Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo
Fernando Puccetti Laterza
Biomimetismo: Considerações Conceituais e Críticas para uma
Aplicação no Ambiente Construído
São Paulo
2017
Fernando Puccetti Laterza
Dissertação apresentada ao Instituto de
Pesquisas Tecnológicas do Estado de
São Paulo – IPT, como parte dos
requisitos para a obtenção do título de
Mestre em Habitação: Planejamento e
Tecnologia.
Data da aprovação ____/_____/_______
_________________________________
Prof. Dr. Marcelo de Andrade Romero
(Orientador)
IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas
do Estado de São Paulo
Membros da Banca Examinadora:
Prof. Dr. Marcelo de Andrade Romero (Orientador)
Mestrado Habitação: Planejamento e Tecnologia
Prof. Dr. Carlos Roberto Zibel da Costa (Membro)
FAU/USP – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo
Profª. Drª. Silvia Pereira de Sousa Vitale (Membro)
FAU/BA – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Belas Artes de São Paulo
Fernando Puccetti Laterza
Biomimetismo: Considerações Conceituais e Críticas para uma
Aplicação no Ambiente Construído
Dissertação apresentada ao Instituto de
Pesquisas Tecnológicas do Estado de
São Paulo – IPT, como parte dos
requisitos para a obtenção do título de
Mestre em Habitação: Planejamento e
Tecnologia.
Área de concentração: Planejamento,
Gestão e Projeto
Orientador: Prof. Dr. Marcelo de Andrade
Romero
São Paulo
Julho/2017
Aos meus pais, a quem dediquei o Valle di Zeri, agora dedico este trabalho.
AGRADECIMENTOS
Agradeço ao meu orientador, Prof. Dr. Marcelo de Andrade Romero, o entusiasmo e
pela generosidade.
À Profª. Drª. Maria Akutsu, os ensinamentos rigorosos e assertivos.
À Profª. Drª. Silvia Pereira de Sousa Vitale, as observações valiosas na qualificação
e pelo apoio e incentivo desde o início da graduação.
Ao Prof. Dr. Carlos Zibel, as observações valiosas na qualificação.
Ao Prof. Dr. Valdir Gaspar, as reflexões sempre assertivas, baseadas em sua
experiência ímpar na prática da docência.
Ao Prof. Dr. Marcelo Aquilino, os ensinamentos e a atenção generosa.
À Prof. Drª. Adriana Camargo de Brito, o entusiasmo e a dedicação.
Aos professores de todo o mestrado, o conhecimento compartilhado e a contribuição
valiosíssima em minha formação.
A Adilson Feliciano, Andreia Longuinho da Silva, Andreia Valero, Bruno Damião,
Maria Natalina e Mary Yoshioka Pires de Toledo, a competência e a seriedade, cada
qual com seu trabalho, profissionais fundamentais para o bom funcionamento do
mestrado.
Ao Centre Européen d'Excellence en Biomimétisme de Senlis, pela acolhida
entusiasmada no Colóquio de 2015 na Grande Galerie de l'Évolution du Muséum
National d'Histoire Naturelle de Paris.
À Profa. Drª. Kalina Raskin, pela disponibilidade e pela assertividade nas
informações e indicações preciosas acerca do tema.
Ao Dr. Jean-Philippe Buffet, pela esclarecedora apresentação referente aos adesivos
biomiméticos.
À Profª. Drª. Leila Rabello, a organização da biblioteca da Belas Artes de São Paulo.
Ao Prof. Me.Wagner Amodeo, o apoio e incentivo em todo o percurso deste trabalho.
Ao Prof. Me Wilis Tomy Miyasaka, a motivação durante o percurso deste trabalho.
Ao Prof. Dr. Rafael Manzo, as contribuições bibliográficas e o apoio em todo o
percurso de elaboração desta pesquisa.
À Profª. Drª. Lúcia Pirrò, o incentivo e pela generosidade durante todo o percurso
deste trabalho.
Ao Prof. Dr. Fulvio Vittorino, o apoio e incentivo durante todo o percurso deste
trabalho.
RESUMO
O presente estudo apresenta as principais linhas de pesquisa e diferentes
abordagens da literatura a respeito do biomimetismo. Pretende auxiliar, assim, na
formulação de hipóteses que sirvam de base para o desenvolvimento e a
sistematização de critérios sociourbanísticos ambientais, na avaliação de
desempenho do ambiente construído. Também discorre a respeito da evolução
histórica da bioinspiração, precursora do biomimetismo, trazendo uma necessária
contextualização. Por meio de uma revisão das diferentes abordagens
historicamente construídas, faz um exame de como se apresenta o atual cenário de
pesquisas que visam à inovação tecnológica com inspiração em seres vivos. Na
introdução, houve o cuidado de fazer um alerta no tocante aos aspectos éticos
envolvidos no tema em pauta. O estudo evidencia, ainda, a superficialidade no trato
do assunto por muitos dos projetos chamados de biomiméticos, que, na realidade,
são apenas biomórficos, resultado da produção Orgânica Pós-Informática. O
trabalho procura identificar tecnologias, conceitos e linhas de pesquisa, evidenciadas
na revisão bibliográfica, que possam contribuir para a melhoria da qualidade de vida
das populações (aspecto social), do ambiente construído (arquitetura, bens e
relações estabelecidas entre as pessoas e seu meio, dentre outros aspectos) e na
diminuição dos impactos da antropização no meio ambiente (aspecto ambiental), ou
seja, não privilegia um ou outro aspecto, mas pretende oferecer uma abordagem
mais ampla. A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica – principais autores,
pesquisadores e linhas de pesquisa -, o que permitiu observar a evolução da
produção científica da Renascença aos dias atuais, destacando as principais
abordagens através dos tempos. Este olhar acerca do contexto histórico possibilitou
proceder a um levantamento da gênese do que atualmente denominamos
biomimetismo, desde as primeiras observações feitas por Leonardo da Vinci (1452 –
1519) acerca do voo dos pássaros, até as mais recentes pesquisas, que utilizam
tecnologias de ponta. Neste sentido, o estudo evidencia que é preciso compreender
a adoção de novas formas de produção do ambiente construído como um exercício
de monta, o que, por vezes, exige esforços em pesquisas que apenas instituições de
grande porte são capazes de empreender. Por fim, alerta para o fato de que o
avanço da popularização dos softwares de parametrização e simulação, somado à
necessidade de dar respostas competitivas em um mercado complexo, pode
impulsionar um voluntarismo capaz de gerar riscos para a sociedade. O estudo foi
concluído com uma série de exemplos de pesquisas biomiméticas em andamento,
que demonstram a aplicação dos conceitos levantados no presente trabalho,
encerrado com as devidas considerações finais.
Palavras-chave: Biomimetismo. Ambiente construído. Arquitetura. Design.
Desempenho.
.
ABSTRACT
Biomimicry: Conceptual and Critical Considerations for an
Application in the Built Environment
The present study presents the main lines of research and different approaches
of research regarding biomimetism. It intends to help, in this way, the formulation
of hypothesis that serve as basis for the development and systematization of socio-
environmental criterias in the performance evaluation of the built environment. It also
discusses the historical evolution of bioinspiration, precursor of biomimicry, bringing a
necessary contextualization. By a review of the different historically constructed
approaches, it examines the present scenario of research that aims at technological
innovation inspired by nature. In the introduction, caution was taken regarding the
ethical aspects involved in the topic at hand. The study also shows the superficiality
in the treatment of the subject by many of the so-called biomimetic projects, which, in
reality, are only biomorphic, a result of Organic Post-Informatics production. This
work aims to identify technologies, concepts and lines of research, showed in the
bibliographical review, that can contribute to the improvement of the quality of life of
the populations (social aspect), the built environment (urban aspect) and the
reduction of the impacts of anthropization in the environment (environmental
aspect), not focusing, though, on one or the other aspect, but intends to offer a
broader approach. The methodology used was the bibliographical research - main
authors, researchers and lines of research -, which allowed to observe the evolution
of the scientific production from the Renaissance to the present day, highlighting the
main approaches through time. This look at the historical context made possible a
survey of the genesis of what we now call biomimicry, from the first observations
made by Leonardo da Vinci (1452-1519) on the flight of birds, to the most recent
research using top technologies. In this sense, the study shows that it is necessary to
understand the adoption of new forms of production of the built environment as a
major exercise, which sometimes requires efforts in research that only large
institutions are capable to fulfill. The methodology used was the bibliographical
research - main authors, researchers and lines of research -, which allowed to
observe the evolution of the scientific production from the Renaissance to the present
day, highlighting the main approaches through time. This look at the historical context
made possible a survey of the genesis of what we now call biomimicry, from the first
observations made by Leonardo da Vinci (1452-1519) on the flight of birds, to the
most recent research using top technologies. In this sense, the study shows that it is
necessary to understand the adoption of new forms of production of the built
environment as a major exercise, which sometimes requires efforts in research that
only large institutions are capable to fulfill.
.
Keywords: Biomimetism. Built environment. Architecture. Design. Performance.
Lista de Ilustrações
Figura 1 – Mapas comparativos de evolução da antropização no Brasil 16
Figura 2 – Fluxograma da pesquisa 30
Figura 3 – Homem Vitruviano 37
Figura 4 – Mecanismo voador davinciano 39
Figura 5 – Linhas de esforços em fêmur 42
Figura 6 – Projeto da Torre Eiffel 43
Figura 7 – Habitação popular de operários ingleses 44
Figura 8 – Cozinha de Frankfurt 47
Figura 9 – Blocos de concreto 49
Figura 10 - Igreja de São Francisco de Assis, Pampulha, Belo Horizonte 53
Figura 11 – Cobertura do Palazzetto Dello Sport 53
Figura 12 – Modulador 54
Figura 13 – Edifício biomimético – corte esquemático e ampliação 71
Figura 14 – Edifício alimentado por algas 74
Figura 15 – Redes de inteligência artificial 77
Figura 16 – Estação de tratamento esgotos biomimética 81
Figura 17 – Planta de indústria 82
Figura 18 – Planta de indústria após aplicação de algoritmo bioinspirado 83
Fotografia 1 – Lixo em Nápoles 28
Fotografia 2 – Edifício Esther 50
Fotografia 3 – Colmeia 51
Fotografia 4 – Parque Eduardo Guinle 52
Fotografia 5 – Terra vista do espaço 56
Fotografia 6 – Exemplo de arquitetura orgânica pós-informática 68
Fotografia 7 – Edifício biomimético 69
Fotografia 8 – Edifício alimentado por algas – detalhe 74
Fotografia 9 – Relações “econômicas” naturais 78
Fotografia 10 – Movimento ondulatório dos peixes 79
Gráfico 1 - Movimento ondulatório dos peixes 80
Lista de Tabelas
Tabela 1 – Tabela comparativa de tipos de ecossistemas 66
Tabela 2 – Atributos e caracterização do ambiente construído 86
Lista de Abreviaturas e Siglas
NBR Norma Brasileira
CDHU Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano
IPCC Intergovernmental Panel on Climate (Painel Governamental sobre
Mudanças Climáticas)
ETE Estação de Tratamento de Esgoto
ETA Estação de Tratamento de Água
ONU Organização das Nações Unidas
SINAT Sistema Nacional de Avaliações Técnicas
PBQP-H Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade no Habitat
CONAMA Conselho Nacional de Meio Ambiente
SNIF Sistema Nacional de Informações Florestais
REDD+ Redução de Emissões Provenientes do Desmatamento e
Degradação Florestal; Conservação dos Estoques de Carbono
Florestal, Manejo Sustentável de Florestas, Aumento dos
Estoques de Carbono
IRCC Inter-Jurisdictional Regulatory Comitee
CIAM Congrès Internationaux d’Architecture Moderne
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 12
2 MÉTODOS E TÉCNICAS 29
2.1 Considerações preliminares 29
2.1.1 Revisão bibliográfica: levantamento de dados secundários 31
2.1.2 Levantamento histórico da bioinspiração e contextualização do biomimetismo e do 31
ambiente construído
2.1.3 Levantamento de aspectos caracterizadores e contextualizadores que permitiram a 31
conceituação de biomimetismo e diferenciação com o bioformismo
2.1.4 Prospecção de conceitos e tecnologias 31
2.1.5 Levantamento de resultados de pesquisas biomiméticas na Arquitetura e 32
considerações críticas
2.1.6 Exemplos de biomimetismo em tecnologias aplicadas e na Arquitetura 32
2.1.7 Descrição de critérios de avaliação de qualidade e desempenho 32
2.1.8 Conclusão 32
3 BIOMIMETISMO: UMA ABORDAGEM HISTÓRICO-TEÓRICA 33
4 BIOMIMETISMO: UMA ABORDAGEM CONCEITUAL 57
5 APLICAÇÃO DO BIOMIMETISMO NA ARQUITETURA, NO DESIGN E NO 64
AMBIENTE CONSTRUÍDO
6 APLICAÇÃO DO BIOMIMETISMO PARA O DESENVOLVIMENTO E A 84
SISTEMATIZAÇÃO DE CRITÉRIOS SOCIOURBANÍSTICO AMBIENTAIS NA
MELHORIA DA QUALIDADE E AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DO AMBIENTE
CONSTRUÍDO
CONSIDERAÇÕES CRÍTICAS 87
CONCLUSÃO 89
REFERÊNCIAS 91
GLOSSÁRIO 98
12
1 INTRODUÇÃO
O presente estudo tem por objetivos apresentar as principais linhas de
pesquisa e diferentes abordagens presentes na literatura de Biomimética e auxiliar
na formulação de hipóteses que sirvam de base para o desenvolvimento e a
sistematização de critérios sociourbanísticos ambientais na avaliação de
desempenho do ambiente construído. Pretende-se discorrer acerca da evolução
histórica: a bioinspiração, precursora do biomimetismo; explicitar como se apresenta
o atual cenário de pesquisas que visam à inovação tecnológica com inspiração na
natureza; identificar tecnologias, conceitos e linhas de pesquisa evidenciadas na
revisão bibliográfica que possam contribuir para a melhoria da qualidade de vida das
populações (aspecto social), da qualidade do ambiente construído (aspecto
construtivo e urbanístico) e para a diminuição dos impactos da antropização no meio
ambiente (aspecto ambiental).
O conceito de biomimetismo e a área da ciência na qual está circunscrita a
Biomimética ainda são pouco conhecidos. Trata-se de uma ciência que vem
conquistando espaço, mas cuja área de conhecimento necessita de mais
evidenciação, a fim de que se torne claro seu espectro de atuação para a
comunidade científica. Corroborando a noção de que há pouca difusão do conceito,
o verbete biomimetismo sequer consta do dicionário Houaiss (2016), que traz
apenas o termo “biomimética”. Segundo o referido dicionário, biomimética é um
substantivo feminino que descreve o ramo da Biônica que aplica o conhecimento
das estruturas biológicas e de suas funções na produção de sistemas para uso em
medicina, engenharia, indústria, navegação, dentre outros (HOUAISS, 2016).
Já a respeito do verbete “Biônica”, o dicionário afirma ser “a observação
sistemática da natureza para a solução de problemas de engenharia, medicina etc.”
(HOUAISS, 2016). A descrição já seria suficiente para definir o biomimetismo, de
acordo com a descrição desse dicionário, na medida em que se pode utilizar o termo
Biônica como sinônimo de Biomimética (a ciência ou campo dela) e, por
conseguinte, Biomimetismo como sendo o processo, o fenômeno descrito dentro do
campo dessa ciência ou estudo.
Faz-se necessário, contudo, aprofundar o conceito para melhor delimitar sua
área de conhecimento. Biomimetismo, segundo o postulado por Janine Benyus
(2007), é uma área da ciência que busca soluções sustentáveis para os desafios
13
que a humanidade encara em diversas frentes do conhecimento. Trata-se de uma
abordagem que se inspira na natureza e que, em sua trajetória, apresentou soluções
adaptativas. Tais soluções podem ser aproveitadas pelo ser humano como resposta
a problemas dos mais variados tipos, da escassez de recursos a simples soluções
mecânicas aplicáveis em objetos de uso cotidiano. Depreende-se da obra de Benyus
(2007) que a amplitude da área de estudos comporta uma multi, inter ou
transdisciplinaridade. Cabe ressaltar a hierarquização dos níveis de colaboração e
integração apresentada por Jurjo Torres Santomé (1998, p. 70) proposta por Jean
Piaget (1896-1980):
1. Multidisciplinaridade. O nível inferior de integração. Ocorre
quando, para solucionar um problema, busca-se informação e ajuda
em várias disciplinas, sem que tal interação contribua para modificá-
las ou enriquecê-las. Esta costuma ser a primeira fase da
constituição de equipes de trabalho interdisciplinar, porém não
implica em que necessariamente seja preciso passar a níveis de
maior cooperação.
