A REPARTIÇÃO
RELAÇÕES ECONÓMICA INTERNACIONAIS
CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO
Repartição dos rendimentos e crescimento económico
Segundo ROLO, entende-se que, no processo de crescimento de qualquer economia
capitalista constata-se que os esquemas de repartição do rendimento nacional exercem
dois efeitos importantes, que, aliás, se interpenetram parcialmente e estão em
conformidade com as exigências da teoria tradicional1:
O primeiro desses efeitos consiste em possibilitar a formação da poupança
necessária ao investimento;
O segundo efeito dos fenómenos de repartição é facilitar a evolução das
estruturas económicas e sociais no sentido exigido pelo crescimento.
O primeiro desses efeitos consiste em possibilitar a formação da poupança
necessária ao investimento
Na maior parte dos modelos teóricos de crescimento, a taxa de crescimento
prevista é tanto mais elevada quanto maior é o peso relativo dos lucros no
rendimento nacional — considerando constantes as propensões a poupar dos
titulares de lucros e dos assalariados. Quando o processo de crescimento é
acompanhado de uma taxa significativa de inflação, admite-se também, em regra,
que as subidas de preços precedem com desfasamento temporal considerável as
subidas de salários: o peso relativo dos lucros aumenta desde logo e isso estimula o
investimento. Esta argumentação aplica-se com frequência aos chamados «países
subdesenvolvidos» que, entre outras condições —as que definem o equilíbrio
macroeconómico—, financiem parte do seu crescimento através da inflação. Com
efeito, dado que a flexibilidade ascendente dos salários não é muito elevada, a alta
dos preços fornece às empresas e aos poderes públicos os recursos necessários à
manutenção de relativamente elevados níveis de investimento. Ã aplicação desta
teoria aos países industrializados capitalistas deparam-se, contudo, algumas
dificuldades. A principal reside no facto de, nestes países, os trabalhadores estarem
1
ROLO, J. M. Repartição dos rendimentos e crescimento económico.p.1.
fortemente organizados e os sectores oligopolísticos dominantes praticarem
políticas de preços administrados. De facto, neste caso, a inflação não favorece
necessariamente os lucros, principalmente se os sindicatos têm suficiente poder
para fazer subir os salários à medida que os preços sobem. Por outras palavras,
nestes países, a «inflação-progresso» não é, a largo prazo, uma «inflação- -lucros»,
salvo o caso e na medida em que as empresas consigam tirar partido da diminuição
do rendimento real dos titulares de rendimentos fixos. Por outro lado, não parece
evidente que o aumento de poupança que resultar de um incremento eventual da
parte dos lucros no rendimento nacional dê lugar a um incremento correspondente
do investimento, tudo dependendo do facto de o peso relativo desses lucros ser
superior ou não à taxa de poupança daqueles titulares de rendimentos fixos, bem
como da decisão de investir ou não investir por parte dos sectores oligopolísticos
em face de reivindicações crescentes por parte dos trabalhadores. Nos países
desenvolvidos, e segundo aqueles modelos teóricos, todas as tentativas tendentes a
elevar a taxa de crescimento através de modificações na repartição do rendimento
podem, portanto, conduzir mais depressa a uma diminuição da produção e do
emprego do que ao crescimento do rendimento real.
Três circunstâncias permitem, no mundo moderno, atenuar essa
possibilidade latente: o aumento da poupança do sector público, o
autofinanciamento crescente das empresas e a utilização da inflação como factor
de crescimento. Hoje em dia, uma parte da poupança nacional forma-se, não ao
nível dos orçamentos familiares, mas sim ao dos orçamentos das colectividades
públicas. Enquanto, no século passado, os poderes públicos se esforçavam por
manter os seus orçamentos equilibrados, actualmente tendem a estabilizar as suas
despesas correntes a níveis inferiores aos das receitas correntes, com vista
precisamente a criar uma poupança que possa ser afectada a investimentos no
sector público ou a ser transferida, designadamente sob a forma de subvenções,
para investimentos no sector privado. Na medida em que os poderes públicos
actuem sobre este modelo, torna-se menos necessário um eventual aumento do
peso relativo dos lucros em relação aos salários. Ao mesmo tempo, reduzem-se os
níveis de desequilíbrio entre o aforro e o investimento, dado que as decisões de
aforrar, como as de investir, procedem, pelo menos parcialmente, do mesmo centro
decisório.
finalmente, a própria inflação constitui um forte estimulante do crescimento2 .
