial, a colônia maranhense
domiciliada no Rio de Janeiro em 1890 decidiu fundar o plano de organização de
uma empresa, com grande capital para promover grandes empreendimentos
necessários.
Esta iniciativa estava ligada ao “Banco Emissor do Norte” que era parte
do programa financeiro do Ministro da Fazenda, aprovado desde 1890, com sede
em Belém e circunscrição nos Estados do Pará e Maranhão.
Embora combatido pelos jornais locais, o Banco era destinado a dar
crédito a operações comercias e contratos de hipoteca, penhor agrícola e também a
lavoura e indústria extrativa (VIVEIROS, 1992b). Tinha por objetivo alavancar
grandes obras fundamentais ao escoamento e dinamização da produção agrícola no
Estado assim como a circulação e mobilidade das mercadorias:
a) Construção uso e gôzo da estrada de ferro Caxias a São José das
Cajazeiras e de Caxias a Rio Araguaia;
b) Construção uso e gôzo das obras de melhoramentos do porto da
capital do Estado do Maranhão;
c) Instalação uso e gôzo dos dois engenhos centrais para o fabrico de
açúcar;
90
d) Construção uso e gôzo dos saladeiros centrais para preparo de
charque e fábricas anexas;
e) Introdução de 3000 famílias de imigrantes, contrato de 1890;
f) Desenvolvimento e aperfeiçoamento da navegação fluvial e costeira;
g) Exploração da indústria e comercio de algodão;
h) Fazer toda sorte de operações bancárias para auxiliar fins sociais;
i) Organizar companhias, levantar empréstimos e compra de matérias
primas no país e no estrangeiro;
j) Empreitar obras;
k) Edificar, comprar e vender terrenos e prédios e proceder à divisão de
terras;
l) Organizar e explorar fábricas e estabelecimentos industriais.
A Companhia, dentre tantas iniciativas para soerguer a economia do
Maranhão como as fabricas e o banco emissor foi exitosa em seu lançamento, mas
sofreu duros golpes não conseguindo que seus acionistas atendessem à chamada
de coleta de capital e com os prejuízos na bolsa. De todos os itens propostos
finalmente conseguiu realizar apenas o porto, o cais da sagração, “malogrando mais
uma vez a esperança de soerguimento do Maranhão” (Viveiros, 1992b, p. 94).
Se a capital encontrava-se em péssima situação, os municípios do interior
do Estado, que de acordo com dados do IBGE eram 65 em 1872 contra 217
atualmente, encontravam-se totalmente abandonados pelas políticas públicas.
3.1.3 Babaçu: a esperança do Maranhão
O Babaçu, juntamente com o algodão e acuçar foi uma das maiores
riquezas maranhense e o produto de exportação mais importante da década de 40
do Estado, mas, tal como os dois outros produtos , sofreu com as mudanças dos
mercados internacionais e com a concorrêrncia e facilidade na industrialização de
outros produtos .
Palmeira nativa da região do meio-norte, existem dois generos Orbignya e
Attalea. Seu côco é extraído pelo pequeno agricultor de forma rudimentar,
manualmente em um sistema caseiro tradicional e de subsistência, principalmente
pela população feminina e os maiores focos dos babaçuais situam-se nos vales dos
91
principais rios maranhenses e na mata de transição. As amêndoas contidas em seus
frutos são importantes produtos extraídos do babaçu que possuem valor mercantil e
industrial. Da amêndoa do babaçu produz-se óleo, inclusive diesel, margarina e
sabão.
Em 1948 a indústria do babaçu começava a se firmar e ele se transforma
num importante produto de exportação gerando um convênio americano-brasileiro
para compra e venda do produto. Meireles (1992) explica que neste convênio,
estava assegurado ao mercado americano 75% da produção e 25% para consumo
interno. Em 1946, as consequências deixadas pela II Guerra mundial, levaram a
Associação Comercial do Maranhão a pleitear o adiamento do convênio e a
negociação da produção em partes iguais.
Em 1951 foi promulgada uma lei para criação do Instituto do Babaçu,
semelhante às que existiam com o Cacau, Mate, açúcar e Álcool. Brasil e Estados
Unidos estavam, conjuntamente, interessados no desenvolvimento da produção do
Babaçu. O Diário Oficial de 10/11/1951 publicou o convênio entre o Ministério das
Relações exteriores e a Embaixada Americana para exploração do babaçu, Meireles
(1992) afirma que havia uma expectativa, em 1952, de que não só o problema do
Babaçu, mas toda a economia do Estado estaria em breve solucionada e em pleno
desenvolvimento.
Amaral Filho (1990) analisa as formas de organização economica, social
e técnica do babaçu e suas tendências e ressalta que além das articulações e
relações entre grupos no interior do complexo babaçueiro, dois processos
econômicos afetaram o desenvolvimento do complexo do babaçu : o primeiro foi a
retomada do aproveitamento do côco em bases amplas e industriais na década de
70, após a crise do petroleo como outra alternativa energética ; o segundo foi a
mudança e modernização da agropecuária maranhense e a expansão de novas
culturas como a cana, para atender a fabricação de alcool, arroz mecanizado, soja e
a pecuária que avançaram sobre a população do babaçu, provocando devastação .A
atividade da coleta do côco e extração da amêndoa envolvia, na decada de 70,
cerca de 300 mil famílias de pequenos produtores.
92
3.1.4 Ciclo econômico contemporâneo
O economista Holanda explica que o estado do Maranhão passou por quatro
importantes ciclos. O primeiro deles foi o ciclo primário exportador do algodão,
monopolizado pela Cia Grão-Pará de Comércio, iniciado em 1755 que durou até
1889, seguido da exportação de arroz e couro e depois da cana. A abolição dos
escravos, foi uma das razões da decadência somada às mudanças no mercado
internacional seguida da desarticulação do sistema agrícola.
O segundo ciclo apresenta o surto de crescimento industrial têxtil entre 1890-1940,
na perspectiva de resgatar o algodão no mercado e levantar a economia foi seguido
de falências das fábricas. O terceiro ciclo, do babaçu no inicio do século XX, foi
considerado por Getúlio Vargas a salvação do Maranhão, por ser um produto com
100% de aproveitamento, todavia não alcançou os resultados esperados.
O quarto ciclo, contemporâneo, diz respeito à integração na economia
nacional e à implantação de investimentos públicos e privados no Estado a partir dos
anos 70, através de grandes projetos como a estrada de ferro de Carajás, da Cia
Vale do Rio Doce, instalação da Alumar fábrica de guserias de alumínio, pólo
graneleiro na região do baixo Parnaíba e a implantação da soja no sul do Maranhão,
na cidade de Balsas e centro de lançamentos de foguetes em Alcântara. Uma nova
etapa deste ciclo se desenha com a possibilidade de implantação em 2012 com
novos projetos no Estado como o da refinaria Premium da Petrobras em bacabeira,
da fabrica Suzano celulose e uma nova etapa do centro de lançamentos de
Alcântara, projeto Cyclone space com a Ucrânia.
Neste contexto o economista Holanda (2011) ressalta que a economia
maranhense exibiu uma taxa de crescimento acumulada no período de 2003 a 2010
de 61% ou de 7 % ao ano, trata-se de um excelente desempenho, mas ele ressaltar
que o dinamismo deveu-se a fatores que não dependem das condições internas à
economia maranhense mas sim das condições financeiras internacionais e da
condução da política macroeconômica nacional .
Parece-nos que os entraves citados por Gaioso (1970) e as bases frágeis citadas
por Tribuzzi (1981) permanecem na contemporaneidade no contraponto entre o
global e o local.
93
Dimensão política
3.2 O fenômeno do Coronelismo e patrimonialismo
Faoro (2001) reflete sobre o coronelismo e sobre o patrimonialismo
explicando que na supremacia estadual e da eleição sancionadora se insere o
coronelismo. Ele se irmana à oligarquia das unidades federadas, num recíproco jogo
de interações ativas.
O comando do sistema, afirma o autor, caberá ao governador, ao grupo
estadual isto é, ao grupo estadual por ele representado, intermediário de favores e
benefícios da união sobre a comunidade. Entre governador e coronel a relação é de
obediência, autoritariamente garantida pela milícia estadual e pelos instrumentos
financeiros e econômicos.
Esta relação se forma através de um sistema de reciprocidade, de um
lado os chefes municipais e os coronéis, que conduzem os eleitores e de outro lado
a situação política dominante no Estado, que dispõe do erário, dos empregos, dos
favores e da força policial, que possui em suma o cofre das graças e o poder das
desgraças. (Faoro,2001, pag 711)
Faoro (2001) explica que o patrimonialismo pulveriza-se, num localismo
isolado, de modo a converter o agente público num cliente, dentro de uma extensa
rede clientelista. O coronel utiliza seus poderes públicos para fins particulares,
mistura a organização estatal e seu erário com os próprios bens. Os coronéis não se
apropriam das oportunidades econômicas do município, pois há poucos recursos
nos municípios fracos que não possuem grande arrecadação financeira; poucos
cargos políticos a distribuir e as pequenas e esparsas obras, os coronéis se
alimentam das concessões de terras devolutas, entregues ao Estado desde a
república. São senhores de créditos e dos monopólios comerciais, que graças a
suas conexões políticas, enriqueciam com empréstimos e com a compra de safras
de pequenos sitiantes. O Estado do Maranhão vivenciou e vivência ainda oligarquias
políticas e o fenômeno do coronelismo.
Weber (1999) afirma que a dominação é um dos elementos mais
importantes da ação social, pois todas as áreas de ação social mostram-se
profundamente influenciadas por complexos de dominação e a dominação é um
94
caso especial de poder. Desta forma, o poder de disposição sobre bens econômicos
é uma conseqüência freqüentemente deliberada e planejada da dominação.
Para Weber (1999), dominação no sentido muito geral de poder, isto é,
de possibilidade de impor ao comportamento de terceiros a vontade própria, pode
apresentar-se nas formas mais diversas. A despeito de todas as formas de
dominação, o autor ressalta duas radicalmente opostas, a dominação em virtude de
uma situação de monopólio e a dominação em virtude de autoridade, poder de
mando e dever de obediência.
A dominação compreende uma situação de fato, em que a vontade
manifesta do dominador ou dominadores quer influencia as ações de outras pessoas
ou dominados.
3.2.1 O Estado do Maranhão na República Velha
Entre 1894-1930 a República oligárquica foi composta por governadores
civis ligados às oligarquias rurais de São Paulo, Minas Gerais e Rio grande do Sul.
De acordo com Cotrim (1999) os títulos de coronéis, mesmo depois de extinta a
guarda nacional em 1918 continuaram a ser usados pelos grandes proprietários de
terras na República Velha.
A Monarquia legou à república um Maranhão anêmico e cheio de dividas
(FERNANDES, 2003). Enquanto os Estados do Sul se beneficiavam pelas vias
férreas e pela imigração, os Estados do extremo norte não encontravam as mesmas
facilidades e investimentos. O mundo enfrentou a primeira Grande Guerra entre
1914-1918 com reflexos na economia mundial dando grande ênfase a
industrialização nos ramos da alimentação, veículos motores, farmacêuticos e
químicos, com impulso na exploração e aproveitamento do minério brasileiro,
centrando no eixo produtivo do País em Minas Gerais e São Paulo onde se situavam
todas as subsidiárias das indústrias americanas (PRADO JUNIOR, 1987).
Os investimentos esperados no Estado do Maranhão como a construção
da estrada de ferro São Luís-Teresina unindo as bacias dos rios Itapecurú e
Paraíba, a construção de estradas unindo os vales do Pindaré e Tocantins e o
incremento da navegação fluvial nunca chegavam e deixava o Estado à margem do
desenvolvimento. Fernandes (2003) afirma que havia um ciclo vicioso: o governo
não construía a via férrea porque o que o Maranhão produzia mal sustentava a
95
navegação fluvial e a produção não se movimentava porque o transporte era
péssimo. Exclusão e abandono caracterizavam o começo do século no Estado.
A estrada de ferro autorizada em 1905 começou a funcionar parcialmente
em 1919 e apenas em 1923 foi concluída a ponte Benedito Leite, complementando o
acesso da estrada de ferro à ilha de São Luís, atravessando o estreito dos
Mosquitos.
A situação financeira e econômica do Estado era precária. A indústria o
comércio, a navegação e a agricultura permaneciam sem avanços. A capital, São
Luís não dispunha de serviços básicos como esgoto, água, transportes nem
saneamento e já havia sido assolada pela peste e pela gripe espanhola. O Estado
encontrava-se falido e recorreu a dois empréstimos internacionais na tentativa de
resolver suas dificuldades.
Em 1907, o governador Benedito Leite solicitou empréstimo ao Banco
argentino-francês que foi utilizado em socorro à Companhia de Navegação a Vapor
do Maranhão, em obras de saneamento da capital, reformas de escolas e prédios
públicos. Não sendo suficiente, foi solicitado um novo empréstimo pelo Senador
Magalhães de Almeida em 1923, cujo objetivo era dotar a capital de condições de
salubridade, iluminação, abastecimento de água e esgoto, melhoria dos bondes que
constavam no programa de Governo de Dr. Godofredo Viana. A capital, São Luís,
com 50 mil habitantes não dispunha de serviços satisfatórios e suficientes.
A operação de crédito, no entanto, foi feita simultaneamente com o
contrato das obras com a empresa America Ullen & Company, de Nova York. Em
1926 e 1928 mais dois novos empréstimos foram feitos para a conclusão dos
serviços urbanos através da mesma Ullen Company, detentora do contrato de obras.
3.2.2 O Estado do Maranhão no Estado Novo do Governo Vargas: 1930-1945
O pensamento autoritário que entre as décadas de 30 e 40, proliferou no
Brasil tem suas raízes no fascismo italiano e no nacional-socialismo alemão, apesar
de florescer em condições histórico-sociais diferenciadas daquelas da Europa
(Caldeira, 1999). Esse pensamento interferiu na realidade brasileira seduzindo
grupos significativos de brasileiros.
96
Dentre os vários segmentos identificados com essa nova ordem, a Ação
Integralista Brasileira (AIB) foi, sem dúvida, o primeiro partido nacional com uma
organização de massa implantado no País. A Ação Integralista Brasileira (AIB)
(1933-1937) foi uma organização política que se expandiu no país, embora mais
concentrada em regiões do sul onde a imigração alemã e italiana foi expressiva. A
AIB, no entanto, se estendeu também pelas cidades do interior e do nordeste, que
eram maltratadas pela miséria e submetidas aos interesses do poder local e se
deixaram seduzir pelas novas fórmulas de catequização política até o seu
fechamento em 1937, por Getúlio Vargas.
Além destes aspectos, Caldeira (1999) em sua análise sobre a trajetória
da ação integralista no Maranhão entre 1933 e 1937 ressalta que o Maranhão era
um Estado onde o comando político tinha à sua frente lideranças cuja atuação
remontava a décadas anteriores. Eram chefes políticos fortes, comandantes, e os
integralistas aliaram-se a estas forças autoritárias. No Maranhão, o integralismo não
conseguiu envolver as massas devido aos baixos índices de industrialização e de
urbanização do Estado, bem como pela forte dominação de antigas lideranças.
Nesta época, o Estado do Maranhão de acordo com Anuário estatístico
do Brasil e com os dados coletados na pesquisa em diferentes fontes9 já havia
enfrentado várias epidemias, era deficiente de hospitais e grande parte da
população era pobre e vivia no meio rural. Em 1935 o Estado possuía cerca de hum
milhão de habitantes, sendo que setenta mil habitavam na capital, São Luís. Os
principais produtos econômicos eram o algodão e arroz e a atividade fabril contava
com quarenta e quatro fábricas (figura 12).
10
O historiador maranhense Meireles (1992) relata que apresentaram ao
ditador Getúlio Vargas um memorial preparado pela Associação Comercial do
9
Dados do IBGE, coleção da Associação Comercial-História do Comercio, livros raros e jornais da
Biblioteca Pública Benedito Leite em São Luís.
10
A coleção “História do Comércio no Maranhão” de 1612-1895, v. I e II – 1986-1934, edição fac
similar da Associação Comercial do Maranhão foi escrita pelo historiador Jerônimo de Viveiros
(1884-1965) e complementada pelo historiador contemporâneo Mario Meireles em seu volume IV.
97
Maranhão antes da revolução de 1932, quando de sua visita aos Estados do
Nordeste e do Norte. Vargas esteve em São Luís em 29/09/1931.
Figura 12 - Estatísticas populacionais
Fonte: Fundação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (1992)
O memorial subscrito por toda a diretoria da Associação Comercial do
Maranhão afirmava que: “estavam certos de que o governo central não faltaria com
o concurso de que carecia o novo delegado e interventor Antônio Martins de Almeida
para que pudesse alcançar o êxito na gestão da coisa pública e que haveria de
proporcionar os meios que libertariam o Maranhão dos compromissos da ordem
financeira que o atormentavam, pondo a salvo das dificuldades que vinham
minguando as suas fontes de riqueza, estiolando o trabalho da lavoura e jugulando o
desenvolvimento e a expansão econômica.
O memorial alertava para problemas como a baixa na produção de
algodão, arroz e babaçu; para a dívida externa decorrentes de empréstimos com a
França em 1912, como os EUA em 1928 e com o Banco do Brasil. Chamava a
atenção para os problemas das vias de comunicação para escoamento e circulação
de gêneros e mercadorias; para a inexistência de rodovias e existência de apenas
uma única estrada de ferro São Luis-Teresina em estado muito precário; mostrava
ainda a necessidade de drenagem e dragagem dos rios Itapecurú, Pindaré e Mearim
com intuito de assegurar a navegabilidade e insistia na necessidade de construção
98
do cais da alfândega e obras contra o assoreamento do Porto de São Luís ou até
mudança do mesmo.
As dificuldades encontradas à época no Estado, não foram resolvidas
pelo ditador e sequer pelos seus interventores. O Maranhão, neste período, teve
nove governadores discricionários. Meireles (1992) afirma que houve momentos de
muitas mudanças no governo marcado pela estagnação econômica e desequilíbrio
orçamentário. Posteriormente, as mudanças no governo ainda estariam por
acontecer. Com a indicação de Vargas, entre os anos de 1930 e 37 governaram o
Maranhão sete interventores, cujos mandatos foram marcados por conflitos políticos.
As medidas autoritárias da “era Vargas” iniciaram com a suspensão da
Constituição de 1891, o fechamento do Congresso Nacional, das assembleias
legislativas, das câmaras municipais e culminaram com a indicação de interventores
militares ligados ao tenentismo para chefiar os governos estaduais. Promulgada a
nova constituição a assembleia instalada em 1935 poria fim ao governo de
interventores e elegeria de forma indireta o Dr. Aquiles Lisboa (1935-36) e em
seguida foi indicado o interventor Paulo Ramos (1936-37).
3.2.2.1 O interventor Paulo Ramos: 1937-1945
Dentre os representantes de Getúlio Vargas que governaram o Estado do
Maranhão destacou-se o interventor Paulo Ramos que permaneceu no cargo entre
1937 e 1945, como Governador e interventor.
Paulo Ramos era maranhense, alto funcionário do Ministério da Fazenda,
advogado e homem de confiança do presidente Vargas.
Meireles (1992) explica que ele foi designado com a missão de acabar
com as crises políticas no Estado, constituindo uma nova correlação de forças, além
de controle financeiro, com contenção de despesas e aplicação racional de recursos.
No documento de Moraes Filho (1938), observamos no capitulo que trata
dos “Municípios e do Estado novo” que a constituição outorgada em 10 de novembro
de 1937 devolveu a autonomia aos municípios, que vinham sendo abandonados
pelo poder. Consta neste documento o retorno aos direitos à escolha de vereadores,
de cobranças de taxas e impostos e da organização de serviços públicos.
99
O documento reforça a ênfase dada pelo interventor Paulo Ramos às
questões relativas à capital em detrimento aos municípios do interior do Estado.
Observa também que a prioridade aos municípios do interior do Estado era dada de
acordo com a ação dos integralistas.
Dentre os princípios da administração de Paulo Ramos observamos o
tratamento que pretendia dar o chefe da nação sobre os principais e urgentes
problemas administrativos do Maranhão e das grandes reformas exigidas pelas
novas instituições políticas ou aconselhadas pelos seus preceitos os quais
impunham uma pronunciada compressão nas despesas públicas.
No relatório apresentado pelo interventor Paulo Ramos ao Presidente
Getúlio Vargas em 1939, Ramos (1939) afirma que quando assumiu o cargo em
1936 encontrou o Estado em condições adversas, além dos efeitos das lutas
partidárias, das crises políticas havia os fatores negativos, dentre eles os municípios
do sertão estavam abandonados e esquecidos.
Ramos (1939) ressalta que no discurso proferido em 1933 por Getúlio
Vargas, o presidente afirmava que agora era a “hora do Maranhão”. Este discurso foi
proferido durante uma viagem aos estados do Norte quando Vargas conheceu de
perto as condições econômicas e sociais das várias unidades da federação e
estabeleceu que as prioridades do governo estivessem no desenvolvimento
econômico, no equilíbrio financeiro, na solução dos problemas dos transportes, da
justiça, instrução, saúde, agricultura, pecuária e segurança pública.
A situação geral econômica do Estado do Maranhão é freqüentemente
relatada nos jornais da década de 3011 que denunciam uma situação de decadência
do Estado:
É incontestável a decadência econômica do Maranhão. Estado dos mais
ricos da união, não oferece, entretanto possibilidade imediata de
alevantamento. A linguagem iniludível das realidades sociais empolga e
convence muito mais do que os mais derramados artigos deste jornal.
