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O artigo discute a necessidade de mudança nas políticas linguísticas e práticas educacionais no Brasil, promovendo o multilinguismo e a diversidade linguística em escolas que atendem imigrantes e refugiados. A pesquisa, baseada em uma experiência em Dourados, Mato Grosso do Sul, revela a urgência de implementar um ambiente educacional inclusivo que reconheça a diversidade linguística como um recurso valioso. Os resultados evidenciam a viabilidade de mudanças no modelo de ensino, alinhadas às necessidades de um mundo globalizado.

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O artigo discute a necessidade de mudança nas políticas linguísticas e práticas educacionais no Brasil, promovendo o multilinguismo e a diversidade linguística em escolas que atendem imigrantes e refugiados. A pesquisa, baseada em uma experiência em Dourados, Mato Grosso do Sul, revela a urgência de implementar um ambiente educacional inclusivo que reconheça a diversidade linguística como um recurso valioso. Os resultados evidenciam a viabilidade de mudanças no modelo de ensino, alinhadas às necessidades de um mundo globalizado.

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https://doi.org/10.22409/gragoata.v30i66.63952.

pt

Dossiê

Do monolinguismo ao multilinguismo de acolhimento

Edilaine Buin1,*
Gilvan Müller de Oliveira2 

*Bolsista CNPq.
RESUMO:
Este artigo tem como objetivo discutir a necessidade de uma mudança nas
políticas linguísticas e nas práticas educacionais no Brasil, promovendo a
valorização do multilinguismo e da diversidade linguística, especialmente
em contextos escolares que atendem a imigrantes e refugiados. A pesquisa
explora a transição de uma política linguística monolíngue para uma
abordagem que reconheça e valorize a diversidade linguística, por meio de
uma experiência educacional em uma escola da rede pública na cidade de
Dourados, Mato Grosso do Sul. O contexto educacional é desafiador, pois
O contexto educacional é desafiador, , que já contavam com estudantes
indígenas falantes de guarani, agora recebem um número crescente de
imigrantes e refugiados, como venezuelanos e haitianos, que não dominam
o português. A fundamentação teórica aborda a repressão linguística e a
necessidade de reconhecer a diversidade linguística como um recurso valioso.
A metodologia adotada é qualitativa, baseada em relatos de acadêmicos da
licenciatura em Letras e de Psicologia que participaram do projeto de extensão
universitária “Solidariedade Linguística”, que previa o acompanhamento de
aulas do ensino fundamental com estudantes de diferentes línguas, durante
um semestre letivo. A partir de relatos selecionados qualitativamente, o
artigo busca (1) compartilhar situações frequentemente não discutidas
que envolvem o bi/multi/plurilinguismo; (2) problematizar as urgências
nesse contexto educacional, que é representativo de outros cenários; e (3)
promover uma reflexão que inspire movimentos políticos em favor dos direitos
da comunidade afetada pela dinâmica do monolinguismo. Os resultados
Bethânia Mariani
Editora-chefe dos evidenciam a viabilidade e a urgência de implementar mudanças no modelo
Estudos de Linguagem de ensino, promovendo um ambiente educacional mais inclusivo e solidário,
alinhado às necessidades de um mundo globalizado.
Dr. Ebal Bolacio
Dr. Paul Voerkel PALAVRA-CHAVE: Política linguística, Ensino de língua,
Editores convidados Imigrantes, CODAs.

Recebido em: 07/08/2024


Aceito em: 04/11/2024

Universidade Federal da Grande Dourados, Dourados, MS, Brasil. E-mail: [email protected]


1

Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, RS, Brasil. E-mail: [email protected]


2

Como citar:
BUIN, Edilaine; OLIVEIRA, Gilvan Müller de. Do monolinguismo ao multilinguismo de acolhimento. Gragoatá, Niterói, v. 30, n. 66, e63952,
jan.-abr. 2025. Disponível em: https://doi.org/10.22409/gragoata.v30i66.63952.pt

1
Edilaine Buin & Gilvan Müller de Oliveira

Introdução
A construção de uma ideia de país monolíngue, que se estabelece
ainda hoje em contextos de ensino, foi um plano de governo alicerçado
nos pressupostos do Estado Novo e do Regime Militar. Tratou-se de um
longo processo de repressão, conforme é tratado em Oliveira (2009, p. 20):

O Estado Português e, depois da independência, o Estado Brasileiro,


tiveram por política, durante quase toda a história, impor o português
como a única língua legítima, considerando-a “companheira do Império”
(Fernão de Oliveira, na primeira gramática da língua portuguesa, em
1536). A política lingüística do estado sempre foi a de reduzir o número
de línguas, num processo de glotocídio (assassinato de línguas) através
de deslocamento linguístico, isto é, de sua substituição pela língua
portuguesa.

Para complementar, o autor menciona Darcy Ribeiro, segundo o


qual, somente na primeira metade do século XX, 67 línguas indígenas
desapareceram no Brasil. O número de 1.078 línguas faladas no ano de
1500 foi reduzido para cerca de 180 no ano 2000 e “várias destas 180
encontram-se já moribundas, faladas por populações diminutas e com
poucas chances de resistir ao avanço da língua dominante”. (p. 20)
Pessoas eram presas e torturadas simplesmente por falarem outras
línguas, o que levou à instauração de um longo período de resistência,
que se perpetua até hoje. O autor (op. cit.) chama a atenção tanto para
a questão das línguas indígenas quanto para as línguas de imigrantes.
Tal regime de repressão não foi aceito de forma pacífica: foi seguido por
muita resistência, em um contexto de guerra linguística.
Durante o regime militar de Getúlio Vargas, entre 1941 e 1945,

o governo ocupou as escolas comunitárias e as desapropriou, fechou


gráficas de jornais em alemão e italiano, perseguiu, prendeu e torturou
pessoas simplesmente por falarem suas línguas maternas em público
ou mesmo privadamente, dentro de suas casas, instaurando uma
atmosfera de terror e vergonha que inviabilizou em grande parte a
reprodução dessas línguas, que pelo número de falantes eram bastante
mais importantes que as línguas indígenas na mesma época: 644.458
pessoas, em sua maioria absoluta cidadãos brasileiros, nascidos aqui,
falavam alemão cotidianamente no lar, numa população nacional
total estimada em 50 milhões de habitantes, e 458.054 falavam italiano
(Mortara, 1950). Essas línguas perderam sua forma escrita e seu lugar nas
cidades, passando seus falantes a usá-las apenas oralmente e cada vez
mais na zona rural, em âmbitos comunicacionais cada vez mais restritos.
(Oliveira, 2009, p. 22).