2. Interdisciplinaridade. Segundo nível de associação entre disciplinas,
em que a cooperação entre várias disciplinas provoca intercâmbios
reais; isto é, existe verdadeira reciprocidade nos intercâmbios e,
consequentemente, enriquecimentos mútuos.
3. Transdisciplinaridade. É a etapa superior de integração. Trata-se
da construção de um sistema total, sem fronteiras sólidas entre as
disciplinas, ou seja, de ‘uma teoria geral de sistemas ou de
estruturas, que inclua estruturas operacionais, estruturas de
regulamentação e sistemas probabilísticos, e que una estas diversas
possibilidades por meio de transformações reguladas e definidas.
Assim, qualquer que seja o nível de hierarquização, a abrangência dessa área
é apoiada em pesquisas eminentemente aplicadas. Por ser focada na resolução de
problemas de forma sustentável, no contexto da crise ambiental vivida atualmente
pela humanidade, faz-se importante ressaltar seu caráter de urgência voltado a
resultados em benefício da sociedade em curto espaço de tempo.
Considerando tal urgência, seja na arquitetura, no design e, por fim, no
espaço construído, o biomimetismo se apresenta como possível metodologia para o
aumento de desempenho dentro do contexto da sustentabilidade socioambiental.
Isso significa uma produção de ambiente construído que atenda às necessidades
humanas que se colocam no momento e que, ao mesmo tempo, assegure a
qualidade de vida dos usuários de forma sustentável, foco atual das inovações.
Segundo Andrade (2014, p. 34):
14
Compreender e replicar as estruturas biológicas a partir da
observação de novos conceitos e paradigmas “projetuais” vindos da
natureza, que se somam ao conhecimento tecnológico desenvolvido
pelo homem, é, em suma, a principal premissa da Biomimética, que
tem sido considerada uma ferramenta profícua para a criatividade e a
inovação.
Em todos os casos, o ponto de interseção é a limitação e/ou escassez de
recursos, que figuram entre os desafios postos para o desenvolvimento atual da
humanidade e às espécies sobreviventes à evolução. Isso reforça a tese de que a
natureza pode apontar soluções, contidas em ensinamentos formulados em bilhões
de anos. Esses ensinamentos se expressam de diferentes formas, seja no
desenvolvimento de moléculas, de novas substâncias, de arranjos sociais, da
produção de meios e associações inúmeras que podem ser feitas com base nesses
itens, trazendo enorme variedade e riqueza de soluções técnicas e conceituais.
É importante destacar que o biomimetismo difere do biomorfismo. Deve-se
considerar que o biomimetismo é um processo que pode ou não resultar em algo
biomórfico. O que é biomórfico se assemelha, quanto à forma, a algo natural,
notadamente nos seres vivos. Porém, nem tudo o que é fruto de um processo de
inspiração na natureza pode ser chamado de biomimetismo. Uma escultura ou
pintura, por exemplo, pode se basear em curvas ou motivos encontrados na
natureza ou em seres vivos. Nesse caso, há um resultado biomórfico, mas que não
pode ser considerado biomimético.
Assim, biomimetismo é uma metodologia que, aplicada à pesquisa, tem início
a partir de um determinado ponto em que a natureza (espécies vivas ou partes
delas) se torna uma referência para solucionar um problema ou aumentar um
desempenho, ou seja, trazendo um ganho sob algum aspecto. Inicia-se, portanto,
com base numa reflexão, que toma por fundamento um conhecimento relacionado a
seres vivos. Desse ponto em diante, instaura um diálogo interdisciplinar, buscando
uma reconciliação entre a biodiversidade, a inovação e a economia. São duas as
possibilidades de condução do processo, do biomimetismo:
observar características em seres vivos com potencial para solucionar um
problema e retirar deles os ensinamentos para a concepção de projeto de
pesquisa;
15
haver uma demanda específica e, a partir dela, uma busca, nos seres vivos,
de algo que colabore para a solução da demanda.
Já o biomorfismo não objetiva a esse ganho, essa solução, tampouco é fruto
de intensa pesquisa multi, inter ou transdisciplinar, característica do biomimetismo.
Algo que tenha a forma de uma flor, por exemplo, mas que não seja mais eficiente
ou traga melhor desempenho em consequência dessa forma, será apenas
biomórfico, e não biomimético.
O biomimetismo, por ser uma metodologia focada em soluções sustentáveis,
é frequentemente utilizado em contextos de pesquisa em que há um sentido de
urgência relacionado aos efeitos das mudanças climáticas e à escassez de recursos
naturais. Esse sentido de urgência, essa percepção emergencial, advém, em grande
parte, da popularização das informações relativas à escassez de recursos e a
problemas ambientais, resultantes das atividades humanas. Contudo, a importância
dessas questões não se dá pela popularização das informações, mas pelos efeitos
deletérios que podem ocorrer devido à degradação ambiental resultante da
antropização, ou seja, resultante da ação do ser humano sobre o meio ambiente.
A emergência de encontrar soluções sustentáveis é evidenciada pela Agenda
211, endossada pelo Brasil durante a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio
Ambiente e Desenvolvimento (Cnumad) ou ECO 92, como ficou conhecida2. Da
Conferência, emergiram aspectos socioambientais, exortando o poder público, as
universidades, os centros de pesquisa e a sociedade civil em geral à proposição de
soluções e mudanças de paradigmas que contribuam para o desenvolvimento
sustentável, buscando um equilíbrio entre as crescentes demandas do ser humano e
a finitude dos recursos naturais disponíveis no planeta.
1
Documento assinado em 14 de junho de 1992, no Rio de Janeiro, por 179 países,
resultado da “Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento” –
Rio 92, podendo ser definida como um “instrumento de planejamento participativo visando
ao desenvolvimento sustentável”.
Disponível em:
http://www.meioambiente.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=25. Acesso
em: 19 maio 2017.
2
Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (Cnumad),
realizada em junho de 1992, no Rio de Janeiro. A reunião ficou conhecida como Rio-92,
Eco-92 ou Cúpula da Terra. Disponível em:
http://www.senado.gov.br/noticias/Jornal/emdiscussao/rio20/a-rio20/conferencia-rio-92-
sobre-o-meio-ambiente-do-planeta-desenvolvimento-sustentavel-dos-paises.aspx. Acesso
em: 19 maio 2017.
16
Se considerarmos o consumo do território que dá suporte às cidades no mundo
todo e observarmos a evolução da antropização apenas no território brasileiro,
constatar-se-á que a questão ambiental extrapola a territorialidade da cidade e
ganha contornos epidêmicos em toda a extensão do território nacional, mostrando
relevância quantitativa e qualitativa. Um estudo do IBGE (SANTOS, 2010) mapeou
as áreas antropizadas no Brasil, de 1950 a 2004. No período, há uma evolução para
quase a metade do território brasileiro antropizado, mostrando quão extensas são as
atividades humanas no País.
Figura 1 - Mapas comparativos de evolução da antropização no Brasil
Fonte: IBGE, 20103. S/e = sem escala; s/cg = coordenadas geográficas.
Os mapas acima mostram a evolução das áreas antropizadas, ou seja,
alteradas pela ação do ser humano, de 1950 a 2004. Eles não fazem distinção entre
os vários tipos de impactos causados pela ação humana. Dessa forma, sua visão
seria ainda mais pungente se sobrepuséssemos a eles um mapa de áreas
3
Disponível em:
ftp://geoftp.ibge.gov.br/atlas/nacional/atlas_nacional_do_brasil_2010/2_territorio_e_meio_a
mbiente/atlas_nacional_do_brasil_2010_pagina_104_evolucao_do_antropismo.pdf. Acesso
em: 23 maio 2017.
17
contaminadas, e outro, de áreas degradadas (desertificação, assoreamento, perda
de biodiversidade etc.), que são as realidades presentes na maioria das áreas
antropizadas.
A alteração do ambiente natural, evidenciada nos mapas do Atlas do IBGE,
mostra, quantitativamente, a relevância de buscar meios para um desenvolvimento
sustentável que minimize os impactos do desenvolvimento nas áreas antropizadas e
que, ao mesmo tempo, garanta qualidade de vida às populações, procurando
atender às suas necessidades.
Faz-se também necessária uma reflexão a respeito de espaço, território e
lugar. Para Duarte (2002), são três manifestações distintas dos fenômenos espaciais
e que não guardam relação hierárquica entre si nem apresentam qualquer
possibilidade de sobreposição. Tomemos o conceito de Milton Santos (1996) para
definir o espaço como “aquele cujos fixos e fluxos compõem o ambiente vivido pelos
seres humanos de forma coletiva". Duarte (2002) alega não haver lógica absoluta do
espaço, tampouco de espaço absoluto. O que existe, segundo ele, é uma relação
entre objetos, ações e seres humanos que pode ser compreendido como sendo o
ambiente construído. Para Rapoport apud Paz, 2014, essas relações definem o
ambiente construído, e são dadas por diferentes graus de permanência ou
estabilidade, chamados de fixos, semifixos e não fixos:
[...] Hall, que divide o espaço em três elementos por grau de
estabilidade: “fixos”, “semifixos” e “informais” (que Rapoport prefere
chamar de “não fixos”). Os fixos são aqueles de lenta modificação,
como a arquitetura. Os semifixos são modificados com maior
frequência, como móveis, cortinas, biombos, roupas, sinais, ícones e
jardins, e são responsáveis pela distinção funcional e simbólica dos
edifícios e espaços. Já os não fixos se relacionam com os ocupantes
do ambiente: suas relações espaciais em movimento (proxêmica),
suas posturas e posições corporais (cinésica), gestos dos braços e
mãos, expressões faciais, etc. Isto é, a comunicação não verbal do
corpo. (HALL; RAPOPORT, apud PAZ, 2014)4
A complexidade dos elementos que constituem o ambiente construído impõe a
necessidade de, por honestidade intelectual, diferenciar e circunscrever as
dimensões e características desses elementos, contextualizando-os. Dos fixos, que
compõem o ambiente construído, é a arquitetura que, notadamente nas cidades,
4
Disponível em: http://www.arqpop.arq.ufba.br/taxonomy/term/103. Acesso em: 23 maio
2017.
18
catalisa as atenções e organiza os espaços, determinando, em grande parte, a
qualidade do ambiente construído, qualificando-o. No capítulo 5 deste estudo serão
apresentados exemplos de biomimetismo que levarão em conta esses elementos
que compõem o ambiente construído, com ênfase na Arquitetura, por se tratar de
elemento-chave nas relações descritas por Duarte, Rapoport e Hall.
Uma vez feita a reflexão, é preciso tratar dos ambientes nos quais se dão
essas relações, que servem de palco para a construção do ambiente. Assim, quando
se fala de ambiente construído, é importante notar que existem diferenças entre
aquilo que é tido como natural e o que é visto como artificial ou construído. Para a
compreensão dessas diferenças, é útil, em primeiro lugar, esclarecer como a
legislação brasileira descreve a questão ambiental.
Segundo Farias (2016), a expressão “meio ambiente” foi difundida por leigos,
causando, em sua origem, estranheza ao mundo acadêmico, por serem palavras
sinônimas, ensejando uma redundância desnecessária. Porém, dado o uso
excessivo do termo, sobretudo pela mídia, acabou por ser adotado, tendo seu uso
consolidado e incorporado ao cotidiano, a despeito do pleonasmo e da sua
imprecisão.
[...] precisou a terminologia: “Art. 3º. Para os fins previstos nesta Lei,
entende-se por: I - Meio ambiente, o conjunto de condições, leis,
influências e interações de ordem física, química e biológica, que
permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas". (Política
Nacional do Meio Ambiente, apud FARIAS, 2016).
Ainda segundo o autor, o termo consagrou-se definitivamente com a
Constituição de 1988, de forma a abarcar um sentido o mais amplo possível. Note-
se que essa amplitude é motivada pela vontade de o legislador proteger ao máximo
o indivíduo, o cidadão, de forma que não fiquem de fora aspectos ligados às
inúmeras manifestações de cunho ambiental e suas relações com o ser humano.
Nesse sentido amplo, para efeito de atuação metodológica, foram destacados quatro
espectros distintos presentes no conceito de meio ambiente, recorrentes na literatura
de direito ambiental:
meio ambiente natural ou físico;
meio ambiente artificial ou construído;
meio ambiente cultural;
19
meio ambiente do trabalho.
Esses quatro espectros contidos na definição de meio ambiente ajudam a
definir ações mais adequadas à natureza de cada um deles, em suas diferentes
dimensões. A seguir, foram adaptadas5 de Farias (2016), de forma resumida, as
quatro definições de meio ambiente:
o meio ambiente natural é descrito na legislação brasileira como sendo
constituído pelos recursos naturais, como, por exemplo, o solo, a água, a
fauna e a flora em suas relações;
o meio ambiente artificial é composto por edifícios, espaços públicos
abertos ou fechados, dentre outros;
o meio ambiente cultural é concebido pelo conjunto formado pelo
patrimônio histórico, artístico, científico, em suas manifestações materiais
e imateriais, como danças, costumes, etc.;
o meio ambiente do trabalho é integrado por fatores que se relacionam
às condições do trabalho, como local, ferramentas, relação entre
trabalhadores e meio físico, tendo como objetivo a promoção de
condições adequadas de salubridade e incolumidade física e psicológica
dos trabalhadores.
Qualquer atividade de criação, produção e consumo de bens e de ambiente
construído que contribua, positivamente, para a resolução de algum problema em
um dos contextos acima descritos apenas poderá ter o status de sustentável, do
ponto de vista socioambiental, se contribuir para a manutenção das condições
5
Uma divisão de diferentes meios presentes no conceito de ambiente (natural, artificial,
cultural e do trabalho) constitui um facilitador metodológico para a aplicação da lei e
efetividade das ações dela decorrentes. Farias (2016) discorre em sua obra sobre as
diferenças existentes entre eles, evidenciando sua importância e recorrência na literatura
relacionada ao direito ambiental. Para o estudo de uma aplicação biomimética voltada a
uma oferta mais consona de espaço construído para com as necessidades da sociedade, é
preciso inicialmente estabelecer as bases teórico-conceituais por meio das quais se dará a
discussão e o encaminhamento dos estudos. Neste sentido, a definição de meio ambiente, e
a compreensão de que o espaço construído faz parte deste meio ambiente, são
fundamentais. Disponível em:
<http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=15
46>. Acesso em: 21 jun.2017.
20
socioambientais de qualidade por tempo indeterminado, pressuposto fundamental
para a sustentabilidade. Farias (2016), em sua pesquisa, aponta para uma série de
exemplos de problemas ocasionados pela ação do ser humano relacionados ao
meio ambiente.
Portanto, o meio ambiente é necessariamente algo que faz parte de
nossas vidas e de que também fazemos parte. Está no problema da
falta de esgoto sanitário, da falta de água, da energia elétrica, do ar
poluído, da qualidade dos alimentos, da disposição dos vários tipos
de lixo, do carro de som, dos panfletos dos políticos, da ventilação,
do ordenamento das praças e quarteirões, da higiene e segurança no
trabalho, do resguardo do patrimônio histórico e arqueológico, da
proteção às danças e costumes, da defesa dos animais e das
florestas, do transporte público, da arborização urbana, do consumo
verde, da industrialização adequada etc. (FARIAS, 2016, p. 2)
O aspecto histórico e mundial de inserção da produção do ambiente
construído nas relações econômicas, notadamente da produção de habitação,
constitui importante fator dentro da gênese do desenvolvimento do capitalismo pós-
Revolução Industrial. Isso acaba por gerar um modelo prescritivo, que neutraliza, em
grande parte, as possíveis tensões que possam surgir entre a sociedade e o capital
produtivo. Ao monopolizar a produção desse ambiente, opacifica-se um possível
olhar crítico sobre a questão, o que dificulta a construção de uma demanda, por
parte da sociedade, por novas abordagens que possam alterar o atual modelo de
produção.
Dialeticamente, a realidade descrita relacionada à produção do ambiente
construído não colabora para que surjam modelos mais adequados às atuais
necessidades dessa sociedade, ainda que as demandas estejam em estado de
latência, que contemplem aspectos sociourbanísticos ambientais. Se imaginarmos
alterar tal realidade, buscando novas abordagens na formulação de hipóteses que
tenham como premissa maior adequação da produção do ambiente construído,
talvez encontremos as demandas latentes, bem como as alternativas de novos
arranjos.
Essas abordagens devem estar submetidas a uma nova visão de
desenvolvimento e sistematização de critérios sociourbanísticos ambientais, bem
como à avaliação de desempenho do ambiente construído. Sua premissa é a de
viabilização de arranjos econômicos e produtivos capazes de contemplar as reais
necessidades da sociedade (sociourbanísticos ambientais), manifestadas
21
principalmente no encaminhamento de soluções às emergências ambientais ligadas
aos efeitos das mudanças climáticas, da escassez de recursos e das desigualdades
sociais.