Estudar a questão do nosso esplendor e da nossa decadência econômica é
tarefa, assa árdua, porque obriga a um recuo bem longo na nossa história
(LOPES, 1937, p. 1).
Nesse período de decadência, “Alcantarizar-se” virou, sinônimo de
abandono, arruinamento, destruição e tristeza, uma espécie de reflexo da crise do
11
Acervo de obras raras da biblioteca Pública Benedito Leite, em São Luís. Jornal Diário do Norte,
abril de 1936-37, tendo como Redatores chefe: Antonio Lopes.
100
Estado do Maranhão observada na Capital. As políticas públicas enfatizavam a
renovação urbana da capital em detrimento aos municípios do interior do Estado.
São Luís é uma cidade de poucas alegrias. Decadente e triste, a nossa
capital alcantariza-se de dia para dia. Vivendo entre ruínas, o maranhense
quer, no entanto ter alma nova sente a inevitável e linda alegria de viver. Os
Escombros não fazem bem a todas as ânsias moças da vida. Mas, como
procurar fugir do espetáculo de tristeza e desolação de nossa cidade.
Marchamos e nisto esta o nosso progresso para uma “Alcantarização” [...]
(Diário do norte, 1936).
Observamos no relatório de Ramos (1939, p. 77), relativo ao
Departamento da municipalidade sobre as prefeituras do interior que:
[...] as cidades estavam abandonadas ao seu próprio destino durante quase
meio século, as nossas municipalidades ao rebentar a revolução de
outubro, encontravam-se em precária situação em que sempre estiveram
desde a queda do império. De quem é a culpa? Dos seus administradores?
Em parte, mas principalmente da extrema liberdade da carta constitucional
de 91 que concedeu aos municípios menos preparados a mesma autonomia
dos grandes Estados.
3.2.2.2 Renovação urbana de São Luís e o abandono do interior
No Governo do interventor Paulo Ramos houve uma grande mudança no
perfil da capital do Estado, São Luis, entre a década de 30 e 40. Este arrojado
projeto de acordo com o historiador Meireles (1992), inicialmente foi um plano do
conceituado técnico da secretaria de Viação e Obras do Distrito Federal que o
governador Ramos importou do Rio de Janeiro. O jovem urbanista era o engenheiro
Otacílio Sabóia Ribeiro12 (1899-1967) que foi prefeito da cidade de São Luis em
1936 e que tinha um plano de transformar a velha capital maranhense de perfil
colonial com ruas estreitas em uma cidade de feição moderna, retilínea, com
avenidas largas e espaçosas.
Em mensagem a Câmara municipal depois de empossado prefeito assim
se manifestou: Chamado a esta cidade, aqui cheguei com o mais sincero otimismo,
trazendo a decidida vontade de romper com a rotina que estava conduzindo a
cidade a uma ruína muito próxima. ( Marques,2008,p.653):
O prefeito Otacílio criou uma comissão para elaborar o plano da cidade,
integrada por figuras representativas da sociedade com vistas à remodelação a
12
José Otacílio Sabóia Ribeiro foi atuante urbanista brasileiro. Em 1937 ingressou como professor na
cadeira de urbanismo da Faculdade Nacional de arquitetura da Universidade do Brasil.Ocupou o
cargo de coordenador do curso de urbanismo.www.urbanimso.br/org
101
capital, mas não foi bem entendido por alguns setores expressivos da sociedade,
sobretudo a Associação comercial que desencadeou contra ele uma campanha
difamatória. Diante da apresentação à Câmara dos recursos necessários à obra, que
eram superiores a possibilidade do erário, houve uma grande polemica que culminou
na exoneração do prefeito do cargo.
Marques (2008, p.653) explica que na realidade houve reação contra os
custos e impostos gerados, pois a Prefeitura, para fazer face as despesas das
obras, principalmente as viárias, com base na constituição de 1934, criou mais
tributos e aumentou impostos.
Parte deste plano foi executada pelo seu sucessor o Prefeito Pedro Neiva
de Santana que administrou São Luis entre 1937 a 1945, até o final do período da
gestão do interventor Paulo Ramos. Em sua gestão Santana promoveu obras de
relevância urbanística .
Na revista Athenas13, de 1940, podemos observar as imagens das obras
de modernização da capital São Luís, à época em que Paulo Ramos era interventor
(figuras 13A e B e 14). Nelas, se encontram respectivamente: o Quartel 24 Batalhão
de caçadores; o Palácio do comércio (hoje Hotel Central) e Palácio da educação
atual Liceu Maranhense.
Figura 13a - Palácio do Comércio (A) e Palácio da educação (B)
Fonte: Imagens e postais da revista Athenas, 1941
13 s
Revista Athenas, junho de 1941, n . 23-30. Acervo de periódicos da Biblioteca Nacional do Rio de
janeiro.
102
Figura 13 - Palácio do Comércio (A) e Palácio da educação (B)
Fonte: Imagens e postais da revista Athenas, 1941
Figura 14 - Monumentos modernos, postal de natal
Fonte: Acervo do Museu de Artes Visuais do Maranhão
Esta renovação urbana no centro de São Luís feita com muitas
demolições na busca pela “imagem moderna da cidade” foi Influenciada pelas idéias
higienistas das renovações urbanas executadas pelo prefeito Haussmann, de Paris
e pelas obras da abertura da avenida central no Rio, na gestão de Pereira Passos,
cidade onde o governador Paulo Ramos trabalhava como funcionário do Ministério
da Fazenda, antes de assumir o governo do Maranhão.
103
Hoje as novas estratégias de reabilitação de centros históricos evitam as
demolições de estoques urbanos existentes promovendo o aproveitamento e
integração dos prédios. A prática da demolição muito comum no início do século tem
sido substituída por uma visão da conservação urbana integrada. De acordo com a
Carta de Lisboa renovação urbana é uma ação que implica na demolição das
estruturas morfológicas e tipológicas existentes numa área urbana degradada e sua
conseqüente substituição por um novo padrão urbano, com novas edificações
atribuindo uma nova estrutura funcional a essa área. Desta forma todo o padrão da
arquitetura tradicional foi substituído na avenida pela linguagem arquitetônica
vigente que refletia a chegada do moderno através do eclético e do art déco (Carta
de Lisboa, 1995).
Em São Luís, uma das principais obras realizadas por Paulo Ramos e
Pedro Neiva de Santana foi a abertura da Avenida chamada 10 de Novembro que
posteriormente faria homenagem a José Maria de Magalhães de Almeida oficial da
Marinha, deputado, Senador e Governador do Estado (figura 15).
Figura 15 - Postal da construção da Avenida Magalhães de Almeida em São Luis
Fonte: Acervo do Museu de Artes Visuais do Maranhão
104
As obras promovidas na capital pelo prefeito Pedro Neiva de Santana
foram a triplicação em largura da Rua do Egito até o largo do Carmo, rumo ao norte
até a Avenida Beira Mar e a abertura da Avenida Magalhães de Almeida, rasgada
em diagonal conforme podemos observar no mapa abaixo de 1950. A ligação do
centro com os novos bairros seria feita posteriormente pela Avenida Getúlio Vargas
onde exemplares da nova arquitetura como “bungalows” e casario eclético e
moderno se mesclariam com a tradicional arquitetura colonial luso brasileiro do
centro histórico de São Luis. O nome da nova avenida foi uma clara homenagem ao
Governo Vargas
A mudança do traçado na planta ortogonal de São Luís pode ser
observada na cartografia do século XX, nos mapas de 1912 e 1950. Podemos notar
o eixo diagonal de abertura da nova Avenida Magalhães de Almeida (figuras 16 e
17).
Figura 16 - Planta de São Luís em 1912 – Justa Jansen
Fonte: Marques (2008)
105
Figura 17 - Planta de São Luís em 1950, detalhe para a diagonal da Avenida Magalhães
Fonte: Álbum Miércio Jorge, acervo BPBL
Enquanto a capital São Luís, se modernizava, os municípios do interior,
excluídos do processo de industrialização entravam em decadência econômica e
isolamento.
Este foi o caso de Alcântara, cujo processo de isolamento foi analisado
pelos consultores internacionais da Organização das Nações Unidas para
Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) que em visita técnica a São Luís e
Alcântara. Eles alertavam o processo de fragilidade urbana e econômica e
desconexão dos mercados nacionais e regionais de Alcântara e da necessidade de
tombamento para preservação do conjunto em franco estado de arruinamento.
A governança do Estado, conforme Meireles (2001) afirma, estava ligada
as classes empresariais e em mãos de figuras exponenciais do Estado Saturnino
Belo e Francisco Aguiar, de firmas exportadoras bancos e fabricas Sebastião Archer,
de Codó, chefe da Companhia Manufatureira Agrícola e Eugenio de Barros dono da
fábrica Sanharó.
A produção agro-industrial maranhense do final do século XIX alternava-
se em concorrências, sendo superada pelo mercado internacional que era um
grande entrave para os focos do progresso de pouca durabilidade, articulado pela
106
transição do escravismo para o assalarialismo, onde o Maranhão gradativamente
perdia posições no contexto brasileiro.
O declínio da economia maranhense no final do século XIX acarretou em
último momento na formação do parque industrial, visto que a aristocracia rural
necessitava urgentemente de uma nova atividade que transformasse o panorama da
crise ocasionada pela falência em massa dos engenhos e fazendas algodoeiras.
O investimento na transferência de atividade impulsionou um crescimento
periódico baseado nas indústrias de pequeno e médio porte voltados para a
produção de bens de consumo: calçados, produtos têxteis, fósforo, pregos, etc.
A inexistência de um setor agrícola forte, principalmente algodoeiro, assim
como a falta de industria de base, o frequente êxodo rural e a venda de grandes
propriedades rurais a preços baixos ocasionou a crise do parque fabril, pois a euforia
da indústria, além de passageira, impulsionou o aumento da dependência
econômica do Estado, bem como sua decadência frente ao restante do pais, pois
muitas fábricas, não saíram da planificação deixando, portanto, uma parcela da
indústria têxtil como responsável pela manutenção da economia local.Fragilizada a
economia fabril, dependia exclusivamente das flutuações do mercado internacional e
das pequenas quedas dos seus concorrentes, por consequência sobrevive até a
metade do século XX. É neste contexto, após os ciclos do algodão, do açúcar e do
arroz que surge o babaçu como esperança de renascimento da economia
maranhense.
3.2.3 Vitorino Freire e Sarney
Em 1945, o governo Paulo Ramos entra em franca desvantagem face ao
desprestigio do Governo Vargas o que acarretaria na sua renúncia na interventoria
do Estado dando assim a oportunidade de surgimento de uma nova força política,
que se consolidaria pelos próximos 20 anos, denominada Vitorinismo.
14
Cabral explica que Paulo Ramos não foi bem sucedido na montagem de uma
engrenagem que lhe desse sustentação política após a queda do Estado Novo,
tendo renunciado ao cargo e ingressado no PTB. A saída de cena do ex-interventor,
14
Cabral, Wagner .crises políticas e estratégias periféricas no Maranhão 1945/1970. In www.fundaj.gov.br
Professor da Universidade federal do Maranhão.
107
junto com outros fatores, permitiu a ascensão à chefia política estadual de Victorino
Freire.
Victorino Freire nasceu em Pernambuco, onde, na condição de tenente, apoiou o
golpe de 1930. No Maranhão, sua história começa em 1933, quando assume a
chefia do gabinete do interventor Martins de Almeida, cumprindo funções
burocráticas. organizar o Partido Social Democrático (PSD) com vistas às eleições
de outubro de 1934 . Depois de uma fracassada tentativa de eleger parlamentares,
no âmbito federal e estadual, viaja para o Rio de Janeiro, a convite do presidente
Getúlio Vargas, para assumir um cargo na Câmara Federal e exercer o posto de
Ministro da Viação e Obras Públicas.
Ele remete verbas ao Estado e nomeia aliados para cargos estratégicos. Victorino
Freire, retorna ao Maranhão na década de 40, a fim de articular a campanha do
candidato a presidente, Eurico Gaspar Dutra, seu amigo pessoal. É nessa década
que Victorino monta a sua trajetória rumo ao poder, exercido até meados da década
de 60, quando José Sarney assumiu o controle do Estado. A ascensão de Victorino
está vinculada às benesses que recebe do governo federal; a ausência de um grupo
político que lhe fizesse oposição; bem como a sua articulação política em torno do
principal partido nacional, o PSD.
De acordo com Zulene Barbosa15 em seu artigo sobre “as temporalidades da política
no Maranhão” a liderança de José Sarney foi associada ao domínio político de
Vitorino Freire, chefe oligárquico que controlou a política maranhense entre 1946 e
1965. Membro da chamada geração 50, Sarney tornou-se o candidato das
oposições coligadas pela UDN (partido que, mais tarde, deu sustentação ao
movimento militar de 1964), combatendo o Vitorinismo.
A pesquisadora afirma que o grupo Sarney e seu projeto de dominação na política
regional e local, estão vinculados ao discurso de modernização econômica desde
1965. A base ideológica desse projeto foi construída sob o mito do passado de um
Maranhão de prosperidade. Personalizando o projeto de um “Maranhão Novo”, José
Sarney iniciou sua trajetória no comando da política maranhense.
15
Barbosa ,Muniz Zulene . As temporalidades políticas do Maranhão, in www.pucsp.br/neils.
professora da Universidade Estadual do Maranhão
108
4 ALCÂNTARA : Apogeu e Declínio
“[...] Você sabe melhor do que ninguém, sábio Kublai, que jamais se deve
confundir uma cidade com o discurso que a descreve. Contudo, existe uma
ligação entre eles [...] (CALVINO, 2002, p. 59).
Foto 1 - Imagem das ruínas do Imperador, em Alcântara
Fonte: Marcio Vasconcelos, em 2010
Este capítulo faz uma narrativa sobre o apogeu e declínio da cidade de
Alcântara, com foco no século XX, na perspectiva de construir uma cronologia para
compreender as temporalidades históricas, organizando por datas as informações
coletadas na pesquisa empírica. Aborda brevemente o século XVIII, momento de
apogeu da cidade para depois tratar das razões de seu declínio. No século XX
,inicia-se a narrativa a partir do relato de 1904 dos médicos Victor Godinho e o
Adolpho Lindenberg que comparam o abandono da Rua da Amargura de Alcântara
às ruas de Pompéia, devastada pelo Vesúvio na Itália. Mesmo considerando as
109
diferentes causas e temporalidades, a metáfora utilizada serve para ilustrar o
arruinamento visto pelo viajante.
Entre 1904 e 1906 há as imagens inéditas das ruínas de Alcântara que
ilustram os textos da “Revista do Norte”; em 1908 as fotografias de Cunha (1987),
produzidas para Exposição Nacional do Rio de Janeiro com os monumentos que
restavam da cidade já decadente, omitindo as ruínas; em 1912 o relato das
impressões do viajante francês Paul Walle; em 1927 os debates no jornal “O
Imparcial” sobre a demolição das ruínas e de 1936 sobre a “alcantarização” da
capital, quando a cidade passa a ser então, sinônimo de ruínas.
Em 1948, o decreto de tombamento de Alcântara em patrimônio nacional
demonstra o claro interesse na preservação e é seguido em 1950 da decisão de
transformação do principal edifício da cidade em presídio de segurança máxima.
Dados da enciclopédia dos Municípios de 1950 e do álbum de Miércio Jorge
contextualizam este período de estagnação econômica e social.
Constatamos na pesquisa realizada no acervo de obras raras da
Biblioteca Pública Benedito Leite em São Luís16 que em Alcântara o processo de
decadência foi intenso, contextualizada pela falência dos ciclos econômicos do
Estado, do algodão, cana de açúcar, das fábricas e até do babaçu. Mas não
podemos omitir que este processo foi também reforçado pelas decisões políticas e
pela existência de um discurso recorrente dos intelectuais e técnicos sobre o
declínio da cidade de Alcântara.
4.1 Alcântara: antecedentes da decadência
A história social, econômica e política de Alcântara foi contada pelos
autores maranhenses Viveiros (1999) e Lopes (1957) e Lima (1998). No inicio era
Tapuitapera, a aldeia dos índios tapuios que exerceu importante papel na conquista
do Maranhão nos primórdios da colonização.
A aldeia Tapuitapera recebeu a visita dos franceses que já percorriam a
costa do Maranhão desde o século XVI e fundaram a cidade de São Luis em 1612,
no intuito de concretizar o sonho da França Equinocial e dos holandeses em 1646,
16
Revista do Norte e Jornal “O Estado do Maranhão‟ e “O Imparcial” de 1904 a 1910, 1927- 30-40 e
1970” do setor de obras raras da Biblioteca Pública do Estado do Maranhão.
110
dois anos antes de fundação da vila de Alcântara, período que invadiram a capital
São Luis entre 1640-46, conforme nos conta Lopes (1957, p.169-173).
Figura 18 - Mapa do Maranhão em 1631 de João Teixeira Albernaz
Fonte: Mapoteca do Itamaraty – RJ
Por sua localização estratégica, guardando a Baía de São Marcos no lado
oposto à São Luis, a vila religiosa foi fundada pelos portugueses em 1648, com a
denominação de Santo Antônio de Alcântara, sede da capitania de Cumã.
Implantada num promontório, instalou na praça principal o pelourinho e câmara
municipal símbolos da coroa portuguesa.
A transição do século XVII para o XVIII é marcada pela presença dos
agentes da formação histórica: as ordens religiosas, os índios e a coroa portuguesa,
concretizando as disputas pela ocupação do território. A Villa eleita em 1648 segue
até 1700 sem grandes transformações, com sua pequena estrutura em torno das
edificações religiosas. A vila viveu seu apogeu no século XVIII, quando foi a sede da
aristocracia agro-exportadora do algodão,
O século XVIII será um momento do apogeu econômico e social com a
ascensão da aristocracia rural agro-exportadora de algodão impulsionada pela Cia
Grão Pára- Maranhão, trazendo mudanças à estrutura urbana da Vila de Santo
111
Antonio de Alcântara. O modelo urbano e arquitetônico adotado foi o alçado
Pombalino17que foi um padrão arquitetônico estabelecido pelo Marques de Pombal
na reconstrução de Lisboa após o terremoto de 1755.
O esforço desta reconstrução significou um marco de mudança no
planejamento urbano da Colônia com profundas influências no traçado a na
arquitetura das vilas e cidades do Brasil do século XVIII. Este planejamento urbano
pode ser observado no mapa de 1755, onde percebe-se a transformação da aldeia
indígena e religiosa na Villa estruturada com seus eixos de crescimento. Ruas e
quadras configuram o traçado urbano .
Figura 19 – Planta da Vila de Alcântara 1755,
Fonte: REIS Filho, Nestor Goulart. 2000
Na metade do século XIX, de acordo com Viveiros (1992), trabalhavam na
freguesia principal e outras do município de Alcântara sete a oito mil escravos e
moviam-se quinze engenhos de açúcar, cento e vinte fazendas de lavoura de
mandioca, arroz, fumo, algodão e outros gêneros e umas quarenta fazendas de
17
Pelouro da Reabilitação dos núcleos históricos. Câmara municipal de Lisboa. 1993. Pág. .32-34 in O terremoto e a Lisboa
iluminista.
112
gado. Até meados de 1880, a cidade era próspera. Com a abolição dos escravos e a
mudança dos mercados produtores e exportadores no final século XIX, a cidade
entra em declínio. A elite se transfere para a capital, São Luís, abandonando seus
engenhos e fazendas.
Porém, nas décadas seguintes, vários fatores históricos irão impulsionar o
inicio da decadência de Alcântara. Durante a primeira metade do século XX, a
cidade permanece em estado de letargia. Não houve projetos ou atuação políticas
no sentido de reverter a estagnação sócio-econômica que tantos reflexos trazia para
o tecido urbano. Seus edifícios sofrem um processo de arruinamento decorrente,
não somente do abandono, como também do vandalismo da população
empobrecida.
Diante deste quadro de fragilidade e vulnerabilidade do patrimônio
construído de Alcântara o IPHAN decide em 1948 tombar o conjunto histórico da
cidade. No entanto, as políticas públicas estaduais e federais não contribuíram para
o incremento econômico da cidade nem para reversão do estado de conservação
dos imóveis. A decisão de instalar o presídio de segurança máxima do Estado do
Maranhão entre 1959 e 1965 acentuou sua exclusão e arruinamento.
Alcântara também foi excluída do ímpeto industrial (1890-1960) do Estado
do Maranhão e o modelo de governos autoritários do Estado do Maranhão também
se reproduziu na cidade por décadas e não levaram novos investimentos nem novas
perspectivas econômicas ao município.
Os entraves citados por Gaioso (1970) que foram responsáveis pela
decadência da lavoura no Estado do Maranhão são percebidos no processo de
decadência econômica e social de Alcântara, uma vez que a aristocracia rural não
se preparou no período da prosperidade para as dificuldades. A falta de braços, de
técnicas alternativas para a produção e a falta de terras permanecem no século XIX
e XX como entraves de uma sociedade rural centrada na monocultura. A elite ficou
absorvida em disputas políticas partidárias e não formou sua população para a
pratica rural. Posteriormente a industrialização não atinge esta região e a falta de
imigrantes na região devido ao clima, desestimula as novas colônias configurando
novos entraves ao desenvolvimento da região.
113
4.2 A Elite Alcantarense :Fidalgos e Barões
Viveiros (1999, p. 92-93) explica que Alcântara teve forte influência
política no Senado. Durante os 63 anos de duração do Senado as províncias foram
representadas por 229 senadores sendo cinco oriundos da cidade de Alcântara,
portanto 38% do total.