Apesar dos novos modos de pensar e agir trazidos pela Constituição


de 1988, mais abertos para a diversidade e legitimidade das diferenças
culturais e linguísticas dos brasileiros (a “nova república”), tal construção
ecoa até hoje em novas gerações que acreditam que o português (diga-se,
por vezes, o “português brasileiro”) é a língua única e soberana. Esse
processo homogeneizador é tão forte (e, por vezes, “naturalizado”) que

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Do monolinguismo ao multilinguismo de acolhimento

atinge não só a população em geral e o sistema básico de Educação,


mas, também, os intelectuais brasileiros. Um indício forte disso está na
própria linguística brasileira, que pensa a diversidade linguística, na
maioria das vezes, como interna à própria língua portuguesa. Isso explica
o predomínio no Brasil de uma sociolinguística de cunho laboviano, o
que Oliveira (2009, p. 24) chama de “sociolinguística do monolinguismo”.
Nesse cenário, não é de se admirar que instituições de ensino brasileiras,
ainda que localizadas em regiões fronteiriças, como é o caso das duas
escolas onde foram gerados os dados que trazemos para análise neste
artigo, preservem suas bases no colonialismo da língua única.
Essa crença no monolinguismo está em contraposição à realidade de
um território onde hoje habitam mais de 300 línguas, incluindo línguas
indígenas, de imigração e de sinais. São 274 línguas indígenas, segundo
o IBGE, e pelo menos 156 línguas de imigração que resistem há mais de
três gerações. Contudo, o fato de 98% dos brasileiros falarem somente
o português ajuda a manter a crença de que o país é monolíngue em
muitas comunidades. Isso, somado ao valor exacerbado que se atribui
à língua inglesa (a única língua estrangeira, na maioria dos casos, que
participa do rol de disciplinas dos currículos escolares), contribui para
cercear possíveis aberturas transnacionais, tanto de bens de consumo
quanto de turismo e de produções científicas em diferentes línguas
Tal fechamento é incompatível com a realidade mundial, fluida
e dinâmica, de uma sociedade marcada pelas novas tecnologias da
informação e da comunicação. A multiplicidade das línguas — e,
inerentemente, das culturas — potencializada pela quebra de barreiras
impulsionada pela web 2.0, explode em meio a essa construção de
um país monolíngue. Essa nova realidade sócio-histórica ressalta a
importância não apenas da comunicação, mas também da interação e
colaboração; portanto, das línguas e de todos os aspectos culturais a elas
relacionados. Em 2010, o Inventário Nacional da Diversidade Linguística
(INDL), instituído pelo Decreto nº 7.387 como parte do Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico do País (IPHAN), legitima as línguas
como patrimônios imateriais da nação. (Patrimônio Imaterial).
Os relatos apresentados neste artigo foram produzidos por
quatro graduandos da Universidade Federal da Grande Dourados: dois
estudantes, bolsistas do PET-Letras, que trabalharam com duas crianças
CODAs (Children of Deaf Adults), classificação dada aos filhos de pais
surdos, e duas bolsistas de Iniciação Científica, que trabalharam com
crianças imigrantes, filhas de pais refugiados. A Universidade está situada
em Dourados, cidade localizada a 120 km de Ponta-Porã, uma cidade
brasileira de fronteira seca com Pedro Juan Caballero, no Paraguai. Trata-
se de uma região impulsionada pelo agronegócio, cujo produto interno
bruto (PIB) costuma ser bastante elevado em comparação a outras regiões
do país. Contudo, as populações indígenas (bororó e guarani-kaioá),
que habitam aldeias situadas muito próximas da cidade e, por vezes, até
mesmo no centro urbano, não entram nessa estatística, o que oculta a

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Edilaine Buin & Gilvan Müller de Oliveira

grande pobreza que também compõe o cenário. Não são raros os casos
de exploração da mão de obra e de condições inadequadas ou precárias
de trabalho nos frigoríficos que abastecem o país (Artigo: Da escravidão
aos frigoríficos).
O currículo das escolas tradicionais brasileiras é regido pelos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) (Brasil, 1998), que mencionam
as línguas estrangeiras, e pela Base Comum Curricular Nacional (BNCC)
(Brasil, 2018), que considera apenas a língua inglesa. De qualquer modo,
ambos os documentos fazem menção à necessidade de se construir uma
nação que preze pela diversidade e valorize as diferentes culturas, o que é
incoerente com a rigidez das tradições disciplinares. Em relação ao ensino
de línguas, as escolas mantêm o ensino da Língua Inglesa e da Língua
Portuguesa, sendo esta considerada o espaço para análise linguística e
gramatical, bem como para o desenvolvimento da expressão escrita e da
oralidade dos estudantes. Embora os objetivos de ensino sejam múltiplos,
na maioria dos contextos de escolas públicas e privadas, ainda se valoriza
muito mais o ensino da gramática tradicional e normativa, herança de um
direcionamento voltado para formar trabalhadores, e não necessariamente
leitores ou cidadãos críticos.
Embora haja um movimento político, por meio de documentos
oficiais da Educação, para garantir a língua como direito (Ruiz, 1988),
muito do que acontece, conforme podemos observar por meio dos
estagiários, cursos de formação continuada e conversas com professores,
diretores, coordenadores e estudantes, parece caminhar em outra direção.
Nesse sentido, Ribeiro da Silva (2013), inspirado em Spolsky (2004) e
Schiffman (1996), traz para a discussão uma concepção mais ampla de
política linguística, que extrapola os limites dos órgãos oficiais, com base
no princípio de que “a compreensão de política linguística das sociedades
democráticas da atualidade passa mais pela análise das práticas e
representações linguísticas e menos pela discussão da legislação oficial”
(p. 311).”
Nas salas de aula das escolas públicas da cidade, como é o caso
das duas instituições onde atuaram os graduandos, é comum encontrar
crianças e adolescentes de famílias em situação de refúgio, além de sujeitos
surdos, CODAs e indígenas, uma multiplicidade que não costuma ser
contemplada nas licenciaturas. Assim, trazer memórias de vivências
em espaços de formação acadêmica, em situações atuais de bi/multi/ 1
O bilinguismo refere-
plurilinguísmo1, resgatadas por meio de trabalhos de cunho etnográfico se à habilidade de
uma pessoa em usar
e de observação/intervenções com anotações em cadernos de campo, e/ou compreender
duas línguas; o
torna-se relevante como uma força de resistência a práticas hegemônicas multilinguismo
está relacionado à
de gestão das línguas. diversidade linguística
No contexto trazido como ilustração, a universidade aproxima-se da de uma sociedade, ou
seja, à coexistência de
escola por meio de um pedido de ajuda de alguns diretores e coordenadores várias línguas em um
determinado contexto;
a professoras universitárias envolvidas com estágio supervisionado e o plurilinguismo se
refere à habilidade de
com o Programa de Educação Tutorial (PET) da Faculdade de Letras da se usar e compreender
Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD). O objetivo é “resolver” várias línguas, levando
em consideração a
uma situação considerada problemática, que, embora exista desde sempre relação entre elas.