Com preços estáveis ou estabilizados, ao operar- -se um endividamento crescente
das empresas em virtude das reivindicações salariais, por exemplo, reduz-se a taxa
de investimento e, por consequência, a taxa de crescimento. Com preços altistas, ao
contrário, aquele endividamento crescente tende a reduzir-se, sustentando até
alguns autores que quanto mais débil é a taxa de crescimento mais elevada é a taxa
de inflação requerida para reduzir o peso daquele endividamento e baixar o custo
dos empréstimos necessários à manutenção daquela taxa3 . Por outras palavras,
podemos dizer que as perspectivas de lucro a largo prazo têm em conta a evolução
dos preços e da produtividade4 . Se a economia está numa situação de pleno
emprego e a oferta de força de trabalho é constante, a taxa de crescimento do
produto per capita será igual à taxa de crescimento do produto global real. Nestas
condições, se um determinado montante de moeda é emprestado para financiar
investimentos, o fluxo de rendimentos monetários previstos que resultará desses
investimentos dependerá do crescimento do produto per capita e da variação dos
preços. Desde logo, quanto mais débil é a taxa de crescimento do produto prevista,
mais elevados terão de ser os níveis de preços previstos para que a taxa de
rentabilidade desejada possa ser obtida. Deste modo, quanto mais fraca é a taxa de
aumento actual da produtividade, mais forte terá de ser a taxa de inflação
requerida para assegurar a manutenção das despesas de investimento, do
crescimento e do emprego.
No total, perante a necessidade de assegurar certos níveis de poupança e
investimento com vista ao crescimento, pelo menos a longo prazo, está presente a
importância dos efeitos que a repartição do rendimento tem sobre esse processo
O segundo efeito dos fenómenos de repartição é facilitar a evolução das estruturas
económicas e sociais no sentido exigido pelo crescimento.
A obtenção deste efeito pressupõe a existência de disparidades entre as
remunerações dos factores capazes de estimular as transferências e a orientação dos
capitais e da força de trabalho para as actividades mais aptas a contribuir para o
crescimento. Dada a rigidez das estruturas e a inércia dos comportamentos, é manifesto
que se trata de um efeito cujos resultados somente serão visíveis a longo prazo. Na sua
essência, este efeito resulta de um aumento desigual, dos rendimentos das diferentes
categorias socioprofissionais, visto que, na economia moderna, os ajustamentos,
praticamente, não podem efectuar-se senão na alta 6 . O processo de alta tende a
satisfazer os grupos que dispõem dos mais fortes meios de acção, precisamente aqueles
que, pela sua posição estratégica relativamente ao mercado ou na sociedade,
desempenham uma função dominante. Tal processo, ao contrário, desfavorece os grupos
sociais de mais débil poder (económico, político, social), provocando sucessivas
degradações dos critérios de avaliação tanto da sua situação económica, como da sua
função política e como da sua posição social. A largo prazo, alguns destes grupos
sociais, como é o caso dos já referidos empresários independentes, tendem a
transformar-se, a cindir-se e a reintegrar-se em novos grupos sociais, no quadro amplo
de alteração das relações sociais de produção que entretanto se tenha verificado. O
número dos seus membros diminui, o seu poder relativo deteriora- -se, tudo permitindo
as alterações estruturais que evocamos. É então que, se as funções que os antigos grupos
desempenhavam.