No conselho da Coroa, Alcântara teve dois representantes: Gomes de
Castro e Franco de Sá. Ao baronato foram elevados quatro alcantarenses: Barão de
Mearim (1849), São Bento (1853); Pindaré (1854) e Grajaú (1884). Segundo o autor
o domínio dos alcantarenses era tanto que se falecesse algum dos senadores pelo
Maranhão, seria privilégio de Alcântara escolher um dos seus para substituto.
Os filhos dos aristocratas alcantarenses estudavam em Coimbra, em
Paris e na Filadélfia. Esse movimento favoreceu a formação de uma elite cultural
qualificada em universidades européias e americanas e que retornava para o Estado
e acabava por exercer grande influência política e social.
Em alguns casos, a formação obtida não se adequava às atividades
agrícolas e rurais dos engenhos e casas grandes. Exemplo disto foi o Barão de
Pindaré, Antonio Pedro da Costa Ferreira (1778-1860) que cursou humanidade em
Coimbra e voltou à Alcântara para administrar a fazenda do pai, mas acabou sendo
um dos arautos do movimento da independência no Maranhão. Foi também senador
pela Regência Trina e a Coroa concedeu-lhe o titulo de Barão em 1854. Outro caso
semelhante foi o de Francisco Mariano de Viveiros Sobrinho (1819-1860) que
doutorou-se em matemática em Coimbra. Regressando entrou nas lutas políticas e
foi agraciado pelo Imperador, em julho de 1836, com o titulo de o Barão de São
Bento com o foro de fidalgo cavalheiro da casa imperial. Constatamos, portanto, que
inadequação à vida rural levou os aristocratas a desempenharem papéis políticos
fora de Alcântara e a se afastarem das questões locais.
Essa elite era sustentada pelos engenhos, salinas e plantações de
algodão movido pelo trabalho escravo. Segundo Moraes Filho (2000), os
descendentes das antigas famílias da província, a quem pertencia o monopólio do
comercio, não herdaram as características empreendedoras de seus ancestrais. O
autor defende ainda a tese de que uma das causas da decadência da economia foi
114
porque grande parte destes descendentes da aristocracia não entendia nada de
lavoura e de criação.
As lutas políticas também eram fortes entre os dois partidos políticos: o
partido liberal e o partido conservador que dividiam as famílias alcantarenses, com
profundas incompatibilidades políticas.
A partir de 1890 com a proclamação da república e a decadência econômica,
a elite já desconectada das questões locais abandona de vez a cidade. As
propriedades privadas no interior do município de Alcântara foram doadas para ex-
escravos, sendo nomeadas as “terras de preto” e as terras religiosas que foram
abandonadas ainda hoje são nomeadas como “terras de Santo”.
4.3 A não-industrialização /A não-imigração
Dentre os fatores que contribuíram para a decadência da cidade, além da
abolição dos escravos, atribui-se que o maior deles foi o incremento da indústria
açucareira da província. O ciclo tardio do açúcar em Alcântara, também não
consolidou transformações econômicas. A elite dominante abandonou suas terras
mudando-se para a capital e lavouras foram migrando para outras cidades às
margens do Rio Itapecurú mais adaptadas ao plantio.
As terras alcantarenses eram muito arenosas, próprias à plantação de
mandioca, milho, batatas e feijão, mas impróprias para o cultivo do arroz e da cana.
A lavoura canavieira encontrou seu habitat natural nas margens dos rios Mearim,
Pindaré e Itapecurú incentivados pela navegação fluvial a vapor que favoreceu a
movimentação da produção.
Desta forma o eixo de produção maranhense se voltou para o Vale dos
Rios Itapecurú e foram eleitas outras cidades, como Caxias, para sediar as novas
fabricas.
Alcântara não consegue neste período superar os entraves e fica excluída
da rede agro exportadora e comercial. O ímpeto fabril (1890-1960) não chegou à
cidade de Alcântara, embora o município tenha sido um grande produtor de algodão.
Além do Algodão, Marques (2008) registra a existência de pequenas culturas, tais
como: as salinas que restaram dos jesuítas, pequenas fábricas caseiras de velas de
115
ceras, olarias do tempo dos carmelitas e também a fabricação de redes fortes e
panos grossos de algodão.
Em 1891 houve uma tentativa fracassada para salvar a economia da
cidade e incentivar a implantação de uma fábrica. O “Diário do Maranhão” registrou
a fundação de uma fábrica de fiação e tecidos alcantarenses, mas o projeto não foi
realizado e a fábrica nunca chegou a funcionar. No dicionário Histórico e geográfico
18
do Maranhão, (MARQUES, 2008) há uma transcrição de um artigo do jornal
maranhense de 1892 com o apelo pela instalação de uma fabrica em Alcântara:
[...] Como vimos nos jornais desta capital a noticia de que alguns
capitalistas da cidade do Pará pretendem montar uma fabrica de fiação e
tecidos de algodão nesse Estado, vamos lembrar-lhes essa velha cidade de
Alcântara, onde ainda há alguns prédios que se compram barato, havendo
muitas pedras das casas demolidas para a construção da dita fábrica./Além
do perímetro dessa cidade há a fonte pública da Mirititiua, e o pitoresco sítio
de Nazaré, onde há abundância de água, e portos de embarque com todos
os cômodos./temos pessoal para custear qualquer fábrica e muitas famílias
que ficaram reduzidas à miséria com a lei da abolição terão onde ir ganhar o
pão. Aqui, além de termos os materiais baratos, o clima é saudável e o
passadio é mais barato do que na capital, onde já há tantas fábricas de
fiação e tecido./acresce ainda para cá uma grande vantagem que o algodão
produzido em Pericumã, Pinheiro e Santo Antonio das Almas é remetido
para a capital com escalas por aqui. Esta cidade, que outrora já foi
importante, pode ainda reviver com o estabelecimento de algumas fabricas,
não só porque esta situada perto da capital, como porque tem ótimo porto e
está colocada numa península possuindo bons terrenos para o plantio de
algodão (MARQUES, 2008, p. 99).
O município de Alcântara era um dos mais pobres, segundo consta no
relatório teve como receita em 1937 de 19$300 e em 1938 de 21$960, observou
abaixo o quadro de receitas, do Estado onde se constata que a situação precária
econômica do município (RAMOS, 1938) (quadro 1).
Arrecadação dos
Valor
municípios em 1936
Alcântara 17:500$00
Bacabal 119:000$00
Araioses 118:000$00
18
Verbete Alcântara p. 91 a 104- Jomar Moraes, historiador e presidente da Academia Maranhense
de Letras reeditou o Dicionário Cesar de Moraes (2008). verbetes e notas auxiliares. Este
dicionário só possuía duas edições de 1870 e 1970.
116
Caxias 353:000$00
Codó 185:000$00
Coroatá 185:000$00
Pedreiras 101:000$00
Quadro 1 – Valores da arrecadação dos municípios em 1936
Fonte: Ramos (1936)
Outro fato importante que consta no relatório era que o interventor Paulo
Ramos apostava no Babaçu como esteio econômico. Ramos (1939) afirma no
relatório: “estar convencido de que o babaçu transformaria o Maranhão no mais
prospero Estado do Brasil”. No ano de 1936-38 a exportação do produto já superava
o algodão. A economia dos pequenos empreendedores resistia na tentativa de
novas alternativas econômicas como o Babaçu, o sal e outras culturas menores
(quadro 2).
Exportação em 1936 Exportação em 1938
Algodão 27.856 kg Algodão 27.856 kg
Babaçu 414.122 kg Babaçu 414.122 kg
Arroz 159.00 kg Arroz 159.00 kg
Quadro 2 – Comparativo das exportações de 1936 e 1938
Fonte: Ramos (1936)
No arquivo público do Estado do Maranhão, encontramos um caixa de
documentos encaminhados a Coletoria Federal de Alcântara em obediência ao
artigo 111 do regulamento do “Imposto de consumo” da época que obrigava
pequenos produtores a relatarem seus lucros ou prejuízos em 1938.
Nesta documentação, há relatos da produção de 2000 kg de sal, além
pequenas produções de açúcar pelos engenhos ariquipá e santa estela e engenho
São Luís. O que comprova a existência dos pequenos empreendimentos na tentativa
de subsistir economicamente após a decadência do algodão.
O Instituto Nacional do Sal foi organizado por lei federal em 13 de maio de
1957: conforme decreto abaixo:
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA faz saber que o CONGRESSO
NACIONAL decreta e sanciona a seguinte Lei que denomina Instituto
Brasileiro do Sal, dando-lhe nova organização:
Art. 1º O Instituto Nacional do Sal (I.N. S), que passa a denominar-se
Instituto Brasileiro do Sal (I.B.S.), entidade autárquica com personalidade
117
jurídica e patrimônio próprio, sede e fôro na Capital Federal, sob a jurisdição
do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio e com jurisdição em todo o
território nacional, é o órgão da intervenção do Estado na economia
salineira. Com objetivo de organizar os registros das salinas, dos
produtores, rebeneficiadores, exportadores do sal e dos estabelecimentos
da indústria de transformação de sal; b) assegurar o equilíbrio da produção
de sal com o seu consumo; c) manter a estatística da produção, do
consumo, dos preços (BRASIL, 1957, não paginado).
4.4 Narrativas da decadência
Em fragmentos para a chorografia do Maranhão, Justo Jansen Ferreira
ressalta que em 1901, Alcântara era uma cidade muito bem edificada, embora seus
edifícios estejam “em ruínas possuem importantes e numerosas salinas ao longo da
costa, constituindo a exportação de sal a sua principal riqueza.” (ALCÂNTARA,
1980, p. 57).
Em 1904, os médicos sanitaristas Victor Godinho e seu assistente
Adolpho Lindenberg relatam uma visita a cidade Alcântara e comparam a rua da
amargura às ruas da cidade de Pompéia na Itália (GODINHO; LINDENBERG, 1906).
Este relato é de extrema importância por ser rico em detalhes e porque ambos
estavam preocupados em compreender a situação da decadência de Alcântara e
sua história, observando, pois todos os detalhes urbanos.
Os médicos do serviço extraordinário de higiene de São Paulo vieram ao
Maranhão a pedido do senador Benedito Leite e do Governador do Estado, Coronel
Alexandre Collares Moreira para tratar da peste que assolava o Estado e que atingia
mais de 10.000 mil habitantes. Notavam os médicos o mais profundo desânimo no
espírito da população no que dizia respeito à peste, sendo que mais de 10.000
pessoas se refugiaram no interior do Estado. Como resultado deste período,
Godinho (1904) escreveu um livro-relatório intitulado com uma série de medidas
higienistas para evitar que a peste se alastrasse pelo Estado.
Encontramos referência deste relato nas pesquisas realizadas pelo
arquiteto Pedro Alcântara, que sistematizou para o IPHAN todos os relatos relativos
à cidade em sua cuidadosa pesquisa sobre a cidade na década de 60 e
encontramos o original na biblioteca do IHGB do Rio de Janeiro.
Os médicos viajantes narram num tom dramático a impressão causada
pelas ruínas da Rua da “Amargura” de Alcântara comparando-as com as ruas da
cidade italiana de Pompéia devastada pelo Vesúvio. Respeitando as diferentes
118
temporalidades achamos muito pertinente a comparação estabelecida pelo médico
que confirma a impressão de cidade morta.
A narrativa chama atenção para o processo urbano do arruinamento.
Vejamos que no início do relato eles afirmam
[...] Não que a cidade velha e arruinada não mereça ser visitada... Mais
adiante afirmam que [...] A ruína é beleza encantadora, mesmo com a
sensação cruel de abandono, do silêncio e constatando que a verdadeira
ruína ainda estava por ser vista [...]. Eles iniciam a visita acompanhados
pelo guia e constatam as ruínas da igreja das Mercês onde relatando a
visão do frontispício da igreja, hoje inexistente e desconhecido (GODINHO;
LINDENBERG, 1906).
Os médicos refletem sobre a decadência “[...] Granitos e mármores
atestam a sua passada grandeza e tentam ainda compreender os motivos... Não foi
cataclismo como Herculano e Pompéia, mas um acidente como Tiro e Cartago”, e se
despedem, vendo ao longe a luz branca do farolete da necrópole. Como forma de
ilustração desta visita podemos citar as imagens da revista do Norte que
encontramos no acervo da Biblioteca Pública (fotos 2 e 3) (GODINHO;
LINDENBERG, 1906).
Foto 2 - Rua da Amargura, em 2007 (A) e de Pompéia, em 2008 (B)
Fonte: Pflueger, G
Foto 3 - Rua da amargura
Fonte: Marcio vasconcelos, em 2010
119
É interessante pontuar neste momento, as primeiras imagens das ruínas
19
de Alcântara que surgiram na “Revista do Norte” de 1901 e 1905 (figura 16). Esta
importante publicação trazia muitas ilustrações de artigos com as ruínas de
Alcântara. As fotos dos palacetes arruinados ilustravam vários artigos sobre a
falência econômica no Estado (fotos 4 a 5).
Foto 4 – Ruína dos interior da Igreja das Mercês (A) e ruína da Rua da Amargura (B)
fonte: Revista do Norte reproduções de Francisco Otoni, em 2007, acervo Biblioteca Publica
Benedito Leite em São Luis
Foto 5 - Rua Grande e ruína da Igreja Matriz
Fonte: fonte: Revista do Norte reproduções de Francisco Otoni, em 2007,
acervo Biblioteca Publica Benedito Leite em São Luis
19
Revista do Norte de 1901 a 1905, acervo de obras raras da Biblioteca Pública Benedito Leite. São
Luís-MA.
120
As imagens demonstram que já na primeira década do século XX o
estado de arruinamento da cidade era evidente. Em pouco mais de uma década a
cidade que demonstrava pujança em 1850, está completamente abandonada.
Nestas fotos observa-se que os edifícios estavam começando a ser vandalizados e
seus materiais de construção seriam utilizados para outras construções.
Vale ressaltar que logo em seguida, em 1908 o fotógrafo Gaudêncio
Cunha reúne imagens de São Luís e Alcântara, para um álbum que seria
apresentado na Exposição Nacional no Rio de Janeiro20 e escolhe os ângulos que
não mostravam o lastimável estado das edificações em ruínas.
.Observamos que as fotos ressaltavam os principais edifícios públicos
como a “Casa de Câmara e Cadeia” e a Igreja do Carmo e as principais ruas e
sobrados ainda em bom estado. As ruínas foram omitidas e não foram fotografadas
para exposição ainda que elas representassem os principais monumentos, marcos
da cidade colonial como a Igreja da Matriz e o Pelourinho. Importante ressaltar que o
olhar do fotógrafo Gaudêncio Cunha, neste caso, tinha por objetivo mostrar apenas
o que restava da vila colonial, excluindo, desta forma, as ruínas (fotos 7 e 8).
Observamos então que é natural e podem ocorrer registros e narrativas
contraditórias no mesmo recorte temporal. A cidade de Alcântara estava decadente
e morta de acordo com os relatos de Lindenberg e Walle e nas imagens da Revista
do Norte, mas a imagem da cidade registrada pelas lentes do fotógrafo Gaudêncio
Cunha ressaltavam a vila sem mostrar sua face arruinada.
Anos depois, o viajante francês Paul Walle21 (1912, p. 35) esteve nos Estados
do Piauí e Maranhão em 1912 e comprovou o arruinamento de Alcântara,
20
Exposição realizada no bairro da Urca, do Rio de Janeiro em comemoração a abertura dos portos às nações amigas
composta por pavilhões dos Estados brasileiros. No Museu Histórico e Artístico do Maranhão (MHAM)estão as imagens
originais . há seis fotos de Alcântara
21
Alcântara, L‟ancienne Tapuy-tapira des indienes tupinambás, fut en d‟autres temps la rivale de São Luiz;cette ville,
aujourd‟hui en pleine décadence et presque en ruines, est située de l‟autre côté de la baie de São Marcos, sur le continent, a
peu près en face de São Luiz et à une quinzaine de kilomères de cette derniére. Nous eûmes la curiosité de visiter cette cité qui
meurt...Nous l‟avons vivement regretté, car vieille et ruinée, elle ne mérite pas les deux heures et demie de barque nécessaires
pour y aller et les quatre qu‟il nous a fallu faire au retorn, par un vent violent. Lorsqu‟on pénètre dans Alcântara, édifiée sur une
coline dans une bonne position, on a la sensation de l‟abandon le plus absolu, du vide : les rues sont mal pavées, on ne les
entretient plus depuis longtemps, la plupart des églises et couvents sont abandonées et en ruines. La cathédrale ou Matriz ne
sert plus à rien.Dans la rue principale on note encore une vingtaine de maison en bon état, autrefois les palacettes des gents
riches;à côte, des maison à demi Ruinées.Cette décadence si complète fait peine à voir, surtout lorsqu‟on regarde les murs
noircis, dans les interstices desquels appairait une végètation herbacée, et parfois une sorte d‟arbre, l‟atraca;qui croit entre les
pierres.La décadence et la ruine d‟Alcântarasont dues, assure-ton, aux progrés et à la prospérité de la navugation fluviale á
Maranhão.Autrefois, quand les vapeurs ne sillonnaient pas encore les riviéres, Alcântara, située sur le continent, servait
d‟intermédiaire entre la capitale pour les échanges et le commerce avec l‟intérieur de l‟État, em somme, l‟entrepôt des
commercants de São Luiz, qui en recevait tout les produits nécessaires à la consommation. Alcântara aurais encore de 3.000 á
3500 habitants (WALLE, 1912, p. 59).
121
comentando a plena decadência e sensação de abandono e também a curiosidade
em visitar uma vila que estava morta.
Foto 7 - Rua Afonso Pena atual Rua Direita
Fonte: Reprodução do álbum original de Cunha, no MHAM. Foto de Francisco Otoni, em 2007
Foto 8 - Igrejas e convento do Carmo – fachada frontal
Fonte: Reprodução do álbum original de Cunha, no MHAM. Foto de Francisco Otoni, em 2007
122
Alcântara, antiga tapuitapera dos índios tupinambás, foi em outros tempos
rival de São Luis. Esta vila, hoje em plena decadência e ruínas, está situada
do outro lado da Baia de São Marcos, no continente,em frente a São Luis , a
quinze quilômetros .Tivemos a curiosidade de visitar a cidade
morta.Lamentamos porque, velha e arruinada, não merecia às duas horas e
meia de travessia de barco necessárias a ida e as quatro horas que fizemos
para retornar com ventos fortes.Quando entramos em Alcântara, construída
sobre uma colina em boa posição, temos a sensação de abandono absoluto
,as ruas são mal pavimentadas,não se mantêm mais por muito tempo as
igrejas e conventos foram abandonados e estão em ruínas. A catedral, a
Matriz não serve mais para nada. Na rua principal, há vinte casas em bom
estado que eram os palacetes dos ricos, ao lado de sobrados meio
arruinados. Essa decadência faz pena de se ver, sobretudo as paredes
enegrecidas, preenchidas pela vegetação herbácea e ás vezes por um tipo
de a arvore – a atraca, que nasce nas pedras. A decadência e ruína de
Alcântara foram devido o progresso e a prosperidade da navegação fluvial ,
quando os vapores não atracaram mais nos rios. Alcântara situada no
continente serviu de intermediária para as trocas e comercio entre a capital
e o interior do Estado. Em suma era entreposto dos comerciantes de São
Luis que recebia todos os produtos necessários ao consumo. Alcântara tem
ainda entre 3.000 a 3500 habitantes. (Walle, 1912.pag.35)
4.5 O debate sobre a demolição das ruínas de Alcântara e a Renovação urbana da
capital
Viveiros (1999) ressaltam que a decadência começou no qüinqüênio de
1865 a 1870 concorrendo para isso vários fatores. O maior deles foi o incremento da
indústria açucareira, O deslocamento da produção maranhense para do litoral para o
vale dos Rios, seguido da abolição dos escravos e da urbanização da capital São
Luis.
Enquanto na capital São Luis, o governo promovia a renovação urbana,
na perspectiva higienista e moderna havia um movimento pela demolição das ruínas
da cidade de Alcântara. O interventor Paulo Ramos ressalta no seu relatório de 1938
encaminhado ao governo a ênfase dada às obras de remodelação das vias públicas
na capital São Luis, incluindo a pavimentação de novas avenidas, a construção do
mercado central, limpeza pública, arborização de jardins, construção do 24º
Batalhão do exercito que seria transferido do campo de Ourique para o bairro do
João Paulo, obras no porto, construção do palácio do comércio e Palácio da
educação.
Enquanto isso, intelectuais maranhenses debatiam nos jornais para
defender a cidade de Alcântara da iniciativa de demolição das suas ruínas. O
jornalista Antonio Lopes usou como argumento a comparação da permanência das
123
ruínas italianas e gregas para a preservação das ruínas da igreja da matriz de
Alcântara.
Este debate consta no jornal “O Imparcial” 22 de 1927, onde a proposta de
demolição das ruínas da Igreja da Matriz foi levantada pelo Tenente Ulpiano
Brandão, morador de Alcântara, na perspectiva higienista de demolição das antigas
estruturas para criar uma praça arborizada e contou com a resistência dos membros
do IHGB-Maranhão, num debate travado entre o escritor Antonio Lopes e Ulpiano
em forma de carta publicada pelo periódico (LOPES, 1927).
[...] Que não sejam arrasadas as vetustas ruínas da Igreja da Matriz.