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Do monolinguismo ao multilinguismo de acolhimento

com a população indígena, agora se potencializa com a onda imigratória:


a presença em sala de aula de crianças e adolescentes venezuelanos e
haitianos que não dominam a língua oficial.
Como forma de atender ao pedido das escolas, foi criado o projeto
“Solidariedade Linguística”, que envolve ensino, extensão e pesquisa.
Sobre esse projeto, discorreremos mais adiante, no âmbito do PET-Letras/
MEC, na ocasião em que a autora deste texto era coordenadora, com o
apoio do Grupo de Estudos em Linguagem e Transculturalidade (GELT/
CNPq). Ações como essa estão longe de resolver o problema, mas podem
constituir caminhos para a abertura de espaços para futuras resoluções.
Assim como a Política Linguística nasceu nas décadas de 60 e 70
como um campo acadêmico, fundamentada na racionalidade para resolver
situações em que a diversidade linguística é vista como um obstáculo à
modernidade, agora recorremos, como linguistas e educadores, à Política
Linguística reconfigurada, décadas depois, em bases epistemológicas
(Spolsky, 2004; Schiffman, 1996). Isso significa incluir nas análises e
reflexões as ideologias e os contextos sócio-históricos dos falantes e
escreventes. É necessário agregar estudos da linguagem a outros campos
do conhecimento para encontrar caminhos que construam um espaço
mais harmônico e sustentável nas salas de aula. Assim, ações pontuais de
estudantes são retomadas para que deixem de ser fatos isolados e possam
se imbricar na formação de uma rede de ações que consolide políticas
linguísticas mais humanas e solidárias, apoiando a construção de um
país mais moderno, com riquezas culturais diversas.
A partir de alguns relatos, inspirados e produzidos em situações
de ensino por acadêmicos da licenciatura em Letras e por uma
acadêmica do curso de Psicologia, pretende-se: (1) compartilhar situações
costumeiramente não partilhadas ou escondidas (consideradas problemas)
que envolvem o bi/multi/plurilinguísmo; (2) problematizar urgências
nesse contexto educacional, representativo de outros contextos; e (3)
promover uma reflexão que inspire movimentos políticos a favor dos
direitos da comunidade afetada pela “dinâmica” do monolinguismo.
Antes de chegarmos aos relatos, expomos brevemente as situações de
onde eles emergiram.

CODAs, imigrantes e Solidariedade linguística:


antes e pós pandemia
Como foi dito, a cidade de Dourados-MS, assim como outras,
principalmente de regiões fronteiriças, evidenciam o multilinguismo
brasileiro, potencializado pelas ondas mais recentes de imigração, o que
reverbera nas salas de aula. Muitos venezuelanos chegaram recentemente em
Dourados por meio de uma política de interiorização, via operação acolhida,
do Ministério da Defesa, com apoio das Forças Armadas – de Roraima
várias famílias são direcionadas para Dourados. Ao chegar, em geral, os
homens (e, por vezes, suas esposas, quando não têm criança pequena) são
encaminhados para o trabalho em um dos grandes frigoríficos da cidade,
para os quais falta mão de obra local e cujos salários são bem precários.

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Edilaine Buin & Gilvan Müller de Oliveira

A Cátedra Sérgio Vieira de Mello, vinculada à UFGD e implementada


pela agência da ONU para refugiados (ACNUR) tem prestado auxílio no
sentido de viabilizar formação acadêmica, capacitação de professores
para atender à nova população e, sobretudo, projetos comunitários em
áreas do Direito, atuando para validar diplomas, matricular em escolas,
encaminhar para aulas de português como língua de acolhimento (PLAc)
etc. Apesar de todo esse empenho, tanto da empregabilidade quanto de
questões burocráticas mais gerais, na prática, é muito difícil dar conta de
toda a população que chega, pois os que já estão recebem outros parentes
que não vêm nas mesmas condições estruturadas e se amontoam nas
residências dos que já estão instalados. No geral, as famílias de imigrantes
passam por muitas dificuldades, diante das quais muitos encaram o
aprendizado da língua portuguesa e a escolarização dos filhos como porta
para uma situação melhor (Buin; Biondo, 2021).
Diante desse cenário e em função das demandas das escolas básicas,
o Projeto “Solidariedade Linguística”, que concatenava os três pilares da
formação acadêmica – ensino, pesquisa e extensão – foi idealizado pelo
grupo PET-Letras antes do período de pandemia causada pela COVID-19.
O projeto teria duas etapas: (1) a aprendizagem do espanhol básico, mais a
intervenção nas escolas, mediante esse conhecimento (como um piloto); e,
no ano seguinte, (2) o trabalho efetivo de subgrupos nas escolas, orientados
pelas professoras universitárias e pela doutoranda.
Assim, no segundo semestre de 2019, foi oferecido um curso de
espanhol como extensão para os bolsistas e acadêmicos de Letras e
de Relações Internacionais da UFGD. Tanto os acadêmicos quanto as
professoras universitárias foram alunos da professora venezuelana,
doutoranda da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), Ms.
Rosana Daza Garcia, que se dispôs a ministrar as aulas voluntariamente
durante aquele semestre. Ela foi motivada pelo fato de seus filhos
enfrentarem dificuldades semelhantes na escola e, também, pela
necessidade de gerar registros para sua pesquisa de doutorado. A ideia,
como foi mencionado, era que os envolvidos tivessem uma base de
espanhol para poder desenvolver, no ano seguinte, intervenções na escola
com o recurso da translinguagem (Guimarães; Buin; Garcia; Ribeiro, 2021).
Quando os acadêmicos já tinham realizado as experiências piloto
e estavam prontos para atuar nas escolas públicas de Dourados, fomos
surpreendidos pelo isolamento social em função da COVID-19, e as aulas
das escolas foram suspensas. Embora a universidade também tivesse
suspendido suas aulas, o PET, vinculado ao Ministério da Educação
(MEC), continuou funcionando remotamente, readaptando algumas
atividades para a nova situação. Foi nesse cenário que surgiu outra
demanda: uma ex-aluna do mestrado, intérprete de LIBRAS, procurou
sua ex-orientadora (coautora do artigo), que na época era coordenadora
do PET, solicitando ajuda para crianças CODAs.

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Do monolinguismo ao multilinguismo de acolhimento

