Uso de Habitat Padrão
Uso de Habitat Padrão
INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS
GIORDANO CIOCHETI
São Paulo
2007
GIORDANO CIOCHETI
São Paulo
2007
Ficha Catalográfica
Ciocheti, Giordano
Uso de habitat e padrão de atividade de médios e grandes mamíferos e
nicho trófico de Lobo-Guará (Chrysocyon brachyurus), Onça-Parda (Puma
concolor) e Jaguatirica (Leopardus pardalis) numa paisagem agroflorestal,
no estado de São Paulo. 78pp.
Comissão Julgadora
Prof(a). Dr(a).
Ao Prof. Jean Paul Metzger pelas conversas e bate papos nas horas de
café e trabalho.
Carol sua companhia foi sempre muito agradável, tanto nas horas das piadas,
Gorgone, Leandro Tambosi, Milton Cezar Ribeiro, Talita Zupo, Mariana Vidal,
Cristina Banks, Alexandre Igari... Pessoal, eu sei que não é fácil me agüentar,
valeu por todos os momentos em que tiveram paciência comigo, com minhas
piadas nem sempre boas, meu gênio forte e brigão. Sem vocês acho que eu
pela amizade acima de qualquer outra coisa. Re, você vai demorar para se
dissertação.
À Neuza Pierina Bissoli Ciocheti, minha linda mãe, por toda a paciência,
que só as mães tem, depositada em mim e em minha profissão (que não é fácil
de compreender). Enfim, por tudo que ela já fez por mim em toda sua vida.
nossas vidas cedo demais, me deu muito amor e todo o subsidio necessário
você.
Índice:
Abstract....................................................................................1
Resumo....................................................................................3
1. Introdução Geral...............................................................5
2.1. Introdução...............................................................12
2.4. Discussão...................................................................38
2.5. Bibliografia.................................................................44
3.1. Introdução.................................................................51
3.3. Resultados.................................................................63
3.3.1. Dieta do lobo-guará (Chrysocyon brachyurus)..64
3.4. Discussão.................................................................69
3.5. Bibliografia...............................................................72
4. Conclusões Gerais............................................................76
Abstract
The following study analyzed activity patterns and habitat use of large and medium size
mammals as well as diet and trophic niche overlapping of feline and canid species in a fragmented
area of the State of São Paulo. The landscape studied contains two fully protected conservation
units with cerrado and semi-deciduous vegetation and also remnants of native semi-deciduous
forest located in private properties. The general hypothesis of this study are: in more impacted
environments, i, large and medium size mammal species tend to generalize their behavior
regarding habitat use and activity patterns and ii, top food chain predators increase the
competition for resources. The following aspects were studied through photographic traps and
fecal sorting: a) frequency of different habitat use by large and medium size mammals; b) activity
pattern of large and medium size mammals; c) diet and niche overlapping of three top food chain
carnivores: Chrysocyon brachyurus, Puma concolor and Leopardus pardalis. Samples were
withdrawn from seven fragments of native phytophysiognomies - cerrado sensu stricto, cerradão
and semideciduous forest – and from areas of eucalyptus plantations. One hundred and sixty five
photographs were obtained, where 17 species were identified. Two hundred and thirty three
samples of feces were collected and identified, of which 93 of Chrysocyon brachyurus, 68 of Puma
concolor, 38 of Leopardus pardalis, 30 of other small felines and 4 of Cerdocyon thous. The results
show that, generally, large and medium size mammals use the entire area. However, more
specialist mammals, such as the Sylvilagus brasiliensis, kept their preference for a more specific
habitat. Spearman correlation tests demonstrated that those species which are more susceptible
to anthropic alterations were more correlated with areas containing a higher connectivity and
bigger size. The data also indicated that species are generalizing their behavior regarding the
activity patterns: species that were active in some periods of the day are now remaining active in
other periods as well. Among the carnivore species studied, Chrysocyon brachyurus was the specie
with the most diversified diet, feeding on birds, reptiles, fruits, insects and mammals. Puma
concolor and Leopardus pardalis had more restricted diets, where 90% of the items ingested
belonged to other mammals. The trophic niche of C. brachyurus and L. pardalis species were
1
strongly overlapped, indicating competition between them. The results obtained through
photographic traps and diet analysis indicate that there might be a relation between more
conserved areas (less isolated larger areas immersed in more permeable matrixes) and the
frequency of mammals, the overlapping niche of top food chain carnivores ad the density of feces
found.
2
Resumo da dissertação
O presente trabalho visou analisar padrões de atividade e uso de habitats por mamíferos
de médio e grande porte, bem como dieta e sobreposição de nicho trófico de espécies de felinos e
canídeos, numa região fragmentada do estado de São Paulo. Na paisagem estudada, existem duas
grande porte tendem a generalizar seu comportamento de uso de habitat e padrão de atividade e
ii. predadores de topo de cadeia alimentar aumentam a competição por recursos alimentares. Para
distribuídas em sete fragmentos, onde existem fitofisionomias nativas - cerrado sensu stricto,
obtidas 165, fotografias, nas quais identificou-se 17 espécies. Foram coletadas e identificadas 233
mamíferos de médio e grande porte utilizam a área como um todo; os mamíferos mais
especialistas, como o tapiti (Sylvilagus brasiliensis), mantiveram sua preferência por um habitat
específico. Testes de correlação de Spearman mostraram que algumas espécies mais suscetíveis a
conectividade. Em relação aos padrões de atividade, os dados indicam que as espécies estão
generalizando o seu comportamento: espécies que tinham atividade em alguns períodos do dia
estão permanecendo ativas também em outros períodos. Quanto à dieta, o lobo-guará foi a
3
espécie que utilizou mais itens entre os carnívoros estudados, alimentando-se de aves, répteis,
dieta mais restrita, sendo que os mamíferos representaram 90% dos itens consumidos. Houve
uma alta sobreposição de nicho trófico entre lobo-guará e jaguatirica, indicando competição
entre essas espécies. Os resultados, obtidos tanto por meio de armadilhamento fotográfico como
por análise da dieta, indicam que pode existir uma relação entre áreas com maior grau de
paisagens.
4
1. Introdução Geral:
1.1. Situação geral, passada e atual do Cerrado e da Floresta Estacional Semidecídua
na região de estudo
Atlântica e Cerrado (Savana). Segundo Victor (Victor 1975, apud Cavassan 2002), as fisionomias
florestais do bioma Atlântico, tais como floresta ombrófila densa, floresta ombrófila mista, floresta
estacional semidecídual, originalmente dominavam o Estado, ocupando mais de 80% de sua área
(figura 1); as fisionomias de Cerrado, que variam de áreas abertas e campestres - como o cerrado
campo limpo - a áreas fechadas e florestais - como o cerradão (figura 2) - ocupavam, 18,2% do
Estado.
Figura 1. Domínio das formações vegetais que ocorrem no estado São Paul. Em destaque, a região de
estudo (Fonte: BIOTA/FAPESP 2007).
5
Fisionomias Florestais
Floresta
Semidecídua
Fisionomias de Cerrado
Cerrado
Cerradão sensu
stricto
Campo
Cerrado Campo Sujo
BIOTA/FAPESP (2007), existem remanescentes em apenas 8,5% da área original (tabela 1). Outra
fisionomia presente outrora dominante, a floresta semidecídua, possui cobertura em 8,2% da área
Tabela 1 Área original do domínio no estado de São Paulo e cobertura remanescente dos cerrados e das
florestas estacionais semideciduais no estado de São Paulo (BIOTA/FAPESP 2007).
FLORESTA
ESTACIONAL CERRADO
SEMIDECÍDUA
ÁREA DO DOMÍNIO NO
11.346.499 ha 2.474.798 ha
ESTADO DE SÃO PAULO
COBERTURA
927.663 ha (8,2%) 210.372 ha (8,5%)
REMANESCENTE
O histórico da ocupação humana no interior do estado de São Paulo, com grandes áreas
mais recentemente, silvicultura com espécies de eucaliptos e Pinus. Esta ocupação originou uma
paisagem muito alterada, composta por poucos fragmentos de vegetação nativa relativamente
6
grandes (>1.000 ha) e muitos fragmentos pequenos (<100 ha), que representam, na maior parte
dos casos, reservas legais (RL) e áreas de preservação permanente (APPs) das propriedades
efeitos são: a) efeitos de borda, representados por alterações no microclima, como aumento nos
níveis de insolação, temperatura, umidade e vento (Kapos 1989, Bierregaard 1992), fazendo com
que plantas e animais pouco plásticos tenham sua população diminuída, ou até mesmo extinta, e
que espécies plásticas aumentem de forma prejudicial sua densidade (Noss 1985); b) o
cruzamentos consangüíneos, que podem levar ao declínio e extinção dessas populações (Wilcove
& May 1986, Shaffer 1990); c) perda e/ou redução de habitats, com provável isolamento dos
fragmentos e diminuição dos recursos (Andrén 1994, Fahrig 2003, Schonewald-Cox & Buecher
1992).
O antigo pensamento de que apenas aumentar a área das reservas existentes (ou criar
reservas grandes, mas isoladas) seria ideal para manter a biodiversidade vem perdendo espaço
para aquele que ressalta a importância de uma rede de fragmentos grandes e pequenos, que
garantem uma maior diversidade de habitats favoráveis, para onde as espécies possam migrar e
7
A migração diminui a probabilidade de extinção das espécies (Burkey 1988), reduzindo os
metapopulações (Hanski 2004). Entretanto, para que o fluxo de espécies na paisagem seja
fragmentadas. A criação de corredores florestais (habitat linear, envolto por matriz, que conecta
dois ou mais blocos de habitats) (Beier & Noss 1998) é uma das saídas para o manejo dessas
áreas. Muitos autores concordam que a interligação de áreas aumenta a viabilidade populacional
(Meffe & Carroll 1997). Por outro lado, outros alertam para riscos que os corredores possam
trazer, tais como dispersão de doenças, distúrbios e invasão de espécies exóticas (Simberloff
1992). A funcionalidade dos corredores é outro ponto crucial, pois a maioria dos corredores
possui pouca largura, o que acaba por expor toda a sua área a efeitos de borda, inviabilizando
estratégias que visem torná-la mais permeável às espécies (Castellón & Sieving 2006), como por
Para se manejar uma área de forma coesa e funcional, implementando estratégias que
espécies ou grupos funcionais, bem como as características da paisagem onde se insere a área de
estudo (Shaffer 1990, Wiens 1995). Além disso, deve-se definir a paisagem e suas características
pela “visão” das próprias espécies (Metzger 2006), isto é, delimitar espacial e funcionalmente as
paisagens e suas variáveis, com base na biologia das espécies ou grupos biológicos estudados.