Para que se compreenda a atual condição da produção de ambiente
construído, e de como essa produção não acompanhou o desenvolvimento das
pesquisas que ajudam a compreender os desafios da contemporaneidade, contudo,
é preciso fazer uma digressão. Aqui será útil resgatar aspectos de um passado
recente, no qual o atual estado da produção do espaço construído ainda sofre
influência, fornecendo um quadro a respeito das dificuldades de se alterar a
realidade relacionada à produção do espaço construído.
Nas décadas de 70 e 80, o Brasil buscou inovar na produção de habitações
de interesse social, com sistemas construtivos experimentais. Tal produção se deu
em ambiente pouco favorável à pesquisa, resultando numa situação de
desconfiança por parte dos agentes envolvidos (BORGES, 2008). Isso explica, em
grande parte, a manutenção de um arcabouço normativo fundamentalmente
prescritivo, associado à falta de efetividade na formulação de alternativas para o
enfrentamento do problema da falta de moradia nas grandes cidades. Lentamente,
essa realidade de incertezas relacionada à inovação na produção do ambiente
construído vem se alterando, com a adoção da norma de desempenho (NBR
15575)6 e com a implementação do Sistema Nacional de Avaliações Técnicas
(SINAT7), órgão criado pelo Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade no
Habitat (PBQP-H8) para a avaliação de novos sistemas construtivos (CHIEPPE,
2013).
O novo cenário normativo permite, em tese, do ponto de vista tecnológico e
legal, uma evolução das técnicas para a produção de habitação e, por conseguinte,
do ambiente construído, abrindo espaço para novas abordagens. Entretanto, é
preciso reconhecer que a discussão é ainda muito circunscrita à realidade das
últimas décadas a respeito da qualidade do ambiente construído, com uma visão
fortemente pautada pelos principais atores do mercado imobiliário, e não por todos
6
NRB 15575 Disponível em: < http://www.cbic.org.br/sites/default/files/NBR%2015575%20-
%20Novos%20%20padr%C3%B5es%20de%20qualidade%20para%20constru%C3%A7%C
3%A3o%20de%20casas%20e%20apartamentos.pdf.> Acesso em: 11 jun.2017.
7
SINAT. Disponível em: < http://pbqp-h.cidades.gov.br/. Acesso em: 11 jun. 2017.
8
PBQP-H. Disponível em: <http://pbqp-h.cidades.gov.br/>. Acesso em: 11 jun. 2017.
22
os atores políticos, econômicos, ambientais e sociais que poderiam e deveriam atuar
nessa discussão.
Atualmente, o Brasil tem uma única forma de avaliação de desempenho para
o ambiente construído, que está prevista na NBR 15.575, direcionada a edifícios
residenciais, que observa uma série de aspectos de desempenho de todo o edifício,
dividindo-o em sistemas e subsistemas, em seis partes, como segue:
parte 1 - requisitos gerais;
parte 2 - requisitos para sistemas estruturais;
parte 3 - requisitos para sistemas de pisos internos;
parte 4 - requisitos para os sistemas de vedações verticais internos e
externos;
parte 5 - requisitos para os sistemas de coberturas.
parte 6 - Requisitos para os sistemas hidrosanitários.
Não há, nessa NBR, a avaliação de nenhum conceito sistêmico que relacione
o edifício à sua inserção em um enredamento sociourbanístico ambiental passível de
melhorar as condições de eficiência ou de inter-relação com vários atores sociais.
Quase não se observam fluxos e a ideia de serviços ambientais prestados por esses
ambientes construídos inexiste. Por mais que seja correto afirmar que a observação
dos dados objetivos de desempenho individual de um determinado elemento do
ambiente construído possa gerar a melhoria do conjunto, ou seja, um edifício com
melhor desempenho irá, hipoteticamente, produzir uma cidade melhor, os
pressupostos para que haja efetividade na afirmação estarão em arranjos
complexos, que extrapolam o que pode estar contido na legislação brasileira
atualmente.
É nesse contexto que o biomimetismo, que será melhor apresentado mais
detidamente no presente estudo, pode ser um campo do conhecimento ou
metodologia útil para a formulação de hipóteses que tenham força suficiente para
gerar inovação e, quiçá, a quebra de paradigmas. A esse respeito, Piana (2012)
comenta o que seria a verdadeira inovação. Cita o biomimetismo como a
identificação de uma solução completamente nova, capaz de exercer a função à
qual se propõe e reduzindo os problemas apresentados pelas tecnologias
23
disponíveis até seu momento anterior. Segundo o autor, não há real inovação nas
tecnologias que apenas otimizem o funcionamento desempenhado por uma
tecnologia precedente.
Para exemplificar sua afirmação, o autor compara o biomimetismo ao conceito
The theory of inventive problem solving, ou TIPS, como sendo uma metodologia
focada em soluções de inovação por uma tecnologia precedente. Diferentemente
dos modelos russos adotados no desenvolvimento do TIPS e seus congêneres, o
biomimetismo apresenta-se como uma metodologia altamente interdisciplinar, que
estabelece resultados com base em intensa troca entre vários campos do
conhecimento, permitindo, a priori, uma real inovação focada na sustentabilidade.
É importante salientar que a característica interdisciplinar do biomimetismo,
base para a inovação destacada por Piana (2012), deve ser executada,
considerando-se os limites impostos pela natureza distinta das diferentes áreas do
saber, notadamente com relação à Biologia, ao design, à Arquitetura e ao
Urbanismo, focos desta pesquisa. Na Biologia, por exemplo, o objeto de estudo
possui um caráter notadamente amoral, constituindo-se, já na origem, um fator
limitador que pode inviabilizar muitas das transposições conceituais entre a Biologia
e a Sociologia aplicada, ainda que a própria natureza ofereça soluções tecnológicas
surpreendentes. Assim, o caráter ético relaciona-se, antes à prática profissional do
pesquisador, em seus desdobramentos deontológicos, do que ao objeto de estudo.
Deriva, da referida prática, a bioética, como um campo que estuda os problemas e
as implicações morais relacionadas às pesquisas científicas, desde sua origem e
metodologia até o uso social que se faz com o conhecimento adquirido. Silva (2005)
aponta, em seus estudos, muitas das limitações que historicamente mostraram-se
negligenciadas, voluntária ou involuntariamente, nesse campo.
A ideia de naturalismo e biologização das cidades na constituição do meio
ambiente urbano é um exemplo apontado pelo autor como falha epistemológica,
uma vez que está baseada em conceitos que estão fundamentalmente em conflito
com uma série de acordos estabelecidos nas sociedades ocidentais democráticas,
como o estado de direito e a garantia das liberdades individuais. Ainda segundo
Silva (2005, p. 10):
Verificou-se uma surpreendente permanência da abordagem
organicista do urbano, reformulada em novos termos e com a
incorporação de uma linguagem supostamente inovadora. O
24
organicismo possui uma história longa e controversa (...). Essa
abordagem acabara por constituir um paradigma teórico dentro do
qual sucessivas gerações de planejadores foram formadas. Seus
pressupostos acabaram adotados sem que suficientes investigações
teórico-conceituais tivessem sido levadas a efeito.
Uma biologização ou um naturalismo aplicado à ideia de ambiente urbano
podem encerrar, em si, uma desumanização pela perda dos aspectos identitários,
formadores da base dos processos de pertencimento, tão importantes na produção
do espaço construído. Para Santos (2007, p. 37),
A atividade econômica e a herança social distribuem os homens
desigualmente no espaço fazendo com que noções como rede
urbana ou sistema de cidades não tenham validade
para a maioria das pessoas.
Isso significa que se os sistemas de cidades não têm validade para a maioria
das pessoas, elas estão fora da ideia de pertencimento. Do ponto de vista da
biomimética, não será ela a produzir uma desumanização da construção do
ambiente construído, mas os fatores citados por Santos (2007), juntamente com o
postulado por Silva (2005). Para este último, são fatores historicamente relegados,
intencionalmente ou não, gerando uma abordagem desumanizada.
Na maioria das abordagens apresentadas, o manejo da cidade
concebida como ecossistema torna-se uma questão eminentemente
técnica: trata-se de regular os fluxos de energia (ou de “informação”),
os ciclos de matéria, adequando os níveis de produção e consumo
da cidade como um todo (obscurecendo, desta forma, as
desigualdades no acesso a um e outro por diferentes segmentos
sociais) aos requisitos ecológicos da “capacidade de suporte” do
ecossistema frente às pressões exercidas por um crescimento
populacional caracterizado como “descontrolado”. (SILVA, 2005, p.
210).
A explanação se fez necessária, na medida em que há uma crença difusa de
que a biologização e o naturalismo aplicados à ideia de ambientes urbanos são, de
fato, aspectos biomiméticos da produção do ambiente construído. Isso não
corresponde às linhas de pesquisa atuais, apontadas neste estudo, de vários
centros de inovação em diferentes países. Nenhuma delas associa uma visão
estruturalista ao biomimetismo, sendo, em sua grande maioria, circunscritas a
inovações tecnológicas que atendam a demandas específicas postas pela
sociedade, fortemente ligadas à escassez de recursos.
25
As limitações relacionadas à transposição de conceitos entre a natureza e a
pesquisa, são, provavelmente, do ponto de vista metodológico, o aspecto mais
sensível para uma abordagem bioinspirada. Há que se observar, por exemplo, a
necessidade de se ter o cuidado em não transpor conceitos biológicos descritos na
Sinecologia9 para o Urbanismo. Nesse caso, tratar-se-ia de ignorância ou
desonestidade intelectual, uma vez que essa transposição traz, como consequência,
aspectos antiéticos. Não se trata, tampouco, de abandonar uma hierarquia de
valores, na qual o bem coletivo suplanta o individual, base de muitas conquistas
democráticas, presente inclusive na legislação ambiental. Faz-se necessário buscar
o equilíbrio, para que também, em outro extremo, não se encontre a ditadura da
maioria, que vá abolir direitos individuais e ignorar minorias, com sua lógica
comunitária de “colônia humana”, equiparada a uma “colônia de insetos”.
O estudo dinâmico, incluindo alternativas teóricas, fluxos de massa e
de energia em um sistema como unidade morfológica e funcional,
deu origem à sinecologia, em que as populações (e não os
indivíduos) passam a ter relevância metodológica. (BRANCO,
1995)10.
A observação de fluxos de informação, de massa e de energia em ciclos de
vida presente no espaço construído não determina, por si só, um obscurecimento
das desigualdades ao acesso aos recursos nas cidades por suas populações. A
inobservância desses fluxos tampouco garante acesso igualitário e democrático aos
bens e serviços disponíveis. Trata-se, portanto, de uma atuação conjunta com todo o
referencial teórico disponível das Ciências Sociais aplicadas, para que as melhores
práticas relacionadas à democratização e à humanização da produção do ambiente
construído sejam garantidas.
As ações de natureza legal-institucional e os movimentos sociais
ambientalistas têm, como base, o dever moral para com a sociedade de manter o
equilíbrio apontado, por ser vital à sobrevivência da humanidade. Em última análise,
são ações que precisam ter como princípio norteador a melhor qualidade de vida
para a espécie humana como um todo, sem que haja desequilíbrio do meio.
9
Sinecologia: ramo da Ecologia que estuda as inter-relações entre as comunidades de
seres vivos e o meio ambiente.
10
Disponível em: http://dx.doi.org/10.1590/S0103-40141995000100014. Acesso em: 11 jun.
2017.
26
Segundo Branco (1995), alguns desses movimentos podem configurar-se como
extremistas, seja em relação à religião ou a grupos político-partidários
fundamentalistas, por exemplo. Nesses casos, a capacidade lógica e as
delimitações conceituais frequentemente se perdem em favor de ideologias místico-
idealistas ou visionárias, resvalando ou adentrando os limites do fanatismo, o que
Delattre (apud Branco,1995) chama de uma espécie de paixão pelo dever.
A politização democrática do tema pode fornecer o devido antídoto ao risco
estruturalista ou outro ranço ideológico do passado que possa contaminar uma
abordagem bioinspirada. Atualmente, a produção do ambiente construído é
determinada apenas em tese por critérios sociourbanísticos ambientais aplicáveis ao
ambiente construído. Não se observam interesses coletivos da sociedade brasileira
em produzir uma legislação que exija uma visão sistêmica, capaz de produzir efeitos
em toda a sociedade, de acordo com os atuais níveis de conhecimento em matéria
de sustentabilidade sociourbanístico ambiental. E, ao mesmo tempo, contemplando
a indispensabilidade de pertencimento da população, bem como suas demandas por
ambientes inclusivos em seu mais amplo sentido. A produção do ambiente
construído é apenas parte do problema sociourbanístico ambiental. A produção de
bens de consumo, o uso de energia pela sociedade, a geração de resíduos e o
abastecimento e saneamento das cidades e suas atividades formam um
enredamento complexo, com enormes fluxos que são, atualmente, insustentáveis e
ineficientes.
A legislação vigente, produzida pelos três níveis governamentais presentes no
Brasil, somada às normativas (NBRs) e às resoluções federais (Conama), além das
convenções internacionais das quais o Brasil é signatário, produz, quando
respeitada, um ambiente construído aquém das reais necessidades da sociedade. É
importante destacar que, ainda assim, são muito mais atendidos os interesses da
indústria da construção civil e do mercado imobiliário, do que os reais interesses da
sociedade, que precisa usufruir de um ambiente construído adequado às suas
necessidades e, portanto, de qualidade. O atendimento das demandas sociais está
diretamente relacionado ao artigo 225 da Constituição Federal de 1988:
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem
de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo
e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
27
É preciso reconhecer tratar-se de um direito, por natureza, difuso e coletivo.
Ele traz, em seu bojo, uma série de desdobramentos e garantias às pessoas que
estiverem em solo nacional.
O Brasil possui, ainda, como exemplo de legislação ambiental, uma política
nacional de resíduos sólidos (PNRS11), instituída em 2010, que busca prevenir e
reduzir a geração de resíduos com práticas de consumo mais conscientes e
consonantes com as atuais demandas em matéria de meio ambiente. A lei prevê o
incentivo à reciclagem e ao reuso, além do controle e da dispersão criteriosa do que
não puder ser reciclado ou reutilizado. A logística reversa também é incentivada na
lei, que é a possibilidade de desmonte e destinação criteriosa de bens de consumo.
Vale ressaltar que a lei determina que a responsabilidade seja compartilhada
pelos geradores de resíduos, consumidores e fabricantes. É preciso observar em
que medida essa lei é aplicada ao ambiente construído, que sabidamente é gerador
de resíduos. Isso porque, mesmo tendo um conjunto de leis abrangente, o Brasil
carece de mecanismos que atualizem sua legislação, de acordo com os avanços da
ciência em matéria relacionada.
A criação da lei que institui a PNRS vem no sentido de encaminhar um
problema que é gravíssimo: o destino dos resíduos sólidos urbanos. O consumo nas
cidades brasileiras vem se elevando e a produção de lixo é, do ponto de vista
ambiental, um problema muito difícil de ser resolvido. Para que se possa ter uma
ideia, até mesmo os países mais desenvolvidos do mundo têm enorme dificuldade
em dar soluções efetivas para a questão, sendo que muito do lixo produzido na
Europa e nos Estados Unidos da América (EUA) é descartado sem o devido
tratamento.
11
Política Nacional de Resíduos Sólidos. Disponível em:
<http://www.mma.gov.br/pol%C3%ADtica-de-res%C3%ADduos-s%C3%B3lidos.> Acesso
em: 11 jun. 2017.
28
Fotografia 1 - Lixo em Nápoles
Fonte: Antonio Galdo (2013). Disponível em: <http://www.nonsprecare.it/rifiuti-a-napoli-olanda-
smaltimento>. Acesso em: 10 jun. 2017.
O quadro descrito acima evidencia a existência de um cenário de grandes
desafios relacionados às questões ambientais, sociais e urbanísticas. Tendo
consciência da magnitude desse desafio, o presente trabalho tem como principal
propósito realizar o estudo do biomimetismo e sua possível aplicação ao
desenvolvimento e à sistematização de critérios sociourbanísticos ambientais,
visando à sua melhoria, por meio da avaliação de desempenho do ambiente
construído.
29
2 MÉTODOS E TÉCNICAS
No presente capítulo, serão tratadas as considerações preliminares da
pesquisa. A descrição de cada uma das etapas do estudo será feita após a
apresentação de um fluxograma, que ilustra a relação entre elas, a saber: revisão
bibliográfica: levantamento de dados secundários; levantamento histórico da
bioinspiração e contextualização do biomimetismo e do ambiente construído;
levantamento de aspectos caracterizadores e contextualizadores que permitiram a
conceituação de biomimetismo e diferenciação com o bioformismo; prospecção de
conceitos e tecnologias; levantamento de resultados de pesquisas biomiméticas na
arquitetura e considerações críticas; exemplos de biomimetismo em tecnologias
aplicadas e na Arquitetura; descrição de critérios de avaliação de qualidade e
desempenho; e conclusão.