As escolas públicas, com a suspensão das aulas, passaram a enviar


atividades para seus alunos a cada duas semanas. As atividades eram
retiradas na escola pelos pais, que deveriam repassá-las para seus filhos
realizarem e, posteriormente, devolvê-las, retirando novas atividades
sucessivamente. Juntamente com as atividades, os pais recebiam
orientações por escrito sobre como deveriam conduzir os afazeres
escolares das crianças. Os pais surdos, embora conhecessem a dinâmica
da escola, não entendiam os bilhetes e as orientações. A intérprete de
LIBRAS, que estava em contato com duas famílias nessa situação, após
conversar com a ex-orientadora, marcou uma reunião na escola, onde
se encontraram a coordenadora, a professora responsável pelo 3º ano
(série em que estavam matriculadas duas crianças CODAs), as mães
das crianças e dois bolsistas do PET, que se dispuseram a trabalhar
com as crianças, a fim de suprir um pouco as demandas que os pais
não conseguiam atender por não dominarem a escrita do português.
Os dois alunos trabalharam com as crianças, orientando-as por meio
de aulas síncronas durante um ano e meio, tempo em que ainda durou
o isolamento social. Desse modo, o projeto “Solidariedade Linguística”
se remodelou, envolvendo não mais o espanhol, mas a LIBRAS, língua
que os acadêmicos conheciam muito pouco.
Cabe ressaltar que os pais imigrantes enfrentaram dificuldades
semelhantes às dos pais surdos. Segundo as coordenadoras, eles não
entendiam os avisos e bilhetes. Muitos não compareceram à escola durante
a pandemia para buscar as atividades que os filhos precisavam realizar
e, posteriormente, devolver. Tratava-se das Atividades Pedagógicas
Não-Presenciais (APNPs), que continham conteúdo semanal, quinzenal
ou mensal para auxiliar os filhos na execução e, após, devolvê-las à
professora regente por meio de canais digitais (Facebook, WhatsApp) ou
na própria secretaria da escola. Em contato com educadores das escolas,
a culpa desse “não funcionamento”, tanto no caso dos surdos quanto
dos imigrantes, era sempre atribuída aos próprios pais, como se eles
não se adequassem às regras por escolha própria. Nunca se direcionava
o problema para a ineficiência do processo de comunicação, no qual
ambas as partes estão envolvidas. Além disso, não se considerava algo
que aumenta a responsabilidade institucional: a questão dos direitos
linguísticos, que está interligada aos direitos humanos. Oliveira e Silva
(2017) chamam a atenção para a necessidade da presença de intérpretes
e tradutores em contextos de atendimentos médicos e jurídicos, o que
não seria diferente nos contextos escolares. Ou seja, a falta de uma
política linguística específica para os diferentes setores da sociedade
contribui para a violação dos direitos humanos. Os autores mencionam a
legislação internacional, que fundamenta a afirmação de que as “barreiras
linguísticas podem, sim, constituir violação dos direitos humanos” (p.
136), uma vez que têm como base a não discriminação.

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Edilaine Buin & Gilvan Müller de Oliveira

Somente após o período de isolamento é que se iniciou parcialmente


o que havia sido planejado inicialmente: acompanhar crianças imigrantes
em sala de aula. Contudo, isso não foi mais feito no âmbito do PET-Letras,
mas como atividade do PIBIC, uma vez que a coordenação do programa
passou para outra docente.
As duas situações que serão apresentadas aqui, ambas como
exemplos de integração da escola com a universidade pública, referem-
se, respectivamente, a um período durante e depois da pandemia: (i)
uma aula on-line, síncrona, com duas crianças CODAs, que têm LIBRAS
como primeira língua e português como segunda, ocorrida durante a
pandemia do Covid-19; (ii) outra vivência em aulas presenciais, em que
duas acadêmicas acompanharam crianças venezuelanas em diferentes
aulas, logo após o retorno presencial das atividades.
Dos registros resultantes das duas atividades (durante e pós-
pandemia), selecionamos para este artigo cenas que inspiram reflexões a
respeito da relação entre língua e pertencimento, entre língua e ideologia,
entre língua e identidade. Ou seja, entre língua e problemas sociais, por
vezes graves, que envolvem seu uso e o que se legitima como possível e
não possível, como adequado e inadequado etc. Apresentamos a seguir
um episódio da primeira situação e, na sequência, da segunda.

Experiência on-line: português e LIBRAS


As duas crianças CODAs, com 8 anos de idade, atendidas pelos
dois acadêmicos que trabalharam em dupla, tinham LIBRAS como sua
primeira língua e só tiveram contato mais sistemático com o português
aos 6 anos, quando iniciaram a escolarização. Embora ouvintes, são filhas
de pais surdos. O menino é filho único, enquanto a menina, mais velha,
tem outros três irmãos bem mais novos. Os encontros on-line com os
acadêmicos, que marcam a fase em que as crianças estavam no 3º ano,
foram realizados pelo Google Meet e gravados.
No caso das crianças ouvintes, os pais (ou algum parente adulto)
ajudavam na execução das tarefas, recebendo orientações por escrito. Já
os pais surdos enfrentavam um isolamento em relação a isso. Para tentar
incluí-los, a intérprete de LIBRAS, por iniciativa própria (sem vínculo
com a escola), produzia vídeos traduzindo as orientações. No entanto,
muitas vezes, as tarefas que envolviam gramática e escrita do português
não faziam sentido para eles. Foi nesse contexto que marcamos uma
reunião na escola, com a coordenadora, a professora, os alunos CODAs
e suas mães, além dos acadêmicos e da professora orientadora, para que
as famílias nos conhecessem e organizássemos o trabalho que ocorreu
por um ano e meio, até a volta presencial das aulas.
As primeiras aulas foram preparadas com base nas APNPs. Contudo,
percebemos que nem sempre as tarefas atendiam às necessidades
das crianças. Para alcançar os mesmos objetivos de aprendizagem,
era possível explorar outras metodologias. Assim, acordamos com
a professora que atividades alternativas, elaboradas com a ajuda da

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Do monolinguismo ao multilinguismo de acolhimento

professora orientadora, também fariam parte do processo de avaliação.


Embora isso tenha sido explicado, as crianças insistiam em considerar
que os momentos em que não desenvolviam atividades das APNPs eram
de brincadeira, participando ativamente. Nessas atividades, a LIBRAS,
que era a língua de domínio dos pais e de maior fluência das crianças,
servia como suporte. Os acadêmicos, com um conhecimento básico dessa
língua, estavam dispostos a aprender com os alunos. Essa troca elevou
a autoestima deles, que frequentemente ocupavam o papel de “menos
fluentes” ou “com dificuldades”. Segue o relato de um dos acadêmicos
(Quadro 1):

Quadro 1 – Dados da pesquisa.

TRECHO 1. Acadêmico J., bolsista do PET-Letras.


Em diversos momentos de nossas aulas, mesmo sem perceber, os alunos
faziam uso da língua de sinais como apoio para se expressar. Percebemos que
a LIBRAS os deixavam mais confortáveis. Desse modo, resolvemos fazer o
uso da translinguagem como apoio para nossas aulas, usando o bilinguismo
dos alunos a nosso favor, para que as aulas pudessem ser mais participativas.
Eles adoraram a ideia, pois assim que inserimos o uso de LIBRAS nas atividades
de Língua Portuguesa o interesse e o rendimento dos alunos melhorou bastante.
Mesmo com a internet caindo ou deixando o microfone no mudo por acidente,
estavam sempre querendo ter seu espaço de fala. Um dos exercícios que achei
incrível a participação dos alunos foi quando estávamos trabalho os substantivos.
O Luan teria que criar um substantivo próprio para um homem, então pedimos
para ele fizesse em LIBRAS primeiro que tentaríamos descobrir qual o era o nome.