Oponho-me e comigo o Instituto Histórico. Admira que você não tenha
desde logo impedido. “Pois então meu caro poeta compreenderia você que
Roma demolisse o Coliseu para ajardinar o local, e Athenas do alto da
colina da Acrópole varresse as ultimas colunas do Parthenon para abrir um
passeio público”? Não foi, é certo, Phidias quem construiu a matriz de
Alcântara, nem outro archictetcto celebre dos áureos tempos da Grécia,
mas também não se sabe quem elevou tantos edifícios que, embora sem
grande valor artístico nos falam, em velhas cidades, das gerações que se
extinguiram e das grandezas para sempre perdidas! Os povos cultos,
quando querem modernizar os seus agrupamentos urbanos colocam as
ruínas nos logradouros públicos entre flores, árvores, gramados e repuchos
cantantes deixando-as realçar com o prestigio sua ancianidade venerável,
os lugares de prazer, olhando em volta na nudez eloqüente das suas pedras
(LOPES, 1927, p. 1).
No relatório de Ramos (1938) consta que era o “Departamento das
Municipalidades” que controlava a vida dos municípios. Este departamento foi
dirigido por Clodoaldo Cardoso e depois por Helvidio Martins, sendo que à época os
municípios arrecadavam à revelia do Governo, pois não havia estatística.
O relatório explicita que a prioridade da administração do Interventor
Ramos eram os municípios da 1ª circunscrição: (Anajatuba, Barra do Corda, Grajaú,
Monção, Pedreiras, Penalva, São Luís Gonzaga, São Pedro, Viana e Vitoria do
Mearim) e da 2ª circunscrição- (Buriti, Caxias, Codó, Coroatá, Itapecurú, Monte
alegre, São José dos matões e Rosário). No entanto, há no documento citado
referências a pequenas melhorias na situação patrimonial realizadas pelo Prefeito de
Alcântara, tais como obras de recuperação no cemitério de S. João de Cortes, do
mercado e do matadouro, das fontes e do Cais do Porto do Jacaré. Essas obras
atendiam então à ênfase higienista e de melhoria dos serviços públicos muito
comuns na década de 30-40 (RAMOS, 1938).
22
Acervo digitalizado de periódicos da Biblioteca Pública Benedito leite, localizado com auxilio do
pesquisador Luis de Mello.
124
A situação geral econômica do Estado do Maranhão é freqüentemente
relatada nos jornais da década de 3023 que denunciam uma situação de decadência
do Estado conforme consta na Coluna “Cidade do “Diário de norte” de 24 de abril de
1936:
É incontestável a decadência econômica do Maranhão. Estado dos mais
ricos da união, não oferece, entretanto possibilidade imediata de
alevantamento. A linguagem iniludível das realidades sociais empolga e
convence muito mais do que os mais derramados artigos deste jornal.
Estudar a questão do nosso esplendor e da nossa decadência econômica é
tarefa, assa árdua, porque obriga a um recuo bem longo na nossa história
(LOPES, 1937, p. 1).
“Alcantarizar-se” virou, nesse período, sinônimo de abandono,
arruinamento, destruição e tristeza. Reflexo da decadência do Estado do Maranhão
observada na Capital (figura 17).
São Luís é uma cidade de poucas alegrias. Decadente e triste, a nossa
capital alcantariza-se de dia para dia. Vivendo entre ruínas, o maranhense
quer, no entanto ter alma nova sente a inevitável e linda alegria de viver. Os
Escombros não fazem bem a todas as ânsias moças da vida. Mas, como
procurar fugir do espetáculo de tristeza e desolação de nossa cidade.
Marchamos e nisto esta o nosso progresso para uma “Alcantarização” [...]
(ALCANTARIZAÇÃO..., 1936).
Figura 20 - Sobrada em ruínas na Rua do Giz em São Luís
Fonte: Racieli Olivas, em 2009
24
Viveiros (1954) escreve contando sobre a riqueza da família
alcantarense refletida no fausto das igrejas. Ele explica que com a decadência da
23
Acervo de obras raras da Biblioteca Pública Benedito Leite – São Luis-MA. Pesquisa feita pela autora em
janeiro de 2006. No jornal diário do Norte, abril de 1937 Redatores chefe: Antonio Lopes.
24
Obra pesquisa no cervo de obras raras da BPBL em São Luis, sendo o artigo localizado por Luis
Mello.
125
cidade, as igrejas foram ruindo a começar pela igreja de Santa Quitéria, São
Francisco, Mercês e Matriz e, dissolvendo-se as irmandades, toda a riqueza foi
recolhida à igreja do Carmo, única que escapou do arruinamento, mas quando
faleceu o último carmelita em 1855 o provincial do convento tentou transladar, por
meio de emissários, toda a riqueza para seu convento.
O artigo feito pelo intelectual comenta sobre a transferência da prata de
Alcântara para São Luís e da resistência da população local ao ato:
[...] alegando que tendo sido esses objetos dados pelos seus antepassados,
para aformosamento das suas igrejas, não era justo que viessem servir os
templos da capital, e alguns homens mais fervorosos adeptos dessa idéia
conseguiram evitar o embarque de uma grande caixa de madeira, que se
dizia conter quinze arrobas de prata [...] Para fazê-lo cumprir o governador
de então mandou o chefe de polícia e 43 praças, sob o comando de um
oficial, no vapor de Alcântara, o povo não esperava este desfecho e às 15
horas o tesouro estava em são Luis, o governo federal constitui-se no
legitimo dono e recolheu o tesouro em seus cofres no Rio de Janeiro!
(VIVEIROS, 1954).
Lopes (1957; 1977) remete à cronologia ao mesmo tempo em que
denuncia o abandono de Alcântara:
Cidade meio abandonada, Alcântara guarda ainda as relíquias do fausto
extinto”. Edificaram-se num plano largo, quase monumental, ruas amplas,
casas sólidas, numerosos sobrados, muitos dos quais verdadeiros
palacetes. As suas igrejas: Carmo e a Matriz, hoje arruinadas são
relativamente notáveis pela sua construção e ornamentação. E a velha
cidade morta, com os seus templos derruídos e casarões destelhados, têm
a poesia do passado, da grandeza perdida, das relíquias veneráveis,
vítimas não só do tempo, mas da incúria e do vandalismo dos interesseiros
negociadores do espólio de uma prosperidade que se foi (LOPES, 1957, p.
103).
As narrativas do começo do século reforçam a situação de decadência e
abandono da cidade, mas reconhecem a importância da cidade no passado. Em
suas crônicas Moraes Filho (2000) cita a cidade de Alcântara como uma das mais
opulentas cidades da província do Maranhão que decaiu do seu antigo esplendor.
Moraes Filho (2000, p. 92) afirma que bastava dizer que descendia de
uma família alcantarense para dizer o grau de apurada refinação e importância desta
família, “Bastava dizer que era alcantarense! Ou, segundo ele, saber ler nas ruínas
os fatos que ela fora outrora! - a vida que a animou com o dilatar dos anos. Dizia
ainda: que a falsa pompa de suas mulatas corria paralela com a balofa aristocracia
dos brancos.”
A constatação do abandono também está presente na análise dos
intelectuais inquietos com o arruinamento da cidade como Lefèvre e Costa Filho
(1971). O autor escreve, a pedido do então governador José Sarney, um livro sobre
126
São Luís e Alcântara (figuras 23 e 24). Em seu texto sobre a cidade, ele inicia com o
titulo “Alcântara, a cidade que se recusa a morrer”.
Segundo os escritos de Costa Filho (1971, p. 23), “Recuso-me a pensar
em Alcântara como cidade morta. Dir-se-ia que Alcântara está morta. Direi que
Alcântara se recusa a morrer. Foi condenada a viver menor: não se entregou a este
destino.”
Figura 21 -Croquis de Renée da Rua da Amargura em Alcântara-MA
Fonte: Lefèvre e Costa Filho (1971)
Odylo Costa Filho, então, trouxe para a cidade a artista paulista Renée
Lefèvre (1905-1996) que estudou artes em Paris para ilustrar o livro. Lefèvre já havia
desenhado várias cidades históricas, inclusive as mineiras, em telas coloridas, mas
no Maranhão ela consegue traduzir em seus desenhos em preto e branco toda a
dramaticidade da decadência. Ferri (1971, p. XII-XVI) no prefácio dessa obra
ressalta que a crítica publicada aos desenhos dela no ano de 1962 disse que:
[...] Renée sente e fixa com sobriedade a matéria secular depositada pelo
tempo sobre as velhas cidades decadentes; recolhe e espiritualiza as cores
dessa matéria e a alma deste tempo, depositada em fímbrias, de
esquadrias, relevos de cornijas, em dosséis de janelas e tímpanos de
portas.
127
Figura 22 - Croquis da Rua da Grande em Alcântara-MA
Fonte: Lefèvre e Costa Filho (1971)
Outros livros contêm desenhos e croquis da cidade de Alcântara como “O
velho Maranhão” de Tom Maia. São belos os croquis, mas não conseguem capturar
a decadência da cidade, visto que retratam a cidade em tom bucólico,
diferentemente dos croquis de Lefèvre que carregam a dramaticidade e o impacto do
arruinamento e abandono, chegando a ser considerados por alguns arquitetos como
desenhos “feios” das ruínas de Alcântara (figuras 20 e 21).
Figura 23 - Croquis do forte são Sebastião e das ruínas do convento do Carmo em Alcântara-MA
Fonte: Maia, Tom, 1985
128
Figura 24 - Ruínas da Matriz
Fonte: Maia, Tom, 1985
129
4.6 Cidade Presídio: a implantação do Presidio Estadual de Segurança Máxima -
1950 a 1965
Figura 25 - Intendência: presídio de Alcântara
Fonte: Revista do Norte 1905, acervo BPBL, em São Luís-MA
A primeira metade do século XX, como vimos , consolida o total
arruinamento da cidade de Alcântara. As medidas de tombamento do IPHAN em
1948 em nada contribuíram para a reversão deste quadro.
Diante das ideais de modernização e progresso da capital, que implicavam na
tentativa de higienização do espaço urbano, o Governador do Estado Sebastião
Archer da Silva através da Lei nº 61, de março de 1948, autorizou a
Transferência da penitenciária Estadual do Maranhão, de São Luís para Alcântara.
De acordo com Melo (2010) o Governo tinha como meta ao implantar um projeto
agrícola para o trabalho dos detentos, cujo objetivo era que os presidiários
considerados adaptáveis ao convívio social pudessem abastecer as cidades de São
Luís e Alcântara a partir da produção de alimentos. Contudo, o projeto agrícola não
funcionou a contento.
130
A implantação do presídio estadual de segurança máxima na antiga Casa
de Câmara e Cadeia, símbolo da cidade colonial foi para Alcântara um golpe de
misericórdia. Esta decisão eliminou qualquer possibilidade de revitalização da
cidade, que poderia acontecer após o tombamento em 1948. A cidade ficou
definitivamente refém de suas ruínas e torna-se uma cidade presídio por 15 anos.
Os moradores ficaram apavorados , conforme relato abaixo :
Na antiga Tapuitapera, hoje Alcântara, a penitenciária do Maranhão erguia-
se como um castelo mal assombrado onde a penalidade era semelhante ou
transcende às vezes a natureza dos próprios crimes praticados pelos
detentos. A filosofia da época, era assim, consistia em castigar o homem
pelos erros cometidos, criando-lhe dentro da alma o maior dos rancores à
sociedade. Hoje em Pedrinhas a poucos quilômetros do estreito dos
mosquitos, que separa a ilha do continente maranhense, ergue-se
monumental o maior centro presidiário do Estado, não é um castelo mal
assombrado, mas uma escola que recebe homens marginalizados
fornecendo a eles a confiança e o credito que merecem.
Até 1966 os “condenados da justiça” eram recolhidos à penitenciaria de
Alcântara, a qual se notabilizou pelas crueldades praticadas pelos seus
diretores. A partir daquele ano substitui-se o velho cativeiro pela atual
penitenciária de "Pedrinhas" vinculada à Secretaria de Justiça do Estado, a
qual recebeu sentenciados de todos os 128 municípios do Estado (Jornal “O
Imparcial”, 1973).
No jornal “O combate” 25, há um forte apelo do professor Guimaraes Pinto,
ilustre representante do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional no sentido de ser
transferida para outro local a atual penitenciaria,
Hoje, passadas largas épocas, transformada a fidalga cidade em relicário no
instante que convergem às atenções turísticas, vemos uma cruel casa de
castigos em exercício pleno como nodoa a confuscar-lhe o nome que a
história consagrou... Que motivos óbvios teriam induzido um obscuro
governo acometido de erro evidentemente grave? A instalação desse
instituto de correção em Alcântara foi demasiadamente fácil, entrementes
tem sido difícil a outros governantes promoverem a transferência desta
medonha cadeia (O combate, 1957).
Dados oficiais comprovam a presença da penitenciária em Alcântara.
Observa-se na mensagem26 apresentada à Assembléia Legislativa do Estado pelo
Governador Cesar Alexandre Aboud em 1951, que:
25
Jornal o Combate 1957 . acervo do Arquivo Público do Estado do Maranhão, em São Luís-MA.
26
Mensagem apresentada a Assembléia Legislativa do Estado em 3 de maio de 1951 pelo
Governador Cesar Alexandre Aboud, São Luis - acervo da biblioteca do Arquivo Público do Estado
do Maranhão
131
[...] a penitenciária esta instalada na vizinha cidade de Alcântara, em prédio
que não satisfaz às exigências de um estabelecimento desta natureza e que
impõe resolver o mais breve possível, o problema de remoção deste
presídio destinado a guarda e regeneração dos detentos, assim como
proporcionar-lhes melhor conforto e tratamento, encontram-se na
penitenciaria, cumprindo as penas impostas por sentença judicial 127
condenados.
A enciclopédia dos municípios de 1959 considerava como Estados mais
pobres da federação o Maranhão e do Piauí. Estes Estados tiveram no período de
1940 a 1950 um incremento na produção agrícola dos produtos de maior
importância para a alimentação humana de subsistência, como o milho, arroz,
mandioca e feijão. Os números indicavam um esforço notável de recuperação que
estes Estados pobres vinham realizando para superar seus péssimos indicadores
(FERREIRA, 1959, p. 3).
Na data do recenseamento, em 1950, havia no Estado do Maranhão: 72
municípios, 133 distritos, 72 cidades e 61 vilas. Os resultados censitários reportam-se a
divisão territorial. Alcântara apresentava a área total de 1114 quilômetros quadrados
com população de 14.820 habitantes o que equivale a 13, 3 habitantes por quilômetros
quadrados sendo 7547 homens e 729 mulheres. A sede do município contava com
1453 habitantes e a vila de São João de Cortes com 550. A zona rural era habitada por
12917 almas, ou seja, 86%da população total. A atividade econômica era intensa e
havia 1815 estabelecimentos comercias
Em 1957 o Antonio Lopes escreveu e publicou na série das Publicações
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional o livro “Alcântara subsídios para a
história da cidade, de onde copiamos as fotos abaixo. As imagens demonstram o
estado de abandono da cidade. No prefacio o autor relata o abandono , a
inexistência de arquivos na cidade e as dificuldades em recuperar os dados
históricos. Lopes foi um incansável defensor da cidade. Foi ele que impediu em
1927 a demolição das ruínas da Matriz , através de seus artigos publicados no
jornal “ O Imparcial” .
O tombamento não garantiu a sobrevivência da vila decadente, em função
disto a UNESCO enviou seus consultores para analisarem a situação da cidade em
1960. Os relatórios elaborados entre os anos de 1960 e 1980 constituem uma fonte
importante de reflexão sobre o urbanismo, a exclusão e a decadência da cidade de
Alcântara.
132
Figura 26-Mapa de Alcântara em 1957
Fonte: Lopes (1957)
Figura 27 – imagem da Peninteciaria e Igreja Matriz em 1957
Fonte: Lopes (1957)
133
Figura 28 – Imagem da Matriz de S. Mathias em 1957
Fonte: Lopes (1957)
O fato é que as políticas públicas Estaduais, mesmo ciente destes
relatórios, poderiam ter direcionado o município para o turismo ou implantação de
serviços, mas a decisão foi de instalar um presídio. Com a implantação do presídio e
o afastamento dos investimentos, a cidade decaiu. Vale ressaltar que Alcântara
reproduziu o modelo político vigente no Estado do Maranhão, alternando oligarquias
e governos autoritários ao longo de sua história. Após a implantação do Centro de
Lançamentos em 1980, na década de 1990, houve uma queda das oligarquias com
eleição de prefeitos de partidos de oposição ,que logo em seguida foram derrotados
e a cidade voltou a ter governos autoritários , seguindo o modelo do Estado .
A população de Alcântara, portanto, cresceu muito pouco em 20 anos,
entre 1950 e 1980. Após a implantação do Centro de Lançamento em 1980 houve
um crescimento significativo da população. Atualmente de acordo com os dados do
Censo 2010 a população é de 21 mil habitantes, sendo divididos em
aproximadamente 6.000 habitantes na sede ou vila e 15 000 habitantes na zona
rural entre povoados, colônia de pescadores e comunidades quilombolas. O
município além da sede abriga 218 pequenos povoados, de acordo o mapa da nova
cartografia social da Amazônia de Pereira Junior (2008) esses povoados são
formados por colônias de pescadores, remanescentes de quilombos e antigas
fazendas.
134
4.7 A Cidade espacial: do global ao local: 1979 a 2010
Foto 9 – antiga Plataforma de lançamento do VLS, em Alcântara antes do
incêndio em 2003.
Fonte: Associação do Comércio Exterior do Brasil (AEB)
135
Foto 10 – Centro de lançamento, em 2003
Fonte: www.CLA.Aer.mil.br
4.7.1 1980: implantação do Centro de Lançamento de Alcântara-MA
A instalação do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA) foi feita
através de decreto do Governo Estadual (N. º 7.820, de 12 de setembro de 1980) e
foi um dos fatores responsáveis pela transformação econômica e territorial do
município, devido à desapropriação em 1980 de uma área de 52 mil hectares,
equivalente à metade da base territorial de Alcântara.Havia na época uma
expectativa muito grande de que este empreendimento alavancaria a economia da
cidade gerando empregos e renda.
O Centro de Lançamento de Alcântara, na verdade uma base militar
espacial, foi construída juntamente com instalações administrativas, residenciais e
militares, ocupando uma parte do litoral do município onde muitos povoados de
pescadores e comunidades negras se localizavam. Esse processo levou ao
deslocamento compulsório (FERNANDES, 1998) de mais de 2.000 famílias de
povoados localizados à beira mar para agrovilas no interior do município, gerando
desagregação social e econômica.
136
Essa transformação modificou as formas de sobrevivência do município,
incentivando o êxodo rural e atraindo para a sede do município muitos trabalhadores
de outras regiões dando início ao processo de inchamento das periferias do centro
histórico decorrente da favelização e ocupação desordenada das encostas e
mangues com ocupação irregular das áreas e sítios arqueológicos.
No auge da obra do CLA, em 1980, 5.000 peões trabalharam na
construção da infraestrutura das plataformas de lançamentos e das vilas militares.
No caso das vilas a maior parte delas hoje está abandonada, pois todos os militares
moram em São Luis.
Neste período o Instituto do Patrimônio Histórico Nacional - IPHAN alertou
quanto à necessidade da construção de uma avenida, chamada de anel de
contorno, para desviar o fluxo de transportes pesados e caminhões do centro para a
periferia, pois o movimento de cargas era intenso. O objetivo de proteger as ruas
históricas foi alcançado, mas a avenida acabou incentivando a ocupação periférica,
dando origem a uma favela chamada de Anel do Contorno, composta de
trabalhadores rurais oriundos das áreas desapropriadas. Hoje, 30 anos depois, esta
favela está consolidada nas encostas da cidade histórica
A Municipalidade, o Estado e o Patrimônio Nacional, incapazes de
enfrentar tamanho desafio e preocupados com a gravidade do processo de
Alcântara, solicitaram apoio ao Ministério da Cultura, que criou em 1980 o GT –
Alcântara, grupo de trabalho para um diagnóstico da situação da cidade face à
externalidades.
Um dos objetivos do grupo de trabalho (GT) foi proceder a uma revisão do
processo de tombamento e propor um plano estratégico para o município. Naquele
momento, diversos relatórios foram produzidos após as reuniões técnicas. Poucas
conquistas concretas, no entanto, foram alcançadas diante do volume do
empreendimento do Centro de Lançamento e muitos problemas se concretizaram na
cidade, sem suporte para enfrentar tamanha transformação.
Ainda em 1981, o poeta e escritor Carlos Drummond de Andrade foi um
dos primeiros a anunciar e protestar contra os impactos negativos e malefícios do
empreendimento:
Qualquer pessoa que tenha um mínimo de sensibilidade em face das coisas
de arte e história (os „bens culturais‟ que o governo procura não só defender
como incitar a população a fazer o mesmo) arrepia-se ao ler que será
instalada em Alcântara a segunda base de lançamentos de mísseis
brasileiros. A área já começou a ser demarcada e um fato novo,
137
surpreendente, bole com os nervos da pacata população da pacatíssima
cidade inscrita nos livros de tombo do IPHAN como monumento nacional.
Claro que os foguetes não serão lançados no espaço ocupado pelo acervo
arquitetônico e paisagístico da cidade, mas a proximidade dessa
assustadora [...] faz crer que os benefícios da circulação de dinheiro
compensem os incômodos da militarização de vasta área agrícola em torno
do conjunto tombado. Não se poderia localizar a estação de mísseis em
outro ponto, sem afetar a grave e silenciosa Alcântara, com seus velhos
sobrados convertidos em monumento nacional? (ANDRADE, 1981 apud
ARAUJO; LIMA FILHO, 2006, p. 209).