2.1 Considerações preliminares
A pesquisa seguiu um fluxo que possibilitou um olhar sobre a história e a
evolução das maneiras que o ser humano encontrou, através dos tempos, de buscar
soluções inspiradas na natureza, notadamente nos seres vivos, a chamada
bioinspiração. O caminho metodológico foi trilhado a fim de que esse aspecto
histórico perpassasse toda a pesquisa e trouxesse elementos que pudessem
contribuir para o futuro do biomimetismo, considerando as necessidades emergentes
do ser humano, as novas demandas e também os impactos sobre a natureza, que
devem ser avaliados criteriosamente. O fluxograma que segue ilustra esse caminho
percorrido até as considerações finais.
30
Figura 2 – Fluxograma da pesquisa
1 2
Revisão bibliográfica: Levantamento histórico da
levantamento de dados bioinspiração e contextualização do
secundários biomimetismo e do ambiente
construído
4
Prospecção de
\ conceitos e
tecnologias
biomimetismo
3
Levantamento de
aspectos
caracterizadores e
5 contextualizadores
Levantamento de que permitiram a
resultados de pesquisas conceituação de
biomiméticas na biomimetismo e
arquitetura e diferenciação com o
considerações críticas bioformismo
6 7
Exemplos de Descrição de critérios de
biomimetismo em avaliação de qualidade e
tecnologias aplicadas e na desempenho e
arquitetura considerações críticas
8
Conclusão
31
2.1.1 Revisão bibliográfica: levantamento de dados secundários
A metodologia utilizada nesta dissertação teve início com a revisão
bibliográfica, que possibilitou a coleta de informações necessárias para configurar o
contexto histórico no qual se insere o biomimetismo.
2.1.2 Levantamento histórico da bioinspiração e contextualização do biomimetismo e
do ambiente construído
O processo de levantamento histórico favoreceu a observância de como as
práticas do que hoje chamamos de biomimetismo foram evoluindo através dos
tempos, destacando-se as principais abordagens e autores, primeiro ligados à
bioinspiração e, em seguida, ao biomimetismo.
2.1.3 Levantamento de aspectos caracterizadores e contextualizadores que
permitiram a conceituação de biomimetismo e diferenciação com o bioformismo
A observância do contexto histórico foi norteada por aspectos
caracterizadores e contextualizadores, relacionados dialeticamente. Tal condição
permitiu que, não apenas fosse possível conceituar o biomimetismo através dos
tempos, como também diferenciá-lo do conceito de biomorfismo.
2.1.4 Prospecção de conceitos e tecnologias
Na sequência, passou-se à fase de prospecção de conceitos e tecnologias. O
parâmetro para essa prospecção foi selecionar o que pode, em tese, ser utilizado
para o incremento da qualidade dos ambientes construídos em seus aspectos
sociourbanísticos e ambientais. Para tal, foram elencados, como referência,
determinados critérios, como eficiência energética, atuação para a economia de
recursos naturais, diminuição dos custos de produção para a garantia de maior
acesso à habitação, ao saneamento, a energias limpas e mais baratas, salubridade
do ambiente construído, democratização do acesso a bens, etc.
32
2.1.5 Levantamento de resultados de pesquisas biomiméticas na Arquitetura e
considerações críticas
Como foi explanado, o aspecto histórico esteve presente em todo o decorrer da
pesquisa. O olhar a respeito os resultados de pesquisas biomiméticas levantaram
questões importantes para a reflexão, quanto à ética, ao uso consciente do meio
ambiente como fonte finita para atender às demandas do ser humano e as
adaptações bioinspiradas.
2.1.6 Exemplos de biomimetismo em tecnologias aplicadas e na Arquitetura
Há tecnologias aplicadas e Arquitetura que utilizam modelos inspirados na
natureza, notadamente nos seres vivos, ou seja, bioinspirados, para solucionar
problemas e assegurar melhor qualidade de vida aos seres humanos. Assim, os
exemplos bem-sucedidos devem servir de inspiração e fizeram parte do caminho da
trajetória do presente estudo.
2.1.7 Descrição de critérios de avaliação de qualidade e desempenho
A literatura oferece base para que seja possível criar modelos que considerem
tanto as necessidades do ser humano quanto o devido respeito ao meio ambiente e
às fontes de recursos naturais. Dessa forma, um elenco de critérios que permitissem
avaliar qualidade e desempenho foi uma decorrência natural da pesquisa. Esse
elenco determinou uma série de reflexões quanto aos desdobramentos, inclusive na
prática do ensino relacionado à Arquitetura e ao design, gerando as considerações
críticas.
2.1.8 Conclusão
O trabalho foi concluído observando-se que são muitos os desafios para que o
biomimetismo se consolide como um campo do conhecimento voltado à aplicação
para o desenvolvimento e a sistematização de critérios sociourbanísticos ambientais
na melhoria da qualidade e avaliação de desempenho do espaço construído,
principalmente da Arquitetura. Com essa reflexão, consolidou-se o encerramento da
dissertação, que contou com as devidas considerações finais.
33
3 BIOMIMETISMO: UMA ABORDAGEM HISTÓRICO-TEÓRICA
No decorrer do presente estudo, foi constante a observância dos contextos
históricos nos quais os conceitos aqui tratados estão inseridos. Isso porque nenhum
conceito nasce ao acaso, mas é fruto de aspectos econômicos, políticos, sociais e
culturais que determinam os anseios, o pensamento e as necessidades da
sociedade numa dada época. Dessa forma, este capítulo tratará do processo
histórico do tema em pauta, de maneira que fiquem ressaltados os principais
aspectos que circundam o tema, entremeado num panorama maior no qual as
fronteiras entre o biomimetismo e a história se tornam mais suaves, posto que são
fronteiras artificiais e que nos servem tão somente com objetivo didático.
Embora a Biomimética seja relativamente nova, tendo destaque principalmente
a partir da segunda metade do século XX, a natureza é fonte de inspiração para os
seres humanos, que dela fazem parte, desde que começaram a observá-la. Seria,
portanto, imprecisa qualquer datação desse momento extraviado na história da
humanidade em que o ser humano observou a natureza e nela se inspirou para criar
algo, com o intuito de se obter um benefício.
Assim, é necessário começar pelo que há de conhecimento a respeito dessa
fonte de inspiração. O primeiro registro de bioinspiração focada na solução de um
problema se encontra no rico período do Renascimento12, mais especificamente com
Leonardo di Ser Piero da Vinci, ou, simplesmente, Leonardo da Vinci (1452 – 1519),
uma das figuras mais importantes do período, e tido como um dos maiores gênios
da humanidade. Embora seja mais conhecido como pintor, especialmente pelas
obras Mona Lisa e A última ceia, Leonardo destacou-se também como escultor,
inventor, matemático, cientista, anatomista, arquiteto, músico, botânico e arquiteto, o
que faz dele uma das mentes mais brilhantes já produzidas na história.
Para Leonardo da Vinci, a natureza foi inequívoca inspiradora. Faz-se
necessário contextualizar o cenário social e cultural em que viveu, o qual foi o pano
de fundo, o substrato para o mestre florentino desenvolver seus estudos
bioinspirados. O Renascimento surgiu na Itália, especialmente na cidade de
12
Movimento intelectual e artístico surgido na Itália, entre os séculos XIV e XVI, e daí
difundido por toda a Europa. Disponível em:
<http://enciclopedia.itaucultural.org.br/termo3637/renascimento>. Acesso em: 05 jun. 2017.
Verbete da Enciclopédia.
34
Florença, e foi indubitavelmente um dos mais importantes marcos da história da
humanidade.
No período, o ser humano torna-se protagonista, em contraposição à visão
medieval do mundo que até então dominava o pensamento da época. É quando
nasce o antropocentrismo, que traz o ser humano como centro do universo,
superando o teocentrismo, a ideia de Deus como figura central. Esse divisor de
águas histórico é muitas vezes mal compreendido e pode levar a crer em uma
suposta superioridade das contribuições e avanços da Renascença com relação à
Idade Média13. Por motivos de honestidade intelectual, é preciso reconhecer que a
Idade Média produziu as bases para o desenvolvimento observado na Renascença,
ou seja, houve um percurso histórico contínuo, como, de resto, em todos os outros
períodos antecedentes e subsequentes.
No ano de 1202, o Livro do Ábaco (Liber Abacci), escrito por Leonardo da Pisa
(1175 – 1250) – depois identificado como Leonardo Fibonacci -, expôs uma
sucessão matemática em que cada número é obtido somando-se os dois últimos
dígitos, ou seja, 1, 1 (1+1) 2, (2+1) 3, (3+2) 5, (5+3) 8, (8+5) 13, (13+8) 21, numa
sequência infinita. Fibonacci contribuiu decisivamente para o desenvolvimento da
Matemática na Europa, e esses números em série ficariam conhecidos como
Sequência de Fibonacci.
A Sequência de Fibonacci gerou inúmeros estudos como desdobramento.
Talvez o mais conhecido seja a Proporção Áurea ou o Número de Ouro, que
demonstra a simetria existente na natureza, que, de forma recorrente, se apresenta
como solução natural presente em várias espécies e na natureza em geral. A
“marca” pode ser observada em fenômenos naturais, como furacões; nos seres que
compõem a natureza, como árvores, flores, ondas, nas faces de seres humanos e
de animais e numa sequência de DNA, por exemplo.
A Proporção Áurea é uma constante real algébrica representada pela letra
grega Φ (phi ou fi), em homenagem ao escultor Phideas (Fídias), que a teria
utilizado para conceber o Parthenon, com o valor aproximado de 1,618. A Proporção
Áurea está presente em toda a natureza e é utilizada na arquitetura, no design e nas
artes como forma de se buscar equilíbrio e harmonia. Muito da produção
13
Período entre os séculos V e XV que tem início com a Queda do Império Romano do
Ocidente e termina durante a transição para a Idade Moderna. Disponível em: <
http://www.meuportalacademico.com.br/wp-content/uploads/2013/04/Dicionario-da-Idade-
Media-H.-R.-Loyn.pdf.> Acesso em: 11 jun. 2017.
35
biomimética, que veremos mais adiante, buscou na Proporção Áurea uma solução
para funções, nem sempre corretamente atendidas pela forma baseada na
sequência de Fibonacci, pelo simples fato de que, para questões de desempenho
ligadas a seres vivos, essas soluções se consolidaram em milhões de anos, e
transpô-las para objetos ou para a arquitetura de forma não gratuita é um exercício
de monta.
E importante salientar que a bioinspiração é precursora do biomimetismo.
Enquanto a bioinspiração é relacionada a todo o ambiente natural, seja ele vivo ou
não, o biomimetismo baseia-se na manifestação viva da natureza. A sequência de
Fibonacci, verificada na natureza, é uma manifestação muito mais das leis da Física,
que permeiam a existência do próprio universo, do que uma solução de
desempenho produzida ou manifestada em seres vivos. A vida desenvolveu-se
buscando adaptar-se e manter-se no tempo, submetida a essas leis primordiais e,
muitas vezes, exibindo formas análogas às manifestações descritas pela sequência
que viabilizaram sua existência. Outras o fizeram também por meio de tecnologias,
como a fotossíntese, exemplo primoroso de armazenamento de energia, muito mais
eficiente do que as baterias de íons de lítio que produzimos atualmente. A título de
curiosidade, e antecipando um pouco a discussão diretamente ligada ao
biomimetismo, um quilo de açúcar é capaz de permanecer por anos como fonte de
energia, a baixo custo relativo e com baixo impacto ambiental, e não tem, em sua
forma (excetuando-se no DNA da planta que o produziu), a forma típica da
sequência em questão. Veremos esses aspectos mais adiante; neste momento,
voltemos à Renascença.
O Renascimento traz um novo pensamento, mais científico e empírico, a
respeito do ser humano e a natureza que o rodeia, marcando profundamente as
ciências e as artes. A obra do pintor, arquiteto e teórico Giorgio Vasari (1511-1574)
constitui uma das principais, senão a principal, fonte de informação acerca da arte
renascentista italiana. O historiador suíço Burckhardt (181-1897)14 (1991) define o
período como de grande florescimento do espírito humano, como a "descoberta do
mundo e do homem". Essa ideia de descoberta do mundo, a que se refere
Burckhardt, é evidenciada na observação da natureza como inspiração, não apenas
14
A cultura do Renascimento na Itália, de Jacob Burckhardt (1818-1897), foi publicado
originalmente em 1867.
36
para as artes, mas também pela vontade de compreender os fenômenos nela
contidos, que podem ser considerados precursores do biomimetismo.
Nas artes, no período renascentista destacam-se obras de artistas como
Michelangelo Buonarroti (1475-1564), Rafael (1483-1520) e Donatello (1386- 1466),
para citar apenas alguns exemplos da vasta produção da época. No campo da
ciência, o desenvolvimento de pesquisas oferece subsídios para a produção de
novos métodos e técnicas.
A perspectiva, impulsionada por Filippo Brunelleschi (1377-1446) e
descrita por Leon Battista Alberti (1404-1472) no tratado Della
Pittura (1435), altera de modo radical os modos de representação e
as concepções de espaço. A nova ciência da perspectiva é colocada
em prática por uma série de artistas. Masaccio (1401-1428) é
considerado exímio na aplicação das conquistas científicas à arte da
representação. A primeira obra a ele atribuída, o tríptico de San
Giovenale (Uffizi, Florença, 1422), é exemplar de como conseguir
criar um sentido coerente de terceira dimensão sobre a superfície
bidimensional. (RENASCIMENTO. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural
de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2017. Verbete
da Enciclopédia).
Como assinalado anteriormente, talvez o nome mais emblemático do
Renascimento, pela abrangência de seu trabalho, que vai desde obras de arte
célebres, passando por invenções e estudos anatômicos e da natureza, seja
Leonardo da Vinci. Embora a humanidade tenha buscado inspiração na natureza
antes dele, a chamada bioinspiração, foi Leonardo o primeiro a utilizá-la de forma
sistemática e metódica e com o devido rigor científico e focado na solução de
determinados problemas. A bioinspiração permite, no futuro, o desenvolvimento de
novas tecnologias capazes de auxiliar na solução de problemas, com a finalidade de
aprimorar algum aspecto da vida humana.
Leonardo inicia sua pesquisa muito jovem, mas é a partir de 1482
(GIORGIONE& BOUCHERON, 2014) que seu interesse pelo voo o direciona à
natureza e aos pássaros. No livro intitulado Leonardo Da Vinci – Natureza e a
Invenção, os autores discorrem a respeito da relação de Leonardo com a
observação da natureza e suas invenções. Em 1490, Leonardo desenha o Homem
Vitruviano. Trata-se de uma obra de extremo valor simbólico, uma vez que
exemplifica, de forma eloquente, como seu olhar para aquilo que é natural - no caso,
o ser humano -, se dá de forma sistematizada. Pode-se asseverar, por meio do seu
desenho, que Leonardo busca compreender e estabelecer como existem limites que
37
são estabelecidos de acordo com uma lógica perfeita; são limites matemáticos que
se relacionam com algum propósito, ou seja, o autor busca determinar a essência da
relação entre forma e função, que é fruto da evolução.
Figura 3 - Homem Vitruviano
Fonte: Leonardo da Vinci (1490). Disponível em:
<https://pt.wikipedia.org/wiki/Escala_humana.>. Acesso em: 11 jun. 2017.
38
Na atualidade, essa relação de limites determinados por forma e função é a
pauta das modelagens algorítmicas da parametrização. Leonardo começou a
observar a natureza como maneira de resolver problemas de ordem muito prática,
intuindo que ela já havia resolvido muitas questões. Hoje sabemos, graças a Darwin
(1809-1882), que isso ocorreu por meio da evolução. O rigor com que Leonardo
tratou o tema o coloca seguramente entre os pioneiros da abordagem, senão o
primeiro. Pode, assim, ser considerado um dos patronos do biomimetismo.
Leonardo era fascinado pela ideia de poder transpor as formas da natureza
para uma máquina que pudesse fazer o ser humano voar. Seu trabalho era
metódico: a observação, o desenho, as medidas e a experimentação andavam
juntos o tempo todo. É por isso que suas máquinas voadoras não resultam de uma
intuição romântica; elas derivam de um trabalho contínuo e cada vez mais rigoroso,
fundamentado em estudos práticos e mecânicos para conseguir formular uma teoria
global a respeito do voo. Leonardo associou a observação da natureza e dos
pássaros ao estudo e ao experimento, aplicando seus conhecimentos em física e
mecânica. Também projetou instrumentos de medição que lhe permitiram entender
melhor as condições dos meios indispensáveis ao voo (GIORGIONE &
BOUCHERON, 2014).