8
O conceito de espécie guarda-chuva, isto é, espécie que possui necessidades ecológicas
maiores do que outras, quando aplicado, pode garantir a proteção de espécies menos exigentes,
para quais características possuem maiores requerimentos do que outras. Diversos estudos
configuração da paisagem (arranjo espacial das unidades que compõem a paisagem) sobre as
espécies presentes nessas áreas (Laurence 1991, Gascon et al. 1999, Metzger 2000). Relacionam
riqueza e abundância das espécies aos tipos de matrizes, distância entre remanescentes e
tamanho de fragmentos. No entanto, os que utilizam riqueza de espécies são bastante criticados,
pois este não é considerado um valor auto-explicativo (Fleishman et al. 2006); o conceito de
riqueza de espécies não separa as espécies sensíveis às alterações antrópicas daquelas não
sensíveis. Assim, em duas áreas, uma com riqueza igual a 25 e outra com riqueza igual a 21
espécies, por exemplo, não se pode garantir que as 25 espécies da primeira área sejam mais
pois a área mais rica pode ter uma alta proporção de espécies oportunistas ou generalistas. Desta
forma, deve-se preferir utilizar, quando possível, variáveis qualitativas, como densidade e
freqüência. Espécies de pequeno porte – por exemplo: aves, roedores e lagartos – são de fácil
captura e recaptura e assim, pode-se obter estimativas de densidade e utilizá-las nos estudos.
Espécies de maior porte – como os médios e grandes mamíferos – são de difícil captura e, desta
forma, deve-se utilizar a freqüência da espécie em relação ao grupo estudado para as análises. A
frente a uma armadilha fotográfica). Utilizando a freqüência e/ou densidade das espécies-alvo,
pode-se verificar a influência das variáveis ambientais de forma isolada para cada espécie e,
Este trabalho teve como objetivo geral analisar o uso de habitats, o padrão de atividade
de médios e grandes mamíferos e a dieta de três espécies carnívoras, numa paisagem altamente
9
Paulo. Visou contribuir para a conservação desse grupo faunístico, que está sob forte efeito da
resultados também podem ser utilizados para subsidiar estratégias de manejo que aumentem a
conectividade funcional da paisagem no estado de São Paulo, a serem recomendadas nos planos
Florestal (FF).
Esta dissertação está organizada em dois capítulos. O primeiro teve como objetivos: i)
destes fragmentos, iii) avaliar o padrão de atividade de mamíferos de médio e grande porte na
área de estudo. Os objetivos do segundo capítulo foram: i) avaliar a dieta de onça-parda (Puma
estudo, ii) quantificar a sobreposição de nicho trófico entre essas espécies, por meio da análise de
suas dietas.
10
2.
11
2.1. Introdução:
O bioma Cerrado faz fronteira com quatro outros biomas brasileiros: Pantanal, Floresta
Amazônica, Floresta Atlântica e Caatinga (Eiten 1979). Toda essa diversidade de contatos e a
flora, sendo o Cerrado considerado um dos “hotspots” mundiais (CI 2005). Segundo Mantovani
(1998), 65% de sua vegetação nativa já foi destruída. Apenas 1,6% da área total do bioma, em
todo o Brasil, está em unidades de conservação, que não são suficientes para a manutenção de
sua biodiversidade, principalmente pelo alto grau de isolamento em que se encontram essas áreas
protegidas. No estado de São Paulo, a situação chega a ser pior: apenas 0,5% do domínio do
encontra-se em situação semelhante, com 0,6% de seus remanescentes em UCsPI (tabela 1).
Tabela 1. Área original do domínio no estado de São Paulo e cobertura remanescente dos cerrados e da
floresta estacional semidecídua no estado de São Paulo e nível de proteção integral para fitofisionomias
presentes no estado de São Paulo (adaptado de BIOTA/FAPESP 2007)
% da % do
Domínio- original Cobertura UCs cobertura Domínio
FITOFISIONOMIA no Estado (ha) atual (ha) integral em UCs em UCs
(ha) integral integral
Floresta Ombrófila 4.786,394 2.012,143 627,542 31% 13%
Densa
Há alguns estudos que mostram o uso de habitats por mamíferos de médio e grande porte
em diferentes fitofisionomias (Alho et al. 1986, Fonseca & Redford 1984, Jácomo 1999), no
entanto, em áreas antropizadas, os poucos estudos existentes são recentes, o que demonstra a
maior importância dada a esses ambientes alterados apenas no momento atual (Daily et al. 2003,
12
Considerando-se o nicho de uma espécie como um hiper-volume, pode-se dizer que as
variáveis ambientais que constituem esse hiper-volume regulam a sua distribuição (Hutchinson
1959). As espécies podem ser mais ou menos sensíveis a essas variáveis e essa sensibilidade está
geralmente não têm muita sensibilidade a variáveis amplas, como temperatura e altitude - muitas
das espécies possuem distribuições continentais, aceitando uma grande variância dentro das
A fragmentação dos habitats naturais gera perturbações que alteram as faixas de valores
destas características ambientais mais amplas (temperatura, umidade etc), mas geralmente são
mudanças nas condições locais, refletidas por efeitos de borda (Noss 1985), o que não implica na
conformação da paisagem. Esta idéia se reforça com as teorias dos limiares de fragmentação: i)
quando uma paisagem possui menos de 30% de remanescentes o isolamento entre esses faz com
que a estrutura do mosaico formado pelos fragmentos seja muito importante na persistência das
populações e/ou metapopulações (Andrén 1994); ii) quando a distância do fragmento focal aos
fragmentos mais próximos, dividida pelo número de fragmentos circundantes, for maior que a
se torna fundamental para a manutenção da espécie focal na região (Fahrig 1998). Portanto, a
naturais remanescentes; ii) tipos de usos das terras pelo homem; iii) tamanho máximo, médio e
vi) densidade de estruturas que gerem conectividade (e.x. corredores, trampolins ecológicos); vii)
13
pode determinar quais variáveis podem influenciar na distribuição das espécies e em que escala
isso acontece.
presentes na área; ii) avaliar a influência das características espaciais dos fragmentos sobre a
freqüência das espécies; iii) avaliar o padrão de atividade de mamíferos de médio e grande porte
na área de estudo; iv) identificar, nessa paisagem, fragmentos mais e menos utilizados pelas
14
2.2. Materiais e Métodos:
temperatura nos meses de inverno (estação seca) varia de 15 a 31°C e, nos meses mais quentes
(estação úmida), de 20 a 36°C (Nimer 1977). A pluviosidade anual é geralmente superior a 1.400
mm, com um período de precipitação mais intenso, de outubro a março, e índices pluviométricos
1.000 m (Shida 2005). Os solos mais representativos são os arenosos, pertencentes às subordens
região são: cerradão, cerrado sensu stricto, campo limpo, campo sujo, floresta estacional
Vassununga (PEV), Estação Ecológica de Jataí (EEJ) e Estação Experimental de Luiz Antônio
(EELA), que se encontram nos municípios de Santa Rita do Passa Quatro e Luiz Antônio (figura 1)
e são gerenciados pela Fundação Florestal de São Paulo (Kronka et al. 1993).
15
Figura 1. Área de estudo (organização Giordano Ciocheti).
A EEJ e a EELA são compostas de três áreas disjuntas: a) Gleba A, envolve parte da EEJ e
Gleba Oitocentos Alqueires (OA), separada da gleba anterior por uma área em regeneração, sem
manejo, e uma estrada com fluxo razoável de veículos, que dá acesso principalmente à cidade de
aproximadamente 1.600 ha; c) Gleba B, separada da gleba A por uma estrada com trânsito de
O PEV é composto por seis glebas: a) Capetinga Oeste (CO): Com vegetação de floresta
rodovia Anhanguera. A gleba é aberta à visitação, pois nela existe o maior exemplar de Jequitibá-
rosa (Cariniana legalis) do estado de São Paulo; b) Capetinga Leste (CL) Com vegetação
16
predominante de floresta semidecídua, possui aproximadamente 91 ha e é envolta por
floresta semidecídua, com cerca de 160 ha de área. É cercada por monocultura de cana-de-
açúcar; d) Maravilha (MAR) Também com vegetação de floresta semidecídua, possui cerca de 130
ha e é envolta por cana-de-açúcar e pelo rio Mogi-Guaçu; e) Capão da Várzea (CV) Com
açúcar; f) Pé-de-Gigante (PG) Possui fisionomias de Cerrado (cerrado sensu stricto, cerradão e
cerrado campo sujo) e floresta semidecídua. Sua área é de aproximadamente 1.250 ha. Faz divisa
a oeste, norte e sudoeste com monoculturas de eucaliptos, a sudeste com monocultura de cana-
Segundo Tambosi (2008), o uso das terras no entorno (10 km de raio a partir das bordas
das glebas) das unidades de conservação acima citadas, é constituído por atividades
paisagem (46,1% do total da área) e exercem influência sobre as Ucs acima citadas, mas
envolvem inteiramente apenas as cinco glebas de floresta semidecídua pertencentes ao PEV (CL,
29,3 % da área) fazem borda com as glebas PG e OA e estão inseridas dentro da EEJ e EELA,
onde há também monoculturas de Pinus spp.. Segundo Shida (2005), em 1962 só havia atividades
agroflorestais na área da futura EEJ e EELA e numa região a leste da rodovia Anhanguera.
Enquanto que, dentro da EEJ e EELA, a área utilizada para essas atividades foi diminuindo, ela
aumentou nas áreas externas às Ucs, que eram anteriormente cobertas por fisionomias de
isolando estruturalmente as duas áreas já citadas (OA e PG) e a EEJ, que eram interligadas até
meados dos anos 70. Os fragmentos de Floresta Semidecídua pertencentes ao PEV já eram
17
Figura 2. Uso e cobertura das terras na área de estudo em 1963 (a) e 2001 (b) (Shida 2005).
atividade foi feita em dois fragmentos de floresta semidecídua (CO e PRA), um de cerradão (OA),
um com cerrado sensu stricto e cerradão (Gleba A), dois de cerrado sensu stricto (Tamanduá e
18
Tabela 2. Denominação e características gerais das áreas amostradas (as áreas de reflorestamento possuem
plantio de espécies de Eucaliptos).