O fato é que a cidade não estava preparada para este empreendimento, a
fragilidade da estrutura local se confrontou com um empreendimento global e com a
nova dinâmica que surgia no mundo da globalização e das redes globais.
4.8 Desconexão local
O fotógrafo alemão Bosshart (1989) registrou um importante conjunto de
imagens da população negra e das ruínas de Alcântara em preto e branco. Na
introdução desse livro, ele relembra, que quando chegou à cidade pela primeira vez
em 1971 a água vinha dos poços, não havia eletricidade, havia apenas um gerador
movido a óleo diesel extremamente barulhento que funcionava de 6 da tarde às 11
da noite. Em 1981 quando retornou já estava em construção o Centro de
Lançamentos. Finaliza então:
[...] O salto do passado para o futuro é violento. O choque cultural é forte,
alguns chamam isso de progresso e desenvolvimento, mas para a maioria
dos moradores predomina o lado negativo das mudanças. O estilo de vida
tradicional não é respeitado [...] a população esta sendo mal informada do
que vai acontecer com sua cidade, não há dialogo entre eles e os diversos
invasores. pouco a pouco vão sendo expulsos da cidade e envolvidos
novamente numa forma de escravidão, dessa vez não pelos portugueses
mas pelos tecnocratas do século XX.fiz questão de mostrei-lhes que para
mim são eles que contam, que eles são Alcântara (BOSSHART, 1989, p. 8).
Nas décadas de 70 e 80 algumas tentativas foram empreendidas para
recuperar a economia da cidade, apoiadas na crença de que o crescimento
econômico do Estado, sobretudo da capital, incluiria Alcântara nas áreas
beneficiadas. Além dos efeitos indiretos, o incentivo ao turismo seria a alternativa
viável. No entanto, não foram feitos os investimentos necessários à melhoria da
infraestrutura física, indispensáveis à dinamização da cidade. Depois do fracasso
das tentativas, a situação geral foi agravada pela desapropriação do território do
município. Havia no ar a expectativa de que a implantação da base de foguetes
138
alavancaria a economia alcantarense transferindo para a comunidade os benefícios
do projeto.
Assim, renasceram as esperanças da recuperação econômica do
município. Havia, no entanto uma contradição com a realidade local, pois a
comunidade estava despreparada para participar de tal empreendimento, e a
demanda especifica do Centro de Lançamento excluiu os alcantarenses e a cidade
de Alcântara dos benefícios do centro. Como era previsível, pois a vila militar criou
uma estrutura independente da cidade histórica.
139
5.REDES E RUÍNAS
Inclusão e exclusão sócio espacial
Figura 29 – Igreja da Matriz de Alcântara
Fonte: Postal do fotografo Barnabas Boshart, 1980
Figura 30 – Ruína do Palácio Negro
Fonte: Postal do fotografo Barnabas Boshart, 1980
140
Há quase dois séculos a decadência do Maranhão e de Alcântara tem
sido tematizada produzindo uma visão cíclica do Estado com uma periodização da
barbárie (período colonial), seguida da prosperidade (lavoura escrava) e depois da
decadência. O historiador maranhense contemporâneo Costa (2001) ressalta a
ideia da cidade como texto e afirma que a construção do “texto urbano de Alcântara:
a cidade morta” tratando da “fastamagórica” que preside as discussões sobre o
Maranhão quando se pretende pensar o complexo processo de instituição do
imaginário social acerca da identidade regional. Destaca ainda uma “ideologia da
decadência” e analisa o conto “Alminta” de Ferreira Gullar como o subconsciente da
decadência, imagens e representação da cidade morta. Esta fantasmagoria
associada à decadência da cidade está presente nos desenhos, nos relatos, nas
poesias e nos livros que se referem a Alcântara. Ele lembra o importante geógrafo
Maranhense Raimundo Lopes (1977), que referia a Alcântara como a cidade das
ruínas verdes.
A morte, mesmo entrelaçada à vida, intimida e assombra; a cidade
decadente inspira uma simpatia mesclada de tristeza. De longe, porém
revêmo-la com amor, num crepúsculo de emoções que suaviza os
contornos da realidade caminho dolorosa; e através da meditação, que é o
da sabedoria, e através da saudade que é mãe da emoção duradoura e
espiritualizada, transportamo-nos às ruas e às ruínas verdes de Alcântara
[...] (LOPES, 1977, p. 7).
Assim como Lopes o poeta maranhense Gullar (1997) inventou cidades
com imaginação fértil, tendo como base cidades históricas brasileiras. A primeira
cidade criada foi Odon em 1955, situada no passado, depois criou On situada no
futuro e em seguida inventou mais 22 cidades. Certamente inspirado na narrativa de
Calvino (2002), que trata do diálogo entre o famoso viajante veneziano Marco Pólo e
o imperador dos tártaros Kublai Khan e da geografia fantástica de cidades, onde a
cidade deixa de ser um conceito para se tornar símbolo da existência humana.
Calvino (2002) também fala da memória das cidades e dos símbolos, das
cidades delgadas, continuas e ocultas, das cidades e o céu e das cidades e os olhos
e das cidades e os mortos. Os livros sobre as cidades inventadas ou invisíveis nos
trazem a narrativa de processos urbanos de decadência e abandono de cidades.
São referências simbólicas da decadência das cidades vistas por escritores e
poetas, reconhecendo a importância delas e seus processos de morte e
arruinamento no contexto social e no imaginário daqueles que entendem as cidades
141
como elemento de resistência das culturas passadas e presentes. São relatos dos
momentos de exclusão destas cidades nas redes urbanas.
Em Gullar (1997, p. 13) reconhecemos duas cidades maranhenses:
São Luís se revela nas cidades imaginarias de Odon e ailum através de
referências ao centro histórico [...] Um amontoado de casas velhas [...] Mas
a evidência maior está em Alminta cuja transcrição da história de Alcântara
se faz presente em sua arquitetura de sobrados vazios e igrejas
abandonadas, revelando o processo de decadência da cidade. Narra ainda
o episódio da visita do imperador que nunca aconteceu, mas que se tornou
lenda na cidade [...].
Observamos no texto original, várias coincidências com o processo de
arruinamento de Alcântara e sua história, que transcrevemos de Gullar (1997). No
livro, “Cidades Inventadas”. Alminta é Alcântara.
Alminta
Os sobrados vazios, as igrejas com suas imagens sujas de excremento de
morcego mostram, ainda assim, que ela conheceu o esplendor e que seus
habitantes gozaram de relativo conforto provinciano. Há sobre Alminta uma
considerável bibliografia, contraditória em muitos pontos, mas harmoniosa
no fundamental: filha de escravo, ela cresceu e progrediu com o suor dos
negros até que um dia, entregue unicamente àqueles que se dizem seus
senhores, começou a morrer. E está morta agora. . Até os escravos a
comentavam com orgulho e espanto. Alminta começou a se preparar para a
visita, que não aconteceu. Ainda hoje pode-se ver a ruína do palácio que
estava sendo construído especialmente para hospedar o imperador:
algumas paredes e portais de mármore mantêm-se ainda de pé em meio ao
amontoado de pedras de cantaria, devidamente preparadas para compor os
muros e arcos (GULLAR, 1997, p. 13).
Lembramos que Monteiro Lobato (1995) foi um dos escritores que
primeiro tratou na literatura da temática da decadência das cidades brasileiras e do
ambiente marasmático das cidades mortas, lembrando que o progresso das cidades
é nômade. No livro “Cidades Mortas” ele registrou suas impressões sobre o
abandono das cidades em São Paulo, com o fim do ciclo do café. São impressões
similares as dos autores maranhenses Gullar e Montello .
A quem em nossa terra percorre tais e tais zonas, vivas outrora, hoje
mortas, ou em via disso, tolhidas de insanável caquexia, uma verdade, que
é desconsolo, ressurge de tantas ruínas: nosso progresso é nômade a
paralisias súbitas. Radica-se mal. Conjugado a um grupo de fatores sempre
os mesmos, reflui com eles de uma região para outra. Não emite peão.
Progresso de cigano vive de acampado. Emigra, deixando atrás de si um
rastro de taperas (LOBATO, 1995, p. 5).
142
5.1. As tentativas de reconexão de Alcântara nas redes
5.1.1 1948: cidade monumento: tombamento do IPHAN
Em 1948, percebendo o grave processo de deterioração e devido à sua
inegável importância histórica, a cidade de Alcântara foi erigida em monumento
nacional e se conectou a rede nacional de cidades tombadas. Nessa ocasião festiva
de comemoração do aniversário de 300 anos da cidade, um dos seus marcos mais
significativo foi reerguido após anos de esquecimento.
Trata-se do Pelourinho, enterrado em 1889 na praça e dividido em
pedaços que deve seu resgate graças às indicações de uma ex-escrava de nome
Calú que localizou suas partes separadas e pela iniciativa dos irmãos maranhenses
Osvaldo e Durval Soares, membros do IHGB - MA, que o reergueram na Praça por
ocasião do tombamento nacional da cidade (foto 11).
Foto 11 - Ruína da matriz e pelourinho
Fonte: Marcio Vasconcelos, em 2010
O Serviço de Patrimônio Federal, em sua fase heroica de 1937 a 1960
preocupava-se em tombar, inventariar e desenvolver estudos em cidades históricas
brasileiras. Seus objetos privilegiados, de acordo com Millet (2000) eram as
edificações portadoras das representações estilísticas do período colonial (igrejas,
143
fortes, casa de câmara e engenhos.). Esta ação pontual visava proteger
monumentos isolados e o IPHAN não vislumbrava o processo de inchamento que
aconteceria mais tarde com a maioria das cidades que se encontravam estagnadas,
colocando em risco o contexto urbano dos objetos privilegiados
O tombamento do acervo arquitetônico da cidade de Alcântara foi
concretizado através do Decreto Lei N.º 26.077- “A”, de 22 de dezembro de 1948,
seguido de tombamento pelo processo Nº 390 t; inscrição Nº 254 no livro histórico;
inscrição Nº521 no livro de belas artes e inscrição Nº 67 no livro arqueológico
etnográfico e paisagístico, em 29.12.1948 e 10.10.1974.
Considerando a comemoração do terceiro centenário da instituição da
vila, antiga aldeia Tapuitapera e seu papel como marco inicial da catequese e do
desbravamento do território Brasileiro.
Art.1º - É erigida em monumento nacional a cidade de Alcântara.
Art.2º - O conjunto deve ser inscrito no Livro do Tombo Histórico, instituído
pelo decreto Nº25 de 30/12/1937, competindo à Diretoria Nacional tomar
providencias necessárias para a demarcação da área respectiva (BRASIL,
1948, não paginado).
Vale ressaltar que o tombamento do conjunto arquitetônico da cidade,
destacou também alguns monumentos isolados como a ladeira do jacaré, capela das
Mercês e do Desterro, os paços, as fontes, o forte e as Ruínas dos palácios do Barão
de Mearim, do Barão de Pindaré e as ruínas da igreja Matriz de São Mathias,
reconhecendo desde então o valor das ruínas como ruínas e protegendo-as como tal.
O reconhecimento e proteção do sitio histórico de Alcântara como
patrimônio nacional pelo IPHAN em 1948 foi anterior ao tombamento da capital, São
Luis, que só ocorreu em dezembro de 1955 pelo decreto N 509-T inscrição N 432
livro de belas artes em 23.12.1955. Diante das fragilidades do município, o Iphan
sempre exerceu importante papel na proteção do patrimônio de Alcântara.
A contradição que observamos nas políticas públicas estadual, municipal
e federal foi que, mesmo tendo sido reconhecida pelo IPHAN por seu valor histórico
diante da perspectiva de preservação de seu acervo arquitetônico em 1948 e
apresentando dados de relativo crescimento em 1950 de acordo com o censo,
instalaram, em Alcântara dois anos depois, um presídio de segurança máxima no
seu edifico mais importante e significativo: a “Casa de Câmara e Cadeia”, sede do
poder municipal, afastando, deste modo, investimentos para a preservação e
144
dinamização da cidade monumento, reafirmando seu caráter de decadência e
isolamento.
5.1.2 Os relatórios da UNESCO
O processo de decadência da cidade histórica de Alcântara foi objeto de
diversos estudos e relatórios técnicos. De acordo com os arquivos do programa de
preservação e revitalização do centro histórico de São Luís - Projeto Praia Grande,
em 1979 foi desenvolvido um projeto especial da disciplina de edificações e
urbanismo do curso de arquitetura da Universidade Nacional de Brasília (UNB)
(MARANHÃO, 1985). Essa iniciativa externa foi fundamental, pois ajudou a
organizar uma coletânea de estudos que serviriam de subsídio para elaboração de
um plano de revitalização do patrimônio histórico de Alcântara-MA. Neste estudo
foram identificados todos os relatórios elaborados pelos consultores nacionais e
internacionais que destacamos a seguir:
a) 1963: recuperação de Alcântara: arquitetos Pedro e Dora Alcântara do
IPHAN 1967-Proteção e valorização do patrimônio cultura brasileiro no quadro do
desenvolvimento turístico e econômico- relatório para a UNESCO de Michel Parent;
b) 1973: relatório e proposta para a conservação, recuperação e
expansão de Alcântara – Viana de Lima;
c) 1976-1984: relatório sobre Alcântara do arquiteto Raul Pastrana –
consultor da UNESCO.
Todos estes relatórios elaborados ao longo de quase 20 anos (1967 a
1984) são unânimes em afirmar que a preservação do conjunto arquitetônico de
Alcântara não pode prescindir de um conjunto de estratégias para a revitalização
social e econômica diante do quadro de decadência da cidade. Todos os consultores
elencaram soluções que iniciam com o levantamento cadastral e diagnóstico do
conjunto arquitetônico e apontam o turismo cultural e ecológico como perspectiva de
revitalização econômica e preservação da cidade. Tais relatórios sintetizam o
questionamento da exclusão e desconexão da cidade de Alcântara das estruturas
econômicas globais e regionais
145
O plano de recuperação de Alcântara elaborado pelos arquitetos do
IPHAN Pedro e Dora Alcântara foi o primeiro e mais importante trabalho de resgate
da formação histórica da cidade. Elaborado em 1963 durante o período em que os
arquitetos Pedro e Dora moraram na cidade entre 1959 e 1965 o plano foi uma
importante contribuição à preservação do patrimônio histórico de Alcântara.
O arquiteto Pedro Alcântara foi o primeiro a desenvolver estudos sobre a
formação da cidade de Alcântara que servem até hoje de referência teórica e a
arquiteta Dora Alcântara publicou um importante registro sobre a azulejaria no
Maranhão. Ressaltamos também que ambos foram consultores do processo
encaminhado à UNESCO para inscrição de São Luís na lista de patrimônio da
humanidade em 1988.
O plano publicado por Gomes e Alcântara (1971) foi uma tentativa de
integrar um planejamento setorial de preservação de bens culturais numa
planificação mais ampla que visasse disciplinar, orientar e coordenar o crescimento
de São Luís e Alcântara, devolvendo-lhes suas antigas funções de centro econômico
e histórico do Estado. O plano consistia num conjunto de ações no esforço
desenvolvimentista global de um Estado secularmente marginalizado, como o
Maranhão.
O arquiteto Pedro Alcântara realizou uma vasta pesquisa bibliográfica e
iconográfica nos acervos do Rio de Janeiro e de São Luis, na perspectiva de fixar
parâmetros para a solução de problemas práticos e projetos específicos para a
preservação da cidade.
O plano inicialmente analisava a cidade em sua estrutura urbana,
analisava o processo de decadência da comunidade e suas potencialidades e foi
apresentado em 1959 ao Governador Dr. Matos Carvalho, constando dos seguintes
itens (GOMES; ALCÂNTARA, 1971):
a) Transformar a cidade num centro de cultura e lazer do Estado, da
capital inserindo-a na rede turística nacional;
b) Dinamizar o acervo histórico cultural e artístico existente e integrá-lo ao
movimento cultural do Estado;
c) Estimular o artesanato, gerando serviços para a comunidade.
146
O arquiteto Pedro apresentou ainda “croquis” com sugestões como a
recuperação das torres da matriz para abrigar um museu e montagem de uma
exposição itinerante sobre a história de Alcântara. No entanto em sua permanência
na cidade observou que: “Transformada em presídio estadual, Alcântara quedou
completamente inerme não podendo conter o avanço avassalador da floresta
equatorial, que a tudo cobria como imensa mortalha (ALCÂNTARA, 1971).
O relatório dos arquitetos Gomes e Alcântara (1971) serviu, mais tarde,
como referência ao trabalho que o consultor Francês Michel Parent veio a realizar.
Em recente documento publicado pelo IPHAN sobre as missões da
UNESCO no Brasil, há especial referência à missão de Parent como a primeira
dentre várias missões de consultores que estiveram no Brasil entre as décadas de
1960-1970. Sua missão foi relevante devido à extensão de sua visita a 35 cidades
brasileiras e, sobretudo, pela importância de Parent no campo da preservação do
patrimônio e pelo seu compromisso com instâncias várias de proteção dos bens
culturais como ICOMOS (PARENT; LEAL, 2008).
Parent era expert do Ministério des alfaires culturelles e inspetor geral dos
monumentos. Históricos do Ministério da Cultura da França e percorreu o Brasil a
convite do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional para formular uma
política de conservação do patrimônio brasileiro. A cidade de Salvador impressionou
o francês, que defendeu calorosamente a preservação de todo o centro.
Seu relatório sobre São Luís foi fundamental na revitalização e proteção
do centro histórico da capital maranhense assim como influenciou os trabalhos
desenvolvidos posteriormente por Viana de Lima na cidade. Vale ressaltar a ênfase
dada ao turismo pela UNESCO como atividade de promoção, desenvolvimento e
sustento do patrimônio cultural. Parent (1967, p. 3) ressalta no documento:
O problema de Alcântara choca evidentemente por sua simplicidade, em
relação ao complexo problema de Salvador. Alcântara pode continuar
durante longos a se esvaziar lentamente do Brasil: a despeito de seu
caráter único, ela é sistematicamente negligenciada nos guias de
reportagens do Brasil. Ela própria cidade de arte e em plena mudança
econômica e urbanística: nada é mais tentador par o visitante que
atravessar este braço de mar, onde do lado de lá repousa o mistério da
cidade ideal, desta utopia materializada que foi Alcântara, que a decadência
econômica alguns decênios após seu nascimento golpeou de forma tão
súbita, que ela se congelou sem deixar traços de uma progressiva
decrepitude.
147
No documento, Parent (1967, p. 5) pontua aspectos da história do apogeu
e decadência da cidade: e como proposição básica coloca a reanimação rural de
Alcântara.
A segunda metade do XVIII é para Alcântara uma época de grande
desenvolvimento, a da prosperidade das fazendas de algodão, da Cia Grão
Para Maranhão. Nesta época Alcântara suplanta São Luís, por sua riqueza
e logo após a queda súbita, resultante de um curioso fenômeno que pode
fazer pensar no efeito de algum cataclisma telúrico, que ao mesmo tempo
arruinou e preservou uma cidade no século XVIII, intacta de qualquer
modificação, Alcântara é um pouco a Pompéia ou Herculano brasileiro [...].
Depois Parent (1967) faz duas proposições para a revitalização da
cidade:
a) Reanimação da zona rural de Alcântara através da SUDENE e de
projetos para agricultura familiar;
b) Oportunidade de reestruturação através do turismo, com a melhoria
dos transportes [barcos e avião] e infraestrutura de hotéis e restaurantes.
Propõe também um plano de urbanismo com três parâmetros (PARENT,
1967):
a) Conservação integral para o quarteirão central e largos de igrejas;
restauração total dos edifícios de interesse;
b) Preservação das ruínas. As ruínas são um momento de vida da cidade
e uma prova de sua alteração devem ser mantidas em seu aspecto de natureza
romântica na medida onde fica compatível com a preservação destes vestígios;
c) Construção Nova, para o desenvolvimento da cidade, respeitando hum
pavimento e os matérias tradicionais locais.
Parent (1967) conclui seu relatório colocando que a cidade de Salvador é
uma prioridade nacional e em segundo lugar está Alcântara.
Alcântara choca pela sua simplicidade em relação ao complexo problema
de Salvador, Alcântara pode continuar durante longos anos a se esvaziar
lentamente do Brasil, a despeito de seu caracter único, ela é
sistematicamente negligenciada pelos guias de reportagem, porém existem
em Alcântara condições modelo de uma atuação onde os critérios do
patrimônio não poderão ser contestados (PARENT, 1967, p. 5).
Michel Parent em sua visita a Alcântara e São Luís foi acompanhado pelo
fotógrafo Marcel Gautherot, Francês radicado no Brasil desde 1940, dedicou-se a
viajar por todo o país, registrando com precisão os aspectos mais variados da vida
148
nacional: das cidades históricas de Minas Gerais às festas populares do Nordeste,
da paisagem amazônica à arquitetura modernista do Rio de Janeiro e de Brasília.
Após a vinda de Parent, Alcântara recebeu o consultor da UNESCO
Português Alfredo Evangelista Viana de Lima (1913 -1991), arquiteto português
formado pela Escola Superior de Belas Artes do Porto (ESBAP), conhecido pela
utilização da linguagem Corbusiana em Portugal. Participante dos Congresso
Internacional de Arquitectura Moderna (CIAM). Colaborou várias vezes com o
arquiteto brasileiro Oscar Niemeyer e foi um dos maiores expoentes da Arquitectura
portuguesa do século XX.