Em sua busca de uma máquina voadora, Leonardo utilizou sua capacidade de
observação para procurar compreender, como fenômeno mecânico, o que fazia com
que os pássaros voassem. Deixou farta documentação a respeito de suas ideias e
experimentos, muitas delas tipicamente biomiméticas. Ao estudar as possibilidades
de se planar com objetos voadores, afirmou que:
[...] O milhano e outras aves que batem pouco as asas procuram o
curso do vento, e quando o vento reina nas alturas, então nós os
vemos em grande altitude, e se ele reina a baixa altitude, eles voam
a baixa altitude. (GIORGIONE &BOUCHERON, 2014, p.93).
39
Figura 4 - Mecanismo voador davinciano
Fonte: Giorgione&Boucheron (2014, p.78).
Assim, Leonardo da Vinci marca profundamente, com sua produção científica e
artística, a Renascença. Seu interesse científico, que o motivou à produção
sistematizada de estudos a respeito de animais e dimensões humanas, ocorre,
portanto, no contexto antropocentrista. Por ter essa produção um caráter
notadamente biomimético, que sistematiza e se desenvolve em um processo que se
inicia com a observação da natureza e de suas possíveis contribuições como
inspiração para a solução de problemas, é que o presente estudo o destaca como
ponto inicial no período.
Se o Renascimento marcou a história e pode ser considerado o início do
biomimetismo, o século XVIII trouxe transformações profundas e fundamentais ao
pensamento humano e à forma de se relacionar com a natureza, à maneira de fazer
política, de tratar a economia e, basicamente, de encarar a própria definição de
humanidade. Embora não haja consenso acerca de seu início, a maioria dos autores
aceita que o século XVIII foi o marco inicial do Iluminismo, ou o chamado Século das
Luzes.
O Iluminismo foi um movimento intelectual europeu, cujo principal berço foi a
França. Tendo como eixo central a razão, entre suas inúmeras expressões e
40
tendências, procurou um conhecimento profundo e detalhado da natureza, a fim de
torná-la útil ao ser humano. Foram grandes personalidades do Iluminismo o filósofo
holandês Baruc Spinozza (1632-1677), o filósofo inglês John Locke (1632-1704), o
filósofo e escritor francês Pierre Bayle (1647-1706) e o cientista e matemático inglês
Isaac Newton (1643-1727), por exemplo.
O movimento acreditava na capacidade que os seres humanos tinham de agir
para tornar o mundo um lugar melhor e mais justo. O Iluminismo influencia uma série
de mudanças que permeiam a contemporaneidade, como a Declaração dos Direitos
do Homem, a Declaração de Independência dos Estados Unidos e a Revolução
Francesa15, marco na história da humanidade e fortemente inspirada por ideais
iluministas. O filósofo Immanuel Kant (1727-1804) definiu o Iluminismo da seguinte
maneira:
O iluminismo representa a saída dos seres humanos de uma
tutelagem que estes mesmos se impuseram a si. Tutelados são
aqueles que se encontram incapazes de fazer uso da própria razão
independentemente da direção de outrem. É-se culpado da própria
tutelagem quando esta resulta não de uma deficiência do
entendimento, mas da falta de resolução e coragem para se fazer
uso do entendimento independentemente da direção de outrem.
Sapere aude! Tem coragem para fazer uso da tua própria razão! -
esse é o lema do iluminismo. (KANT apud TALLARICO; BRITO,
2014, p. 108).
Um dos pressupostos caros ao Iluminismo era fazer uso da razão em prol da
sociedade, com grande ênfase na ideia de progresso por meio do conhecimento
racional. Na esteira da revolução científica do século XVII, o Iluminismo baseou-se
nas concepções mecanicistas da natureza e inspirou-se em modelos de estudo dos
fenômenos físicos para tentar aplicá-los na compreensão de fenômenos sociais e
culturais. Tendo o uso da razão em prol da humanidade e a natureza como um
verdadeiro observatório, a ideia de bioinspiração se fortalece no período entre os
séculos XVIII e XIX, quando novamente são encontradas, na literatura, citações a
respeito da observação da natureza como parte da metodologia aplicada à pesquisa
e à inovação. As Guerras Napoleônicas foram uma série de conflitos que colocou o
Império francês contra diversas alianças das nações europeias. Foram lideradas por
15
Teve início oficialmente em 14 de julho de 1789, com a Queda da Bastilha, e tem seu final
em 1799.
41
Napoleão Bonaparte (1769-1821) e ocorreram entre 1804 e 1815, marcando o
término do período.
Com o crepúsculo do Iluminismo, o século XIX inaugura uma nova corrente
filosófica, novamente surgida em solo francês: o Positivismo. Tendo como principais
expoentes os pensadores Auguste Comte (1798-1857) e John Stuart Mill (1806-
1873), a corrente ganhou impulso na Europa, sobretudo na segunda metade do
século XIX e começo do XX. Do ponto de vista científico, traz a classificação do
conhecimento e a interpretação das ciências atreladas à ética. Defende que o único
conhecimento verdadeiro é o científico, aquele que pode ser testado e verificado por
métodos validados pela ciência. O Positivismo promoveu uma relação com as
ciências naturais e se distanciou dos estudos que analisam globalmente o mundo
natural, norteando as pesquisas com um viés cartesiano de observação e
conhecimento dos fenômenos naturais e da própria natureza, de forma
pormenorizada, em partes separadas. O momento do nascimento do Positivismo
coincide com o fortalecimento da Revolução Industrial, iniciada no século XVIII e
marcada por um conjunto de mudanças advindas do processo de transição do
trabalho artesanal pelo assalariado e pelo uso de máquinas.
Durante o processo da Revolução Industrial, as populações se concentraram
nas cidades. O êxodo rural sobrecarregou os centros urbanos, gerando uma série de
problemas estruturais para as populações europeias. Nesse momento, configura-se
boa parte da problemática que hoje culmina com as mudanças climáticas e a
escassez de recursos naturais, que irão depositar no biomimetismo um caráter de
urgência na solução para problemas ambientais vividos pela humanidade. A procura
por bens de consumo e a necessidade de construção de uma infraestrutura que
desse conta das demandas daquele período impulsionaram a produção das
estruturas metálicas. Elas foram utilizadas em pontes, na expansão das ferrovias,
em navios e edifícios. França e Inglaterra competiam, então, pela supremacia na
capacidade de produção de edifícios e estruturas metálicas.
Em 1887, Gustave Eiffel (1832-1923) ganha a competição para a construção
de uma torre, para a Feira Universal de Paris. Sabe-se que Eiffel e sua equipe
tiveram contato com as pesquisas desenvolvidas pelo engenheiro suíço Karl
Culmann16 (SANTOS, 2007). Este, por sua vez, utilizou as técnicas de análise
16
Karl Culmann (1821-1881).
42
geométrica desenvolvidas pelo engenheiro e matemático francês Jean-Victor
Poncelet (1788-1867), aplicadas às observações do anatomista alemão Hermann
von Meyer (1801-1869), a respeito da constituição dos ossos. Culmann observou
mais especificamente a parte superior do fêmur humano, descrevendo as linhas de
esforços encontradas no fêmur e observando as ranhuras presentes tanto na
superfície maciça do osso, como em seu interior poroso.
Acredita-se que Eiffel tenha concebido a Torre fortemente influenciado pelo
conhecimento da formação do fêmur, apresentado nos estudos de Culmann. Dessa
forma, Eiffel alcançou um resultado vanguardista para a época, baseado no cálculo
preciso de soluções estruturais complexas como os empregados na construção da
célebre torre. Inicialmente concebida como estrutura efêmera para a Feira Universal
de Paris de 1889, a Torre, que deveria ter sido demolida ao final do evento, fez tanto
sucesso que permanece lá até hoje. Com 324m de altura, foi, durante muito tempo,
a estrutura mais alta construída pelo ser humano e tornou-se um dos mais
importantes símbolos da França. Embora tenha sido superada em altura, em 1930,
pela construção do Chrysler Building, de Nova York, a Torre Eiffel, como ficou
conhecida, permanece como uma das obras mais excepcionais já construídas em
ferro. Trata-se de um dos primeiros casos de biomimetismo documentado e que
tenha produzido efeito em uma determinada tecnologia.
Figura 5 - Linhas de esforços em fêmur
Fonte: Revista Española de Cirugía Ortopédica y Traumatología (2001). Disponível em:
<http://www.elsevier.es/es-revista-revista-espanola-cirugia-ortopedica-traumatologia-
129-articulo-respuesta-osea-las-solicitaciones-mecanicas-13015932>. Acesso em: 11
jun.2017.
43
Figura 6 - Projeto da Torre Eiffel
Fonte: Revista Española de Cirugía Ortopédica y Traumatología (2001). Disponível em:
<http://www.elsevier.es/es-revista-revista-espanola-cirugia-ortopedica-traumatologia-
129-articulo-respuesta-osea-las-solicitaciones-mecanicas-13015932>. Acesso em: 11
jun. 2017.
Suprir as necessidades de grandes populações concentradas em um espaço
determinado, como ocorre nos centros urbanos, é um desafio presente para muitas
espécies. Observada como espécie, a humanidade distribui-se de forma análoga a
colônias, como fazem insetos, corais e muitos outros seres vivos. No caso humano,
essa condição de grande concentração em centros urbanos, em ambiente
construído prevalentemente urbanizado, ocorreu em diversos momentos da história,
desde a Antiguidade. Isso foi intensificado definitivamente na Revolução Industrial,
que teve como uma de suas principais consequências justamente o aumento das
populações nas cidades (FOLZ, 2004). A concentração dos meios de produção
forçou um profundo êxodo rural. Os empregos gerados acabaram por concentrar
grandes populações nos centros urbanos. O fenômeno da concentração
populacional nos grandes centros urbanos engendra, até hoje, desafios quanto à
oferta de infraestrutura necessária para a garantia de condições dignas e inclusivas
44
indispensáveis à população residente, mantendo-se o debate a respeito das
necessidades da sociedade no âmbito da habitação referentes a aspectos
numéricos e qualitativos, circunscritos à salubridade, adequação de renda e à
disponibilidade de unidades.
Figura 7 - Habitação popular de operários ingleses
Fonte: Benevolo, apud Folz (2004).
45
No final do século XIX e início do século XX, produz-se na Europa uma série de
experimentações e estudos a respeito de eficiência, racionalização da produção e
aumento da qualidade de sistemas construtivos, com o objetivo de se baratear a
produção de habitação. Esses aspectos são apontados como sinônimos de controle
e diminuição do desperdício a baixo custo, influenciados pelo Taylorismo17.
O ideário focado na eficiência construtiva, que se manifesta por meio da
produção de ambiente construído urbano baseado em modularidade, pré-fabricação
e industrialização de componentes e elementos, de sistemas e subsistemas da
construção civil, reflete-se na produção da Bauhaus18 e nas vanguardas atuantes no
Modernismo. O arquiteto Ernst May (1986-1970)19, com a ideia de “máximo de
função com mínimo de forma20” encomenda a “Cozinha de Frankfurt” à arquiteta
austríaca Margarete Schütte-Lihotzky ((1897-2000)21. Tratou-se de marco histórico
para a produção em série voltada à arquitetura e ao design populares.
17
Taylorismo é o modelo administrativo e produtivo idealizado pelo engenheiro norte-
americano Frederick Winslow Taylor (1856 – 1915), no qual é preconizada a divisão técnica
do trabalho humano dentro da produção industrial. A meta estava assentada na busca por
tornar o processo produtivo mais ágil, por meio da subdivisão de funções, tanto na
produção, como na administração. Esse processo permitiria que cada funcionário cumprisse
as tarefas que lhe foram designadas com o mínimo de conhecimentos. Fonte: MAY, Ernst
and the New Frankfurt am Maiin Initiative. A Organização do Trabalho no Século 20:
Taylorismo, Fordismo e Toyotismo. 2. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2010.
18
Bauhaus é uma importante escola de design, artes e arquitetura, fundada na Alemanha,
por Walter Gropius, em 1919. É considerada referência para o modernismo. Disponível em:
http://www.deutscher-werkbund.de/. Acesso em: 24 maio 2017.
19
Ernst May foi precursor do movimento funcionalista ativo. Atuou primeiro na República de
Weimar (1919-1933), na produção de casas populares. May encomendou para a arquiteta
austríaca Margarete Schütte-Lihotzky a chamada “Cozinha de Frankfurt”, feita de forma
modular, ergonômica e funcional, para atender à classe operária com qualidade a preço
reduzido, numa produção em massa. May foi cofundador da Deutscher Werkbund,
juntamente com Hermann Muthesius (1861-1927) e outros, da associação de artistas na
qual Mies Van Der Rohe (1886- 1969) viria a ser diretor. Posteriormente, May atuou na
então URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas) durante o Stalinismo. May
executou cerca de 20 planos urbanísticos, dos quais se destacam: Magnitogorsk, Orsk,
Novokuznetsk e Kemerovo. Esteve também na África, atuando em vários grupos de
trabalho. (HENDERSON, 1994).
20
Henderson, Susan R. Building Culture: Ernst May and the New Frankfurt am Main
Initiative, 1926–1931 (Studies in Modern European History). Series: Studies in Modern
European History (Book 64) Hardcover: 591 pages. Publisher: Peter Lang Inc., International
Academic Publishers; First edition (August 23, 2013).
21
Margarete Schütte-Lihotzky participou do grupo de arquitetos vanguardistas alemães do
início do século XX. Criada em uma família burguesa de Viena, nasceu e cresceu no
período do final do império Austro-Húngaro (1804 – 1867). De ideal pacifista, fez parte da
resistência aos nazistas. Trabalhou com Ernst May em Frankfurt, indo para a URSS (União
46
Em 1907, surge a escola Deutscher Werkbund22, que conta com um grupo de
pesquisa focado nesses cânones. A escola inova, unindo racionalização e processos
industriais aos aspectos de qualidade ligados à produção artesanal. Trata-se de
manufatura com a junção dos aspectos de produção de massa e qualidade da
customização, presente na produção artesanal. Valoriza-se o “saber fazer”,
antecipam-se em cinquenta anos com conceitos retomados apenas depois da
revolução da informática e da consolidação da Terceira Revolução Industrial23. Ou
seja, a Bauhaus estava muito à frente do seu tempo quando propôs uma relação
entre a industrialização, que atendesse à população de forma massificada, porém,
com a qualidade presente historicamente de forma customizada, artesanal. Na
atualidade, transitamos pela terceira Revolução Industrial, caracterizada pela
popularização dos meios de produção e pela customização em massa, atendendo
ao binômio que era o desafio proposto pela Bauhaus. Talvez o maior desafio dessa
época tenha ocorrido em função da antecipação da proposta, em um tempo no qual
não havia ainda a tecnologia necessária que respondesse adequadamente a esse
desafio.
das Repúblicas Socialistas Soviéticas) após o final da Segunda Guerra Mundial
(HENDERSON, 2013),
22
Deutscher Werkbund é uma associação alemã de arquitetos, designers e artistas, fundada
em 1907 por Hermann Mathesius, Peter Behrens (1868-1940) e Ernst May, dentre outros.
Disponível em: http://www.deutscher-werkbund.de/. Acesso em: 25 maio 2017.
23
A primeira Revolução Industrial começou na Grã-Bretanha, no final do século XVIII, e teve
início com a mecanização da indústria têxtil. As tarefas, até então feitas à mão por tecelões
em suas próprias residências, foram unificadas em um local, dando origem à fábrica. A
segunda Revolução Industrial nasceu no início do século XX, quando Henry Ford (1863-
1947) criou a primeira linha de montagem, inaugurando a era da produção em massa.
Atualmente, uma terceira Revolução Industrial está em curso: a manufatura torna-se digital
(The Economist, 2012). Adaptação livre do autor.
47
Figura 8 - Cozinha de Frankfurt
Cozinha de Frankfurt* Modelo precursor de cozinha planejada atual, projetada pela arquiteta
austríaca Margarete Schütte-Lihotzy a pedido de Ernst May, para casa populares em
Frankfurt no ano de 1926. Fonte: HENDERSON (1994, p. 65).
Em 1928, foi criado o Congrès Internationaux d”Architecture Moderne (Ciam),
que possibilitou um diálogo acadêmico internacional a respeito de arquitetura
moderna (KHAN, 2009, p.34), cujo último encontro foi realizado na ex-Iugoslávia, em
1956. O principal escopo do Ciam era garantir o direito de existência à arquitetura
moderna contra as forças antagônicas oficiais que controlavam os principais meios
de produção de arquitetura (GIEDION, 2004, p.119). Assim, o Ciam foi um
movimento internacional voltado à valorização dos princípios do modernismo e que
pretendeu ser um garantidor de produção de arquitetura de massa com qualidade.