Tamanho Uso e Cobertura das terras
Área Denominação Localização
(ha) / tipos de matriz
Estação Cerrado sensu stricto e
Gleba A EEJ +
1 10.800 ha Ecológica de cerradão / Cana-de-açúcar,
EELA
Jataí pastagem e reflorestamento
Fazenda
2 523 ha Eucalipto 1 Reflorestamento
Limoeiro
Fazenda
3 309 ha Eucalipto 2 Reflorestamento
Limoeiro
Estação
Oitocentos Cerradão / Cana-de-açúcar e
4 1.527 ha Ecológica de
Alqueires Reflorestamento
Jataí
Fazenda Cerrado sensu stricto /
5 131 ha Tamanduá
Limoeiro Cana-de-açúcar
Parque Cerrado sensu stricto /
6 1.250 ha Pé-de-Gigante Estadual de Reflorestamento e Cana-de-
Vassununga açúcar
Parque
Floresta Semidecídua /
7 175 ha Praxedes Estadual de
Cana-de-açúcar
Vassununga
Parque
Floresta Semidecídua /
8 325 ha Capetinga Oeste Estadual de
Cana-de-açúcar
Vassununga
Um mapa de uso e cobertura das terras (1:15.000) foi elaborado por Tambosi (2008)
(Figura 3), sobre o qual foram calculadas algumas métricas de paisagem, usando-se o programa
perímetro com plantio de cana-de-açúcar, adjacente ao fragmento focal; ii) CanA: área da
herbácea adjacente ao fragmento focal; iv) HerA: área de vegetação herbácea adjacente ao
fragmento focal; v) ProP: perímetro de instalações rurais adjacentes ao fragmento focal; vi) ProA:
área de instalações rurais adjacentes ao fragmento focal; vii) SolP: perímetro de solo exposto
adjacente ao fragmento focal; viii) SolA: área de solo exposto adjacente ao fragmento adjacente;
ix) EucA: área de plantio de eucalipto adjacente ao fragmento focal; x) EucP: perímetro do plantio
de eucalipto adjacente ao fragmento focal; xi) PasA: área de pasto adjacente ao fragmento focal;
xii) ArbP: perímetro de vegetação arbórea adjacente ao fragmento focal; xiii) ArbA: área de
vegetação arbórea adjacente ao fragmento focal; xiv) EstP: perímetro de estradas adjacente ao
19
fragmento focal; xv) Area: área do fragmento focal; xvi) Peri: perímetro do fragmento focal; xvii)
Para: relação perímetro / área do fragmento focal; xviii) Shape: índice de forma do fragmento
focal (valores próximos a 1 indicam uma forma circular, valor maiores indicam formas mais
alongadas e/ou dendríticas; xiv) Prox: índice de proximidade, que é calculado com base nos
valores das distâncias (dentro de um raio de busca) dos fragmentos, de mesma fitofisionomia, ao
redor do remanescente –alvo e suas áreas totais, xv) Enn: distância do fragmento focal ao vizinho
Figura 3. Classes de uso e cobertura do solo na área de estudo (adaptado de Tambosi 2008).
20
2.2.2 Armadilhamento Fotográfico
avaliados de forma não invasiva (Karanth 1995, Silveira et al. 2003), por meio de armadilhas
sensor de movimento e calor, assim que um indivíduo é detectado o sensor percebe o movimento
e aciona a máquina fotográfica que dispara registrando a sua passagem. Esse equipamento é
1-Foram evitadas áreas expostas ao sol, uma vez que altas temperaturas, geradas pela
2-Não foram colocadas câmeras voltadas para onde o sol nasce ou se põe, pois a
3-Foram evitadas áreas com alta umidade, pois se muita umidade penetrar na parte
4-As áreas ao redor das armadilhas foram limpas. Como as armadilhas utilizam sensores
de calor e movimento, as áreas próximas a ela devem ser limpas, para evitar falsos
disparos (plantas aquecidas pelo sol e movimentadas pelo vento podem parecer uma
animal homeotérmico para os sensores) e para não existir nada entre o sensor e o local
4-As armadilhas foram fixadas em anteparos (árvore, madeira) para que não oscilassem e
Desta forma, as câmeras eram colocadas nesses locais, com o objetivo de obter o maior número
possível de fotografias.
O critério de distribuição das câmeras levou em conta a área total das diferentes classes
eucalipto). Desta forma, o número de câmeras foi diferente para cada classe – nove câmeras no
21
cerrado sensu stricto, sete no cerradão, quatro na monocultura de eucalipto e três na floresta
semidecídua.
2003, Barlow et al. 2007), uma curva de acumulação de espécies, utilizando o estimador Mao Tao
(Colwell 2004) com 5.000 aleatorizações foi utilizada para garantir a eficiência do tempo de coleta.
O valore de riqueza esperada de espécies foi obtido por meio do estimador não-paramétrico
2.2.4 Freqüências dos mamíferos de médio e grande porte por classes de uso e
A freqüência de cada uma das espécies de mamíferos nas diferentes classes de uso e
cobertura das terras foi calculada pela seguinte fórmula, permitindo a comparação entre as
diferentes áreas:
FCij=nij/Nj,
diferença estatisticamente significativa nas freqüências das espécies nas diferentes classes.
Para verificar a similaridade entre as diferentes classes de uso e cobertura das terras, foi
feita uma analise de ordenação com coeficiente de Jaccard, que leva em conta a presença ou
22
Para verificar a diferença no uso das fitofisionomias pelas espécies, foram analisadas, para
cada espécie, as freqüências de uso do habitat, por meio de um teste de qui-quadrado (Zar 1996),
sendo a hipótese nula (Ho): “Não há preferência da espécie por classes de fitofisionomias”
(α=0,05). Quando a diferença foi significativa, utilizou-se o teste a posteriori dos limites de
tolerância de Bonferroni para verificar qual a relação (negativa, positiva ou nula) das espécies com
2.2.5 Freqüências dos mamíferos de médio e grande porte nos fragmentos amostrados
os índices de paisagem obtidos para cada um dos fragmentos estudados dos fragmentos foram
excluídas três das vinte e três armadilhas fotográficas utilizadas na análise acima (item 2.2.4), que
fragmento foi proporcional ao tamanho do fragmento), que foram verificadas a cada trinta dias,
Para o cálculo da freqüência das espécies nos diferentes fragmentos, utilizamos a seguinte
fórmula:
FFij=rij/Rj,
As freqüências de uso dos habitats pelos mamíferos foram então correlacionadas por meio de uma
análise de correlação de Spearman (Norman & Streiner 1994) com os resultados das métricas por
fragmento focal.
23
2.2.6. Padrão de Atividade:
Uma vez que as armadilhas fotográficas contavam com datador, com registro de dia e
separadas, por espécie, em quatro categorias: manhã (05:00- 11:00), tarde (11:01 – 17:00),
As freqüências por período foram analisadas por meio de um teste de qui-quadrado (Zar,
1996), sendo a hipótese nula (Ho): “Não há período específico do dia para maior atividade das
Quando a diferença de uso dos períodos por determinada espécie foi significativa,
diferentes horários, em: positiva, negativa ou nula (Byers & Steinhorst 1984).
2.3 Resultados
24
Tabela 3. Espécies amostradas pelas armadilhas fotográficas, grau de ameaça nas listas do IBAMA, IUCN e
São Paulo (SP). (VU - Vulnerável; NT - ”Near threatened”)
Família Espécie Nome comum IBAMA SP IUCN
Sylvilagus
Leporidae Tapiti - - -
brasiliensis
Tayassuidae Pecari tajacu Cateto - VU -
Dasypodidae Dasypus sp. Tatus - - -
Dasiproctidae Dasyprocta azarae Cotia - VU VU
Myrmecophaga Tamanduá-
Myrmecophagidae VU VU -
tridactyla bandeira
Cervidae Mazama guazoubira Veado-catingueiro - - -
Gambá-de-orelha-
Didelphidae Didelphis albiventris - - -
branca
Hydrochoerus
Caviidae Capivara - - -
hydrochaeris
Tamandua
Myrmecophagidae Tamanduá-mirim - - -
tetradactyla
Felidae Puma concolor Onça-parda VU VU -
Felidae Leopardus pardalis Jaguatirica VU VU -
Felidae Puma yagouaroundi Gato-mourisco - - -
Gato-do-mato-
Felidae Leopardus tigrinus VU VU NT
pequeno
Chrysocyon
Canidae Lobo-guará VU VU NT
brachyurus
Mustelidae Eira barbara Irara - - -
Procyonidae Nasua nasua Quati - - -
Conepatus
Mephitadae Jaritataca - - -
semistriatus
padrões tendem a se juntar e a curva central tende a estabelecer uma assíntota, o que indica a
eficiência da coleta (figura 6). O estimador Bootstrap mostrou uma riqueza esperada de 17 (+-0)
25
12
nº cumulativo de sp 10
0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18
meses de coleta
Figura 3. Curva de acumulação de espécies (Mao Tao) com 5.000 aleatorizações para
a área de estudo. Em pontilhado, os desvios padrões.
12
riqueza estim ada
10
0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18
meses de coleta
26
2.3.2. Freqüências dos mamíferos de médio e grande porte por classes de uso e
lobo-guará (Chrysocyon brachyurus) e a onça-parda (Puma concolor) seguidos pelo cateto (Pecari
161). A fitofisionomia com maior riqueza foi o cerradão, onde foram registradas todas as 17
espécies amostradas. O cerrado sensu stricto apresentou doze espécies, o eucaliptal cinco
cerradão e do cerrado sensu stricto, afastando a floresta semidecídua desses dois ambientes e
na tabela 4.
Eucalyptus sp.
Floresta Semidecídual
Cerradão
0.04 0.2 0.36 0.52 0.68 0.84 1
Figura 5. Dendrograma utilizando o coeficiente de Jaccard e agrupamento UPGMA, que mostra as relações de
similaridade entre as fisionomias vegetais existentes na área de estudo, com base na riqueza das espécies de
mamíferos de médio e grande porte amostradas.
27
Tabela 4. Índices de similaridade (Jaccard) referentes à fauna de mamíferos de médio e grande porte
amostrados, nos diferentes habitats, presentes na área de estudo.
grande porte amostrados, encontram-se na tabela 5 e os resultados dos limites de Bonferroni para
mirim) e Conepatus semistriatus (jaritataca). Cinco taxa obtiveram maiores freqüências nessa
fitofisionomia: Dasypus spp. (tatus), Dasyprocta azarae (cotia), Mazama guazoubira (veado
cerradão e o teste de qui-quadrado indicou uma diferença significativa no uso de habitat por essa
espécie (χ2=14.143 gl=3, p<0.0027), confirmada pela relação positiva entre a freqüência de tatus
relação positiva dessa espécie com a fitofisionomia (χ2=22.666, gl=3, p<0.000047). Dentre os
de qui-quadrado e de Bonferroni mostraram uma ligação positiva também desse felino com a
no cerradão, mas o teste de qui-quadrado não indicou preferência por nenhuma fitofisionomia
(χ2=6.5, gl=3, p<0.089), e o lobo-guará (Chrysocyon brachyurus), com 44,83% dos registros no
28
cerradão, mostrou, por meio do teste de Bonferroni, uma relação marginalmente positiva com a
fitofisionomia (χ2=12.241, gl=3, p<0.0066). Também a onça-parda (Puma concolor), com 33,33%
tridactyla), com 40,00% dos registros (χ2=10.8, gl=3, p<0.012) estabelecem uma relação nula
registros obtidos no cerradão, não demonstrou significativa preferência por algum tipo de habitat
(χ2=7.00, gl=3, p<0.071). O cateto (Pecari tajacu), com 26,60% de suas fotografias obtidas no
cerradão, não demonstrou ligação com nenhuma das fitofisionomias amostradas (χ 2=5.533 gl=3,
p<0.136), assim como a irara (Eira barbara), com 33,33% de aparecimentos no cerradão (χ
2
=3.66, gl=3, p<0.29). Apenas duas espécies, Nasua nasua (quati) e Leopardus tigrinus (gato-do-
positiva com o cerrado sensu stricto, com 60,00% dos registros obtidos nessa fitofisionomia. S.
nenhum registro nessa fitofisionomia. Todas as outras espécies mostraram uma relação nula com
o cerrado sensu stricto e nenhuma espécie apresentou ligação negativa com a fitofisionomia.
concolor (7,41%). As demais espécies não foram registradas pelas armadilhas fotográficas nessa
fitofisionomia.