No Relatório elaborado em 1973, notamos a percepção do processo de
decadência da cidade denunciando não só a fragilidade do tecido urbano como
também sua desconexão e arruinamento:
Alcântara impressiona pelo que revela de abandono, da cidade isolada do
mundo, habitada por seres que viverão mais resignação que de esperança.
Mas, habita também ali outra população, presente nas ruínas e na mística
que as envolve, tal como envolve a história de seu passado. São os
fantasmas de Alcântara que o tempo não transformou em personagem de
contos de terror, mas que conservam todo o mistério e dignidade de suas
grandezas passadas. Esta presença é especialmente nítida na grande
praça, deparamos com as ruínas calcinadas da antiga matriz. O que resta
das paredes e torres destaca-se, como imensa escultura, dos edifícios que
circundam aquele largo, responsabilizando todos quantos, sejam quais
forem os motivos, contribuíram ou ignoraram a decadência daquela que foi
outrora o principal centro da economia e da cultura da maranhense (LIMA,
1973, p. 9).
Lima (1973) fez um excelente diagnóstico da situação econômica do
estado do Maranhão na década de 50, importante para a contextualização da
decadência de Alcântara no período em que Alcântara esta abrigou o presido
público e alcançou seu maior isolamento:
A perda do dinamismo econômico da capital modera seu poder de atração
populacional, o que produz para o período de 50/60 um crescimento
populacional muito inferior à média das capitais nordestinas (7%). Mesmo
crescendo apenas 4, 3% por efeito da migração proveniente de áreas rurais
também decadentes, São Luís é incapaz de incorporar à vida econômica
esse crescimento atingiu o número de 7000 abrigando uma população de
aproximadamente, cerca de 1/6 do total de habitantes da capital (LIMA,
1973, p. 10).
Assim entre 1950 e 1970, a população da capital aumentou de
aproximadamente 80% com o crescimento, sobretudo pela expansão da área
urbana, pela ocupação bastante desordenada das áreas utilizáveis nos dois lados do
eixo constituído pelo divisor de águas dos Rios Bacanga e Anil-uma faixa de terra
149
estreita e muito irregular, declinando para os mangues onde se acumulam as
palafitas.
A baixa renda da população - estimável em US$140 dólares per capita em
1969, a limitada capacidade de investimento da Prefeitura, e a inexistência de um
planejamento adequado, conferem ao crescimento da cidade características
profundamente negativas em termos de urbanismo e distribuições de serviços
urbanos. Lima (1973, p. 12) estabelece ainda a relação direta das estratégias de
reabilitação de Alcântara ligadas às de São Luís, conforme podemos observar:
São Luis, por suas características socioeconômicas, culturais e políticas foi
incluída como uma das cidades prioritárias pelo Governo Federal para ser
estudada dento de um plano geral de urbanismo; assim, exige grande
atenção, pois é talvez a melhor oportunidade que o Brasil possui, para
afirmar mais uma vez, o seu poder criativo, dentro dum contexto que só
começou a desenvolver-se, „Tourisme d‟art‟.
E quando se fala de “Tourisme d‟art” nesta região, inclui-se, a cidade de
Alcântara, a “Pompéia Brasileira” como a classifica Parent (1973).
A denúncia da fragilidade e da desconexão da cidade da rede global pode
ser percebida de forma bem mais contundente no relatório intitulado Reestruturation
y desarollo, do arquiteto Raul Pastrana27, elaborado em Paris 1976 que ressalta
aspectos como a marginalização, a decadência sócia cultural a pobreza resignada e
a desconexão com os processos globais.
La situación actual de Alcântara puede resumirse en términos de
sobrevivencia y merginalizacion.Sobrevivencia porque la situación
económica e social no permite asimilar su modo de vida a un proceso de
desarrollo dinamique aunque limitado. Marginalización porque se ha aislado
paulatinamente del resto de la región y del país, no participando de seu
desarrollo. […] De la gloria de su pasado testimonian hoy los escasos
vestigios de ingenios de la región y los innumerables palacios em ruinas que
el mato invade inexorablemente. Las causa desta decadencia son
multiples.Entre ellas se pueden notar las económicas como consecuencia
de la desafección agropecuaria, pero también la emigración en la cual debe
buscare la causa de sua decadencia social y cultural […].
La población de Alcântara parece encontrarse em un estado que podríamos
calificar de pobreza resignada, creemos que ello se puede atribuir al hecho
que em su mayoría sencontram em la imposibilidad de inscribir sus
proyectos vitales individuales em la dinámica de un proceso social global de
desarrollo. Toda la Alcântara parece vivir com meios muy reducidos: por ello
nos permitimos de hablar en términos de sobrevivencia, como una pequeña
vida que continúa y se prolonga (PASTRANA, 1976, p. 16).
27
Raul Pastrana, arquiteto consultor da UNESCO. Os relatórios fazem parte do dossiê sobre
Alcântara do arquivo do Patrimônio Estadual e do programa Prodetur- MA.
150
Observamos nas palavras de Pastrana (1976) seu questionamento sobre
a impossibilidade da cidade de participar com seus projetos vitais na dinâmica de um
processo social global de desenvolvimento. Não havia naquela época informações a
respeito de um impacto maior que viria com a implantação de um grande
empreendimento em 1980 que foi o centro de lançamento de Alcântara.
Após todos os relatórios, denunciado as fragilidades da cidade e
propondo medidas de revitalização e em decorrência da implantação do Centro de
Lançamentos, foi assinado um convenio Nº01/198428 entre o Ministério da Cultura, o
Ministério da Aeronáutica, o Governo do Estado do Maranhão e a Prefeitura de
Alcântara com interveniência do IPHAN com objetivo de envidar esforços para
adequar as atividades do município à preservação do patrimônio histórico e para
melhoria da qualidade de vida da comunidade.Resultou deste convênio um
documento intitulado ” A cidade histórica de Alcântara: medidas para sua
preservação face ao novo dinamismo”elaborado em conjunto pelo IPHAN e
Ministério da Aeronáutica através do GICLA – grupo de implantação do Centro de
lançamento de Alcântara . Este documento sintetiza todos os relatórios
apresentados propondo medidas para expansão urbana e para o fortalecimento da
municipalidade. Percebe-se que muitos instrumentos técnicos foram disponibilizados
mas poucas ações os concretizaram .
5.2 As Ruínas como testemunho físico e simbólico dos momentos de
conexão e desconexão de Alcântara
As ruínas de Alcântara, objeto de estudo de historiadores e escritores
maranhenses e metáfora da decadência do Estado, configuram uma especificidade
dentro do conjunto arquitetônico tombado, são inúmeras e estão localizadas na sede
e na zona rural do município remanescentes das antigas casas das fazendas e dos
sobrados da aristocracia agro exportadora de algodão.
Vale apenas, neste momento, descrever um pouco as ruínas mais
importantes, pois elas são o testemunho dos diversos momentos de conexão e
desconexão da cidade nas redes sociais, políticas e econômicas .Representam um
elemento simbólico desse processo .
28
Arquivo SEPLAN-MA . Prodetur- Comissão de preservação projeto Praia Grande .1985
151
Podemos enumerá-las com facilidade, devido sua inserção no contexto
urbano. São ruínas de arquitetura militar, religiosa e civil, geralmente associadas ao
abandono e decadência pela degradação de seus elementos estéticos e
construtivos. Constituem-se reminiscências de um passado de glórias, fragmentos
da cidade colonial, da arquitetura luso-brasileira consolidada no século XVIII
inspirada no alçado pombalino e na reconstrução de Lisboa após o terremoto de
1755.
As ruínas denunciam o abandono que a cidade sofreu no século XIX e XX
e também por sua dimensão e monumentalidade são marcos do apogeu econômico
da cidade. São documentos do processo histórico, vestígios que o tempo conservou.
Podemos questionar porque alguns monumentos permaneceram intactos e outros
foram demolidos? A natureza desta permanência não faz parte da lógica urbana,
mas do valor apropriado de cada monumento.
Em Alcântara, do conjunto religioso original restou apenas a Igreja do
Carmo com as ruínas do convento, da igreja e convento das Mercês nada restou; e
da igreja da Matriz somente a fachada frontal e elementos laterais. Toda a Rua da
bela Vista hoje chamada de Rua da amargura está arruinada e coberta pela
vegetação que vai apagando parte do traçado.
:
Figura 31 Mapa das ruínas de Alcântara
Fonte: Barreto jr, - Manual de preservação do IPHAN, 2009
152
Identificamos algumas particularidades nas ruínas dividindo-as em
categorias conforme o mapa da cartilha do IPHAN
1. Ruínas religiosas – são as ruínas da Tríade religiosa (igreja da
Matriz, das Mercês e do Carmo) marcos originais da cidade, além
das Ruínas da Igreja da São Francisco cujo arruinamento foi
gerada pelo abandono e pelo vandalismo e as pedras foram
consumidas pela comunidade,
2. Ruínas Augustas – ruínas de sobrados feitos para a visita do
Imperador que nunca foram concluídas;
3. Ruínas da Rua amargura- ruínas da antiga Rua da Bela Vista fruto
da decadência e do abandono da elite rural;
Esquema da Tríade religiosa – Ruínas religiosas e marcos originais
Figura 32 – Estudo da formação de Alcântara no século XVII. Mapa base 1970
Fonte: Grete Pflueger, 2002
153
A tríade sobre a qual o traçado da vila religiosa de Santo Antônio de
Alcântara foi articulado no século XVIII, era formada por três igrejas e dois
conventos das ordens dos Mercedários e dos carmelitas e a Igreja Matriz de São
Mathias.Os marcos originais da cidade não resistiram a sua decadência (fotos
12).Hoje estão em ruínas, são os fragmentos da vila religiosa, que destacamos
abaixo:
5.2.1 Ruínas da Matriz de São Mathias (foto 12)- Matriz
Foto 12 - Ruínas da Matriz de São Mathias em 2010 e 1905
Fonte: Revista do Norte em 1905. Fotos de Francisco Otoni, 2007 e Marcio Vasconcelos, em 2010
O inventário do IPHAN29 consta que a igreja da Matriz sofreu no século
XIX um desabamento do telhado. Foi neste período de decadência econômica que
todos os moradores da cidade abandonaram seus sobrados, deixando para trás o
que não podiam vender. Desmontaram igrejas, capelas e sobrados, vendendo a
retalho todo o material de acabamento como azulejos, pedras de cantaria, sinos e
toda a arte sacra do interior dos templos.
De acordo com depoimentos de antigos moradores da cidade, a Igreja foi
vitima do vandalismo e do abandono, as paredes laterais da Matriz foram destruídas
pela retirada sistemática das pedras para construções de calçamento das ruas por
populares e pela própria municipalidade sobrando apenas a fachada frontal e parte
da estrutura das torres.
Em alguns momentos a comunidade negou a sobrevivência dos
monumentos, retirando-lhe seus materiais, promovendo a destruição e arruinamento
e transformando-os em casas, baldrames e calçamento de ruas em bairros
periféricos e favelas que emergem. Percebe-se que para a comunidade local, as
29
Estes dados foram buscados na 3ª Superintendência Regional do IPHAN no Inventario nacional
de bens moveis e integrados: ficha catalográfica do monumento.
154
ruínas estão associadas à cidade morta, ao passado distante da cidade rica e
opulenta que não existe mais e, desta forma, as ruínas são vistas como espaços
mortos, que não podem ser ocupados, congelando assim o tecido urbano.
Choay (2001, p. 106) nos explica sobre a destruição de monumentos com
o exemplo da França onde várias medidas foram tomadas para evitar o vandalismo
ideológico e outras formas de destruição do patrimônio que surgiram com a
revolução francesa, após 1792. Os atos privados de vandalismo, explica o autor,
pertencem ao cortejo tradicional que acompanhas as guerras, destruições e ainda
existem aquelas formas mais perversas que são feitas dentro da legalidade. Após a
revolução em toda a França, do campo à cidade, as pessoas que adquiriram bens
nacionais puderam impunemente, converter em materiais de construção, os mais
prestigiosos monumentos, como foi o caso da abadia de Cluny, destruída entre 1798
e 1823.
Na pesquisa empírica encontramos no acervo de obras raras da
Biblioteca Pública Benedito Leite de São Luís a “Revista do norte”, publicada entre
1901 a 1905, com imagens inéditas que demonstram o processo sistemático de
arruinamento dos monumentos de Alcântara.As duas imagens mais impressionantes
são as do convento dos mercedários e a da rua da amargura, ambas mostram as
paredes inteiras existentes em 1905, onde hoje so restam baldrames comprovando
que o vandalismo colaborou para o arruinamento.
Foto 13- Ruínas da Igreja das Mercês e da Rua da amargura
Fonte: Revista do Norte em 1905. Fotos de Francisco Otoni,
Algumas destas imagens estão no quadro abaixo onde fazemos uma
comparação das fotos de 1905 com as atuais, observamos que os momentos
155
estavam ainda bem completos no inicio do século e foram destruídos e vandalizados
ao longo dos anos.
5.2.2 Igreja e Ruínas do Convento do Carmo (foto 14)
Foto 14 – e 15 e 16 Igreja do Carmo e ruínas do convento
Fonte: Marcio Vasconcelos, em 2010
A Igreja e Convento do Carmo foram construídos em 1655. A ordem dos
carmelitas foi uma poderosa proprietária de terras, escravos e olarias em Alcântara.
Lopes (1970) afirma que já no final do século XIX as ordens religiosas entraram em
156
decadência, depois da adesão do Maranhão a independência, as ordens ficaram
entregues a si mesmas.O desleixo dos responsáveis não justificava a falência das
ordens, pois quando foram expulsas pelo Marques de Pombal, todas possuíam
rendas das fazendas, aldeias e sítios .Atualmente o convento está em ruínas e a
igreja com seu retabulo barroco foi restaurada pelo IPHAN e esta em funcionamento.
5.2.3 Ruínas da igreja e convento das Mercês (foto 17)
Foto 17 – Igreja e convento das Merces em 1905 e 2010
Fonte: Revista do Norte em 1905. Fotos de Francisco Otoni, 2007 e Marcio Vasconcelos,
em 2010
A Igreja e o Convento da ordem Mercedário foram construídas em 1668,
quando a ordem foi expulsa do Brasil. Várias de suas igrejas foram abandonadas e
arruinadas. Das ruínas da Igreja e do Convento dos mercedários em Alcântara, nada
restou a não ser o baldrame com uma nova construção feita pelo IPHAN
identificando o local onde estavam situado. Observamos na foto 13 imagens inéditas
da Revista do Norte com as empenas laterais da igreja ainda existentes em 1905 e a
situação atual.
157
5.2.4 Ruína de São Francisco de Assis (foto 18)
Foto 18 - Portal de São Francisco,
Fonte: Marcio Vasconcelos, em 2010
A igreja de São Francisco foi construída pela Ordem Terceira e de acordo
com inventário nacional de bens móveis e integrados da 3 ª SR do IPHAN consta
que em 1870 já estava ameaçada de destruição e em 1896 já estava totalmente
arruinada. É provável que sua ruína tenha se dado em virtude da perda de prestigio,
e decadência da ordem que a construiu (foto 19) atualmente encontra-se resumida
apenas à fachada com frontão em cantaria com o símbolo das duas mãos da
irmandade e o arco cruzeiro concêntrico em seu interior.
Foto 19 - detalhe do portal de São Francisco,
Fonte: Marcio Vasconcelos, em 2010
158
5.2.5 Ruínas da Rua da Amargura
...Há mais que uma lição profunda a beber nas pedras destas ruínas, por
esta rua da amargura que faz pensar tão amargamente no contraste entre o
passado e presente da cidade e no seu incerto futuro. Ontem uma grandeza
,hoje , uma ruína e amanhã o que será (Lopes ,1970, pag.18)
Foto 20 – Ruínas da Rua da Amargura
Fonte: Marcio Vasconcelos, em 2010
O processo de abandono produz reflexos diretos no traçado urbano e na
arquitetura civil. Neste contexto a Rua da Amargura tem um forte significado no
processo de decadência da cidade pois seu traçado foi apagado pela vegetação que
encobre as ruínas dos sobrados . A Rua da Amargura era a Rua da bela vista,
principal rua de moradia da aristocracia rural com solares e sobrados com
acabamento em pedra de cantaria, fachadas azulejadas e mirantes voltadas para o
mar, importantes exemplares da arquitetura luso- brasileira no Maranhão que hoje
estão cobertos pelo matagal.
Estes sobrados foram abandonados pelos senhores com a decadência da
lavoura de algodão e abolição dos escravos no momento em que deixaram a cidade
159
em sua mudança para a capital São Luis. O escritor maranhense Josué Montello
ilustrou este episódio no romance “Noite sobre Alcântara” quando o personagem
Natalino, descendente de fidalgos e barões desce a ladeira por entre as ruínas com
a chave no bolso e decidi jogá-la no mato cerrado.
Foto 21 - Rua da Amargura 2010 e 1905
Fonte: Foto atual Marcio Vasconcelos, 2010 e Revista do Norte em 1905
160
5.2.6 Ruínas augustas do Palácio do Imperador
Essa é uma das tantas histórias das ruínas da cidade, que foi recontada
por poetas e descrita pelos jornalistas. Trata-se se do palácio que foi construído para
a visita do Imperador Pedro II a Alcântara que se nunca foi concluído, pois a visita foi
cancelada e o palácio transformou-se em ruínas (foto 22).
Foto 22 – Ruínas do Palácio do Imperador
Fonte: Marcio Vasconcelos, em 2010
A história foi ilustrada por Gullar (1997, p. 15) em texto sobre a cidade de
“Alminta” que conta a história de Alcântara:
E chega-se mesmo a anunciar a visita do Imperador à cidade. Essa notícia
por si só fez crescer exageradamente a vaidade dos almintenses. [...]
Alminta começou a se preparar para a visita, que não aconteceu. Ainda hoje
pode-se ver a ruína do palácio que estava sendo construído especialmente
para hospedar o imperador: algumas paredes e portais de mármore
mantém-se ainda de pé em meio ao amontoado de pedras de cantaria,
devidamente preparadas para compor os muros e arcos.
161
E o fato foi comprovado na seqüência do “Jornal Imparcial” dos dias 14,
15 e 16 de junho de 1927 que narram a visita do príncipe D Pedro de Orleans e
Bragança ao Maranhão e a cidade de Alcântara para conhecer as ruínas do palacete
construído para hospedar seu avô o Imperador Pedro II. Os jornais noticiam que o
príncipe D. Pedro de Orleans e Bragança, sua esposa, a princesa D. Elizabeth, e
sua filha, a princesa Isabel, chegaram a São Luís a bordo do Itambé, vindo do Norte,
do Pará e do Amazonas. Desembarcaram em São Luís, na rampa do Palácio dos
Leões, e foram recebidos pelo então presidente do Estado Magalhães de Almeida,
acompanhado de sua esposa e autoridades locais, e depois conduzidos de
automóvel até o Palácio (Jornal o Imparcial de 14 de junho de 1927).
Na programação oficial do primeiro dia constava às 12h um almoço íntimo
com o Presidente no Palácio. No segundo dia foi realizada a visita à cidade de
Alcântara, em vapor especial, acompanhada pelo Senhor Presidente do Estado e
alguns convidados. O objetivo desta visita era o de conhecer as ruínas do imperador
que ainda se encontram intactas em Alcântara, testemunhando um fato que virou
uma lenda na cidade, como mostra Conde (1927).
O artigo relata a história do nobre alcantarense Antonio Raymundo
Franco de Sá, educado na corte e amigo de infância do Imperador Pedro II, que
construiu um palacete para receber o amigo em sua cidade natal. Para tanto
mandou trazer de Portugal todo o material, inclusive pedras de cantaria. No meio da
obra o fidalgo foi envenenado e a obra ficou parada, virando ruína. Assim, o
Imperador sequer chegou a visitar a cidade. Apenas em 1927 as “ruínas augustas”
foram homenageadas com a visita do neto do imperador, Pedro de Bragança. O
episódio da visita do mesmo foi amplamente divulgado em jornais de época.
A casa do Imperador
[...] É uma casa, ou melhor, uma ruína que dá a impressão, no mesmo
tempo, em Alcântara e da veneração com que os grandes senhores da
antiga nobreza brasileira cultivavam por D.Pedro II. É uma ruína solenne,
que imprimi respeito até pelas peças de granito e mármore que rolam em
derredor bem lavradas, de flores esculpidas. Em Alcântara, passa da bocca
dos velhos para a dos novos a história daquelas ruínas augustas. Antonio
Raymundo Franco de Sá foi seu constructor. Era ele um dos fidalgos mais
ricos da família tradicional dos Francos de Sá. Durante muitos annos serviu
Antonio Raymundo Franco de Sá de companheiro predilecto do filho de
Pedro I. Concluídos os estudos, voltou elle para o Maranhão.O fidalgo,
commovido de tantas homenagens, lembrou uma visita do Imperador ao
norte, até Alcântara. E insistiu em retribuir as festas recebidas.
162
Antonio Raymundo Franco de Sá pediu ao imperador que esperasse um
aviso seu, antes de partir. E do Rio mesmo encomendou grande quantidade
de pedras portuguesa de cores diversas, granitos, mármores, tudo de
Portugal.