Não entraremos aqui na efetividade desta afirmação; o importante para este estudo
é evidenciar que os princípios de racionalidade e de economia, defendidos como
princípios básicos para uma produção de arquitetura modernista de qualidade, são
princípios também presentes na natureza, como características das espécies, que,
48
dessa forma, garantiram sua sobrevivência no tempo. Muitos dos esforços desse
período, focados na racionalização, eficiência e economia como forma de se
viabilizar acesso à habitação de forma massificada, podem ser vistos nas técnicas e
sistemas construtivos em dias atuais, como explica Folz:
[...] Embora a construção habitacional seja ainda considerada muito
atrasada comparativamente com outros setores produtivos (...) é
evidente uma evolução constante na arquitetura alavancada pelo
aparecimento de novos materiais e técnicas construtivas. Inclusive
muito da racionalização e industrialização de elementos e
componentes que estão sendo aplicados atualmente no setor da
construção civil remontam às ideias e projetos do final do século XIX
e início do século XX. (FOLZ, 2004, p.17).
Ainda segundo Folz (2004), as tentativas de industrialização podem ser
divididas em dois segmentos distintos. O primeiro é aquele no qual se entende a
unidade habitacional como uma forma única e acabada a ser industrializada em uma
linha de montagem similar à da indústria automobilística. O segundo, por sua vez,
abarca a unidade habitacional como um conjunto de partes industrializadas
passíveis de inúmeras combinações:
Quando se fala sobre industrialização da construção, ou mais
especificadamente, da habitação, pode-se dividir em duas formas de
se abordar esta industrialização. Uma forma seria a produção da
casa como uma unidade, como um todo, variando nos seus modelos
como se fosse um carro. A outra seria a produção de componentes
que seguiriam certas regras de integração para atingir uma variedade
no projeto da casa através de diferentes combinações de suas partes
(...) processo defendido pelos arquitetos modernos, e colocado em
prática com maior frequência após a Segunda Guerra Mundial (...)
que prevê a industrialização das partes e não do todo. Isto evitaria a
repetição maciça de unidades dando espaço à variedade e à escolha
individual. (FOLZ, 2004, p.22)
Houve preponderância do segundo modo que, por ser mais flexível, acabou
sendo amplamente utilizado. Essa industrialização de sistemas construtivos (blocos
de concreto modulados, revestimentos, tubos e conexões, etc.), possibilitou aos
arquitetos projetarem edifícios mais racionais, com obras mais limpas e rápidas.
49
Figura 9 - Blocos de concreto
Fonte: Glasser (s/d). Disponível em: <http://www.glasser.com.br/>. Acesso em: 20
jun.2017.
Com esse processo, evitou-se um grande desperdício de materiais. Também,
como consequência, houve geração de uma oferta mais homogênea com relação à
qualidade. Dos inúmeros exemplos mundiais que podem ser citados, que utilizaram
esses processos de forma pioneira, o edifício Esther, no centro de São Paulo, é um
marco brasileiro nesse sentido, conforme imagem abaixo.
50
Fotografia 2 - Edifício Esther
Fonte: História em detalhe (2013). Disponível em: <http://www.au.pini.com.br/arquitetura-
urbanismo/236/edificio-esther-301056-1.aspx>. Acesso em: 11 jun.2017.
O momento atual de desenvolvimento da produção do espaço construído
urbano ainda é reflexo do histórico descrito acima. Entretanto, se tomarmos como
exemplo a produção de habitação contemporânea, há que se observar a
necessidade de ampliação dessa discussão.
Os aspectos relacionados à diversidade das realidades socioculturais e
ambientais das populações atendidas por programas habitacionais impõem uma
reflexão mais ampla, diante dos avanços tecnológicos atuais. Essa diversidade
sociocultural e ambiental relacionada às populações só será atendida
adequadamente por meio de soluções que incorporem algum grau de customização.
Tillmann (2008) mostra, em sua pesquisa, como a customização de massa
pode ser um conceito determinante para uma oferta mais adequada de habitação. A
autora postula diretrizes para essa customização na produção de habitação de
interesse social. O conceito engloba toda a cadeia produtiva, de forma a possibilitar
a entrega do produto customizado ao cliente final.
51
A customização em massa é um conceito sistêmico que engloba toda a
cadeia de suprimentos, ou seja, todo o processo de transformação da matéria-prima
em um produto, até a entrega ao cliente final. (PILLER, 2003; DURAY, 2002; PINE,
1994, apud TILLMANN, 2008, p.38).
Esse conceito se insere, na atualidade, diretamente conectado à Terceira
Revolução Industrial,, viabilizada pela popularização dos meios de produção
informatizados e robotizados (ECONOMIST, 2012). São utilizadas impressoras 3D e
softwares de parametrização, que possibilitam escalas de produção industrial
pulverizadas nos territórios, sem nenhum tipo de pressão ou prejuízo para sua
eficiência ou custo (de maior tempo de produção, complexidade, etc.). A isso, a
customização é incorporada.
É interessante notar que os cânones do movimento moderno não entram em
conflito com o biomimetismo. Não se verifica uma incompatibilidade entre as duas
abordagens, que se aproximam muito conceitualmente pelo aspecto ligado à busca
da eficiência, usando-se o mínimo de recursos para solucionar o projeto. Note-se
também que há na natureza a presença de soluções estruturais que não utilizam
curvas ou círculos, viabilizadas pela adoção de polígonos, como teias de aranha e
colmeias, entre outros.
Fotografia 3 - Colmeia
Fonte: Colmeia (s/d). Disponível em: <http://www.sonhos.com.br/sonhar-com-abelha>.
Acesso em: 12 jun.2017.
52
Fotografia 4 – Parque Eduardo Guinle (Arquiteto Lúcio Costa, 1943)
Fonte: John Hartmann (2015). Disponível em:
<http://www.dicadaarquiteta.com.br/2015/02/cobogo-100-brasileiro.html>. Acesso em: 12
jun.2017.
Alguns arquitetos e engenheiros utilizaram, consciente ou inconscientemente,
formas orgânicas nas soluções construtivas, mesmo naquelas ainda fortemente
impactadas pelos cânones do modernismo. Talvez o maior exemplo dessa condição
esteja na obra de Niemeyer, em que a presença de curvas para a solução de seus
projetos é uma constante. Um exemplo dessa utilização das curvas por Niemeyer é
a Igreja de São Francisco de Assis, na Pampulha, de 1943. Não menos importante,
é o projeto do Palazzetto dello Sport, construído em Roma, na década de 1950.
Esses projetistas, Oscar Niemeyer e Annibale Vitellozz e Pier Luigi Nervi,
respectivamente, adotaram uma solução formal em que as linhas de esforços se
distribuem, assemelhada a muitas estruturas presentes em espécies vegetais e
seres vivos como solução formal e estrutural.
53
Figura 10 - Igreja de São Francisco de Assis, Pampulha, Belo Horizonte
Fonte: Oscar Niemeyer (2943). Disponível em:
<http://www.arquitrecos.com/2012/12/niemeyer-e-suas-igrejas-homenagem-ao.html>.
Acesso em set.2017.
Figura 11 - Cobertura do Palazzetto dello Sport
Fonte: Projeção da cobertura Palazzetto dello Sport (1959). Disponível em:
<http://www.archidiap.com/opera/palazzetto-dello-sport/>. Acesso em: 11 jun. 2017.
54
Se compararmos o Modulor de Corbusier24 - feito por Charles-Edouard
Jeanneret-Gris, mais conhecido pelo pseudónimo de Le Corbusier (1887-1965) - ao
Homem Vitruviano, de Leonardo da Vinci, evidencia-se a mesma intenção de
estabelecer parâmetros matemáticos que se relacionam a um propósito, ou seja,
temos presente a essência da relação entre forma e função sistematizadas. Nesse
aspecto, é possível afirmar que há uma convergência entre o modernismo e o
biomimetismo, uma vez que, na busca pela eficiência, ambos encontraram, em
formas geométricas, uma solução de modulação que gera economia, solidez
estrutural e produção em série, que estão também presentes na natureza (colmeias,
teias, estruturas coralinas, etc.).
Figura 12 - Modulador
Fonte: Le Corbusier (1948). Disponível em: <https://www.amazon.co.uk/Modulor-2-
Corbusier/dp/3764361883>. Acesso em: 10 jun. 2017.
24
Projetado pelo arquiteto franco-suíço Le Corbusier, o Modulor é uma escala de
proporções baseadas em medidas humanas, utilizando a sequência de Fibonacci e
proporção áurea. Foi desenvolvida em um contexto de tradição vitruviana, na tentativa de
atribuir proporções geométricas ao corpo humano, como forma de se sistematizar aspectos
ligados à funcionalidade e à estética na arquitetura. Foi publicado pela primeira vez em 1948
(Modulor 1) e, posteriormente, em 1955 (Modulor 2). Essa tentativa de sistematização das
medidas humanas, de tradição vitruviana, é ainda hoje bastante criticada, uma vez que parte
de pressupostos que não encontram respaldo na realidade morfológica da população,
limitando quase que por completo a sua aplicabilidade. Sua importância está muito mais nos
aspectos simbólicos de valorização do usuário, em uma visão humanizada da produção do
ambiente construído do que na sua efetiva contribuição ergonômica.
55
Assim, o movimento Modernista pautou-se pela racionalidade, pela economia
e por uma série de cânones que o aproximam de uma abordagem biomimética,
como será apresentado adiante. No terceiro quartel do século XX, inicia-se um
período de grande transformação nos modelos de produção até então praticados.
Uma intensa crise na produção de petróleo25 acende a discussão a respeito
da finitude dos recursos naturais, culminando com o nascimento de movimentos
ambientalistas e de defesa da natureza, dos direitos civis e de outras mudanças
apoiadas numa nova consciência coletiva voltada às questões ambientais. O novo
ideário já havia se iniciado com a divulgação e a popularização de fotos espaciais do
planeta Terra, fruto da corrida espacial, dando a clara ideia de finitude do nosso
território. Outros fatores incidem nesse contexto, como as revoltas de Maio de 6826,
o lançamento do Manifesto de Design Essencial nos EUA, em 64, que pregava uma
maior atenção para os efeitos do consumismo, dentre outros, que compõem o
quadro contextualizador da época.
25
Conhecida como a primeira crise do petróleo, foi uma crise econômica de proporções
mundiais, desencadeada pelos maiores países produtores de petróleo do Oriente Médio.
Após a Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945), os principais países produtores de petróleo
se deram conta de que tinham uma grande riqueza à mão – e um recurso não renovável.
Isso fez com que tivessem um enorme poder. Em 1960, é criada a OPEP (Organização dos
Países Exportadores de Petróleo), composta pela Arábia Saudita, Kuwait, Irã, Iraque e
Venezuela. A finalidade da OPEP era defender os interesses desses países. Em reunião de
outubro de 1973, a OPEP, cujos países-membros eram detentores de praticamente toda a
produção mundial de petróleo, decidiram aumentar significativamente os preços e diminuir a
produção do produto. A decisão teve efeito em todo o mundo, causando racionamentos e
falta de petróleo. A crise terminaria cerca de um ano depois.
26
O assim conhecido movimento de maio de 1968 ocorreu na França naquele ano e tornou-
se ícone de uma época. Diversos fatores antecederam o movimento, como a liberação
sexual, a luta contra a Guerra do Vietnã (1955 – 1975) e pelos direitos civis. O movimento
teve início no dia 2 de maio de 1968, quando estudantes franceses da Universidade de
Nanterre fizeram um protesto contra a divisão dos dormitórios entre homens e mulheres,
sinalizando a reivindicação pelo fim de posturas conservadoras. Outros universitários e
políticos franceses engrossaram o movimento, fazendo protestos em todo o país contra os
problemas vividos na França, culminando no pedido de renúncia do presidente conservador
Charles de Gaulle (1890 -1970) No dia 18, mais de 10 milhões de trabalhadores fizeram
uma greve geral, exigindo melhores condições de trabalho. O presidente Charles de Gaulle,
que havia se refugiado numa base militar alemã, concedeu abono de 35% ao salário
mínimo, além de convocar novas eleições legislativas, dando fim aos protestos. Mesmo sem
alcançar um objetivo específico, Maio de 68 foi um movimento marcante, que teve inúmeros
desdobramentos posteriores.
56
Fotografia 5 - A Terra vista do espaço
Fonte: Terra vista da Apollo 8 (1968). Disponível em: <http://popscience.com.br/a-terra-vista-
do-espaco-em-9-imagens>. Acesso em: 05 jun.2017.
O percurso de questionamentos do período e a efervescência social geraram
pressão cada vez maior por setores organizados da sociedade civil, principalmente
nos países desenvolvidos. Esses questionamentos serão pano de fundo para vários
campos emergentes do conhecimento, como o biomimetismo, descrito no capítulo a
seguir.
57
4 BIOMIMETISMO: UMA ABORDAGEM CONCEITUAL
Como abordado na Introdução deste estudo, Biônica e Biomimética podem ser
consideradas, linguisticamente, como sinônimas. A prática acadêmica, contudo, tem
distanciado esses termos, por conta de diferenças expressivas entre as várias linhas
de pesquisa envolvidas com a temática bioinspirada. Dessa forma, há de ser feita
uma distinção entre Biomimetismo, mais ligado à Biomimética, e Biônica.
Neste sentido, é preciso observar que há, por pesquisadores de vários
centros de pesquisa pelo mundo, um uso deliberado da palavra biomimetismo no
lugar de biônica. Isso ocorre pela necessidade de se expressar uma nuance
semântica distinta existente entre os dois conceitos e entre as duas áreas de
pesquisa. Historicamente, a Biônica popularizou-se como robótica aplicada ao uso
medicinal. Nesse campo, o pesquisador brasileiro Miguel Nicolelis (1961) é
referência mundial.
Já os centros de estudo dedicados ao biomimetismo atuam em diferentes
campos, não apenas na produção de próteses humanas. Eles são mais inspirados
por princípios relacionados à ecologia e a aspectos físico-químico funcionais em
processos e fenômenos, e menos em uma reprodução robótica de funções
notadamente motoras. Esses processos e fenômenos são mais bem descritos
quando o sufixo grego “ismo” é utilizado, pois ele faz uma referência mais explícita a
“fenômeno”. A importante diferença conceitual encontra-se bem determinada no
trabalho de Wahl (2006), que diferencia Biônica e Biomimetismo, evidenciando que
são abordagens distintas.
Segundo o autor, enquanto a primeira contém implicitamente a ideia de
pesquisa, que busca manipulação e controle da natureza – ou, mais no limite,
complementaridade-, o Biomimetismo estaria mais relacionado à ideia de
participação e inclusão, visando a aspectos de sustentabilidade. O autor ainda
considera que, nos processos biomiméticos, há um componente cultural participando
(fluxos de informação) em sistemas de criação, produção e uso dinâmicos, que se
interligam. Esse componente está ausente nas linhas de pesquisa que se
autodenominam Biônica.
É importante ressaltar o fato de que boa parte da pesquisa levada a cabo sob
a alcunha de Biônica ocorreu em um período marcadamente impactado pela
58
realidade das tensões da chamada Guerra Fria27. Foram estudos amplamente
financiados pelos círculos de pesquisa ligados a órgãos governamentais, no âmbito
militar, como forma de produzir próteses robóticas para mutilados de guerra e de
aumentar o desempenho dos soldados em batalha. Silva (2005) mostra como o
período sofreu policiamento e controle social, em ambiente de acirramento
ideológico que impactou toda a sociedade e contaminou os meios acadêmicos.
O termo “Biônica” foi cunhado no final da década de 50, pelo militar norte-
americano Jack E. Steele (1924-2009). Em 1960, o termo foi usado por ele em um
congresso. Posteriormente, em 1969, foi fundado o New Alchemy Institute,
instituição pioneira na bioinspiração, como forma de inovação e produção mais
sustentável, baseada na Biônica, dividindo o rumo das pesquisas (WAHL, 2006). Se
a Biônica ficou “refém” da pesquisa militar, é natural que pesquisadores muito
distantes dessa realidade sentissem a necessidade de uma definição que melhor
descrevesse suas atividades, imbuídos de um sentimento fortemente distinto
daquele presente nos anos 60 e 70 na esfera militar.
Porém, além do fato de se distinguir Biônica de Biomimetismo, há que se
observar também uma dispersão em que se encontrava a discussão que atualmente
é concentrada sob a alcunha de biomimetismo e de biomimética, presente nas mais
diferentes áreas do saber. Tal dispersão é atenuada pela primeira vez na obra de
Janine Benyus (2007), escritora e pesquisadora das Ciências Naturais. A ela são
atribuídas a compilação e a sistematização pioneiras do biomimetismo como campo
de conhecimento específico e bem delimitado. A autora faz um mapeamento que
relaciona pesquisas, que vão desde Buckminster Fuller (1895-1963) a Carl Sagan
(1934-1996). Benyus (2007) postula em sua obra que há três abordagens
indissociáveis quanto ao Biomimetismo:
o uso da Natureza como modelo;
o uso da Natureza como medida;
o uso da Natureza como mentora.
27
A chamada Guerra Fria refere-se ao período imediatamente após o final da Segunda
Guerra (1945) e a dissolução da União Soviética (1991). Nesse ínterim, houve diversas
disputas em vários âmbitos entre as duas superpotências armamentistas. Como nunca
houve confronto direto, denominou-se o período de Guerra Fria.