29
Tabela 5. Porcentagens de uso, das fitofisionomias amostradas, pelos mamíferos de médio e grande porte e
número de fotografias (n) em cada tipo de classe amostrada.
Cerradão Cerrado Sensu Floresta Semidecídua Eucalipto %
% (n) Stricto % (n) % (n) (n)
Sylvilagus brasiliensis 100,00 (9) 0,00 (0) 0,00 (0) 0,00 (0)
Pecari tajacu 26,60 (4) 33,33 (5) 40,00 (6) 0,00 (0)
Dasypus sp. 85,71 (6) 14,29 (1) 0,00 (0) 0,00 (0)
Dasyprocta azarae 83,33 (10) 16,67 (2) 0,00 (0) 0,00 (0)
Myrmecophaga
40,00 (4) 60,00 (6) 0,00 (0) 0,00 (0)
tridactyla
Mazama guazoubira 43,75 (7) 25,00 (4) 0,00 (0) 31,25 (5)
Didelphis albiventris 62,50 (5) 25,00 (2) 12,50 (1) 0,00 (0)
Hydrochoerus
100,00 (1) 0,00 (0) 0,00 (0) 0,00 (0)
hydrochaeris
Tamandua
100,00 (1) 0,00 (0) 0,00 (0) 0,00 (0)
tetradactyla
Puma concolor 33,33 (9) 7,41 (2) 7,41 (2) 51,85 (14)
Leopardus pardalis 53,85 (7) 30,77 (4) 0,00 (0) 15,38 (2)
Puma yagouaroundi 0,00 (0) 0,00 (0) 0,00 (0) 100,00 (3)
Leopardus tigrinus 0,00 (0) 100,00 (1) 0,00 (0) 0,00 (0)
Chrysocyon
44,83 (13) 31,03 (9) 0,00 (0) 24,14 (7)
brachyurus
Eira barbara 33,33 (1) 66,67 (2) 0,00 (0) 0,00 (0)
Nasua nasua 0,00 (0) 100,00 (2) 0,00 (0) 0,00 (0)
Conepatus
100,00 (3) 0,00 (0) 0,00 (0) 0,00 (0)
semistriatus
30
Tabela 6. Valores observados e esperados das freqüências dos mamíferos de médio e grande porte
amostrados com diferenças significativas para o uso de fitofisionomias, limites de Bonferroni e relação
(positiva, negativa ou nula) das espécies com as classes de fisionomias vegetais amostradas.
Freqüência Freqüência
Limites de Bonferroni Relação
observada esperada
"Cerradão" 0,85 0,25 0.625<p1<1 positiva
"Cerrado" sensu
0,14 0,25 0<p2<0.374 nula
stricto
Dasypus sp.
Floresta
0 0,25 0<p3<0.232 negativa
Semidecídua
Eucaliptos 0 0,25 o<p4<0.232 negativa
"Cerradão" 0,83 0,25 0.601<p1<1 positiva
Cerrado sensu
0,16 0,25 0<p2<0.398 nula
Dasyprocta stricto
azarae Floresta
0 0,25 0<p3<0.232 negativa
Semidecídua
Eucaliptos 0 0,25 o<p4<0.232 negativa
Cerradão 0,4 0,25 0.168<p1<0.632 nula
Cerrado sensu
0,6 0,25 0.368<p2<0.832 positiva
Myrmecophaga stricto
tridactyla Floresta
0 0,25 0<p3<0.232 negativa
Semidecídua
Eucaliptos 0 0,25 0<p3<0.232 negativa
Cerradão 0,33 0,25 0.098<p1<0.562 nula
Cerrado sensu
0,07 0,25 0<p2<0.302 nula
stricto
Puma concolor
Floresta
0,07 0,25 0<p3<0.302 nula
Semidecídua
Eucaliptos 0,51 0,25 0.288<p4<0.752 positiva
Cerradão 0,53 0,25 0.308<p1<0.772 positiva
Cerrado sensu
0,30 0,25 0.078<p2<0.532 nula
Leopardus stricto
pardalis Floresta
0 0,25 0<p3<0.232 negativa
Semidecídua
Eucaliptos 0,15 0,25 0<p4<0.382 nula
Cerradão 0,44 0,25 0.218<p1<0.682 nula
Cerrado sensu
0,31 0,25 0.078<p2<0.542 nula
Chrysocyon stricto
brachyurus Floresta
0 0,25 0<p3<0.232 negativa
Semidecídua
Eucaliptos 0,241 0,25 0.008<p4<0.472 nula
Em relação aos padrões de atividade (tabela 7 e tabela 8), cinco espécies - o tapiti (S.
noite. O quati (N. nassua) foi detectado apenas de manhã. A onça-parda (P. concolor) (χ2=42.19,
gl=3, p<0.000) e a jaguatirica (L. pardalis) (χ2=16.28, gl=3, p<0.002) obtiveram 76,00 e 76,92%,
31
relação positiva como esse período. A onça-parda ainda apresentou relação negativa com o
Oitenta e cinco por cento das fotografias de tatus do gênero Dasypus foram obtidas à
noite e 15,00% à tarde (χ2=14.143, gl=3, p<0,0027). Essas espécies apresentaram uma relação
positiva com o período noturno e negativa com a manhã e o crepúsculo. Também o lobo-guará (C.
brachyurus), com 62,96% das suas fotografias obtidas à noite (χ2=29.46 gl=3, p<0.000),
apresentou relação positiva com esse período. Ainda de hábito preferencialmente noturno, foi
período da tarde, 20,00% no crepúsculo e 70,00% à noite (χ2=11.6, gl=3, p<0.0089), mostrando
Para o veado-catingueiro (M. guazoubira), 68,75% das fotografias foram obtidas pela
manhã, enquanto que 31,25% foram obtidas à noite. O teste de qui-quadrado rejeitou Ho
(χ2=20.5, gl=3, p<0.0001) e a espécie revelou uma relação positiva com a manhã e negativa com
O cateto (P. tajacu) apresentou 33,33% das suas fotografias no período noturno, seguido
de 26,67% na parte da tarde e 20,00% na manhã e no crepúsculo, sendo que a espécie não
demonstrou preferência por período (χ2= 2.529, gl=3, p<0.47). Também a cotia (D. azarae) não
revelou preferência por algum período (χ2=5.333, gl=3, p<0.149), tendo-se obtido 8,33% das
fotografias nos períodos da manhã e da tarde, e 41,67% das fotografias nos períodos do
crepúsculo e noite. Entretanto, quando agrupados em apenas dois períodos, um com alta
luminosidade (manhã e tarde) e outro com baixa luminosidade (crepúsculo e noite), foi
encontrada uma diferença significativa (χ2=5.333, gl=1, p<0.02), mostrando uma relação positiva
manhã, quanto no crepúsculo e à noite. O teste de qui-quadrado (χ2=1.00 gl=1, p<0.83) indicou
falta de preferência por horários. O mesmo ocorreu com a irara (E. barbara), para quem 66,66%
das fotografias foram obtidas de manha e 33,33% à tarde (χ2=3.36, gl=1, p<0.29).
32
Tabela 7. Porcentagens, nos períodos de atividade amostrados dos mamíferos de médio e grande porte e
número de fotografias (n).
Manha (05:00-11:00) Tarde (11:01-17:00) Crepúsculo (17:01-18:00) Noite (18:01-04:59)
% (n) % (n) % (n) % (n)
Sylvilagus
0,00 (0) 0,00 (0) 0,00 (0) 100,00 (9)
brasiliensis
Pecari tajacu 20,00 (3) 26,67 (4) 20,00 (3) 33,33 (5)
Dasypus sp. 0,00 (0) 14,29 (1) 0,00 (0) 85,71 (6)
Dasyprocta azarae 8,33 (1) 8,33 (1) 41,67 (5) 41,67 (5)
Myrmecophaga
0,00 (0) 10,00 (1) 20,00 (2) 70,00 (7)
tridactyla
Mazama
68,75 (11) 0,00 (0) 0,00 (0) 31,25 (5)
guazoubira
Didelphis
0,00 (0) 0,00 (0) 0,00 (0) 100,00 (8)
albiventris
Hydrochoerus
0,00 (0) 0,00 (0) 0,00 (0) 100,00 (1)
hydrochaeris
Tamandua
100,00 (1) 0,00 (0) 0,00 (0) 0,00 (0)
tetradactyla
Puma concolor 20,00 (5) 0,00 (0) 4,00 (1) 76,00 (19)
Leopardus pardalis 7,69 (1) 15,38 (2) 0,00 (0) 76,92 (10)
Puma
33,33 (1) 0,00 (0) 33,33 (1) 33,33 (1)
yagouaroundi
Leopardus tigrinus 0,00 (0) 0,00 (0) 0,00 (0) 100,00 (1)
Chrysocyon
3,70 (1) 11,11 (3) 22,22 (6) 62,96 (17)
brachyurus
Eira barbara 66,66 (4) 0,00 (0) 0,00 (0) 33,33 (2)
Nassua nassua 100,00 (2) 0,00 (0) 0,00 (0) 0,00 (0)
Conepatus
0,00 (0) 0,00 (0) 0,00 (0) 100,00 (3)
semistriatus
33
Tabela 8. Valores observados e esperados das freqüências dos mamíferos de médio e grande porte amostrados
com diferenças significativas para o uso dos períodos de atividade limites de Bonferroni e relação (positiva,
negativa ou nula) das espécies com os períodos de atividade amostrados.
Freqüência Freqüência Limites de
Relação
observada esperada Bonferroni
34
2.3.3. Relação entre a freqüência dos mamíferos amostrados com as características
melhor relação perímetro/área (PARA=0.002), indicando menos bordas expostas em relação à sua
área total; além disso, o índice de proximidade (PROX = 19251,3) mostra que é o fragmento com
A EEJ dista da mais próxima área de mesma classe (ENN) 30 m, possui PARA baixo
(0.093), indicando uma forma próxima a um círculo, e faz borda com grandes áreas de plantio de
eucalipto (843,4 ha) e de pastagem (458 ha). É o maior fragmento estudado (7.822 ha).
plantios de eucaliptos (2.556 ha) adjacentes a ele. Seu vizinho mais próximo (ENN) está a apenas
30 m.