O uso da LIBRAS possibilitou que as crianças se integrassem à


situação de ensino-aprendizagem. Professores e alunos interagiam,
utilizando conhecimentos de ambas as línguas e alternando os papéis
de quem ensina e de quem aprende. Isso foi viável porque os acadê-
micos, dentro do grupo de pesquisa, já haviam entrado em contato
com o conceito de translinguagem e com a relevância da intercompre-
ensão. No espaço acadêmico e nas discussões do grupo de pesquisa,
sustentamos a translinguagem em uma perspectiva decolonial (Mig-
nolo, 2003), que deve ser incluída na agenda atual, tanto na formação
de professores quanto no empoderamento de sujeitos “bilinguajan-
tes” nas escolas brasileiras. O atual cenário multilíngue das escolas
públicas de Dourados, que representa muitas outras, clama por uma
dinâmica didático-pedagógica que privilegie a diversidade linguísti-
co-cultural (Guimarães; Buin; Garcia; Ribeiro, 2020).
Inspirados em Li Wei (2011) e em Mazzaferro (2018), Lucena, Rocha
e Maciel (2021) entendem a translinguagem como o cruzamento de
diferentes estruturas e sistemas linguísticos, além de um atravessamento
para além deles. Nesse processo, recursos multimodais são mobilizados
para combinar diferentes dimensões de histórias, experiências pessoais e
contextuais. Ou seja, não se trata apenas da forma (o uso da língua X ou

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Edilaine Buin & Gilvan Müller de Oliveira

Y), mas, essencialmente, da função e do sentido do conjunto de recursos


verbais e não verbais que “são amalgamados, de modo dinâmico, crítico e
criativo, com o propósito de viabilizar a constituição de novas ideologias,
identidades e subjetividades” (p. 356). Assim, a translinguagem parece
ser, no ambiente escolar, um recurso verdadeiramente inclusivo, pois
possibilita aprender a língua do outro, permitindo o uso da própria
língua. Isso difere de uma abordagem que se concentra apenas na
língua local, a qual pode, ainda que implicitamente, contribuir para a
manutenção da hegemonia social construída historicamente.
Enquanto as mães das crianças ouvintes “reclamavam” da
sobrecarga de ajudar seus filhos nas tarefas escolares, as mães surdas
permaneciam isoladas, sem uma comunicação eficiente com a escola,
que parece não acessar outros recursos linguísticos além da língua
oficial. A introdução da LIBRAS nas aulas on-line possibilitou a inclusão
dessas mães nesse espaço, permitindo que elas se identificassem como
participantes ativas na aprendizagem de seus filhos. O trecho do
acadêmico B. ilustra um momento em que esse movimento se inicia
(Quadro 2):
Quadro 2 – Dados da pesquisa.
Trecho 2. Acadêmico B. Bolsista do PET-Letras.
Quando a mãe dela [Ana] percebeu que estávamos utilizando a Libras para
aplicar o conteúdo, parou ao lado da filha e foi se posicionado cada vez mais no
enquadramento da câmera e foi possível observar, pela primeira vez, uma interação
familiar durante todo o processo em permaneceu ao lado da filha, observando
suas respostas com um sorriso no rosto e tentando interagir com os professores.
Professor B., minha mãe fez um sinal pra você... é assim ó.. faz a letra B com a
mão e passa no rosto, na bochecha. Agora seu sinal é esse (repete o gesto).

A experiência de B, nesta situação, mostra que é possível avan-


çar, em um ambiente de ensino-aprendizagem, no sentido de garantir
o direito dessa mãe de participar de situações às quais as outras mães
normalmente são chamadas, sem discriminação, ainda que se esteja
longe de possuir as condições e recursos ideais para isso.

Experiência presencial: português e espanhol


Com o retorno das aulas presenciais na escola básica, duas
acadêmicas, referidas pelas iniciais de seus primeiros nomes, E. e D.,
foram para uma escola pública a fim de dar continuidade ao projeto
“Solidariedade Linguística”, como parte de suas atividades de iniciação
científica. Durante um semestre, as acadêmicas acompanharam alguns
estudantes refugiados. A escola que as recebeu possui um número
significativo de imigrantes, assim como as outras da cidade. No ano
letivo em que as acadêmicas participaram, havia um total de 824
alunos matriculados, dos quais 116 eram estrangeiros: 114 imigrantes
venezuelanos, um haitiano e um argentino. Embora a coordenação
tivesse aberto as portas para o trabalho acadêmico (e também buscado

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Do monolinguismo ao multilinguismo de acolhimento

por isso), houve muita resistência por parte do corpo docente, o que
impediu a realização de videogravações. Portanto, a experiência nessa
escola, diferentemente da anterior, está registrada apenas nos cadernos
de campo, por meio das memórias das bolsistas.
As acadêmicas frequentaram a escola duas vezes por semana
durante um semestre, observando e contribuindo com uma turma
específica de alunos designada a elas, com a autorização dos respectivos
professores. Todas as salas de aula tinham pelo menos dois ou três alunos
filhos de famílias refugiadas, recém-chegadas ao país.
A primeira situação que ambas encontraram em relação aos
estudantes imigrantes foi o total isolamento da turma e de todas as
atividades propostas. Parte dos professores acolheu as acadêmicas,
reconhecendo nelas um apoio para os problemas imediatos ocasionados
pela dificuldade de comunicação com os imigrantes e suas famílias. As
duas alunas possuem conhecimentos básicos de espanhol, e uma delas
está estudando a língua formalmente.
A expectativa dos docentes era que as acadêmicas exercessem,
naquele espaço, a função de tradutoras, sem entender que o trabalho
necessário era bem maior do que uma simples tradução. No início, as
bolsistas ficavam isoladas com os alunos “a serem atendidos”, mas, com
o passar das semanas, começaram a se integrar à dinâmica da sala. À
medida que foram se integrando, os imigrantes acompanharam o mesmo
movimento. O trabalho das bolsistas envolveu tradução, mas, sobretudo,
compartilhamento, empatia, troca de conhecimentos e escuta.
Embora o lugar de “problema” fosse sempre atribuído aos recém-
chegados na situação de refugiados, o dia a dia mostrou que alguns alunos
brasileiros apresentavam dificuldades, por vezes, bem significativas em
relação à aprendizagem. Foi o caso, por exemplo, de Maria, conforme
relatado por E. (Quadro 3):
Quadro 3 – Dados da pesquisa.

Trecho 3. Acadêmica E. PIBIC. Psicologia (orientada pela professora do curso


de Letras)
Algumas semanas após minhas visitas, a professora se sentia à vontade para
solicitar meu auxílio com outros alunos. Pediu para sentar do meu lado, além
do João, a Maria, uma colega que tinha dificuldade em leitura e escrita, não foi
alfabetizada, pois, não conseguia juntar as sílabas como os alunos da turma. Era
uma das alunas da sala que no período matutino frequentava as aulas de reforço. Foi
muito bom essa aluna começar a sentar com João. Eu percebi que esse movimento
de trocar de lugar foi uma oportunidade para que ela e ele estabelecesse um laço
de amizade. Esforcei-me para que houvesse momentos de trocas entre os dois.

João, aluno imigrante, para o qual foi atribuída a necessidade de


acompanhamento por causa de “suas dificuldades”, parece ter muito
mais facilidades em relação aos conteúdos (Quadro 4):

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Quadro 4 – Dados da pesquisa.