A teoria das relações internacionais
Segundo RODRIGUES, explica-se que, “os filósofos Espinoza, Rosseau e Kant
foram, no século XVIII, os primeiros a examinar as relações internacionais no mundo,
com base na força e poder dos Estados”2.
Mas foi após a 1ª Guerra Mundial que o estudo da ciência das relações
internacionais mais se desenvolveu, através das universidades anglo-saxónicas, e, desde
então, teve sempre subjacente o estudo das relações e contactos estabelecidos entre
Estados, com particular destaque para a política externa dos mesmos, apresentando-se
de natureza variada, desde conflitos interestaduais à cooperação nos planos políticos,
económico, estratégico, cultural.
Para isso, muito contribuíram os pensamentos de Edward Carr, de Reinhold
Niebuhr, Hans Morgenthau, Frederick Schuman, Nicholas Spykman, Raymond Aron,
2
RODRIGUES, Ricardo Jorge da Silva. Dinâmicas económicas e política externa portuguesa nos países
não lusófonos da SADC (1975-2002).Maio, 2004.P.8.
Marcel Merle, George Kennan, Henry Kissinger, Rudolf Hilferding, Nicholai
Boukharine, Rasa Luxemburgo, Lénine, entre outros.
Devido a esta situação, começou a tornar-se evidente a necessidade de se impor
uma visão larga e global das relações internacionais, tendo em conta o conjunto de
fenómenos internacionais, que contemplam a existência do Estado, logo, das suas
fronteiras. Estas dão a sua especificidade na dimensão internacional das relações
sociais, mesmo se, em determinadas regiões – Médio Oriente ou África Sub-Sahariana,
a noção de fronteira tenda, hoje em dia, a ser desafiada e a sofrer mutações.
Conceito das relações internacionais
Segundo RODRIGUES, as relações internacionais podem assim ser definidas
“como o conjunto de relações e comunicações susceptíveis de ter dimensões políticas,
económica, social e cultural, estabelecidas entre grupos sociais, atravessando as
respectivas fronteiras”3.
O campo das relações internacionais tomou, no decorrer do século XX, uma
importância muito grande na vida das sociedades devido a processos de mutação
complexos. Em primeiro lugar, as trocas internacionais conheceram um crescimento e
uma diversificação sem precedentes sob o efeito do processo de modernização que se
inscreveu na dinâmica da revolução industrial. Este crescimento das trocas foi sobretudo
estimulado pelo desenvolvimento das redes de comunicação associadas ao progresso
tecnológico, assim como pela divisão internacional do trabalho e a constituição de um
mercado mundial. Depois, a revolução tecnológica conduziu à criação de novos
sistemas de armamento cuja aplicação em larga escala é susceptível de ameaçar a
existência de toda a humanidade. Neste contexto, os conflitos internacionais tomaram
também um crescimento e uma diversificação sem precedentes. Por outro lado, com o
desenvolvimento do conhecimento e da tecnologia, derivado do aumento das trocas
internacionais, originou-se o processo de globalização e mundialização das relações
internacionais. Esta importância sem precedentes adquiridas pelas relações
internacionais, torna necessária uma reflexão sistemática sobre esta questão complexa.
O estudo das relações internacionais conheceu, no decorrer das últimas décadas, um
desenvolvimento rápido, marcado, por um lado, pelo crescimento quase exponencial de
3
RODRIGUES, Ricardo Jorge da Silva. Dinâmicas económicas e política externa portuguesa nos países
não lusófonos da SADC (1975-2002).Maio, 2004.P.8 e 9.
trabalhos de análise e pesquisa e, por outro, por importantes mutações a nível mundial.