O fragmento Tamanduá (TD) é o menor estudado (132 ha), não faz divisa com plantios de
eucaliptos ou pastos, possui baixa relação perímetro/área (0.229), dista 117,1 m (ENN) do
fragmento de cerrado sensu stricto mais próximo, caracterizando-se como o fragmento de cerrado
87,4 m) e é o que possui as menores áreas de cerrado próximas a ele (PROX = 148,9); possui
média relação perímetro/área (0,587) e faz divisa com uma grande monocultura de eucaliptos
(5.364 ha).
estas são muito pequenas e não significativas na paisagem (PROX = 11,0 e 8,0, respectivamente).
35
Tabela 9. Resultados dos cálculos das variáveis da paisagem (métricas) para os fragmentos focais na área de
estudo.
PARA
Área Prox (sem ENN PasP PasA
(sem EucA (ha)
(ha) unidade) (metros) (metros) (ha)
unidade)
Jataí (EEJ)
7822,0 324,2 30,0 0,093 843,4 193,9 458,6
Oitocentos (OI)
1566,1 365,9 30,0 0,082 2556,0 3978,0 458,6
Tamanduá (TD)
132,1 511,3 117,2 0,229 0,0 0,0 0,0
Pé-de-gigante (PG)
1215,5 149,0 87,5 0,587 5364,9 0,0 0,0
Praxedes (PR)
163,4 11,1 30,0 2,710 0,0 0,0 0,0
Capetinga (CP) 11,775
325,9 8,1 94,9 0,0 0,0 0,0
Eucalipto(1-2)
829,8 19251,3 30,0 0,002 829,8 0,0 0,0
(EU)
mostrou que a configuração da paisagem influencia a freqüência das espécies por fragmento,
fragmento focal (PasA), perímetro de pastagem adjacente ao fragmento focal (PasP), relação
perímetro / área (PARA), distância mais próxima ao vizinho de mesma classe (ENN), tamanho da
área (Área) e proximidade a fragmentos de mesma fisionomia (PROX). As freqüências obtidas por
O lobo-guará (C. brachyurus) apresentou correlação positiva com PasP, PasA e Área
com o índice PROX (respectivamente 0.81 e 0.775) e o cateto (P. tajacu) apresentou correlação
bandeira (M. tridactyla) não apresentaram correlação significativa com nenhuma das métricas
analisadas.
36
Dentre as métricas da paisagem analisadas, as que mostraram correlação significativa
com a riqueza de espécies foram: área de eucalipto adjacente ao fragmento (EucA = 0.876), Área
Tabela 10. Porcentagens de uso dos fragmentos, pelos mamíferos de médio e grande porte, com mais de 9
fotografias obtidas no estudo e número de fotos.
"800 "Pé-de-
"Jataí" "Tamanduá" "Praxedes" "Capetinga" "Eucaliptos"
Alqueires" Gigante"
% (n) % (n) % (n) % (n) % (n)
% (n) % (n)
Chrysocyon
54,55 (18) 12,12 (4) 3,03 (1) 15,15 (5) 0,00 (0) 0,00 (0) 15,15 (5)
brachyurus
Puma concolor 30,30 (10 3,03 (1) 0,00 (0) 18,18 (6) 6,06 (2) 0,00 (0) 42,42 (14)
Leopardus
46,67 (7) 20,00 (3) 20,00 (3) 6,67 (1) 0,00 (0) 0,00 (0) 6,67 (1)
pardalis
Didelphis
44,44 (4) 33,33 (3) 0,00 (0) 11,11 (1) 11,11 (1) 0,00 (0) 0,00 (0)
albiventris
Mazama
13,33 (2) 33,33 (5) 13,33 (2) 20,00 (3) 0,00 (0) 0,00 (0) 20,00 (3)
guazoubira
Myrmecophaga
28,57 (4) 7,14 (1) 7,14 (1) 50,00 (7) 0,00 (0) 0,00 (0) 7,14 (1)
tridactyla
Pecari tajacu 25,00 (3) 0,00 (0) 33,33 (4) 8,33 (1) 0,00 (0) 33,33 (0) 0,00 (0)
Total por
37,80 (48) 13,39 (17) 5,51 (7) 18,90 (24) 2,36 (3) 3,15 (4) 18,90 (24)
fragmento
Tabela 11. Valores superiores a 0,7 dos coeficientes de correlação de Spearman entre freqüência e riqueza
de mamíferos e as métricas de paisagem utilizadas (NS - não significativo).
EucA PasP PasA Area PARA Prox ENN
Chrysocyon
NS 0,764 0,809 0,846 -0,828 NS NS
brachyurus
Puma concolor NS NS NS NS NS NS NS
Didelphis albiventris NS NS NS NS NS NS NS
Myrmecophaga
NS NS NS NS NS NS NS
tridactyla
Pecari tajacu NS NS NS NS NS NS 0,856
37
2.4 Discussão:
tigrinus), o quati (Nasua nasua), a irara (Eira barbara) e a jaritataca (Conepatus semistriatus)
foram fotografadas menos de três vezes, o que comprometeu as análises estatísticas e, desta
forma, não foi possível fazer maiores inferências sobre seu comportamento.
levantamentos realizados na região (Lyra-Jorge 1999, Talamoni et al. 2000; Lyra-Jorge 2007).
Algumas espécies encontradas em outros trabalhos não foram amostradas neste, pois o método
do armadilhamento fotográfico, da forma como foi utilizado neste trabalho, é eficaz para espécies
terrestres de médio a grande porte e de hábitos cursoriais. Portanto, espécies arborícolas, como
os primatas e certos felinos (como o gato-maracajá, Leopardus wiedii), espécies com habitats
muito específicos, como a lontra (Lontra longicaudis) e espécies muito raras na região, como a
significativa na riqueza de espécies encontradas nas áreas protegidas e nas não protegidas, o que
reforça a teoria dos mosaicos em relação à das grandes áreas (Metzger 2006), pois as áreas
diferentes das áreas não protegidas pois as espécies de mamíferos de médio e grande porte
O padrão de uso de habitat pela maioria das espécies mostrou-se fortemente ligado às
pela análise de agrupamento indicaram que o cerrado sensu stricto e o cerradão possuem mais
espécies em comum entre si do que com as outras fisionomias estudadas, o que era esperado se
considerarmos a semelhança florística entre esses ambientes, mas que diferem quanto à estrutura
da vegetação. Esta análise também separou das fisionomias de cerrado tanto a floresta
semidecídua como o eucaliptal, que apresentaram riquezas bem menores. No entanto, a relativa
proximidade destas duas fisionomias (floresta semidecídua e eucaliptal) deve ser devida
justamente à sua estrutura florestal. Apesar dos plantios de eucaliptos serem monoespecíficos e
38
constituídos por espécies exóticas, o que os tornam menos procurados pelas espécies da fauna
nativa, eles compõem a matriz de quase todos os fragmentos na paisagem estudada, servindo
como ambiente (passagem, habitat) para algumas espécies que se adaptaram a essa floresta
exótica.
Sylvilagus brasiliensis (tapiti) foi detectado apenas no cerradão. Isso corrobora outros
trabalhos que mostram que a espécie é exclusiva de fitofisionomias florestais (Trolle & Kéry 2005,
Srbek-Araújo & Chiarello 2007). Levando-se isso em conta, a espécie deveria ter sido detectada
também nas áreas de floresta semidecídua, mas provavelmente pelo fato dos remanescentes
dessa fisionomia estarem isolados há muito tempo, sofrerem grandes pressões antrópicas - por
estarem envolvidos por monoculturas de cana-de-açúcar, cujo manejo é intenso, com o uso de
grandes quantidades de agroquímicos - e serem de tamanho pequeno (< 200 ha) devem ter
ocorrido extinções locais da espécie nesses remanescentes. A espécie também sofre com a
invasão da lebre-européia (Lepus europaeus), que não foi detectada pelas armadilhas fotográficas
durante o estudo, mas foi visualizada na área no final do período de campo (junho de 2006) e
Também a cotia (Dasyprocta azarae) obteve uma relação positiva com o cerradão e não
foi encontrada na floresta semidecídua ou nas áreas de plantio de eucaliptos. Segundo Mourão
(2003), essa espécie é encontrada tanto em áreas mais abertas, como o cerrado sensu stricto,
qualidade dos fragmentos de floresta semidecídua amostrados pode ter sido responsável pela
stricto, o que provavelmente se deve ao fato de preferirem áreas de solo menos firme (arenoso) e
não áreas com solo de origem basáltica para cavar, pois estes são mais resistentes à escavação
demonstra o caráter generalista desta espécie. A relação positiva entre a espécie e os plantios de
ser um grande carnívoro de topo de cadeia alimentar, precisa forragear em grandes áreas para
39
encontrar recursos suficientes. Como a maioria dos fragmentos na área de estudo está envolta por
fisionomias amostradas, mas as altas correlações encontradas entre essa espécie e fragmentos
com grandes áreas e perímetros de pastagem adjacentes reafirma a preferência da espécie por
áreas mais abertas. Da mesma forma que a onça-parda, o lobo-guará também necessita forragear
cerrado sensu stricto pode estar ligado ao fato de seu único recurso alimentar, os cupins e
formigas, preferirem áreas mais abertas que as florestais (Medri & Mourão 2005).
Isso ressalta seu comportamento críptico nas áreas naturais e sua plasticidade em utilizar habitats
não naturais para se deslocar entre os remanescentes. Esse fato ainda não é muito conhecido na
literatura científica e há pouco tempo atrás se achava que a espécie era extremamente sensível às
O uso dos plantios de eucaliptos por diversas espécies, principalmente as cursoriais, indica
a importância de um manejo florestal que garanta maior segurança aos indivíduos – por exemplo:
cortes intercalados de talhões, de forma a não deixar a área totalmente exposta durante a época
Neste estudo, infelizmente não foi possível amostrar as culturas de cana-de-açúcar, devido
à alta intensidade no manejo da monocultura, à alta probabilidade de roubo das armadilhas (por
ser um ambiente mais exposto à presença do homem) e às altas temperaturas diurnas nesse
ambiente, que acabariam por prejudicar o bom funcionamento das armadilhas fotográficas. É
possível que todas as espécies que utilizam as plantações de eucalipto utilizem as áreas de cana-
de-açúcar também, pois muitas pegadas foram encontradas nessas áreas. A certeza é de que as
espécies de mamíferos de médio e grande porte, tanto pelo tipo de seu manejo (muito mais
intenso que o manejo dos eucaliptais: enquanto que as árvores de eucalipto são cortadas a cada 7
40
anos, as monoculturas de cana-de-açúcar passam pelo processo de colheita a cada 7 meses,
aproximadamente) como por seu contraste com as fitofisionomias vegetais presentes na área que
a configuração e composição das unidades que compõem uma determinada paisagem, surgem
maioria dos estudos envolvendo captura de mamíferos de médio e grande porte valeu-se da rádio-
telemetria para a obtenção dos dados (Mantovani 2001). Esse método quase sempre envolve um
número muito pequeno de indivíduos capturados, impedindo análises demográficas. Espécies com
por meio de armadilhamento fotográfico, pois suas manchas possuem as mesmas características
de uma impressão digital. E essa pode ser uma alternativa metodológica para essas espécies.
relação a outros grupos, fazendo com que os dados coletados muitas vezes se traduzam em
pseudo-réplicas (Hargrove & Pickering 1992). Segundo Hurlbert (1984), “garantir que as réplicas
das medidas ou amostras que estão dispersas no espaço (ou tempo), de uma maneira apropriada
para testar sua hipótese específica, é o aspecto mais critico do delineamento de um experimento”.