59
Seguindo essa divisão, a abordagem biomimética, que usa a Natureza como
modelo, procura aspectos naturais que possam ser aplicados para a solução de
problemas humanos. Já a abordagem que utiliza a Natureza como medida aplica
aspectos relacionados à durabilidade, à adequação e à funcionalidade como
parâmetros obtidos por observação e aplicados em pesquisas diversas. Por fim, a
abordagem que utiliza a Natureza como mentora busca identificar problemáticas
postas pela evolução, fornecendo modelos válidos de analogias que embasam e
norteiam as pesquisas.
Em sua principal obra, Biomimética – Inovação inspirada na Natureza
(2007), Benyus reúne as principais inovações presentes em pesquisas de diferentes
campos do conhecimento, evidenciando potencialidades em suas aplicações,
sobretudo em cenários futuros. Por enfatizar questões de processos em que a
bioinspiração é presença constante, o trabalho ressalta o caráter eminentemente
metodológico do biomimetismo aplicável a diferentes áreas. Assim, o biomimetismo
assume uma aplicação sistêmica voltada à identificação de processos, conceitos,
técnicas e princípios contidos na natureza, que podem ser úteis ao desenvolvimento
de soluções de variados problemas enfrentados pela sociedade.
Benyus (2007) faz um inventário de tecnologias, abordagens e transposição
de conceitos que culminaram com inúmeras soluções, algumas, inclusive, utilizadas
já há algum tempo no mercado. Assim, sistemas de otimização de rotas que utilizam
algoritmos, velcros, superadesivos e uma série de novas tecnologias que
solucionam problemas por meio de bioinspiração, em processos biomiméticos, são
produtos amplamente consumidos pela sociedade atual.
Recentemente, o biomimetismo vem atraindo cada vez mais a atenção de
arquitetos e designers. Tal atenção vem ganhando impulso pela conjunção de vários
fatores:
compreensão difusa de como a questão ambiental é uma emergência
mundial, percepção a respeito da escassez de recursos e de suas
consequências;
marketing relacionado à visibilidade que o tema agrega;
60
incentivo de governos e empresas, por compreenderem a questão da
escassez como sendo o principal limitador para a expansão dos
mercados mundiais;
disponibilidade de softwares de simulação e parametrização
computacional mais eficazes e acessíveis;
avanços de campos da ciência, como a Biotecnologia, Nanotecnologia,
Química, Genética Molecular, etc., que possibilitam a compreensão e
utilização de tecnologias presentes nos seres vivos.
Se observarmos as publicações acadêmicas que tratam da temática,
constataremos uma produção crescente, o que não significa igual incremento de
qualidade. Na verdade, caso a qualidade não acompanhe o aumento da produção
científica, pode mesmo haver prejuízo ao campo do conhecimento em seu todo, por
difundir, de forma superficial ou equivocada, a abordagem biomimética. Isso pode
contribuir para macular sua imagem perante a comunidade científica mundial,
rebaixando o tema ao patamar de modismo.
Outros autores se destacam na formulação do campo biomimético do
conhecimento. Datschefski (2002), por exemplo, preconiza uma reformulação na
maneira de se projetar, buscando, na bioinspiração, a meta 100% de
sustentabilidade na produção. Drake (2002), por sua vez, evidencia como a logística
em ciclos naturais é mais eficiente do que naquelas criadas pelo ser humano.
Vários aspectos de eficiência são primorosos na natureza, nos seres vivos.
Muitos dos exemplos na natureza, no tocante à sobrevivência das espécies, estão
relacionados à eficiência energética. A energia é, de fato, o maior custo nos ciclos
naturais dos seres vivos. Não é diferente na sociedade, no espaço construído.
Nosso custo energético também é preponderante na produção da maioria desses
espaços. Na natureza, a evolução mantém uma lógica de seleção que premia a
eficiência energética. Por outro lado, a ineficiência foi, em geral, extinta. Porém, tal
afirmação não pode ser categórica e merece algum cuidado.
Benyus (2007) alerta, em sua obra, para o fato de existirem, na natureza,
muitos exemplos ruins de êxito de espécies que perpassam situações de predação,
parasitismo e formas que não seriam aceitáveis como modelos para serem aplicadas
à sociedade. Não se pode incorrer na ingenuidade ou credulidade de que qualquer
aspecto natural seja, por definição, benéfico e válido para a humanidade, em virtude
61
das já citadas questões éticas que devem estar presentes em quaisquer
transposições nas áreas de conhecimento. Ainda assim, a questão da eficiência
energética permanece como importante no encaminhamento de muitas pesquisas
atuais ligadas ao biomimetismo.
Desde o início da Revolução Industrial, os níveis de consumo praticados pela
humanidade aumentaram de forma ininterrupta, criando cada vez mais uma enorme
dependência da sociedade contemporânea por energia. Somente a partir dos anos
70, com a grande crise do petróleo – que também foi uma crise energética -, são
observadas as limitações impostas pela finitude dos recursos naturais à manutenção
e expansão dos níveis de consumo mundiais. A nova realidade deu origem à
necessidade de novas tecnologias que equacionassem a questão.
Por muito tempo recorreu-se à energia atômica, bastante limitada em função
de uma série de fatores que não serão analisados neste trabalho. Uma das
hipóteses mais plausíveis para a solução da incompatibilidade entre manutenção do
aumento dos níveis de consumo mundial e a escassez de recursos é descrita pela
superação do conceito de obsolescência programada, praticada pela indústria de
bens de consumo desde o início do século XX.
A produção de bens de consumo sensivelmente mais duráveis é vista pela
indústria como uma forma de manter a expansão dos mercados sem aumento da
demanda por recursos escassos. Desta forma, centros de pesquisa biomimética
buscam tecnologias bioinspiradas para o desenvolvimento de substâncias que se
regeneram e que se autorreparam, prolongando suas vidas úteis. Essas tecnologias
serão úteis em novos modelos de negócios, em novas formas de comercialização
dos bens, passando para um mercado de venda de serviços e secções em
comodato e não apenas de venda de produtos. Comercializa-se, assim, o serviço de
iluminação e não a lâmpada, que deverá durar muito mais tempo e ser utilizada em
uma produção de reuso antes de ser reciclada. Isso significa que a matéria-prima
ainda seria utilizada, mas em produtos com ciclos de vida muito longos, passíveis de
atualização e sem a necessidade de serem totalmente refeitos. A demanda por
matérias-primas se daria em função dos ciclos de vida dos bens de consumo,
principalmente os duráveis e semiduráveis. Tomando novamente a lâmpada como
exemplo, tendo um ciclo de vida longo, ela poderia servir por muito tempo à
comercialização de serviços de iluminação, diminuindo a pressão por matérias-
primas, por recursos naturais, e garantindo o modelo de negócio no mercado.
62
A escassez de recursos é um problema típico dos processos evolutivos das
espécies, dos nichos ecológicos. A natureza evidencia que é necessário encontrar
um ponto de equilíbrio entre o que se consome e o que se tem à disposição em
termos de recursos naturais, uma vez que há limites dados pelo ambiente.
Atualmente, essa busca pelo equilíbrio, essência da sustentabilidade para que
se garanta a qualidade de vida da sociedade contemporânea na Terra, encontra
novas abordagens descritas na literatura, como a biomimética, as tecnologias
baseadas em softwares de parametrização, a nanotecnologia, a algorítmica e
demais áreas emergentes da ciência, possibilitando novas formas de aplicação
bioinspiradas.
O biomimetismo tem oferecido um vasto campo de pesquisas e soluções, que
passam por novos materiais e tecnologias. Auxiliam desde a área da saúde (brejos
para depuração de substâncias emergentes presentes nos resíduos líquidos das
cidades), até o desenvolvimento de novos aplicativos que otimizam a logística dos
correios, do tráfego de automóveis e das coletas de resíduos sólidos nas cidades
(otimizadores de rotas), por exemplo. Já o aspecto da escassez de recursos é
tratado principalmente pelo viés da eficiência energética, que procura soluções de
maior efetividade dos sistemas e subsistemas em edifícios ou cidades. Assim,
modelos de organização e tecnologias constituem um arsenal disponível na natureza
para ser identificado, descrito, compreendido e aplicado a favor da humanidade.
Michaud-Lariviere (2015) observa, em sua pesquisa, que a forma correta de
se destrinchar modelos naturais é, primeiramente, observando suas funções. Em
seguida, devem ser observados os fluxos que a compõem. Segundo o autor, na
natureza tudo tem uma função e ela está relacionada à combinação de três tipos de
fluxos: de informação, de massa e de energia. Tal conclusão coincide com as
definições produzidas pela Cibernética.
Os fluxos descritos pela cibernética se manifestam em sistemas interativos
(BEER, 1972). O comportamento desses sistemas é regido por leis presentes na
natureza; leis de autorregulação e auto-organização configuram-se como um
princípio gerenciador pelo qual esses sistemas crescem, se ajustam, se adaptam,
evoluem e decrescem, mantendo sempre um comportamento de viabilidade que os
auxilia na sobrevivência. Revela-se um comportamento eminentemente dinâmico de
tais estruturas, influenciado por conjuntos de variáveis que a levarão à evolução ou à
decadência.
63
Segundo essa abordagem, por meio da observação das funções e de seus
fluxos, surge a similaridade do biomimetismo com a cibernética. É necessário
observar que os aspectos éticos e os contextos sociais e históricos, já explanados
na introdução do presente estudo, devem ser considerados. Somente por meio da
descrição das funções contidas no objeto de estudo natural e dos três tipos de fluxos
nele descritos, é que se pode iniciar qualquer processo de transposição para a
formulação de soluções plausíveis para o enfrentamento de problemas da
sociedade, aferindo-se sua validade ética. Michaud-Lariviere (2015) salienta a
importância de se observar o fato de que esses fluxos podem ser descritos em ciclos
fechados, ou seja, quando em equilíbrio, podem ser determinados por terem limites
que são dados por funções derivadas das quantidades de recursos disponíveis, das
demandas por eles requisitadas e da capacidade desses recursos em se renovarem
ou não, e em quanto tempo.
O conceito está intimamente ligado à ideia de conhecimento dos limites
impostos pela escassez de recursos. Até os recursos renováveis são finitos em sua
capacidade de renovação. Compreender os fluxos descritos acima é base para que
se formulem teses que ajudem no encaminhamento do desenvolvimento de uma
produção que respeite esses limites para que se torne sustentável.
A metodologia biomimética, descrita por esses autores, também tem em
comum a indagação primordial, feita pela simples observação da natureza. Por
exemplo: como um besouro, que aparentemente não é aerodinâmico, voa? Como o
faz sem ter de “tomar impulso”? O intuito de se iniciar a pesquisa biomimética a
partir de uma observação desse tipo é garantir o menor número possível de etapas
na pesquisa. Assim, em tese, ela poderá ser iniciada de um ponto mais evoluído,
com uma validação de dados já feita pela seleção natural, experimentada por
protótipos desenvolvidos em milhões de anos. Serão analisados alguns desses
casos no capítulo seguinte. O biomimetismo pode, portanto, inserir-se no amplo
campo de pesquisas que buscam inovações tecnológicas que sejam paradigmáticas,
que alterem para melhor a relação do ser humano com o meio ambiente, de forma
que seja garantida a qualidade de vida adequada e o atendimento às necessidades
da sociedade, de acordo com os atuais níveis de conhecimento a respeito dos temas
abordados.
64
5 APLICAÇÃO DO BIOMIMETISMO NA ARQUITETURA, NO DESIGN E NO
AMBIENTE CONSTRUÍDO
A aplicação dos conceitos e as abordagens presentes no campo da
biomimética estão inseridas em um dado contexto. No que se refere à sociedade
contemporânea, esse contexto é o de enfrentamento de dificuldades com relação à
sustentabilidade.
O grande desafio para a sociedade é conciliar o crescimento
econômico, com a inclusão social e com a elevação da qualidade
ambiental, de forma sistêmica e equilibrada nos processos
produtivos. Diante desse cenário, a preocupação relacionada aos
impactos ambientais gerados pela sociedade tem induzido o
desenvolvimento de novos métodos e ferramentas que visam auxiliar
o entendimento com o controle e a redução desses impactos
(MORAES et al ,apud SETTE, 2010).
Benyus (2007) postula o princípio da ecologia industrial como sendo uma
abordagem que pode estabelecer condições de sustentabilidade para as demandas
postas pelas necessidades da sociedade. Trata-se da utilização apenas de
substâncias que a natureza reconheça e possa assimilar em ciclos produtivos, nos
quais todo o resíduo seja um subproduto e não lixo. Esses resíduos podem ser, em
função das tecnologias atuais, aproveitados em novos ciclos produtivos, utilizados
como matéria-prima.
Muitas destas matérias-primas se viabilizam em novos ciclos produtivos por
serem associadas a novas tecnologias que utilizam nanopartículas, por exemplo.
Nanotecnologias estão sendo pesquisadas com muito rigor, uma vez que recaiu
sobre essa nova classe de substâncias uma série de dúvidas a respeito da real
segurança para as pessoas e para o meio ambiente em geral. Em alguns casos, foi
descoberto um potencial cancerígeno em produtos que já estavam em fase de
lançamento no mercado. Fortes suspeitas surgiram com relação ao grafeno, por
exemplo, o que sugere cautela na adoção de tais tecnologias.
Entretanto, a precaução e a necessidade de estudos mais aprofundados
nunca foram impedimento para o avanço do desenvolvimento de novas tecnologias,
desde que tomadas as devidas precauções. Foi assim com a eletricidade, com a
radioatividade e com inúmeras outras tecnologias potencialmente perigosas. Elas
se inserem em um contexto de demandas crescentes com relação às necessidades
da sociedade, à eficiência energética e na constituição de uma sociedade mais justa
65
quanto ao acesso a bens e ao equilíbrio com o meio ambiente. Esse equilíbrio pode
ser definido de acordo com os sistemas maduros descritos por Benyus (2007). A
autora chama a atenção para a condição de sistemas naturais, definidos por ela
como sendo Sistemas Naturais Maduros ou Sistemas de Tipo III28, organizados em
comunidades que privilegiam a diversidade de seus integrantes e que se integrem
em objetivos comuns, facilitando a permanência por longos períodos no mesmo
lugar, sendo eficientes no uso dos recursos disponíveis.
Um modelo baseado em sistemas do tipo III pode, por exemplo, nos ajudar a
superar uma produção de espaço construído que vise somente organizar e proteger
as atividades humanas, atendendo à legislação e à normativa aplicável. É preciso
que se incorpore definitivamente todo o arcabouço de conhecimento disponível
atualmente na produção de um espaço construído mais adequado às necessidades
da sociedade. Tal incorporação deve ter em vista a melhoria do ambiente construído
e de bens de consumo, atendendo a essas necessidades, especialmente as
concernentes a questões sociourbanísticas ambientais, gerando energia em suas
superfícies, limpando ar e água, produzindo alimentos e dando qualidade a serviços
que tradicionalmente não foram pensados com base nos elementos que compõem o
ambiente construído.
Seguindo o postulado por Benyus (2007), são critérios biomiméticos que
podem ser aplicados:
usar resíduos como recursos;
diversificar e cooperar como forma de usar completamente o habitat;
assimilar e usar energia eficientemente;
aperfeiçoar no lugar de explorar ao máximo;
28
Os sistemas de tipo I, tipo II e tipo III são caracterizados, segundo Benyus (2007), pela
maturidade de suas condições com relação à eficiência energética produzida pela sinergia
entre as espécies que compõem estes sistemas, privilegiando a cooperação em detrimento
à competição. Assim, os sistemas de tipo I são os menos desenvolvidos, caracterizados por
desorganização de seus componentes, competição intensa, alto consumo de energia e
desperdício de recursos, sistemas que expõem seus integrantes a mortalidades periódicas e
riscos variados. Os sistemas de tipo II são intermediários, possuem processos de alguma
ordenação e sinergia entre as espécies que o compõem e caminham para um equilíbrio no
futuro, depois de ajustes. Os sistemas de nível III são os mais evoluídos, privilegiam a
cooperação, são organizados em comunidades que privilegiam a diversidade de seus
componentes e que se integram com objetivos comuns, facilitando a permanência por
longos períodos no mesmo lugar, sendo eficientes no uso dos recursos disponíveis, através
de um alto grau de sinergia entre as espécies que o compõem.
66
usar materiais parcimoniosamente;
não sujar sua morada;
não esgotar recursos;
manter-se em equilíbrio com a biosfera;
operar com base em informações;
consumir os recursos do próprio habitat.
A autora elabora, em sua obra, uma tabela, comparando dois tipos de
ecossistemas como forma de compreensão das diferenças que existem e de como
nem tudo na natureza é adequado para efeito de bioinspiração.