Assistimos, de facto, desde o período entre as duas Grandes Guerras, a uma
multiplicação do número de trabalhos consagrados às relações internacionais e à
aparição progressiva de uma comunidade científica de origens diversas, tendo como
objecto de reflexão os fenómenos internacionais
O objecto das relações internacionais
admite que as relações internacionais «são todas as relações sociais em que os
participantes ou o conteúdo estão ligados a duas ou a várias sociedades políticas
estatais». refere que «as relações internacionais são a ciência dos factos sociais
internacionalizados», entende-se a dimensão do objecto desta disciplina que, no fundo,
abrange as relações políticas, as relações económicas, as relações estratégicas, num
mundo global, mas delimitado.
AS CONCEPÇÕES DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
A teoria das relações internacionais sempre esteve separada em três grandes
correntes filosóficas fundamentais. Tucídides, Lenine, Maquiavel, Hobbes, Hume,
Clausewitz, Rosseau, entre outros, foram grandes pensadores e tudo ou quase tudo
reflectiram sobre as relações internacionais, a paz e a guerra, as nações e os homens, a
cooperação e o conflito. Por exemplo, Maquiavel sonhava com a grandeza de Florença e
com o destino da República. Já Hobbes vivia obcecado com a segurança civil quando 12
escreveu o Léviathan. Clausewitz reflectiu sobre a guerra e foi um dos que mais
reflectiu sobre as relações entre as nações. Hegel e Fichte construíram a sua reflexão a
partir do Estado. Marx sonha com a revolução na Alemanha e na Inglaterra. Lenine com
a Rússia (Huntzinger, 1987, pp 52-53). Todos estes actores e pensadores promoveram
três grandes correntes de pensamento, ou seja, três paradigmas fundamentais das
relações internacionais. Clausewitz, Vitoria e Marx são a imagem mais clara da
contradição destes três paradigmas: a sociedade internacional como relação entre
Estados soberanos e independentes através do interesse nacional, do poder, da guerra ou
do equilíbrio; a sociedade internacional como comunidade universal, encontro de
homens, combinação de relações individuais e transnacionais; a sociedade internacional
como sistema de dominação dos poderosos sobre os fracos, dos possuidores sobre os
possuídos, dos exploradores sobre os explorados. (Huntzinger, 1987, pp 53, 54)
RODRIGUES, Ricardo Jorge da Silva. Dinâmicas económicas e política externa portuguesa
nos países não lusófonos da SADC (1975-2002).Maio, 2004.
Definição de crescimento e desenvolvimento económico
Na concepção do autor ADELMO M. FRANÇA, “entende-se que, algumas
correntes económicas, por algum tempo, divergiram quanto à definição de crescimento
e desenvolvimento económico”4. E então, de forma acertada, passaram a atribuir a
necessidade premente da existência de crescimento para a ocorrência de
desenvolvimento. Outras, por sua vez, também de forma correta, separaram o
crescimento do desenvolvimento económico, em razão do facto do crescimento
apresentar variações no produto e o desenvolvimento estar reflectido na melhoria da
qualidade de vida das suas populações, sendo que essa nova situação económica e
social, afirmativamente, decorre do aumento das suas rendas.
Dessa forma, segundo ADELMO M. FRANÇA5:
O desenvolvimento económico pode ser definido como sendo a
combinação de crescimento económico contínuo, embora não
necessariamente, muito maior que o crescimento demográfico,
propiciando mudanças estruturais e modificações positivas nos
indicadores económicos e sociais para um universo maior possível de
beneficiários das várias classes que compõem o sistema económico.
4
FRANÇA, Adelmo M. Os modelos de crescimento e de desenvolvimento económico e sua
aplicabilidade nas economias regionais não desenvolvidas. Janeiro, 2012.p.2.
5
Ibidem.
O pré-liberalismo dos fisiocratas
“O pré-liberalismo dos fisiocratas, na forma mais rude do conceito de
desenvolvimento, tinha nas mãos de Deus todos os meios para que a economia
apresentasse os resultados desejados em prol da humanidade”6.