Devido a esses problemas, uma outra alternativa para se explorar os fatores influentes na
persistência das espécies de mamíferos de médio e grande porte pode ser correlacionando-se a
freqüência da espécies com métricas de paisagem. Por exemplo, neste estudo, os coeficientes de
correlação obtidos para Chrysocyon brachyurus indicaram que a espécie usa como habitat tanto os
grandes fragmentos (Área; PARA) como as áreas abertas, como as pastagens (PasP; PasA). Essa
correlação positiva com as áreas de pastagem pode se explicada pelo fato de C. brachyurus se
alimentar de pequenos roedores, lagartos e tatus, animais mais facilmente capturados em áreas
abertas. Por outro lado, a alta plasticidade e a capacidade de deslocamento em áreas alteradas da
41
onça-parda (Puma concolor) e do gambá-de-orelha-branca (Didelphis albiventris) devem ser as
razões para não se ter encontrado correlação destas espécies com nenhuma métrica avaliada.
vulnerável, hoje teve sua categoria mudada para “próximo a ameaçado” (NT) pela lista vermelha
da IUCN (IUCN 2006). Os resultados encontrados aqui mostram que a espécie não obteve
correlação com nenhum índice e isso pode indicar um comportamento plástico semelhante ao de
P. concolor.
fragmentos menos isolados e o cateto (Pecari tajacu) está fortemente correlacionado à distância
entre fragmentos de mesma cobertura vegetal, o que provavelmente também indica uma
escala grosseira, podemos distinguir três tipos de grupos funcionais de médios e grandes
com forte efeito de borda, mas poderiam sobreviver numa área com fragmentos médios,
conectados por corredores largos. Possuem pequenas áreas de vida (em média 4km2) – por
b) Sensíveis à área de habitat: grandes mamíferos cursoriais, que não possuem muitas
urbanizadas. Possuem uma alta pressão de caça. Como a persistência de suas populações está
muito ligada aos recursos, necessitam de várias áreas (fragmentos) para forragear. Possuem
grandes áreas de vida (50-230km2). Em longo prazo, têm seus recursos diminuídos, aumentando
a competição direta por território – por exemplo: onça-parda (Puma concolor) e lobo-guará
(Chrysocyon brachyurus).
dois fatores, mas em menor grau que os primeiros (a e b). Precisam de fragmentos de boa
qualidade (baixa influência humana), são afetados indiretamente pelos efeitos de borda, pois têm
dieta específica e suas presas sofrem ação direta dos efeitos, resultando no declínio de suas
42
populações, nestas áreas de borda. Suas áreas de vida são intermediárias em relação aos acima
descritos (15-20km2). Atravessam matrizes não muito contrastantes com o habitat, quando muito
43
2.5. Bibliografia
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49
3. Capítulo 2
FRAGMENTADA
50
3.1.Introdução:
S = c Az ,
extinções estão altamente relacionadas à perda de habitat, quanto menor for a área disponível
(Metzger 2001). Esse processo isola estruturalmente remanescentes de vegetação natural gerando
na paisagem, anteriormente contínua, um mosaico composto por diferentes ocupações das terras
pelo homem e fragmentos de vegetação nativa. Nessas áreas, onde a vegetação natural encontra-
se com poucos fragmentos, e estes, com alto grau de isolamento, espera-se que as populações
das espécies presentes também se apresentem isoladas e, portanto, com maior probabilidade de
extinção local (Turner 2005). Esse isolamento pode levar à diminuição das densidades
recursos, por parte dos consumidores. Por outro lado, espécies generalistas podem obter
vantagem nas perturbações geradas pela fragmentação, como os efeitos de borda (Downes &
Elgar 1997). Nestes casos, predadores oportunistas podem substituir, em sua dieta, espécies
sensíveis, antes abundantes, por espécies generalistas que se tornam abundantes após a
fragmentação.
entre os fragmentos. Por exemplo, quando dois fragmentos estão separados entre si por uma
matriz de plantio de cana-de-açúcar e distam 400 metros um do outro, para uma espécie menos
sensível, como a onça-parda (Beier 1995), pode-se dizer que os dois fragmentos estão
51
funcionalmente conectados, pois a espécie pode se locomover entre os fragmentos sem
dificuldades. Já para uma espécie mais sensível, como o gato-maracajá (Oliveira & Cassaro 1999),
a distância entre os fragmentos e o tipo de matriz não podem ser transpostos, o que acarreta em
um isolamento funcional, além do estrutural, para esta espécie. Quanto mais próximos os
fragmentos e quanto menor o contraste entre a matriz e a área natural, maior a probabilidade dos
O estudo da dieta de uma comunidade gera diversas informações, entre elas: relações
tamanho dos nichos, plasticidade das espécies associada à disponibilidade de recursos, influência
Wright et al. 1994; Valkenburgh & Wayne 1994, Jácomo 1999). Além disso, o conhecimento dos
Existem diversos métodos para análise da dieta: i) análise direta do conteúdo estomacal
(Facure & Monteiro Filho 1996); ii) análise de carcaças e encontradas nos campo e examinando o
local em busca de indícios da espécie predadora (Crawshaw & Quigley 1984); iii) observação
direta dos indivíduos em comportamento natural de predação (Brady 1979) e iv) através da
com estradas de terra cortando as áreas naturais e antrópicas, e com condições de relevo e
vegetação favoráveis, a análise das fezes é a metodologia mais apropriada para o estudo da dieta
lugares bem visíveis, como as estradas de terra e as trilhas dentro dos fragmentos. Esse hábito
permite a coleta abundante de material sem a utilização de métodos invasivos, como a análise de
conteúdo estomacal, ou cansativos como a observação direta de predação no campo (Reynolds &
Aebischer 1991).
Neste capitulo, foi estudada a dieta de três carnívoros de topo de cadeia alimentar: a
52
brachyurus). Os objetivos visados com o estudo da dieta destes carnívoros foram: i) analisar a
freqüência de utilização de diferentes itens alimentares pelas três espécies; ii) verificar o grau de
sobreposição de nicho entre as espécies e iii) comparar a densidade de fezes encontradas dentro
e fora das unidades de conservação existentes na área de estudo, para as três espécies.
A área de estudo está localizada entre as coordenadas 21° 30’ – 21° 45’ S e 47° 20’ – 47°
55’ W, ocupando aproximadamente 500 Km2. Caracteriza-se por ser uma região de transição entre
Antonio e Santa Rita do Passa Quatro, e contém a Estação Ecológica de Jataí, a Estação
de vegetação nativa localizados em áreas particulares. O clima é do tipo tropical savânico, onde a
temperatura nos meses de inverno (estação seca) vai de 15 a 31ºC e, nos meses mais quentes
(estação úmida), de 20 a 36ºC (Nimer 1977). A pluviosidade anual é geralmente superior a 1.400
mm, com período de precipitação mais intenso de outubro a março (Pires 1995).
O Parque Estadual de Vassununga, localizado em Santa Rita do Passa Quatro, possui área
total de 2.069,24 ha, dividido em seis glebas. A Gleba Pé-de-Gigante é a única composta por
fisionomias de cerrado, desde campo cerrado até cerradão, e uma pequena área composta por
floresta estacional semidecídua ela faz divisa com plantações de eucaliptos ao norte e oeste, com
(Praxedes, Maravilha, Capetinga Leste, Capetinga Oeste e Capão Várzea) são cobertas por floresta
estacional semidecídua (Korman 2003) apresentam tamanho pequeno, variando de 100 a 350 ha,
todas estão imersas em uma matriz de plantação de cana-de-açúcar. A Estação Ecológica de Jataí
53
aproximadamente de 4.532 ha (Decreto-lei 18.997, de 15/06/1982) e é o maior fragmento
existente no estado de São Paulo com área contínua de cerrado “sensu lato”. Limita-se a oeste
com o rio Mogi-Guaçu, abrangendo uma planície de inundação, onde existem 15 lagoas. As
ripárias, cerrado em diversas fisionomias, desde campo sujo a cerradão (Toppa 2004).
54
3.2.2. Carnívoros estudados:
É o maior canídeo sul-americano (figura 1) podendo chegar a 40 kg, com peso médio de
Santos 1999). Habita toda a região compreendida pelo Planalto Central, Pantanal Matogrossense,
extremo sul da bacia Amazônica, área que se estende para o leste até o limite com as áreas de
Floresta Atlântica dos estados da Bahia, Minas Gerais, São Paulo, e parte semi-árida da região
nordeste, até o extremo sul do país (Paraná). Os indivíduos são solitários durante o ano todo, a
não ser no período de acasalamento, quando formam pares. Podem ter de dois a cinco filhotes,
55
A Onça-parda (Puma concolor, Linnaeus 1771):
Panthera onça. Chega a atingir 1,08 m de comprimento, mais a cauda, que é longa, medindo até
61 cm; pode chegar a 63 cm de altura e pesar até 80 kg. Solitários, só formam pares para a corte.
Podem ter de um a seis filhotes a cada dois anos. A espécie é encontrada na América do Norte,
América do Sul e América Central. No Brasil, pode ocorrer em todos os biomas (Oliveira & Cassaro
1999).
Figura 3. Fotografia de onça-parda (Puma concolor) obtida por meio de armadilhamento fotográfico, na área
de estudo.
56
A Jaguatirica (Leopardus pardalis, Linnaeus 1778):
excetuando-se a cauda, que pode chegar a 45 cm. Pesa entre 8 e 16 kg. De hábitos noturnos,
passa a maior parte do dia dormindo nos galhos das árvores ou escondido entre a vegetação. As
chegam à idade adulta em um ano e meio e os machos aos dois anos (Oliveira & Cassaro 1999).
Atualmente, a espécie se distribui do sul do Texas ao norte da Argentina e Uruguai. (Audubon &
Bachman 1846).
Figura 4. Fotografia de jaguatirica (Leopardus pardalis) obtida por meio de armadilhamento fotográfico, na
área de estudo.
57
3.2.3. Coleta e triagem das fezes:
Foram percorridas estradas de terra existentes na região e que se sabia serem utilizadas
pelas espécies para deslocamento entre as áreas. Em cada área, a quilometragem percorrida
durante a procura das fezes foi anotada, a fim de se estimar e comparar a densidade de fezes. As
fezes coletadas foram armazenadas em sacos plásticos, tendo sido identificadas com uma ficha de
coleta (Tabela 1) contendo dados significativos para a identificação do predador e outras análises.