Trecho 4. Acadêmica E. PIBIC. Psicologia (orientada pela professora do curso


de Letras)
Em uma das minhas visitas, consegui convencer o João para sentarmos um pouco
mais a frente, e não mais na última carteira da sala. Nos primeiros encontros, não via
ele interagindo com outros colegas, porém, consegui conversar um pouco mais com
ele e aos poucos essa realidade foi se alterando. Depois do intervalo, ficávamos na sala
realizando as atividades de matemática, ele demonstrava muita facilidade em realizar
as contas, entretanto, não conseguia interpretar as questões que tinham problemas
para resolver. Reparei que o João conseguia entender os conteúdos quando lhe era
explicado o significado de algumas palavras do português com sinônimos no espanhol.

O relato traz um indício forte de que, na verdade, João não tinha


dificuldades, como a escola dizia e como os colegas imaginavam. Ele
apenas não entendia a língua. Quando a comunicação acontecia, ele
resolvia os exercícios com facilidade.
Foi possível perceber que a atenção e o carinho que a acadêmica E.
dispensava a João e, também, com todos ali serviu como exemplo para
as crianças da sala também se aproximassem dele (Quadro 5).

Quadro 5 – Dados da pesquisa.

Trecho 5. Acadêmica E. PIBIC. Psicologia (orientada pela professora do curso


de Letras)
Uma das alunas brasileiras, Iara, veio conversar comigo se lamentando porque
em breve iria fazer 11 anos, mas não sabia ler. Falei que logo ela aprenderia.
Ela solicitou a minha ajuda. Então, pedi para que ela lesse uma palavra que
escrevi numa folha. Iara quis sentar próxima de mim para que eu a auxiliasse
também. Além dela, Joaquim era outro aluno em fase de alfabetização que era
ajudado por mim. O fato de eu estar auxiliando outros alunos, além de João,
fez com que ele e outros colegas se relacionassem a ponto de se ajudarem nas
atividades. A experiência foi muito boa. A professora da turma também percebeu
como João se soltou mais desde que os colegas se aproximaram de sua carteira.
Nas últimas semanas em que estive na escola, busquei trazer brincadeiras para
que os alunos migrantes estivessem juntos interagindo no intervalo. Nos últimos
encontros, o comportamento do João me impressionou muito; ele se soltou bastante.
Notei como ele estava confiando em mim e em seus colegas. Nos intervalos,
jogávamos forca e jogo da velha. Reparei a empolgação dos colegas imigrantes e
os brasileiros, que misturavam palavras em português e palavras em espanhol.

Foi muito importante para os alunos imigrantes observarem que


outros colegas brasileiros também tinham dificuldades. Esse aconteci-
mento, relatado no trecho, parece ter contribuído significativamente
para tirar João do lugar do “não saber”, por ser imigrante e por não
dominar a língua portuguesa.
As acadêmicas notaram um esforço e um movimento por parte
dos alunos imigrantes em tentar resolver as atividades solicitadas. Eles
utilizam os recursos de que dispõem para isso. Mesmo sem aulas de

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Do monolinguismo ao multilinguismo de acolhimento

português direcionadas para suas necessidades específicas, seja pela


breve vivência no país, seja pela familiaridade com as duas línguas, os
imigrantes demonstram algum conhecimento. Um exemplo disso ocorre
quando respondem a uma interpretação de texto em espanhol. Embora
isso revele um grau significativo de leitura, a professora desconsidera
totalmente as respostas, sem ao menos buscar ajuda ou tentar entender
as respostas da criança por meio de tradução (Quadro 6):

Quadro 6 – Dados da pesquisa.


Trecho 6. Acadêmica D. - PIBIC. Letras.
[...] Ramon leva o caderno para a professora avaliar, havia escrito palavras em
espanhol tentando responder às questões do texto. A professora diz a ele que
responda em português já que ela não entende o espanhol.

A avaliação não é considerada, como prescrevem os documentos


oficiais, um instrumento de diagnóstico que permita orientar os estu-
dantes sobre o que precisam melhorar e para os professores reverem
metodologias, conteúdos etc. Trata-se de um instrumento de poder.
Nas palavras da acadêmica D.: “Durante as avaliações, a professora
regente não me autoriza a ajudar os alunos imigrantes ou qualquer
outro aluno da sala”.
Contudo, a professora permite que cada aluno faça até três
perguntas a ela, mas os alunos imigrantes nem chegam a perguntar
nada, segundo o relato de D. A língua do outro entra naquele contexto
como um problema, nunca como uma porta para novos conhecimentos.
Outro episódio de avaliação valorizada na escola é o “ditado”.
Segundo o relato das alunas, os venezuelanos tentam participar
escrevendo a palavra em espanhol correspondente àquela que é ditada
em português pela professora (Quadro 7).

Quadro 7 – Dados da pesquisa.

Trecho 7. Acadêmica D. - PIBIC. Letras.


Os alunos imigrantes ouvem a palavra em português e tentam traduzir para
o espanhol, o aluno às vezes sabe o significado da palavra, mas não domina a
escrita em português, um exemplo disso, ocorreu com Ramon a palavra “gosto”
ele traduziu por “Me Gosta”. Assim sucessivamente os alunos ouvem em
português e associam ao espanhol e tentam traduzir as palavras.
Embora a tradução esteja correta, a professora não considera a resposta como
correta, já que o objetivo do ditado é verificar se o aluno domina a escrita correta
da palavra em português. Gianna ao tentar escrever “banana” escreveu “vanana”
provavelmente uma dificuldade com o uso das letras “b” e “v”, em espanhol
essas duas consoantes não possuem diferenças fonológicas tão marcantes como
no português.

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Edilaine Buin & Gilvan Müller de Oliveira

As respostas dadas, tanto por Ramon quanto por Gianna, mos-


tram que eles conseguem entender o significado da palavra em portu-
guês e, assim, traduzir para sua língua. No entanto, essa importante
habilidade na aquisição de uma segunda língua sequer é considerada
e suas respostas são tidas como erradas.
Ignorar a língua do outro em atividades escolares pode revelar não
só algo pontual, de uma tarefa escolar, mas resultado ou indício da não
abertura das experiências que o outro traz por meio de sua carga cultural.
Diferentemente do que as acadêmicas observaram, um ambiente com
espaço para a interculturalidade seria muito mais produtivo. Segundo
Walsh (2005),