Como o modelo económico estava limitado à agricultura, buscava-se a aplicação
da teoria do bom preço, pois com a alta dos preços dos produtos agrícolas haveria o
estímulo necessário para os produtores, que teriam seus lucros ampliados. Esperava-se
que as intervenções dos governos fossem nulas ou mínimas possíveis, principalmente
nas questões voltadas aos impostos, pois quanto menores as pressões sobre os pobres
mais beneficiados estariam os ricos.
Contrariamente a posição providencial dos fisiocratas, os clássicos tinham no
individualismo e egoísmo a busca pela ampliação dos mercados e das suas riquezas,
destacando outras actividades económicas, diferentes da agricultura como geradores de
valor, graças à divisão do trabalho e a ampliação de mercados, bem como atribuindo, ao
aumento do consumo dos trabalhadores produtivos, a ampliação da produção e dos
lucros dos capitalistas. Preocupavam-se consideravelmente com a possibilidade da
estagnação económica, visto que dessa forma, os países teriam o crescimento
econômico reduzido ao ponto zero, cessando assim a acumulação do capital.
A composição básica da teoria do crescimento de Adam Smith
A composição básica da teoria do crescimento de Adam Smith sustentava-se na
riqueza das nações como resultante do trabalho produtivo, gerador de excedente de
valor sobre os custos da reprodução. Estabelecida a relação quantitativa de
trabalhadores e população total, encontrava-se a produtividade, originando a
acumulação do capital, responsável pela geração de novos empregos. Dessas condições,
decorria a ampliação de novos mercados e a especialização, cada vez maior, da mão-de-
obra, acrescida da incorporação de novas técnicas e máquinas, incentivando o lucro e
dando sustentação à mão invisível da economia clássica.
Na visão dos neoclássicos
6
FRANÇA, Adelmo M. Os modelos de crescimento e de desenvolvimento económico e sua
aplicabilidade nas economias regionais não desenvolvidas. Janeiro, 2012.p.6.
Na visão dos neoclássicos, mais especificamente, Alfred Marshall, o desenvolvimento
se dá de forma gradual, contínua e harmônica, visto que a preocupação concentrava-se
em curto prazo e no plano microeconômico do comportamento do mercado, que tem na
parcimônia familiar a formação da poupança, regulada pela taxa de juros, permitindo a
ocorrência do consumo no futuro, visando a acumulação de capital e a estabilidade
social do sistema, resultando em um maior crescimento e desenvolvimento econômico.
Marshall demonstrou em seus estudos4 a preocupação com fatores não econômicos,
voltados ao aperfeiçoamento do desenvolvimento, destacando o avanço e a
credibilidade das instituições e suas leis, o funcionamento perfeito da mobilidade da
mão de obra, o crescimento urbano e a ampliação do mercado interno e, principalmente,
os investimentos em educação com destino a melhoria do capital humano, visando
diminuir o nível de pobreza e suas implicações diretas na economia e na sociedade
Na medida em que essa teoria busca compreender um fenômeno histórico, os modelos
que constrói são necessariamente históricos, ou seja, modelos que buscam definir as
características e dificuldades principais que os processos de crescimento enfrentam. Os
primeiros modelos tratavam de como se inicia o desenvolvimento econômico em uma
região pré-capitalista, discutiam a ‘armadilha do desenvolvimento’, o problema da
oferta ilimitada de mão-de-obra, a acumulação primitiva e a poupança forçada, a
revolução industrial e seus pré-requisitos. A partir daí, estudam-se o que poderíamos
chamar de diferentes modelos ou estilos de desenvolvimento econômico: o modelo
original de desenvolvimento dos países que iniciaram a revolução industrial, como a
Inglaterra e a França; o modelo dos países de desenvolvimento atrasado do centro que
jamais foram colônias como a Alemanha ou o Japão; o modelo russo e chinês que
excluiu os empresários capitalistas na fase inicial e concentrou todo o processo de