Tabela 1 Ficha de coleta de fezes dos carnívoros estudados, elaborada para as coletas neste trabalho.
Data da Coleta: Número da amostra
10%, 91% de álcool 700gl, 4% de ácido acético e algumas gotas de detergente comercial) para
posterior triagem. Essa solução, além de conservar as fezes por um longo período, elimina todos
A triagem consistiu na lavagem das fezes em água corrente e na separação dos itens
alimentares em oito categorias: dentes, ossos, pêlos, penas, partes de insetos, partes de frutas,
escamas e material inorgânico (Putman 1984). Para a identificação dos itens, foi usada uma
58
coleção de referência montada durante o estudo (composta de frutas, folhas, e animais mortos
coletados na área de estudo), coleções (Museu de História Natural da Universidade de São Paulo,
coleção do Professor Doutor Manuel Martins Fontes da Universidade Federal de São Carlos e
coleta direta de pelos de mamíferos existentes no Parque Ecológico de São Carlos) e a análise
microscópica dos pêlos, segundo a técnica descrita por Quadros (2002). As chaves de
classificação, baseadas nas características de medula e cutícula dos pelos (descritas em Quadros
2002), foram utilizadas para identificar aqueles que não puderam ser identificados apenas por
comparação.
4- cobrir uma lâmina de vidro com uma fina camada de esmalte incolor para unhas,
6- colocar a lâmina contendo os pêlos sobre um pedaço de madeira e cobrir com outro
10- retirar os pêlos pela parte distal esfregando suavemente com a ponta do dedo;
A técnica para análise da medula dos pêlos guarda consiste em (Quadros, 2002):
59
1- colocar os pêlos-guarda (podem ser os mesmos utilizados na impressão cuticular) em
jaguatirica.
Para evitar que presas fossem registradas mais de uma vez, o número mínimo dos itens
foi obtido por meio do número de estruturas anatômicas, simples ou duplas, como crânios,
mandíbulas, maxilares, bicos, alguns tipos de dentes e partes cefálicas de insetos (Lockie 1959,
Para calcular a porcentagem de ocorrência dos itens encontrados nas fezes, foi utilizada a
%Oi = ni x 100/Ni,
o número de vezes que o item em questão aparece nas fezes e Ni é o número total de itens
encontrados.
Para calcular a porcentagem de fezes com determinado item foi utilizada a seguinte
60
%Ofi = nfi x 100 / Nf,
onde %Ofi é a porcentagem de fezes com o item i em relação a todas as fezes encontradas, nfi é
Foram separadas as fezes coletadas na estação seca das coletadas na estação chuvosa. A
porcentagem das classes de itens encontradas nas fezes em cada estação foi calculada, e um
teste de qui-quadrado foi realizado para verificar se houve diferença significativa na variação das
Amplitude de Nicho
Foi utilizado o índice de Levins (Pianka 1973) para avaliar a amplitude de nicho:
BA = (B – 1) / (n-1),
1 / Σ pij2 . Onde pij é a freqüência do item i na dieta da espécie j. B é calculado unindo itens em
categorias: mamíferos de pequeno porte, mamíferos de médio porte, mamíferos de grande porte,
aves de médio porte, aves de pequeno porte, répteis, insetos, frutos e capim.
61
Sobreposição de Nicho
sobreposição de nicho será calculada para cada par de espécies. A sobreposição de nicho foi
2) mamíferos de médio porte (501-10000g); 3) mamíferos de grande porte (> 1000g); 4) répteis;
5) aves de médio porte (51-1500g); 6) aves de pequeno porte (0-50g); 7) insetos; 8) frutos e 9)
capim.
Vassununga (PEV). Em cada uma delas, foram percorridas estradas de terra com indícios de
passagens das espécies em estudo. O número de fezes de uma determinada espécie, encontradas
no campo, foi dividido pelo total de quilômetros percorridos, em cada uma das três áreas, na
procura por fezes. O resultado reflete a abundância relativa de cada uma das espécies nas
62
3.3. Resultados
os itens alimentares foram agrupados em nove classes: mamíferos de pequeno porte (0-500g),
mamíferos de médio porte (501-10000g), mamíferos de grande porte (> 1000g), répteis, aves de
médio porte (51-1500g), aves de pequeno porte (0-50g), insetos, frutos e capim. Nas fezes do
lobo-guará, todas as classes menos mamíferos de grande porte, foram encontradas; já nas fezes
de jaguatirica, apenas cinco classes foram encontradas, sendo elas: mamíferos de pequeno porte,
mamíferos de médio porte, répteis, aves de médio porte e capim. Nas fezes da onça-parda, foram
encontradas quatro das classes, sendo elas: mamíferos de grande porte, mamíferos de médio
encontrados em 75% das fezes, e a lobeira (Solanum lycocarpum), correspondendo a 16.91% dos
itens e aparecendo em 71,88% das fezes (tabela 2). A seguir, vieram tatus do gênero Dasypus
63
Tabela 2. Porcentagens dos itens encontrados nas fezes (Oi = quantidade de vezes que o item aparece em
relação a todos os itens) e de fezes com o item encontrado (Ofi = quantidade de vezes que o item aparece em
relação ao total de fezes encontradas) para o lobo-guará (Chrysocyon brachyurus) na área de estudo. (N =
total de fezes; nfi = número de fezes com o item i; ni = número de itens i encontrado nas fezes; pp = pequeno
porte; mp = médio porte).
N=93 nfi ni Ofi (%) Oi (%)
Marmosops incanus 3 3 3,13 0,74
Mamíferos de Roedor pp 72 89 75,00 21,81
pequeno porte Marsupial pp 21 28 21,88 6,86
Mamífero pp 12 12 12,50 2,94
Mamífero mp 5 5 5,21 1,23
Mamíferos de Dasypus sp 45 45 46,88 11,03
médio porte Monodelphis sp 1 1 1,04 0,25
Tamandua tetradactila 5 5 5,21 1,23
Serpente 15 15 15,63 3,68
Répteis
Tupinambis teguxim 13 13 13,54 3,19
Ave mp 7 7 7,29 1,72
Ave pp 18 18 18,75 4,41
Scarabaeidea 6 13 6,25 3,19
Insetos Cerambycidae 7 9 7,29 2,21
Orthoptera 15 34 15,63 8,33
Solanum lycocarpum 69 69 71,88 16,91
Citrus sp. 12 12 12,50 2,94
Frutos Annona coriacea 7 7 7,29 1,72
Semente não identificada 1 1 1,04 0,25
Semente não identificada 1 1 1 1,04 0,25
Capim 21 21 21,88 5,15
TOTAL - 408 - 100,00
mamíferos e aves de pequeno porte durante a estação seca. Houve um maior consumo de répteis
e frutos durante a estação chuvosa, as aves de médio porte e os insetos só foram consumidos na
estação chuvosa (Figura 5). O teste qui-quadrado mostrou uma diferença altamente significativa
na dieta dessa espécie durante a época chuvosa e a seca (X2 = 112,394; g.l. = 7; p** ≤ 0,000).
60,00%
50,00%
40,00%
Estação chuvosa
30,00%
Estação seca
20,00%
10,00%
0,00%
M amíferos M amíferos Répteis Ave pp Ave mp Insetos Frutos Capim
pp mp
Figura 5. Diferença na dieta do lobo-guará (Chrysocyon brachyurus) nas estações chuvosa (vermelho) e
seca (verde), na área de estudo. (pp = pequeno porte, mp = médio porte).
64
3.3.2. Dieta da jaguatirica (Leopardus pardalis)
apenas 1 de origem vegetal. Dentre os itens, os tatus do gênero Dasypus foram os mais
pequeno porte, que representaram 18,98% dos itens e apareceram em 55,26% das fezes, e por
Tabela 3. Porcentagens dos itens encontrados nas fezes (Oi = quantidade de vezes que o item aparece em
relação a todos os itens) e de fezes com o item encontrado (Ofi = quantidade de vezes que o item aparece em
relação ao total de fezes encontradas) para a jaguatirica (Leopardus pardalis), na área de estudo. (N = total
de fezes; nfi = número de fezes com o item i; ni = número de itens i encontrado nas fezes).
N=38 nfi ni Ofi (%) Oi (%)
Marmosops incanus 4 4 10,53 2,92
Mamíferos de Roedor pp 21 26 55,26 18,98
pequeno porte Marsupial pp 12 15 31,58 10,95
Mamífero pp 7 7 18,42 5,11
Mamífero mp 7 7 18,42 5,11
Mamíferos de Dasypus sp 32 32 84,21 23,36
médio porte Monodelphis sp 2 2 5,26 1,46
Tamanduá mirim 8 8 21,05 5,84
Serpente 7 7 18,42 5,11
Répteis
Tupinambis teguxim 9 9 23,68 6,57
Ave mp 7 7 18,42 5,11
Ave pp 9 9 23,68 6,57
Capim 4 4 10,53 2,92
TOTAL - 137 - 100,00
65
60,00%
50,00%
40,00%
Estação chuvosa
30,00%
Estação seca
20,00%
10,00%
0,00%
Mamíferos Mamíferos Répteis Ave mp Ave pp Capim
pp mp
Figura 6. Diferença na dieta da jaguatirica (Leopardus pardalis) nas estações chuvosa (vermelho) e seca
(verde) na área de estudo (pp = pequeno porte, mp = médio porte).
Nas fezes de onça-parda, foram identificados nove itens, sendo todos de origem animal.
Dentre os itens, os tatus do gênero Dasypus foram os mais freqüentes, representando 47,06%
dos itens e aparecendo em 16,91% das fezes, seguidos pelo tamanduá-bandeira (Myrmecophaga
tridactyla) que representaram 33,82% dos itens e apareceram em 16,91% das fezes, a capivara
(Hydrochoerus hydrochaeris) com 32,35% dos itens e 16,18% de aparecimento, seguidos pelo
teiú (Tupinambis teguxim) com 26,47% dos itens e 13,24% das fezes, e por fim, a lebre-européia
(Lepus europaeus), espécie de coelho invasor nas terras brasileiras, constituindo 17,65% dos itens
66
Tabela 4. Porcentagens dos itens encontrados nas fezes (Oi = quantidade de vezes que o item aparece em
relação a todos os itens) e de fezes com o item encontrado (Ofi = quantidade de vezes que o item aparece em
relação ao total de fezes encontradas) para a onça-parda (Puma concolor), na área de estudo. (N = total de
fezes; nfi = número de fezes com o item i; ni = número de itens i encontrado nas fezes).
N=68 nfi ni Ofi Oi
Lepus europaeus 12 12 17,65 8,82
Mamíferos de Dasypus sp. 32 32 47,06 23,53
médio porte Tamandua
8 8 11,76 5,88
tetradactyla
Myrmecophaga
23 23 33,82 16,91
tridactyla
Mamíferos de Mazama guazoubira 5 5 7,35 3,68
grande porte Tayassu tajacu 7 7 10,29 5,15
Hydrochoerus
22 22 32,33 16,18
hydrochaeris
Aves mp 7 9 10,29 6,62
Répteis Tupinambis teguxim 18 18 26,47 13,24
Total - 136 - 100,00
grande porte (a não ser os tatus do gênero Dasypus) durante a estação chuvosa e um aumento
no consumo das aves de médio porte e do teiú (Tupinambis teguxim) na estação seca.