Um dia, entretanto que não sei se era bello ou feio, alguém que não gostava
do rico fidalgo o mandou deste para um mundo que dizem ser melhor, com
terrível veneno. Com a morte de Antonio Raymundo Franco de Sá, a casa
passou para a propriedade dos filhos que o rico fidalgo possuía.E a casa foi
aos poucos ficando em ruínas, cahiu o primeiro andar, espalhando pedras
esculpidas pela rua a fora, mas ficou com o pavimento térreo erecto, como a
demonstrar a solidez da amizade que o levantara. E se D.Pedro II não veio
em pessoa a Alcântara, encarregou-se da missão o seu neto Pedro de
Bragança, que em 1927 visitou as ruínas em companhia do Presidente
30
Magalhães de Almeida. A casa esperou pela magestade real e a
magestade veio. Não importa que ella o recebesse em ruínas. A magestada
que a visitou também vinha em ruínas... Esta finda a missão agora podeis
cair ruínas augustas! (o imparcial, 1927, p. 1).
Montello (1984) também ilustra o final do período Imperial. No livro “Noite
sobre Alcântara” o autor conseguiu traduzir toda a história da vila colonial em seu
apogeu e decadência em um romance de fôlego, reconhecido internacionalmente
Quando esta geração passar, e outra vier, e mais outra, talvez só haja
ruínas onde hoje se alteiam os velhos sobrados de Alcântara, rodeados de
silêncio e solidão”. Vejo de perto, mais uma vez, a resignada cidade
imperial, depois de tê-la olhado de longe com meus olhos de menino, e
sinto-lhe, emocionado, a vagarosa agonia. Dói reconhecer, mas não posso
calar; a Alcântara senhorial, que viu passar nas suas ruas retilíneas os
orgulhosos palanquins doirados, está-se acabando. Morre devagar, dia por
dia, hora por hora, silenciosa e esquecida (MONTELLO, 1984, p. 11).
Em crítica a este livro publicada no Jornal do Comércio do Rio de Janeiro
em 1978, Austregésilo de Athayde afirma que os romances maranhenses de
Montello, já numerosos, fixam antes de tudo a universalidade do sentimento e
caracterizam-se por ações e acontecimentos comparáveis a densidade psicológica
dos personagens, sob os influxos das idéias dos costumes do tempo. Ressalta o
autor que o gênio do romancista sempre foi à possibilidade de fazer coexistir o
misterioso e o real, o evidente e o invisível e a atmosfera maranhense está
carregada simultaneamente de mistério e realidade.
Com maestria absoluta da pena que possui, Montello nos toma pela mão, a
fim de assistirmos ao crepúsculo de uma cidade e com ela o fim do Brasil
imperial. O encanto deste livro está precisamente na presença de duas
ausências: a morte de um regime e a morte de uma cidade (ATHAYDE,
1978, p. 78).
Considera Athayde (1978), que o essencial na obra e arte é a
identificação do homem com seu meio, onde o artista encontra os símbolos, o poder
de transformar a realidade subjacente na consciência, em criações imaginárias.
30
Magestade - grafia de época. Grafia atual correta majestade.
163
Afirma que nenhum romancista alcança os páramos de seu gênero sem esse
patrimônio de experiências dos sentidos acumuladas por ele próprio ou adquiridas
de gerações que nele encarnam pelo mistério da hereditariedade e ele inicia seu
texto com a seguinte frase: as cidades passam como os homens e não seria bom
que fossem eternas? (ATHAYDE, 1978) e conclui afirmando que Alcântara não
morrerá jamais.
A seguir examinaremos o ultimo momento da história recente de
Alcântara, quando da instalação do centro de lançamento de foguetes
5.2.7 Ruínas do futuro
Além das ruínas do passado colonial e imperial, Alcântara também tem
ruínas contemporâneas resultantes de um grave acidente com a plataforma de
lançamentos de foguetes.
Em 2003 houve um grande incêndio no centro de Lançamentos em Alcântara
localizado a 5 km da cidade histórica. Este incidente teve início com a ignição
espontânea de um dos quatro motores do foguete, segundo o major brigadeiro Tiago
Ribeiro, diretor do Centro Técnico Aeroespacial (CTA) e destruiu o Veículo Lançador
de Satélite (VLS-1) causando a morte de 21 técnicos e cientistas na base espacial
de Alcântara, no Maranhão (Folha Press, 2003).
Esse acidente da base espacial foi comentado pelo poeta contemporâneo
31
maranhense Chagas (2008) em artigo intitulado “Inferno sem barreira” com uma
denúncia da situação das ruínas de Alcântara através da análise das ruínas antigas
da cidade colonial e das novas ruínas resultantes da plataforma de lançamento de
foguetes). No artigo o autor refere-se a Alcântara como uma “infelizcidade”.
“E de fato, vítima tanto do tempo quanto do espaço, Alcântara sofre pelo
passado que lhe arrancaram à força e por um futuro que também à força lhe
querem dar”. A rigor é uma cidade que não tem presente. Eu disse sobre
ela, no meu livro “Alcântara - negociação do azulou a castração dos anjos ”-
que ali” o tempo se condensou em tempo de espera /espera de tudo/e o
grande orgulho da cidade é saber hoje esperar/o passado/que pelo futuro/
qualquer cidade espera (CHAGAS, 2008, p. 8).
31
José Chagas é membro da Academia Maranhense de letras, autor de 11 livros. Cf. CHAGAS,
Jose. Alcântara: negociação do azul ou a castração dos anjos. São Luis: Edições AML; SIOGE,
1994.
164
Figura 33 - Ruínas da Plataforma de Lançamento Foto 23 - Ruínas do Palácio do
Foguetes em Alcântara Imperador,
Fonte: O Estado do Maranhão, em 2003 Fonte: Grete Pflueger, 2009
Foto 24 - Ruínas da Rua da Amargura, Figura 34 – Ruínas da plataforma de
Fonte: Grete Pflueger, 2009 Fonte: Florido (2003) lançamento
Após sete anos do acidente que destruiu a primeira torre do Centro de Lançamento
de Alcântara e que deixou saldo de 21 mortos em 2003, uma nova estrutura para a
plataforma de lançamento denominada de TMI (Torre Móvel de Integração) está
praticamente concluída. A nova torre de lançamento do foguete espacial brasileiro
VLS-1 (Veículo Lançador de Satélite) de acordo com dados do Instituto de
Aeronáutica e Espaço32 foi aperfeiçoada e contempla equipamentos de segurança
que não existiam na versão anterior, que derreteu na explosão ocorrida em 2003.
Os recursos para a obra do complexo espacial foram em torno de R$ 44,1 milhões.
De acordo com o engenheiro Valderci Giacomelli, gerente do projeto, a nova torre é
toda em estrutura de aço e pesa 380 toneladas, mede 33 metros de altura, o
equivalente a um edifício de nove andares. O projeto foi desenvolvido no Instituto de
32
Disponíveis no site http://brazilianspace.blogspot.com/2010/07/torre-do-vls-esta-em-fase-final-de.html
165
Aeronáutica e Espaço, vinculado ao Departamento de Ciência e Tecnologia
Aeroespacial, em São José dos Campos – SP
Foto 25 - Nova plataforma inaugurada em 2011
Fonte : Brazilianspace.
166
6.ALCANTARA NO SECULO XXI
Figura 35 - Planta cadastral cidade de Alcântara, em 1970
Fonte: Pedro Alcântara
Figura 36 - Imagens de satélite de Alcântara
Fonte: Google Earth (2011)
167
Podemos observar a transformação urbana da cidade com o confronto do
mapa cadastral da década de 1970 com a imagem de satélite do Google Earth de
2011. Na planta cadastral de 1970 observa-se a fragilidade urbana da cidade em
processo de decadência e que apresenta uma malha urbana pequena. Na imagem
de satélite de 2011 observamos a expansão da ocupação das encostas e a avenida
de anel de contorno consolidada (foto 22) figuras 27 e 28. O crescimento da cidade
é visível e também a explosão da ocupação das áreas de encostas do mangue.
6.1 A questão fundiária e o Centro de Lançamento de Alcântara
A questão territorial e fundiária em Alcântara configura-se como um
desafio, as terras de propriedade inicialmente das ordens religiosas carmelitas,
mercerdárias e jesuítas durante todo o século XVII e XVIII foram abandonadas e
apropriadas passando para os aristocratas e para o Estado na medida em que
ordens foram extintas como a dos mercedários e jesuítas, criando uma situação
confusa nas titularidades dos terrenos urbanos. As ruínas dos grandes conventos e
igrejas das casas de fazendas e engenhos são hoje reconhecidas como área de
proteção federal pelo IPHAN e configuram-se como sítios arqueológicos.
Muitos imóveis em Alcântara, devido o processo de decadência
econômica, são objeto de infindáveis inventários de famílias burguesas decadentes
que acabaram virando ruínas na impossibilidade de desapropriação ou venda ou
pelo alto custo da restauração.
Na zona rural de Alcântara, no século XIX após a decadência econômica
e com o abandono dos engenhos e fazendas pelos aristocratas e produtores rurais
as terras foram doadas aos negros libertos que permaneceram nelas criando novas
categorias de titularidade denominadas pela “nova cartografia social” de: terras de
santo, terras da pobreza, e terras de negros reconhecidas como territórios étnicos
dos remanescentes de quilombos. A questão territorial está no centro da discussão
entre quilombolas e o centro de lançamentos, na qual ambos brigam pela
titularidade.
Em 1999 foi instaurado um inquérito público destinado a diagnosticar
possíveis irregularidades na implantação e funcionamento do Centro de
Lançamento, especialmente com relação ao reassentamento das famílias residentes
na área desapropriada e aos problemas da sede.
168
A ocupação desordenada das áreas de mangue, do Baixão do Lobato
(foto 23) e do entorno da Avenida de Anel do Contorno deu início a um processo de
favelização em Alcântara, alterando a estrutura da malha urbana, áreas de interesse
ambiental e arqueológico. O Processo de favelização do entorno foi visível assim
como o crescimento de bairros pobres com casas de taipa nos baixões, valas e
encostas de mangues favorecidos pela topografia do promontório onde a cidade foi
implantada.
Foto 26 - Favela do Anel de Contorno, em Alcântara-M
Fonte: Grete Pflueger, 2009
Foto 27 - Baixão do Lobato - ocupação irregular
Fonte: Marcio Vasconcelos, em 2010
Na figura abaixo destacamos em verde a avenida do anel de contorno
que foi construída em 1980 para atender o tráfego pesado de caminhões fora do
centro no período da construção do Centro de Lançamentos. Observa-se hoje que
em torno desta avenida começou o processo de favelização das áreas de mangue e
ocupação dos baixões situados nas imediações desta avenida.
169
Figura 37 - Avenida de Anel de Contorno sobre mapa de GPS, de Alcântara-MA, em 2000
Fonte : Grete Pflueger, 2010
O Centro de Lançamento pouco contribuiu para o crescimento econômico
da região e além disso o êxodo da população deslocada de seus povoados na zona
rural para a sede pressionou a estrutura física e social da cidade, gerando
desagregação social e urbana .
Decorridos 30 anos da implantação do CLA-Centro de Lançamentos
(1980) questões preliminares ainda são discutidas, como, por exemplo, a
consolidação do primeiro Relatório de Impacto Ambiental (EIA-RIMA) do
empreendimento no município e a delimitação da área de tombamento federal.
O termo de referência do EIA RIMA proposto foi rejeitado por
desconsiderar o contexto etno-histórico e arqueológico regional assim como os
impactos sobre o patrimônio cultural da sede, já evidente, como o processo de
favelização, além da definição das medidas mitigadoras do processo. Além deste
impasse, há ainda o problema da falta de delimitação da área de tombamento
federal. Sem os instrumentos técnicos e sem o conhecimento do zoneamento
necessário, os mecanismos de preservação foram deficientes e o processo de
ocupação do espaço urbano da cidade ocorreu sem controle.
170
Nesse sentido, o IPHAN elaborou um plano diretor para a cidade histórica
que estabeleceu critérios para a regulação das áreas de intervenção e contenção da
ocupação desordenada.
Persovian (2006) explica que grande parte das famílias que estão
morando, atualmente nas periferias da capital, especialmente do bairro da Camboa
e Liberdade são oriundas de Alcântara, “muitas por conta da implantação da base,
que as expulsou de suas terras”. Os moradores destes bairros são produtores de
carvão, prática antiga dos alcantarenses, eles comercializam o produto oriundo das
comunidades negras do interior do município. O carvão chega à capital nas canoas
costeiras que encostam nas proximidades das margens do Rio Anil, abaixo da ponte
Bandeira Tribuzzi e são revendidos pelos alcantarenses que moram na periferia de
São Luis.
Castells (2005) coloca que a globalização atua de forma seletiva incluindo
e excluindo segmentos de economias e sociedades das redes de informação,
riqueza e poder que caracterizam o novo sistema dominante. Ressalta ainda o papel
das organizações sociais dentro da nova dinâmica das redes e da globalização
como elementos de resistência na mediação da relação dialógica entre o local e o
global. Podemos observar que este processo ocorre com as comunidades
quilombolas de Alcântara, que uma vez reconhecidas pela Constituição Federal de
1988, estão atuando de forma a conseguir a titularidade das terras dos negros.
Na América Latina o nível de desigualdade na distribuição de renda
sempre foi elevado. Para países em desenvolvimento como o Brasil, Castells (2005)
afirma que a disparidade corresponde à taxa de migração do campo para a cidade,
uma vez que o principal fator referente à desigualdade na distribuição de renda é a
diferença abissal entre os níveis de renda na área rural e nas aglomerações
urbanas. Em suas estatísticas, o autor apresenta dados de 1990 relativos ao que era
considerada a linha de pobreza extrema e o nível de consumo equivalente a um
dólar por dia, significa dizer que 1.3 bilhões de pessoas, 33% da população em
desenvolvimento, encontram-se em estado de miséria, destas pessoas 550 milhões
vivem na Ásia, 215 na África e 150 milhões na América Latina. A individualização do
trabalho deixa os trabalhadores à mercê da própria sorte, tendo de negociar seu
destino em vista das forças de mercados e mudanças constantes.
Em seus estudos sobre as cidades na economia mundial, Sassen (1998)
considera que ao lado das novas hierarquias globais e regionais há um vasto
171
território que se tornou cada vez mais periférico e cada vez mais excluído dos
grandes processos econômicos que alimentam o crescimento econômico na nova
economia global. Uma multiplicidade de centros manufatureiros, cidades portuárias
outrora importantes, perdeu suas funções e encontra-se em declínio. É o caso
particular de alguns estados brasileiros e de algumas cidades históricas, como
Alcântara.
Sassen (1998) trabalha ainda o conceito de cidades periféricas como
cidades que se transformaram em secundárias ou marginais devido às
transformações na economia mundial. Elas perderam a importância, pois os
produtos que exportavam ou produziam caíram em desuso, subtraindo seu lugar
privilegiado para as novas cidades. Algumas cidades decadentes, provavelmente
jamais recuperarão a importância que tiveram, portanto terão dificuldades de se
reconectar em rede de cidades importantes hoje. Ela nos coloca a nova geografia
dos centros e margens ressaltando que três fatores importantes nos últimos 20 anos
estabeleceram as bases de análises das cidades na economia mundial:
1. A dispersão territorial das atividades econômicas das quais a
globalização é uma das formas contribuiu para o crescimento
das funções e operações centralizadas.
2. O gerenciamento e controle centralizados sobre um conjunto
geograficamente disperso de operações econômicas não
ocorrem inevitavelmente como parte de um sistema mundial,
pois requerem a produção de um conjunto de serviços
especializados.
3. A globalização econômica contribuiu para uma nova geografia
da centralidade e da marginalidade
Desta forma surge o lócus da periferia resultante da dualidade existente
entre países desenvolvidos e menos desenvolvidos que gerou esta geografia da
centralidade e da marginalidade, repleta de desigualdades representando a
transformação da geografia do centro e da periferia. A condição de ser periférico
instala-se em diferentes terrenos geográficos, e dependendo da dinâmica econômica
presenciamos hoje novas formas de periferização do centro de algumas grandes
cidades.
172
O que nos leva a concluir que o processo de exclusão nos diferentes
momentos da formação das cidades, válido também para o caso de Alcântara, em
temporalidades diversas, resultou em isolamento, favorecendo o abandono e a
decadência.
Figura 38 – croqui esquemático do processo de favelização de Alcântara
Fonte : Grete Pflueger, 2011
173
6.2 Projeto Cyclone space
Em 2005 o governo brasileiro promulgou o Decreto Lei N° 5.436 que
ratifica o tratado entre a República Federativa do Brasil e a Ucrânia sobre
Cooperação de Longo Prazo na Utilização do Veículo de Lançamentos Cyclone-4 no
Centro de Lançamento de Alcântara assinado em Brasília em 21 de outubro de
2003. O objetivo do presente Tratado é definir as condições para a cooperação de
longo prazo entre as partes sobre o desenvolvimento do sítio de lançamento do
Cyclone-4 e a prestação de serviços de lançamento para os programas nacionais
espaciais das partes, assim como para clientes comerciais.
Este projeto em pleno andamento tem causado polêmicas. O Jornal “A
33
Folha de São Paulo” , na seção debates, que traz opiniões divergentes convidou
Maristela Andrade, antropóloga e Roberto Amaral, cientista e diretor geral do Ciclone
space e colocou a seguinte questão sobre Alcântara. - As obras atuais do programa
espacial brasileiro no Maranhão configuram invasão das terras quilombolas.
Em resposta positiva a antropóloga e Dra Maristela Andrade da
Universidade federal do Maranhão, explica que os militares em 1980 quando
implantaram o centro imaginavam Alcântara como um vazio demográfico,
desconhecendo a existência de terras de quilombos, mas em 1988 a constituição
federal garantiu aos remanescentes de quilombos o direito á titulação das terras.
Alcântara teve seu território étnico integrado por 150 comunidades onde residem 17
mil pessoas reconhecido pela Fundação Palmares no ano de 2000.
Esta perspectiva mudou completamente a questão da desapropriação das
terras e destas comunidades negras para a ampliação do centro de lançamentos.
Em defesa do projeto Roberto Amaral afirma que é indiscutível a importância do
programa espacial no Brasil para segurança do espaço aéreo, monitoramento
ambiental de nosso território e às telecomunicações em geral.
A Ucrânia possui uma das mais testadas linhas de foguetes mas não
possui base de lançamento e Alcântara possui a estrutura mas não tem tecnologia e
está a 2,2 graus da linha do equador que possibilita maior capacidade de
lançamentos para órbitas equatoriais .Amaral afirma que os quilombolas já
paralisaram por um ano o projeto e que os prejuízos são enormes .
33
Folha de São Paulo, 28 de fevereiro de 2009.seção tendências e debates , pagA3.
174
Figura 39: Mapa da área em litígio entre Ciclone e Quilombolas – Alcântara-MA
Fonte: Revista [Epoca de 12/02/2009 .artigo de Mariana Sanches: INCRA atrasa o já
emperrado projeto espacial brasileira por causa de quilombos.
Pereira (2009) explica que o acordo com a Empresa Brasileiro-Ucraniana
Cyclone Alcântara Space foi objeto de polêmica no início da gestão do Governo
Federal devido a cláusulas que não levavam em conta à soberania nacional e que
limitavam a permissão para acesso à base por brasileiros.
Ele afirma que embora Alcântara seja considerada o melhor local do
mundo para lançamento de foguetes, o programa espacial está sendo emperrado
por grupos indígenas e quilombolas que estão instalados na região. O esforço da
aeronáutica tem sido em tentar um acordo com os quilombolas para que os
lançamentos não sejam impugnados pelos movimentos sociais e se tornem alvo de
protesto.
175
6.3 O Território étnico das comunidades quilombolas: os impactos do Centro de
Lançamento de Alcântara34
De acordo com estudos do antropólogo Alfredo Wagner B. de Almeida, os
povoados de Alcântara constituem um “território étnico” ou “território de
exclusividade negra”. Grande parte dessas comunidades está na área de terras que
estão sendo desapropriadas pela base espacial de Alcântara, onde, estima-se, estão
3.600 famílias.
Mesmo as famílias que estão fora da área da base espacial sofreram e
vêm sofrendo danos por causa dos impactos causados pela instalação do
empreendimento, Decorrente do acordo de Salvaguardas Tecnológicas assinado
entre o Brasil e os Estados Unido, e, atualmente pelo projeto Cyclone Space com a
Ucrânia
A área que o governo do Maranhão pretende desapropriar foi dividida em
duas. A Área I correspondente a cerca de 16 mil hectares está na chamada “área de
segurança”. A Área II corresponde ao restante do território que está sendo tirado das
comunidades. Esta área abriga as moradias dos oficiais e técnicos do Centro de
Lançamento de Alcântara, um aeroporto e algumas agrovilas que receberam as
comunidades já deslocadas.
Entre os principais problemas enfrentados pelas comunidades estão:
êxodo rural; formação de favelas, palafitas e ocupações na zona urbana do
município; precariedade das condições nas agrovilas; irrisórias indenizações para as
comunidades que já foram deslocadas; ameaça de novos deslocamentos forçados;
ameaça da desestruturação de algumas comunidades por causa da inclusão dos
agrupamentos forçados das comunidades; esgotamento dos recursos naturais e
destruição ambiental; impedimento à pesca pelas comunidades e ao acesso aos
cemitérios onde estão enterrados os parentes dos moradores.
34
Cf. REDE SOCIAL DE JUSTIÇA E DIREITOS HUMANOS. Os impactos do Centro de lançamento de
Alcântara. Disponível em: <http://social.org.br/cartilhas/cartilha001/cartilha003.htm>. Acesso em: 12 mar.
2010.
176
Hoje, as comunidades encontram-se em três categorias:
1. Ameaçadas de deslocamento: comunidades que estão na
iminência de ser obrigadas a deixar suas terras. Elas sofrerão
deslocamento forçado para áreas que pertencem a outras
comunidades;
2. Ameaçadas de desestruturação: comunidades que estão na
iminência de receber em suas áreas centenas de famílias
provenientes das “comunidades ameaçadas de deslocamento”.