La interculturalidad es distinta en cuanto se refere a complejas relaciones,


negociaciones e intercâmbios culturales y busca desarrollar una
interacción entre personas, conocimientos y prácticas culturalmente
diferentes; una interación que reconoce y parte de las asimetrías sociales,
económicas, políticas y de poder y de las condiciones institucionales que
limitan la posibilidad que el “otro” puede ser considerado como sujeto
com identidad, diferencia y agencia la capacidad de actuar (p.6).2 2
A interculturalidade
se distingue por suas
complexas relações,
É necessário que se criem atividades/dinâmicas nas quais haja negociações e
intercâmbios culturais,
troca de saberes. Poder-se-ia, por exemplo, pensar em rodas de conversas buscando desenvolver
uma interação
em que cada um, do modo como pudesse, com recursos multilíngues entre pessoas,
conhecimentos e
e multimodais, pudesse contar um evento sobre um tema específico práticas culturalmente
diversas. Essa
vivenciado em seu país de origem. Outra possibilidade seria fazer uma interação reconhece e
receita simples, típica do lugar de origem etc. A ideia seria expor jeitos parte das assimetrias
sociais, econômicas,
diferentes e legítimos de atuação no mundo. Segundo Wash (2005, p.11), políticas e de poder,
além das condições
“um intercambio que se construe entre personas, conhecimentos, saberes, institucionais que
limitam a possibilidade
práticas culturalmente distintas, buscando desarrollar um nuevo sentido de que o ‘outro’ seja
considerado um
de convivência de éstas én su diferenciá”3. sujeito com identidade,
diferença e agência, ou
seja, a capacidade de
Algumas reflexões: multilinguismo de acolhimento agir. (tradução nossa)

As situações exemplificadas destacam a urgência de direcionamentos


3
Uma troca que se
na área da educação que sejam compatíveis com um país plurilíngue/ constrói entre pessoas,
conhecimentos,
multilíngue. A presença de acadêmicos de licenciaturas nos espaços saberes e práticas
escolares, seja por meio de estágio, iniciação científica ou programas como culturalmente
distintas, buscando
PET ou PIBID, com a devida orientação, pode funcionar como uma força desenvolver um novo
sentido de convivência
para a mudança. Registrar situações como essa é um passo importante entre elas em sua
diversidade. (tradução
para possíveis e urgentes mudanças curriculares e pedagógicas no que se nossa)
refere ao ensino de línguas.
As situações apresentadas aqui apontam para a necessidade de
reconfigurações urgentes e profundas na escola brasileira. Trata-se de
mudanças muito mais significativas do que as ações que têm sido tomadas
em nome da inclusão, como a colocação de um intérprete em sala de aula
(Pereira, 2019) ou a presença de alguém que traduza qualquer outra língua.
Da mesma forma, não se trata simplesmente de inserir o PLAc nas escolas.

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Do monolinguismo ao multilinguismo de acolhimento

O estudo de Anunciação (2018) e de Maher (2007), como já mostrado


em Buin e Biondo (2021), problematiza o próprio conceito de língua de
acolhimento, que foi transposto do contexto europeu para o Brasil. As
autoras chamam a atenção para o fato de que o termo retifica diferenças
e as classifica como inferiores ou superiores, reforçando o mito de que
o Brasil é um país monolíngue. Além disso,

(...) acolher (...) pode (...) conotar uma relação hierárquica de poder bastante
próximas das perspectivas binaristas que dividem e essencializam
colonizador/colonizado, negro/branco, homem/mulher, indígena/
não indígena, migrantes/ (não)migrantes, entre outros (já bem
conhecidos) estabilizadores de identidades e marcadores de diferença
e de precariedade em uma sociedade que se estrutura, antes de tudo e
a qualquer preço, em uma perspectiva neoliberal (Buin; Biondo, 2021,
p.298-299).

Nesse sentido, seria muito produtivo, a partir do que as cenas


capturadas pelos acadêmicos revelam, usar a expressão ‘multilinguismo
de acolhimento’, um termo que evitaria uma interpretação com conotação
hierárquica e binária. Nas situações apresentadas, parece que legitimar
o uso das várias línguas no espaço da sala de aula seria um caminho
muito mais eficaz, que colocaria as línguas e, sobretudo, os sujeitos, em
uma relação mais democrática e propícia para o ensino e a aprendizagem.
Isso não diminui, como se poderia imaginar, a importância das
aulas de português como língua estrangeira e/ou como língua de
acolhimento em setores escolares e extraescolares, que, em grande parte,
são realizadas por trabalhos voluntários. Esses trabalhos precisam, de
fato, ser ampliados e institucionalizados, uma vez que se trata de um
direito dos imigrantes e parte dos direitos humanos. É necessário refletir
sobre qual orientação ideológica está nas bases desse tipo de política de
expansão. Como afirmaram Oliveira e Silva (2017, p. 148),

(...) [e]mbora o discurso das políticas de ensino do português para os


imigrantes seja um discurso de inclusão social, devemos questionar até
que ponto a busca pela integração social desses grupos não se refere,
ainda que implicitamente, também à sua assimilação linguística e
cultural. O problema não está em querer que os imigrantes aprendam
a língua oficial, pois, repetimos, essa é uma política indispensável e
também um direito deles, mas em ver tal aprendizagem como a única
política linguística possível. Esse tipo de raciocínio, segundo o qual
aprender a língua do país acolhedor é não só a única, como a melhor opção
para que os imigrantes possam estar integrados à sociedade “nacional”,
está ancorado em uma visão de sociedade linguísticamente homogênea
e tem raízes históricas.

Tal “integração” pode estar baseada em uma ideologia que vê


a língua como “um problema a ser superado” (op.cit, p.148), com risco
de contribuir para a construção e manutenção de um significado de
diversidade como algo temporário. Dentro do modelo tradicional de
ensino, como o das escolas focalizadas, no qual o conhecimento é

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Edilaine Buin & Gilvan Müller de Oliveira

apresentado de forma segmentada e desintegrada, há pouco espaço (ou


nenhum) para a interculturalidade, para a entrada do conhecimento
do outro, para entrada daquilo que não estava previsto, o que explica a
dificuldade inicial das acadêmicas para atuarem na sala de aula e, no
caso dos CODAs, o fato de as crianças considerarem “brincadeira” (e
não trabalho/ensino) os momentos em que trocavam suas experiências
com os acadêmicos.
Por outro lado, a experiência dos acadêmicos, no papel de
professores, evidencia muitas possibilidades e, apesar da exiguidade
do tempo em que atuaram, direcionaram o rumo de aprendizagem dos
estudantes envolvidos naquele espaço/tempo. As tensões em torno de
questões linguísticas potencializam mudanças estruturais e formativas
no modelo tradicional de ensino que prevalece no território nacional,
as quais beneficiariam não só os falantes de línguas minoritárias, mas
todos os estudantes. Trata-se de orientações para a educação que fazem/
fariam muito mais sentido em um país multi/plurilíngue. Entre elas,
podemos mencionar:

1. O entendimento da translinguagem, ou seja, do cruzamento de


línguas e de ferramentas multimodais, como algo positivo, tanto
no dia a dia, quanto como estratégia pedagógica, com base em
uma educação linguística ampliada, como defende Cavalcanti
(2013).
2. Espaço para aulas que envolvessem o desenvolvimento das
expressões escrita e oral para as várias línguas maternas que
circulam no ambiente e não somente a Língua Portuguesa,
nas quais pudessem ser valorizados recursos multimodais
e atividades de dramatização. Poder-se-iam formar grupos
específicos de trabalho voltados para necessidades específicas
(ensino da língua do outro, ensino de escrita, desenvolvimento
de oratória etc.), como pode inspirar a pedagogia de Freinet
(2001, 2004).
3. Construção de uma mentalidade nos espaços de formação
acadêmica e de formação continuada para além da visão da
língua como direito: língua como recurso (Ruiz, 1988), tanto
do ponto de vista pedagógico – uso da língua materna como
andaime (Vygotsky, 2003), quanto do ponto de vista econômico
– abertura de mercado de tradução, de recursos digitais etc.
4. Abertura para o letramento científico nas escolas e na formação
de professores (Silva, 2020) inspirado em pedagogias alternativas
em que o professor é mediador do conhecimento e, também, é
aprendiz, modelos em que os papéis possam ser intercalados
– o professor não precisa ser detentor de todo o conhecimento,
podendo, na condição de mais experiente, também aprender
juntamente com seus estudantes, por meio de projetos.