O teste qui-quadrado mostrou que não existe uma diferença estatisticamente significativa
(X2 = 12,496; g.l. = 8; p = 0,1304) na dieta da onça-parda entre os períodos seco e chuvoso.
35,00%
30,00%
25,00%
20,00% Estação
15,00% chuvosa
10,00% Estação
seca
5,00%
0,00%
yla
s
is
m
ra
p
la
cu
.
eu
sp
m
er
xi
ty
bi
ja
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pa
gu
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Tu
ho
m
M
m
Ta
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yr
dr
M
Hy
Figura 7. Diferença na dieta da onça-parda (Puma concolor) nas estações chuvosa (vermelho) e seca
(verde) na área de estudo (mp = médio porte).
67
3.3.4 Comparação entre as dietas dos três carnívoros
estudados
itens utilizado na sua dieta (21), ele obteve a menor largura de nicho (Ba=0,399). A jaguatirica
(Leopardus pardalis), com 13 itens identificados na sua dieta, mostrou uma largura de nicho
intermediária entre as três espécies (Ba=0,543). A onça-parda (Puma concolor) com 9 itens
sobreposição entre a onça-parda e a jaguatirica (0,639) e uma baixa sobreposição entre a onça-
Foi percorrido um total de 10.115 km nas estradas de terra existentes na área de estudo
durante a procura de fezes. Destes, 4.825 km foram dentro da área da Estação Ecológica e
Experimental de Luís Antonio (EELA), 3.252 km nas glebas do Parque Estadual do Vassununga e
seu entorno próximo (2 km) e 2.038 km nas áreas pertencentes a propriedades privadas (PP).
Encontramos uma densidade de fezes total de 0,019 fezes/km sendo, as fezes mais abundantes,
0,022 fezes por quilometro percorrido, seguido da área PP com 0,019 fezes/km e 0,012 fezes/km
nas áreas do PEV. As fezes de lobo-guará e de jaguatirica foram mais abundantes na EELA (0,013
68
Tabela 5. Número de fezes e densidade de fezes por quilometro percorrido, referentes às três espécies
estudadas na área de estudo como um todo e nas três áreas (EELA, PEV e PP) separadamente (n=número de
fezes).
3.4 Discussão
semelhantes aos obtidos em diversos outros estudos (Dietz 1984, Motta Jr. et al. 1996 e
uma variedade grande de itens (desde mamíferos de médio porte até insetos e frutos). A
espécie apresentou o menor valor de largura de nicho entre as três espécies estudadas. Isso
se deu pelo fato do lobo-guará concentrar sua dieta em poucos tipos de presas: se
de se alimentar de uma enorme variedade de presas, ele tem alta preferência por poucos
itens. Sua dieta muda de acordo com a estação chuvosa ou seca, alimentando-se mais dos
carnívora. O aparecimento de capim nas fezes não indica que a espécie se alimentou desse
item, provavelmente ele foi ingerido de forma ocasional, como é visto em gatos
69
domésticos. Não existem muitos trabalhos de análise da dieta da jaguatirica em áreas de
cerrado paulista; a maioria dos estudos da dieta desse felino foi realizado em áreas de
Floresta Atlântica e Amazônica (Murray & Gardner 1999, Meza 2002 e Vidolin 2004). As
encontradas nos estudo citados acima, mas quando agrupamos as espécies em grupos
taxonômicos e/ou classes de tamanho os valores aqui encontrados são semelhantes aos
A jaguatirica apresentou, neste estudo, 13 itens compondo sua dieta, sendo que os
tatus do gênero Dasypus foi o gênero mais predado. Não é comum encontrar tatus em
freqüências tão altas na dieta de jaguatirica e isso pode indicar uma diminuição das
roedores (Murray & Gardner 1999, Meza 2002 e Vidolin 2004), fazendo com que o felino
altere sua alimentação para espécies mais abundantes no local, como os tatus. Sua dieta,
sido encontrados 9 tipos de itens, todos de origem animal. Mostrou certa preferência pelos
tatus, corroborando um estudo de Mantovani (2001), na mesma área, mas isso pode
indicar, como no caso da jaguatirica, uma adaptação alimentar voltada para as espécies
(Lepus europaeus). Nenhum estudo realizado na região tinha apontado a presença dessa
espécie na área. A presença na dieta da onça mostra ainda mais o caráter oportunista da
onça-parda, que se alimenta do que estiver mais disponível no ambiente. Por outro lado, a
70
Apesar da onça-parda se alimentar de menos itens que o lobo-guará e a jaguatirica,
as freqüências de utilização dos itens são mais homogêneas, mostrando menor preferência
alimentar e, conseqüentemente, uma maior largura de nicho. Não foi encontrada diferença
indicar um aumento na competição entre essas duas espécies que são de tamanho e peso
parecidos. Existem indícios de competição direta entre essas espécies, com pelos de
espécies são de grupos taxonômicos bem próximos. Já a baixa sobreposição entre lobo e
onça indica que ainda existem na área espécies de médio e grande porte dos quais a onça-
como um todo e nas três subáreas - Estação Ecológica e Experimental de Luiz Antonio
mostraram diferenças importantes entre as espécies e as áreas. A EELA foi a área que
obteve os maiores valores de abundância para a jaguatirica e o lobo-guará, isso pode ser
explicado pelo fato de ser a área com o maior fragmento de vegetação nativa,
sensível às alterações antrópicas, entre as três espécies estudadas, podendo utilizar as áreas
alteradas tão bem quanto as naturais. Os dados obtidos aqui foram muito semelhantes aos
71
3.5. Bibliografia
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75
4. Conclusões Gerais:
O uso das armadilhas fotográficas, na coleta de registros de mamíferos de médio e grande porte,
foi considerado muito satisfatório. Foram obtidos diversos registros de diferentes espécies que se
sabia existir na região. Algumas espécies que sabidamente existem na região e não foram a
amostradas, são aquelas que possuem características específicas que não foram objeto da
amostragem (por exemplo: espécies com hábitos arborícolas e/ou habitats muito específicos).
maiores valores de freqüência de uso pelas espécies de mamíferos amostradas. Isso ocorreu
principalmente pelo fato dos fragmentos de cerrado amostrados serem de a melhor qualidade
estrutural na paisagem (tamanho, grau de isolamento) e sofrerem menos com a pressão antrópica
Nas áreas de plantio de eucaliptos foram registradas espécies que necessitam de grandes
brachyurus). Isso mostra que essas áreas, podem ser permeáveis (transpostas) a algumas
indivíduo morrer ao cruzar estas matrizes (por caça, atropelamento, ingestão de embalagens e
produtos químicos e outras pressões antrópicas) devemos pensar em formas de manejo das áreas
que seja menos impactantes para as espécies, como por exemplo, o corte intercalado de talhões
de eucalipto (de modo a não deixar áreas muito grandes sem cobertura vegetal), a maior
A maioria das espécies de mamíferos de médio e grande porte amostrada foi mais
maioria dos mamíferos de médio e grande porte. Mas outros períodos, principalmente o diurno,
também foram bastante utilizados, mostrando um caráter mais generalista na preferência por
períodos de atividade, principalmente pelo quati (Nasua nasua), irara (Eira barbara), jaguatirica
76
Dos fragmentos estudados, o que mostrou maior qualidade, tanto estrutural (índices de
paisagem) como qualidade ambiental (aqui refletida pelas maiores freqüências dos mamíferos
amostrados e a maior riqueza de mamíferos de médio e grande porte), foi a Estação Ecológica de
Jataí (EEJ). Os resultados indicam esse fragmento como a grande área-fonte da paisagem. Outro
fragmento que tem características de área-fonte é a gleba Cerrado Pé-de-Gigante (PG), que
também registrou altas freqüências de mamíferos de médio e grande porte e possui melhores
fragmentos e os índices da paisagem mostram que, cada vez mais, variáveis estruturais da
paisagem (por exemplo: área do fragmento, relação perímetro/área - que reflete a pressão do
efeito de borda no fragmento -, índices que levem em conta o grau de isolamento e a quantidade
fragmento), são importantes na persistência das espécies da paisagem. Esses índices, portanto,
parda (P. concolor) por meio da coleta e triagem de fezes encontradas nas estradas de terra e
aceiros presentes na área de estudo foi um método satisfatório para analisar os nichos das
espécies estudadas. O numero de fezes coletadas e triadas foi sufuiciente para realizar as análises
estatísticas e para cálculos de densidade de fezes por quilometro percorrido, tendo sido
O alto valor de largura de nicho (Ba = 0,723) encontrado para onça-parda mostra um
caráter generalista desta espécie, corroborando os dados do primeiro capítulo desta dissertação,
que também apontam para um comportamento generalista desta espécie na preferência por
habitas e períodos de atividade Entre jaguatirica e a onça-parda (0,639), era esperado um alto
grau de sobreposição de nicho, pois são espécies muito próximas taxonomicamente. Entretanto, o
alto valor encontrado na sobreposição entre jaguatirica e lobo-guará (0,765) é preocupante, pois
não existem estudos apontando uma alta competição indireta (disputa por recursos) para estas
duas espécies. Os valores obtidos para o uso de habitat conforme períodos de atividade também
77
são muito parecidos entre essas duas espécies, indicando que, além de uma competição indireta
por recursos alimentares, pode existir uma competição direta por território.
A alta densidade de fezes por quilometro, dentro da Estação Ecológica de Jataí (EEJ), dá
um peso ainda maior à hipótese de que a área é uma área-fonte de indivíduos na paisagem. A
única espécie que não obteve a maior densidade de fezes na EEJ foi a onça-parda que obteve a
maior densidade nas propriedades privadas (PP), mostrando novamente seu caráter generalista.
O fato de as PP terem obtido valores maiores de densidade de fezes que o Cerrado Pé-de-
Gigante (PG) pode indicar que, juntos, os fragmentos existentes nas áreas privadas podem
apresentar uma capacidade de suporte maior que o fragmento PG, para estas espécies de
carnívoros estudadas.
Estado), de seus entornos e de características das diferentes matrizes presentes nas paisagens
imaginar ou almejar que áreas fragmentadas voltem a ser contínuas estruturalmente, mas,
paisagem e os diferentes tipos de matrizes, pode-se estabelecer estratégias de manejo que visem
de indivíduos que estiverem cruzando áreas não naturais que envolvem ás áreas naturais.
paisagem. Sem o incentivo a criação Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs), que
conservação da biodiversidade dificilmente será alcançado, principalmente pelo fato de que, sem
essas áreas, as unidades de conservação estabelecidas no Estado ficam isoladas, levando a maior
78