acumulação primitiva no estado; o modelo de substituição de importações que começa
nos anos 1930 nos países latinoamericanos; e o modelo exportador que se configura nos
anos 1960 no Leste e Sudeste da Ásia. Uma alternativa é comparar modelos atuais de
desenvolvimento econômico dos países sistema econômico continua capitalista, mas os
capitalistas perderam parte substancial do seu poder para os técnicos ou
tecnoburocratas. 12 ricos, ou, em outras palavras, os modelos de capitalismo
desenvolvido: o modelo anglo-saxão, o modelo renano ou franco-alemão, o modelo dos
países escandinavos, o modelo japonês. De acordo com o método histórico, todos esses
padrões históricos são reduzidos a modelos teóricos – modelos que são abertos,
necessariamente incompletos, porque refletem realidades complexas e dinâmicas que
são incompatíveis com os modelos fechados que tanto atraem os economistas (Dow,
1996; Chick, 2004). A partir dos anos 1970, quando o pensamento neoclássico recobra
forças no quadro de uma grande onda ideológica neoliberal, o interesse dos economistas
pelos modelos históricos diminuiu, porque não se adaptavam às exigências de
formalização matemática lógicodedutiva da teoria econômica neoclássica. Como
alternativa a eles, já estavam surgindo então os chamados ‘modelos de crescimento’ –
ou seja, modelos radicalmente abstratos baseados em funções matemáticas de produção
que buscam relacionar o crescimento com determinadas variáveis. Embora o primeiro
desses modelos tenha sido keynesiano, eles tornaram-se especialmente populares entre
os economistas neoclássicos a partir do momento em que, em 1956, Robert Solow foi
capaz de desenvolver um modelo simples que tornava a análise dinâmica do
crescimento compatível com a análise estática do equilíbrio geral – algo importante para
uma teoria econômica que tem como critério de verdade antes o coerentismo do que a
correspondência com a realidade. Com o surgimento desses modelos, tornou-se
convencional distinguir a ‘teoria econômica do desenvolvimento’, que teria bases
históricas, da ‘teoria econômica do crescimento’ (growth economics) que teria como
base funções de produção inicialmente exógenas, ou seja, nas quais o progresso técnico
ou o capital humano eram exógenos, e, em um segundo momento, conseguindo
endogeneizar matematicamente essa variável. A teoria econômica do desenvolvimento
seria mais ampla, e incluiria toda a complexidade do processo do desenvolvimento,
enquanto que a ‘teoria do crescimento econômico’ mostraria como ocorre o crescimento
da renda per capita a partir de um número mais limitado e formalizado de variáveis. Na
verdade, essa diferenciação não faz sentido já que o fenômeno a ser estudado é um só, e
que sua principal medida é sempre o crescimento da renda per capita. Por outro lado,
logo se verificou que o potencial explicativo dos modelos de crescimento é muito
limitado. O modelo de Harrod-Domar tem a vantagem de supor uma função de
produção muito simples, 13 relacionando o crescimento com a taxa de investimento,
dada uma produtividade do capital ou relação produto capital. Já o modelo de Solow usa
uma função Cobb-Douglas também simples mas que permite considerar outros fatores
além do capital. A primeira visava mostrar a tese keynesiana de que o desenvolvimento
econômico não ocorre com equilíbrio assegurado pelo mercado, enquanto que a
segunda, ao prever a substituição de fatores, pretendia demonstrar a tese neoclássica que
o mercado assegura esse equilíbrio. É claro que nem uma nem a outra logrou atingir seu
objetivo. Para pesquisadores neoclássicos, o grande feito do modelo de Solow teria sido
haver demonstrado, através do resíduo das regressões, que a acumulação de capital
sozinha não explica o desenvolvimento econômico, e que era fundamental considerar o
progresso técnico. Ora, disto jamais tiveram dúvidas os grandes economistas em todos
os tempos. Na verdade, uma lamentável conseqüência desse modelo foi haver