Isso iria gerar a desestruturação da cultura, da produção, dos
recursos naturais e do modo de viver destas comunidades;
3. Deslocadas: comunidades que foram forçadas a deixar suas terras
e foram deslocadas para “agrovilas” no período inicial de
implementação do Centro de Lançamento de Alcântara. Estudos
da Confederação de Trabalhadores na Agricultura (CONTAG)
mostram que a instalação da Base Espacial aumentou os casos de
prostituição de gravidez na adolescência nas comunidades.
A importância histórica e cultural dessas comunidades fez com que a
constituição brasileira de 1988 reconhecesse o direito delas aos seus territórios. Em
geral, são territórios denominados “remanescentes de quilombos”. Essas
comunidades, vindas de doações a ex-escravos, também são chamadas de “terras
de preto” ou “comunidades negras”. Seus integrantes recebem o nome de
“quilombolas”. Já as terras abandonadas por ordens religiosas deram origem às
“terras de santo” e “terras de santíssimo”.
177
Figura 40 -Evolução tecnológica ou empreguismo
Fonte: Jornal Pequeno .1/07/2008- Viviane (2008)
178
Figura 41– Duas realidades
Fonte: Fonte: Jornal Pequeno .29/07/2007- Viviane (2007)
179
6.4 Alcântara no século XXI
De acordo com o mapa da nova cartografia social da Amazônia
(PEREIRA JUNIOR, 2008) que promoveu o levantamento de todos os povoados do
município de Alcântara, catalogando-os, grande parte deste território, 51 % do total,
foi desapropriada pelo Centro de Lançamentos, remanejando comunidades de
pescadores na área do litoral e antigos quilombos para as agrovilas construídas pela
aeronáutica em áreas inadequadas.
A classificação das terras de Alcântara, de acordo com Fernandes (1998),
respeita uma divisão especial com denominações como: „Terras de santo’ que se
aplicam às terras doadas às ordens religiosas como o povoado de Itamatatiua
dedicado à Santa Teresa D‟Avila; “terras de preto”, remanescente dos quilombos;
“terras de parente”, doadas por herança ou as terras da pobreza, doadas pelos
antigos proprietários aos pobres.
Figura 42 – mapa do município de Alcântara com a demarcação da área do CLA
Fonte: http://www.alcantaracyclonespace.com
180
Figura 43 – Planta digital da cidade de Alcântara, em GPS, em 2000
Fonte: Prefeitura Municipal de Alcântara
A população residente, de acordo com a sinopse do censo de 2010 do
35
IBGE , é de 21.851 habitantes, divididos entre a sede (zona urbana) com
aproximadamente 5.908 habitantes correspondendo a 29,28% da população e a
zona rural com 15.452 habitantes equivalentes a 70,72% do total. S densidade
demográfica é de 14,7 hab. /M (quadro 3).
População 1940 1950 1960 1982 1991 2000 2010
Total 11079 14820 16089 15815 19587 21291 21851
Homens 5680 7527 8089
Mulheres 5399 7293 8000
Sede 5000 5908
São João 3745 2285 2700
Zona rural 12000 14000 16.291 15.452
Quadro 3 – Resumo populacional
Fonte: Dados IBGE- MA, censo 40-2010
35
Dados montados a partir dos censos dos anos entre 1940 e 2007, disponíveis no site do
IBGE(http://www.ibge.gov).http://www.censo2010.ibge.gov.br/sinopse/index.
181
A maioria dos povoados não dispõe dos serviços básicos como
eletrificação, água encanada e saneamento. Os serviços públicos oferecidos pela
municipalidade são precários e atendem apenas à sede e aos povoados maiores
como São João de Cortes e Oitiua. Vale ressaltar que a energia elétrica chegou à
sede de Alcântara na década de 80, pois antes a cidade era atendida por gerador e
a zona rural vivia sem nenhum serviço básico do Estado como luz e esgoto. O
acesso aos povoados é feito por estradas de terra, dificultando as trocas comerciais
e favorecendo o isolamento. O índice de analfabetismo é um dos maiores do Estado.
O IDH do estado é 0, 636 um dos menores do país e o de Alcântara é ainda menor.
Alcântara –Ma- dados econômicos – renda 1991 2000
Renda per Capita 57,92 60,73
Indigentes
1991 2000
% de indigentes 49,90% 54,50%
% de crianças indigentes 56,45% 63,87%
Intensidade da indigência 43,40% 64,55%
% de pobres 76,15% 79,63%
% de crianças pobres 81,58% 86,39%
Intensidade da pobreza 57,53% 64,27%
Quadro 4 - Renda per capita e Percentual de Indigentes no Município de Alcântara
Fonte: Confederação Nacional de Municípios (2010a) www.cnm.org.br/economia
De acordo com os dados do recente “Relatório de Diagnóstico Local” os
índices de pobreza do município são expressivos: O resultado deste quadro se faz
sentir nos indicadores de pobreza e indigência no município de Alcântara, todos com
tendência de alta. Esse fenômeno alcança também as crianças e compromete as
perspectivas futuras do município (BURNETT; MUNIZ, 2009).
A composição do Produto Interno Bruto (PIB) de Alcântara não deixa
dúvidas quanto ao peso dos serviços na economia local, francamente superior à
própria agropecuária e muito acima da incipiente indústria.
Sendo o único fator a apresentar crescimento constante, juntamente com
a administração pública, os serviços reforçam o caráter improdutivo da atividade
182
econômica de Alcântara, que se renova às custas dos investimentos e dos salários
pagos pelo poder público (quadro 5).
Fator 2002 2004 2006
IDH 0, 588 0,588 0, 600
PIB per capita 1, 609.94 1, 733.32 2, 171.80
População 21, 780.00 22, 165.00 22, 550.00
Quadro 5 - Composição do PIB
Fonte: Confederação Nacional de Municípios (2010b)
O “Relatório de Diagnóstico Local” aponta o turismo como uma
possibilidade de articulador territorial:
Ao identificarmos a reduzida possibilidade de uma retomada do
desenvolvimento em Alcântara a partir de suas próprias forças, sejam elas
urbanas ou rurais, a questão de um fator externo surge como alternativa
decisiva [...] Há, porém, outro fator externo que pode contribuir para o
desenvolvimento de Alcântara e contribuir na construção de um modelo de
sustentabilidade. Graças à qualidade do seu espaço urbano e do acervo
arquitetônico, bem como do forte simbolismo que a cidade carrega, o
potencial turístico de Alcântara deve ser desenvolvido. Entretanto, além de
pouca reversão econômica para o município, os pacotes existentes exigem
disposição e saúde, além do fato de que a cidade conta com um forte rival
no próprio centro histórico de São Luís. Mas, diferentemente da capital, a
elaboração de um programa de turismo integrado campo-cidade tem em
Alcântara amplas possibilidades de sucesso. Para combater o “turismo de
um só dia”, a alternativa é criar vínculos entre a sede e as comunidades
rurais, com os visitantes participando e incorporando a história e a cultura
alcantarense em sua totalidade (BURNETT; MUNIZ, 2009, p. 20).
Os Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) e o PIB se apresentam
baixos, pois a economia do município, atualmente, é baseada na agricultura de
subsistência. Ainda que o turismo seja considerado como fonte de renda do
município, ainda é bastante incipiente. Some-se o fato de que o governo estadual
esta dando ênfase ao turismo na região dos lençóis maranhenses,sem articular os
dois destinos políticos .
O principal empregador é a prefeitura, que conta com uma pequena
parcela do Fundo de Participação Federal, insuficiente para a manutenção de todo o
município. Na zona rural, a agricultura de subsistência é centrada no plantio da
mandioca, banana, milho, arroz, na produção tradicional do carvão vegetal, na
extração do côco de babaçu e na pesca artesanal.
Diante de um cenário de transformações, a comunidade de Alcântara
conservou suas tradições como resistência aos processos externos. As mais
183
expressivas manifestações culturais são as duas festas religiosas: a do Divino
Espírito Santo em maio e a de São Benedito em agosto. São momentos muito
especiais de grande interação, solidariedade e participação da comunidade que, por
sua originalidade, atraem turistas do interior do Estado. A comunidade desliga-se de
sua dura realidade, comemora e revive elementos tradicionais da cultura da antiga
vila de Santo Antonio de Alcântara revelando características muito peculiares de sua
história.
O turismo é visto como a principal alternativa econômica. O turismo que
acontece neste momento está caracterizado por dois tipos: a)o turismo de visitas
diárias , b) o turismo de fim-de-semana e c ) o turismo sazonal
Ambos decorrem do incremento do turismo na capital, especialmente
após o reconhecimento de São Luís como Patrimônio Mundial em 1998. Esse fluxo
contribui pouco para a economia do município visto que ambos não geram novos
empregos nem dinamizam a atividade hoteleira. O turismo diário apenas traz algum
beneficio para o setor de alimentação. E o de fim de semana ainda é mais
prejudicial, pois normalmente a população flutuante que chega à Alcântara, traz tudo
o que precisa de seus locais de origem.
O turismo sazonal mais intenso que ocorre nos períodos de férias, julho e
dezembro e nas festas tradicionais em maio e agosto, provoca uma expressiva
demanda, e a cidade sofre os problemas da sobrecarga, pois despreparada para
receber o turista, devido à falta de infraestrutura urbana, hoteleira e de serviços
provoca um caos urbano no fornecimento de água e luz, coleta de lixo e
abastecimento de produtos na cidade. Além das dificuldades de acessibilidade
decorrente da travessia feita por embarcações simples que dependem dos horários
das marés para chegada e saída.
De um modo geral a cidade depende dos produtos vindos de São Luis,
vivenciando hoje ainda sua relação histórica de dependência social e econômica
com a capital. No passado, ainda havia certa interdependência, pois a cidade era um
entreposto de mercadorias produzidas nas fazendas e abastecia a capital com seus
produtos. Hoje, Alcântara depende quase inteiramente de produtos e serviços
provenientes de São Luís. As mercadorias, profissionais e serviços específicos
chegam de barco regularmente e todos os produtos consumidos na sede vêm de
fora.
184
7 CONCLUSÕES
Esta tese buscou analisar o processo de apogeu e declínio da cidade de
Alcântara no Maranhão. Neste sentido escolhemos autores (Wallerstein, Castells,
Santos, Reis filho e Geiger) que nos ajudaram a contextualizar a cidade de Alcântara
dentro das redes urbanas globais e regionais. Na perspectiva de que as cidades
estão interligadas em redes e que se conectam e se desconectam delas em
diferentes temporalidades e por razões diversas.
Concluímos que o Brasil e, por conseguinte o Estado do Maranhão e a
cidade de Alcântara se inserem na categoria de periferia na teoria do sistema mundo
de Wallerstein(1980,2001,2007) tendo sido explorados pelos governos centrais, no
caso Portugal. .A aristocracia maranhense era ligada ao núcleo, a corte européia
portuguesa, fornecendo matérias primas e enriquecendo a economia mundial.
Alcântara, sede da aristocracia rural, estabelecia conexões diretas com Portugal, os
descendentes da elite estudavam em Coimbra e de lá vinham os produtos de luxo
para consumo. A conexão com o núcleo era tal que o Maranhão foi o ultimo Estado
a aderir à independência do Brasil.
Com relação aos meios colocados por Milton Santos
(2002,2006)concluímos que Alcântara se insere nos três meios da seguinte forma:
no meio natural, Alcântara ocupou um lugar geográfico estratégico na rede das
grandes navegações. A aldeia “Tapuitapera” foi ponto de passagem da navegação
francesa, portuguesa e holandesa no processo de ocupação dos territórios no
contexto da colonização do continente. No segundo meio, o técnico científico, foi o
período do apogeu da lavoura do algodão no Maranhão, onde Alcântara foi a sede
da aristocracia rural agro exportadora. E no terceiro e ultimo meio, na
contemporaneidade consideramos o momento em que o território do município, pela
posição estratégica em relação ao equador, sediou um empreendimento global - O
centro de lançamento de foguetes, conectando a cidade ao mundo informacional e
global.
Com relação ao lugar que Alcântara ocupa na sociedade da era
informacional observamos que Castells (2002) ressalta que o surgimento desta era
está entremeado de desigualdade e exclusão social crescente em todo o mundo.
Isto significa que na contemporaneidade nem todos estão em rede e muitos estão
excluídos. Alcântara é uma dessas cidades que foram excluídas da rede e hoje se
185
reconecta através de um projeto global. Castells (2002, p. 98), afirma que a exclusão
social é um processo, não uma condição. Excluídos e incluídos podem se revezar no
processo ao longo do tempo.Desta forma em diferentes temporalidades Alcântara se
conectou e se desconectou das redes locais e globais.
Do ponto de vista das cidades na economia mundial concluímos que
muitos centros outrora importantes, perderam suas funções e encontram-se em
declínio. É o caso particular de algumas cidades históricas, como Alcântara. Na
categorização de Sassen (1998) Alcântara seria uma cidade periférica que se
transformou em secundárias ou marginal devido às transformações na economia
regional e mundial. Na medida em que perdeu sua importância econômica e seu
lugar privilegiado para outras cidades. Algumas cidades decadentes, como Alcântara
provavelmente jamais recuperarão a importância que tiveram e encontram grandes
dificuldades de se reconectar nas redes econômicas.
Percebemos a importância da dimensão econômica, pois Alcântara sofreu
vários ciclos econômicos de apogeu e decadência. Esses ciclos trouxeram à
Alcântara surtos de crescimento e decadência, conectando-a e desconectando-a por
diferentes momentos das redes regionais e globais Esses ciclos relacionam-se
diretamente com as dimensões econômica, social e política do Estado do Maranhão,
que por diferentes momentos o tornaram um dos Estados mais promissores ou mais
pobres da nação.
Autores como Alcântara (1971), Gaioso (1970), Tribuzi (1981) e Almeida
(2008) demonstram como eram frágeis as bases da prosperidade onde a
decadência já se instalava. Além das frágeis bases havia a construção do discurso
da ideologia da decadência presente nos relatórios e documentos oficiais no século
XIX ressaltando os entraves que existiram no período do apogeu como a falta de
terras, de braços e de incentivos técnicos.
Observamos, também, através dos indicadores do Censo 2010 do Estado
do Maranhão,que embora com ciclos econômicos tenham sido importantes
oportunidades, o Estado não conseguiu alavancar sua economia. O Maranhão é o
Estado que tem proporcionalmente a maior concentração de pessoas em condições
extremas de pobreza. Da população de 6,5 milhões de habitantes, 1,7 milhões estão
abaixo da linha de miséria (ganham até R$ 70 por mês). Este reflexo pode ser
observado nas cidades do interior do Estado e de forma mais grave observamos na
segunda cidade em importância histórica, que foi Alcântara.
186
Concluímos também que diante do conceito de cidade de Weber(1999)
Alcântara hoje não possui todos os elementos constitutivos de uma cidade o
processo de transformação urbana aponta para um aglomerado de população sem
necessariamente ter as atividades e dimensões que caracterizam uma cidade, e
dentro desta cidade há um elemento especifico e importante com dimensões
simbólicas, que são as ruínas, fragmentos do passado, as pedras das ruínas dos
palácios e sobrados da cidade colonial alimentaram a construção de outro tecido
urbano, o da cidade informal.
Considerando que a matéria fundamental da história é o tempo e a
cronologia desempenha um papel importante como fio condutor (LE GOFF, 2003)
construímos uma linha do tempo com os ritmos cronológico apontados na pesquisa
empírica das temporalidades do Estado do Maranhão e da cidade de Alcântara para
identificarmos os diferentes momentos de conexão e desconexão das redes.
Com este aporte teórico fomos buscar na história econômica e no
desenvolvimento urbano de Alcântara as razões explicativas para esses momentos
históricos. Identificamos duas dimensões que serviram para explicar o apogeu e a
declínio da cidade: a dimensão sócio econômica e dimensão política. Diante desse
recorte concluímos que o Estado do Maranhão que viveu quatro importantes ciclos
econômicos
O primeiro deles foi o ciclo primário exportador do algodão, monopolizado
pela Cia Grão Para de Comércio, iniciado em 1755 que durou até 1889, seguido da
exportação de arroz e couro e depois da cana. A abolição dos escravos, uma das
razões da decadência somada às mudanças no mercado internacional foi seguida
da desarticulação do sistema agrícola.
O segundo ciclo foi o surto de crescimento industrial têxtil entre 1890-1940, na
perspectiva de resgatar o algodão no mercado e levantara a economia foi seguido
de falências das fabricas.
O terceiro ciclo foi do babaçu no século XX, considerado por Vargas a
salvação do Maranhão, não alcançou os resultados esperados.
O quarto ciclo foi o da à integração na economia nacional e a implantação de
investimentos públicos e privados no Estado a partir dos anos 70, através de
grandes projetos como estrada de ferro de Carajás, do vale do rio doce, instalação
da Alumar fabrica de guserias de alumínio, pólo graneleiro em na região do baixo
187
Parnaíba e a implantação da soja no sul do Maranhão e em 1980 o Centro de
Lançamento de Alcântara.
Concluímos que as frágeis bases dos períodos de prosperidade citadas por
Tribuzi (1981) aliadas aos entraves colocados por Gaioso (1970), como falta de
tecnologia, falta de braços especializados, configuram ainda na contemporaneidade
dificuldades para alavancar a economia do Estado, que mesmo com oportunidades
internas e externas não conseguiu transformar seus indicadores.
Concluímos ainda a dimensão política que fez o Estado herdeiro das
estruturas autoritárias e oligárquicas configurou-se um entrave ao desenvolvimento
econômico e social.
Diante deste quadro, concluímos que a cidade de Alcântara, que foi a
segunda cidade em importância do Estado passou por todos estes ciclos e de forma
mais acentuada sofreu um processo de decadência e arruinamento. Além das
razões da decadência e dos entraves acima citados ,estudos de Alcântara (1971) e
de Almeida (2008) apontam para a construção de um discurso da ideologia da
decadência no Maranhão e a observamos também na pesquisa empírica a
construção de uma narrativa de técnicos e intelectuais sobre a decadência de
Alcântara.a alcunha de cidade morta esta presente em livros e relatórios .
No caso de Alcântara, a falta de mobilização da elite rural, dos fidalgos e
barões, em recuperar sua produção ou investir em novas possibilidades agravou o
abandono das terras. O município ficou sem um novo projeto econômico para
alavancar a economia e mobilizar a sociedade.
As políticas públicas adotadas em 1950 reforçaram a exclusão de
Alcântara com a instalação do presídio estadual de segurança máxima na praça
principal da cidade gerando isolamento e mais decadência da cidade.Embora a
cidade tenha sido tombada em 1948 pelo Iphan , não conseguiu superar estes
entraves . Relatórios da UNESCO durante 20 anos (1960-1980) apontaram as
razões da decadência e as estratégias de revitalização, mas nada foi efetivado e a
cidade se manteve decadente e abandonada .
Um novo ciclo de inclusão nos programas de integração nacional ocorreu
com a implantação do Centro de lançamentos em 1980, que parecia uma
oportunidade, uma inclusão da cidade na rede global configurou-se também em
exclusão, com desagregação social e urbana. Vale ressaltar que os programas
nacionais implantados no Estado no final da ditadura militar no Brasil e no âmbito de
188
governos oligárquicos no Maranhão e de Alcântara, foram implantados sem a
avaliação de impactos ambientais e sociais e por esta razão não reverteu às
comunidades locais nenhum beneficio econômico ou inclusão de mão de obra local.
Os impactos da implantação destes projetos, avaliados hoje e cujas ações
mitigadoras ainda estão em andamento, geraram questões urbanas e sociais que
contribuem para o baixo IDH do Estado.
De fato, o que se apreende no caso de Alcântara, é que as ruínas
configuram o tempo passado, o presente e o futuro de Alcântara. A cidade histórica
considerada abandonada em sua decadência econômica, cultural e social, observa a
cidade no presente com um empreendimento global e hoje convive com a dura
realidade das ruínas da plataforma incendiada e com todo o investimento da vila
militar abandonado, uma vez que o espaço da base não foi utilizado como o
planejado e parte dele encontra-se obsoleto . Após o fracasso dos lançamentos dos
foguetes durante toda a década de 1990, agravado pelo acidente que vitimou 21
cientistas em 2003, houve um abandono do projeto. Em 2011 há uma nova
perspectiva de ampliação do Centro de Lançamento com um acordo internacional
com a Ucrânia para utilização do espaço aéreo que pode se configurar em uma nova
oportunidade .Portanto, podemos avaliar que a cidade despreparada para um
empreendimento global, não conseguiu transformar sua economia reforçando ainda
mais a exclusão econômica.
O que concluímos é que se configuram na Alcântara contemporânea,
duas realidades diferentes: uma “Global” na perspectiva do grande empreendimento
espacial que tem por objetivo se conectar com o mundo através de lançamento de
satélites e foguetes, que mobiliza comunidades cientificas e outros países em
lançamentos de veículos espaciais e outra “Local” formada pelas comunidades de
remanescentes de quilombos e de aldeias de pescadores que foram remanejados
de suas terras, gente humilde, na maioria analfabeta, que vive em casa de taipa e
depende da agricultura de subsistência, sem serviços básicos ou saneamento ou
ainda os habitantes da sede do município, favelizados, excluídos sem formação
técnica, despreparados e excluídos do empreendimento global.
Da mesma forma o Estado do Maranhão que agora se prepara para
receber grandes empreendimentos nacionais se depara com a mesma realidade o
confronto do global e do local refletindo nas estruturas econômicas sócias e
urbanas.
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