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Do monolinguismo ao multilinguismo de acolhimento

5. Avaliação contínua na escola entendida como diagnóstico


e, também, baseada na evolução individual e nos resultados
de projetos coletivos, as quais prezem pela autoestima dos
estudantes.
6. Espaço para a interculturalidade, tanto na escola quanto na
universidade. A sala de aula pode ser um espaço de troca
de aprendizagens e, no que se refere à língua e a cultura
do estudante, o professor também pode se posicionar como
aprendiz.
7. Incentivo à formação acadêmica que preze pela atuação social,
com base em uma concepção sócio interacional de língua
(Mendes, 2012), o que implica em mudanças no currículo dos
cursos de licenciaturas.

Considerações finais
Embora os documentos oficiais que regem a educação brasileira
orientem uma política educacional voltada para a valorização da
diversidade, na prática, mantém-se uma orientação para a homogeneização,
visando a uma língua única que responda às tarefas escolares, sem foco
na interação e na construção conjunta de conhecimentos. As cenas
resgatadas neste artigo revelam uma política implícita cujas ações têm
suas bases na ideia de monolinguismo, construída fortemente no período
do Estado Novo e do Regime Militar, como foi mencionado na introdução.
As experiências registradas pelos orientandos de iniciação científica
e do PET-Letras mostram que prevalecem, no espaço escolar, atitudes que
usam a língua para cercear e culpabilizar aqueles que estão em posição
de desprivilegio, em um movimento que contribui para a manutenção da
hegemonia linguística e social. No caso dos imigrantes, o que dá respaldo
para a recusa da escuta da língua do outro? O que “legitima” julgar
inadequada a interpretação de um texto em português por estar redigido
em espanhol, sem considerar todo o trabalho de leitura na língua que o
aluno ainda está aprendendo? No caso dos CODAs, o que “naturaliza” a
ausência de intérpretes para a manutenção da comunicação com os pais?
Ir contra o desenvolvimento sustentável de comunidades linguísticas
significa conduzir uma política moldada em interesses que beneficiam
qual grupo social? Que tipo de trabalhador a escola pretende formar?
A economia agrícola, que conta com máquinas potentes para cultivo
e colheita, voltada para a exportação de grãos, acaba, indiretamente,
promovendo o desinteresse pelo ensino técnico e superior. Falar outras
línguas vai contra um modelo hegemônico, baseado na exploração
máxima da terra e da mão de obra, na manutenção dos latifúndios
e da monocultura. Isso resulta em uma espécie de “monocultura do
monolinguismo”, e as escolas que atendem a alunos em condições
econômicas fragilizadas acabam, em geral, por reproduzir esse modelo,
o que é sustentado também pelo não reconhecimento da língua do outro,
seja em sua modalidade escrita ou falada.

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Edilaine Buin & Gilvan Müller de Oliveira

Investir em uma formação para o multilinguismo significa abrir


espaço para a valorização de outro tipo de mercado, em crescente
expansão, no qual a(s) língua(s) ocupa(m) o centro da produção, devido
à importância da comunicação e da interação como parte do próprio
processo produtivo. Diferentemente do trabalho braçal do campo ou
do trabalho repetitivo e mecânico, como o que prevaleceu na cultura
fordista que vigorou até meados dos anos 1970 (Oliveira, 2010), a produção
de bens de consumo da sociedade mediada pelas novas tecnologias
da informação e da comunicação demanda interatividade tanto para
a produção de diferentes softwares quanto de outros produtos que
precisam se moldar em características mais personalizadas para serem
competitivos (modo de produção enxuto ou just-in-time). Soma-se a isso
o grande mercado na internet, que se expande à medida que inclui povos
das mais diversas línguas.
Um caminho a médio e longo prazo para os problemas escolares
aqui apresentados é a promoção de uma sensibilização das instituições
de ensino e da sociedade para a realidade multilíngue e, também, para o
poder econômico das línguas. A escola necessita provocar a interatividade
e o trabalho colaborativo, tal como uma sociedade moderna requer, para
promover o interesse pelo conhecimento e, por interesses mercadológicos,
garantir, sobretudo, que os direitos linguísticos dos estudantes e de suas
famílias sejam respeitados.
Finalizamos este texto ressaltando a importância de ações nos
cursos de graduação, em especial nas licenciaturas, para iniciativas como
as relatadas aqui pelos acadêmicos, com traços ou teor etnográfico, para
que, cientes de que a diversidade linguística formada por muitas línguas
é parte da riqueza de um país, possamos contribuir para consolidar
políticas linguísticas mais humanas e solidárias, que amparem a (re)
construção de um país com vistas à modernidade, que tenha espaço de
protagonismo para suas riquezas diversas.

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Do monolinguismo ao multilinguismo de acolhimento

From monolingualism to host multilingualism


ABSTRACT:
This article aims to discuss the need for a change in language
policies and educational practices in Brazil, promoting the
appreciation of multilingualism and linguistic diversity,
especially in school contexts that serve immigrants and
refugees. The research explores the transition from a
monolingual language policy to an approach that recognizes
and values linguistic diversity, through an educational
experience in a public school in the city of Dourados, Mato
Grosso do Sul. The educational context is challenging,
as these schools, which already had Indigenous students
speaking Guarani, now receive a growing number of
immigrants and refugees, such as Venezuelans and
Haitians, who do not master Portuguese. The theoretical
framework addresses linguistic repression and the need to
recognize linguistic diversity as a valuable resource. The
adopted methodology is qualitative, based on reports from
students in the undergraduate programs of Language and
Psychology who participated in the university extension
project “Linguistic Solidarity,” which involved monitoring
elementary school classes with students from different
language backgrounds over a semester. From qualitatively
selected reports, the article seeks to (1) share situations that
are often not discussed involving bi/multi/plurilingualism;
(2) problematize the urgencies in this educational context,
which is representative of other scenarios; and (3) promote
a reflection that inspires political movements in favor of
the rights of the community affected by the dynamics of
monolingualism. The results highlight the feasibility and
urgency of implementing changes in the teaching model,
promoting a more inclusive and supportive educational
environment aligned with the needs of a globalized world.
KEYWORDS: Language Policy. Language Teaching.
Immigrants. CODAs.

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