depreciado a importância da taxa de investimento quando todas as pesquisas empíricas
mostram uma alta relevância dessa taxa na determinação das taxas de crescimento
econômico. Uma das razões que ainda mantém o interesse nesses modelos de
crescimento está na alegação de que eles legitimariam a pesquisa empírica econométrica
à base de regressões, relacionando a taxa de crescimento com diversas variáveis. Como
toda pesquisa empírica necessita de uma hipótese teórica, os modelos de crescimento
ofereceriam essa hipótese. No caso do modelo de Solow, estaria por trás da pesquisa
toda a teoria econômica neoclássica com a qual ele é coerente. Esse entendimento,
entretanto, é equivocado. Ao invés de as pesquisas partirem ou pretenderem partir de
modelos de estatuto teórico no mínimo discutível, elas na verdade partem de hipóteses
simples como as de que a educação, ou os cuidados de saúde, ou a pesquisa e o
desenvolvimento, ou boas instituições promovem o desenvolvimento econômico, e
testam econometricamente essas hipóteses. Não existe aí a utilização do modelo de
Solow ou qualquer outro modelo teórico, mas uma simples hipótese científica. O
instrumento utilizado é apenas uma função matemática que permite o cálculo de
regressões entre o crescimento da renda por habitante e a variável que se quisesse testar.
Como hipótese teórica para as pesquisas basta a própria hipótese do pesquisador de que
esta ou aquela variável pode ser relevante na explicação do crescimento. Não há
necessidade de usar modelos teóricos gerais que, afinal, além de serem reducionistas do
processo de desenvolvimento econômico, pouco ou nada esclarecendo sobre ele, não
levam em 14 consideração que é sempre necessário analisar o desenvolvimento também
do lado da demanda. O interesse pelos modelos abstratos de crescimento afinal revelou-
se estéril e esta foi uma das razões que levaram o problema central do desenvolvimento
econômico a uma posição secundária na teoria econômica neoclássica. Não obstante
toda essa prioridade dada socialmente ao desenvolvimento econômico, não obstante ser
ele um dos cinco objetivos políticos fundamentais das sociedades modernas ao lado da
segurança, da liberdade, da justiça social e da proteção da natureza, no ensino da
economia nas universidades ele tem um papel muito mais modesto. Se examinarmos os
cursos e os textos de teoria econômica atuais, veremos que o espaço dedicado ao estudo
do desenvolvimento económico é pequeno. Durante um certo tempo, os economistas
neoclássicos dedicaram-se a calcular o resíduo da função de produção de Solow que foi
identificado como a medida da produtividade: a produtividade total dos factores.
Esgotados esses exercícios que afinal eram fúteis, porque não há progresso técnico sem
acumulação, esses economistas se viram sem instrumentos para compreender os
processos reais de desenvolvimento, e acabaram por abandonar ou colocar o tema em
segundo plano. Um aspecto curioso dessa divisão entre uma teoria do desenvolvimento
e outra do crescimento económico proposta pelos neoclássicos é que ela veio de
encontro com a proposta de uma parte dos próprios economistas da teoria económica do
desenvolvimento de distinguir desenvolvimento de crescimento económico. Isto talvez
se explique porque os extremos se tocam. Ou porque para uns foi uma forma de
salientar o conteúdo histórico de transformações estruturais, culturais e institucionais, e
para outros, uma forma de esvaziar desse conteúdo o fenômeno real que estudavam.
Entre as duas alternativas, eu obviamente opto pela segunda, mas não vejo razão para
distinguir substantivamente um processo histórico de desenvolvimento do de
crescimento, a não ser, como vimos, que limitemos o último a processos económicos
nos quais o crescimento da renda per capita ocorre no quadro de enclaves modernos ou
de doença holandesa, de forma que esse crescimento fica limitado geograficamente e
beneficia muito poucos.