Tabela 1 - Tabela comparativa de tipos de ecossistemas
ESTÁGIO DE ESTÁGIO DE
ATRIBUTOS DO
DESENVOLVIMENTO DESENVOLVIMENTO
ECOSSISTEMA
BAIXO OU MÉDIO AVANÇADO
Cadeia alimentar Linear Em forma de rede
Diversidade de espécies Pequena Grande
Dimensão Pequena Grande
Ciclos vitais Curtos e simples Longos e complexos
Estratégia de crescimento Ênfase no crescimento Ênfase no controle de
(como multiplicar-se) rápido (seleção - ɼ) feedback (seleção –K)
Reprodução (quanto à
Quantidade Qualidade
massa e reprodutibilidade)
Simbiose interna (relações
Subdesenvolvida Desenvolvida
de cooperação)
Conservação de
nutrientes ou energia Precária Boa
(reciclagem)
Diversidade de padrões
Simples Complexa
(abrangência)
Diversidade bioquímica
Pequena Grande
(relacionada á resiliência)
Especializações (tarefas
Muitas Poucas
no ecossistema)
Ciclagens minerais Abertas Fechadas
Taxa de trocas de
nutrientes entre
Rápida Lenta
organismos e o meio
ambiente
Papel dos detritos
(matéria orgânica) na
Insignificante Importante
regeneração de
nutrientes.
67
Continuação
ESTÁGIO DE ESTÁGIO DE
ATRIBUTOS DO
DESENVOLVIMENTO DESENVOLVIMENTO
ECOSSISTEMA
BAIXO OU MÉDIO AVANÇADO
Nutrientes inorgânicos
Extrabióticos Intrabióticos
(minerais como o ferro)
Matéria orgânica total
Pequena Grande
(nutrientes em biomassa)
Estabilidade (resistência a
Precária Boa
perturbações externas)
Entropia (perda de
Alta Baixa
energia)
Informação (feedback
Pouca Muita
biológico)
Adaptado pelo autor, de Benyus (2007).
A tabela acima prescreve uma série de critérios que poderíamos aplicar à
produção e avaliação do ambiente construído, como forma de promover um
desenvolvimento sustentável. Tais critérios são também parâmetros úteis para a
determinação a respeito de quanto uma produção de ambiente construído pode ser
chamada de biomimética ou não. Essa questão a respeito de como definir um
ambiente construído como sendo biomimético ou não ainda suscita muita dúvida e
discussão, principalmente nos ambientes acadêmicos. Muitos projetos têm sido
apelidados de biomiméticos em concursos e exposições. Em quase sua totalidade,
porém, não se verificam ganhos objetivos de desempenho com base em aspectos
formais, não credenciando os projetos à adjetivação biomimética, tampouco a uma
proposta coerente com o postulado por Benyus ou outros autores na matéria. Assim,
são tão somente uma imitação de biomimetismo, sem conteúdo adequado para tal
credenciamento. A atual produção do ambiente construído com formas orgânicas é
muito mais um resultado da chamada arquitetura Orgânica Pós-Informática do que
de processos biomiméticos (SIANI, 2015).
O efeito da era pós-informática é notado em uma arquitetura de formas
orgânicas, que não se justificam por razões de desempenho, de estabilidade ou de
eficiência e economia. São muito mais um esforço de experimentação formal ligado
a linguagens e não se configuram, tampouco, como processos bioinspirados que
possam ser chamados de biomiméticos.
68
Fotografia 6 - Exemplo de arquitetura orgânica pós-informática
Fonte: Oikema 0. (2008), Disponível em:
<https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=4501047.> Acesso em: 05 jun.2017.
São poucos - ou inexistem - exemplos de edifícios ou de ambientes
construídos que tenham sido efetivamente concebidos de forma biomimética, ou
seja, associando soluções presentes na natureza às decisões projetuais e
tecnológicas que contribuam para a melhoria de algum aspecto do design ou do
ambiente construído. No entanto, existem projetos que podem ser mencionados
como exemplos positivos nesse aspecto. Um exemplo profícuo de edifício realmente
concebido e construído de forma biomimética é o edifício Eastgate Center, no
Zimbabue. Nele, o arquiteto Mick Pearce (1938 - ), assessorado pela empresa
Arup29, combina soluções biomiméticas sem que a construção se pareça com algo
orgânico ou mesmo lembre, em suas formas, a sua fonte de inspiração: o cupinzeiro.
29
Empresa Arup. Disponível em: <http://www.arup.com/>. Acesso em: 20 jun.2017.
69
Fotografia 7 - Edifício biomimético
Eastgate Building Harare; Disponível em: <http://inhabitat.com/building-modelled-on-
termites-eastgate-centre-in-zimbabwe/eastgate-center-harare-zimbabwe-africa-sustainable-
architecture-biomimicry-termite-mound-construction-natural-cooling-ventilation-4/>. Acesso
em: 05 jun.2017.
A questão climática é preponderante nesse projeto, que buscou eficiência
energética e conforto térmico. Isso foi obtido com base em modelos derivados das
torres de cupinzeiros locais, que já haviam resolvido este problema de forma a se
obter conforto térmico por meio de sistemas passivos. De fato, os cupins do
Zimbabue vivem em colônias dentro de torres construídas com barro, nas quais,
para sua alimentação, são cultivados fungos. Ocorre que os fungos precisam de
temperatura constante para crescer adequadamente e garantirem segurança
alimentar a toda a colônia. Esses cupinzeiros, porém, se situam em uma área em
que a amplitude térmica diária é altíssima, chegando a mais de 35ºC de amplitude
diária, com máximas de 40ºC durante o dia e mínimas, na madrugada, de 2ºC.
A condição extrema fez com que os cupins desenvolvessem uma série de
aberturas, câmaras e respiradouros que são controlados, abrindo-os e fechando-os
70
durante todo o tempo. O sistema permite que haja a regulação da temperatura e
umidade, o que garante condições adequadas à produção dos fungos que irão
alimentar a colônia. Inspirado nesses cupins, construtores bioclimáticos naturais, o
arquiteto concebeu o projeto do Eastgate Center, buscando reproduzir o mecanismo
empregado nos cupinzeiros.
O edifício não utiliza sistema de condicionamento de ar tradicional, mas um
sistema adaptado. Basicamente controlou-se, com a adequada escolha de materiais
e morfologia do edifício, a inércia térmica, o que garante equilíbrio e constância na
temperatura interna do edifício. Essa inércia é associada a uma envoltória isolante
bem vedada e protegida por brises, como forma de evitar o superaquecimento
durante o dia e a perda de calor à noite, respectivamente. Isso significa que a
ventilação e o calor são controlados durante o dia, e o calor é armazenado para a
noite, criando um ambiente de conforto propiciado pelo acentuado atraso térmico. O
projeto somente foi viabilizado em função da precisão de simulações computacionais
de desempenho térmico, e a uma acurada pesquisa acerca do funcionamento dos
cupinzeiros, executadas pela empresa especializada Arup, participante do projeto.
Os projetistas não dão visibilidade, porém, a aspectos que, analisados a
distância, suscitam questionamentos com relação ao desempenho do edifício. As
secções transversais do projeto evidenciam pisos elevados monolíticos, que não
demonstram nenhuma vocação quanto ao bom desempenho com relação ao quesito
de manutenabilidade, que, de acordo com a Norma Brasileira de desempenho (NBR
15575), é a condição de se poder manter o estado original de um sistema ou
subsistema durante sua vida útil. Além disso, não é possível avaliar as condições no
tocante à limpeza, podendo-se constituir focos de contaminação por fungos e
bactérias nesses espaços inacessíveis, que fazem parte da rede de dutos que
constituem o sistema de condicionamento passivo do edifício. Mesmo que não
coloquem a saúde dos usuários em risco, o que precisa ser verificado em estudos
de pós-ocupação, podem constituir espaço propício à produção de odores
desagradáveis e à proliferação de insetos e pequenos animais, cujo controle
normalmente se faz com substâncias químicas perigosas. No caso de avarias e
vazamentos, esses espaços podem se transformar em depósitos que mascarem
patologias da construção potencialmente danosas, inclusive a sistemas estruturais.
A necessidade de controle de radiação solar para a manutenção da
temperatura com uma envoltória isolada pode ter, como consequência, uma
71
ausência completa de radiação solar direta, tão benéfica para a salubridade dos
ambientes internos. Além disso, diminui o contato dos usuários com o exterior do
edifício, tornando-o “claustrofóbico”.
Figura 13 - Edifício biomimético – corte esquemático e ampliação
Fonte: Estante Center – seção esquemática.
Outra possibilidade de atuação daquilo que a natureza oferece como solução
para problemas específicos da sociedade se dá por meio da aplicação direta no
desenvolvimento de uma tecnologia, como, por exemplo, as fachadas com caixilhos
e vedações em vidro duplo, preenchido com solução aquosa para o crescimento de
algas, desenvolvidas na Alemanha. Nesse meio aquoso, algas se desenvolvem e se
alimentam de poluição (interna e externamente ao edifício), produzindo, pela
fotossíntese, biomassa e oxigênio. A biomassa é passível de ser utilizada de várias
72
formas e o oxigênio, disperso no ambiente como forma de serviço ambiental. As
algas podem ser escolhidas de acordo com o que se pretende produzir, sendo
utilizadas como matéria-prima para bioplásticos, enzimas, substâncias para
cosmiatria e indústria farmacêutica, indústria em geral, produção de alimentos,
rações, etc. Também existe a possibilidade de serem usadas para produção de
energia, para aquecer ou resfriar o edifício.
Em tese, a produção de caixilharia para vedação de edifícios e das próprias
vedações demanda, por si só, uma quantidade de matéria-prima e energia que não
serão muito menores do que aquelas utilizadas no exemplo associado à produção
de algas. A diferença consiste no serviço ambiental, subproduto da vedação ou
caixilho, que será produzido gerando uma possível melhora no balanço relacionado
à eficiência energética do edifício e de sua pegada ecológica, conceito importante
para uma visão sistêmica, que pode ser objeto de estudos biomiméticos.
O conceito de pegada ecológica30 surge pela primeira vez no livro Our
Ecological Footprint: Reducing Human Impact on the Earth, de 1998. Desde
1999, o Word Wide Found for Nature (WWF31) - ou Fundo Mundial para a Natureza -
tem atualizado periodicamente o cálculo de pegada ecológica em seu Relatório
Planeta Vivo32. Em 2003, Mathis Wackrnagel (1962 - ) fundou o Global Footprint
Network33, com a proposta de contribuir para a diminuição da pegada ecológica e de
buscar atribuir similar importância a esse indicador àquele atribuído ao Produto
Interno Bruto (PIB) dos países.
O Global Footprint Network colabora atualmente com vinte e dois países,
dentre eles Brasil, Alemanha, França, Finlândia, México e outros, além de contribuir
também com agências governamentais, universidades e centros de pesquisa. A
pegada ecológica é um indicador bastante complexo, que vem sendo utilizado na
30
Pegada ecológica: Disponível em:
http://www.wwf.org.br/natureza_brasileira/especiais/pegada_ecologica/o_que_e_pegada_ec
ologica/. Acesso em: 05 jun.2017.
31
Organização não Governamental (ONG) internacional, fundada em 1961, que atua nas
áreas da conservação, investigação e recuperação ambiental. Anteriormente chamada de
World Wildlife Fund, o nome ainda em é usado nos Estados Unidos e no Canadá. Disponível
em: <https://www.worldwildlife.org.> Acesso em: 11 jun.2017.
32
Relatório publicado a cada dois anos pela organização WWF. Disponível em:
<http://www.wwf.org.br/natureza_brasileira/especiais/relatorio_planeta_vivo/>. Acesso em:
11 jun.2017.
33
Disponível em: <http://www.footprintnetwork.org/.> Acesso em: 11 jun.2017.
73
avaliação dos impactos causados pelo consumo humano nos recursos naturais em
relação à capacidade da Terra de renová-los.
Utiliza-se como método para mensurar a pegada ecológica a quantificação
em área biologicamente produtiva de mar e de terra necessárias para a regeneração
dos recursos consumidos por uma população humana, além de absorver os dejetos
produzidos por ela. Assim, podemos estimar quantos planetas Terra servem para
sustentar os atuais níveis de consumo praticados pela humanidade. Se observarmos
a pegada ecológica de um indivíduo, multiplicarmos pela população do seu país e
dividirmos pela quantidade de território disponível do mesmo país, teremos o
indicador se o país é ou não sustentável. Já para calcularmos a pegada ecológica de
um indivíduo, utiliza-se uma relação entre todos os bens consumidos com uma
constante de rendimento expressa em kg por hectare. O resultado será uma
superfície em hectares necessária para a manutenção desse padrão de consumo. É
possível descrever a pegada ecológica também sob o aspecto energético,
considerando as emissões de gás carbônico em toneladas e, assim, relacionar com
a área necessária de floresta ou mar para absorver esse peso de gás.
A importância da pegada ecológica está associada, em grande parte, ao fato
de ser uma forma eficaz de determinar quanto de território é preciso reservar para
sustentar uma determinada população em função de seu nível de consumo,
atribuindo concretude ao problema. Do ponto de vista biomimético, a pegada
ecológica pode ser um critério útil para verificar se os fluxos de massa, informação e
energia estão indo no sentido de determinar um equilíbrio do sistema no qual o
ambiente construído se insere ou não, evidenciando sua validade como ambiente
sustentável.
74
Figura 14 - Edifício alimentado por algas
BIQ House Splitterwerk Architects. Disponível em\; <http://www.archdaily.com.br/br/01-
110954/e-concluido-em-hamburgo-o-primeiro-edificio-do-muindo-alimentado-
energeticamente-por-algas>. Acesso em: 05 jun.2017.
Fotografia 8 - Edifício alimentado por algas – detalhe
BIQ House Splitterwerk Architects. Disponível em: <http://www.archdaily.com.br/br/01-
110954/e-concluido-em-hamburgo-o-primeiro-edificio-do-muindo-alimentado-
energeticamente-por-algas>. Acesso em: 06 jun.2017.
75
Essa tecnologia pode auxiliar não apenas na produção de um edifício com
desempenho energético superior àqueles comumente produzidos na atualidade,
mas também permite a inserção do edifício em um enredamento sistêmico, que
pode ser biomimético, inspirado em sistemas do tipo III, descritos por Benyus (2007).
Serviços ambientais urbanos produzidos por uma arquitetura seriam o primeiro
passo para a consolidação de uma sinergia de cooperação entre os usuários de
diversos ambientes construídos. Uma vez obtido um subproduto ao invés de um
resíduo, o edifício possibilitaria um aumento de eficiência no uso dos recursos
naturais e a possibilidade de comercialização com base na quantificação e
precificação de seus serviços.
Outra possibilidade de aplicação biomimética aplicável ao ambiente
construído está presente na produção de algoritmos bioinspirados, ou seja, de
algoritmos que contenham parâmetros utilizados por determinadas espécies para a
solução de problemas específicos, como formigas e abelhas, com relação à
localização de alimento para suas colônias. Houve, nas últimas décadas, uma série
de evoluções nas tecnologias da computação que possibilitaram novas aplicações,
como simulações de desempenho, modelagens e novas aplicações para projetos de
arquitetura e design. Como salientado antes, na contemporaneidade há inúmeros
exemplos de arquiteturas que podem ser classificadas como Orgânicas Pós-
Informática, em que formas biomórficas são produzidas com o auxílio de softwares,
viabilizando edifícios e pontes com formas orgânicas. Do ponto de vista de
desempenho e de serviços e tecnologias biomiméticas, contudo, a evolução está
associada às pesquisas que copiam algoritmos da natureza, que são códigos
dedicados à resolução de um determinado problema por meio de um número finito
de passos elementares, ou seja, uma “fórmula” ou “receita” de solução para uma
dada questão solucionada a partir da parametrização. Os algoritmos bioinspirados
podem ser a chave na determinação do uso da informática em uma parametrização
e simulação computacional que resultem em um ambiente construído de fato
biomimético.
O termo algoritmo foi criado em homenagem ao matemático persa Al-
Khwarizmi (CANAL, 2012), considerado um dos primeiros matemáticos a se referir a
76
esse conceito fundamental na informática. O algoritmo34 constitui a base da noção
de cálculo de problemas, ou seja, um problema pode ser considerado calculável
quando podemos resolvê-lo por meio de um algoritmo, de uma “fórmula” ou “receita”.
O algoritmo é também um conceito fundamental nas fases de programação e
desenvolvimento dos softwares, uma vez que, dado um determinado problema, cria-
se uma tradução em códigos para a sua solução, feito em certa linguagem,
executada por um computador. O algoritmo é calculado pelo programador, que
normalmente determina que algumas variáveis sejam alteradas pelo usuário, que,
nesse caso, torna-se “coprogramador”. O software passa a ser uma ferramenta que
necessita de treino para ser utilizada corretamente. Muitas das dificuldades na
utilização decorrem basicamente da falta de familiaridade do usuário com os
conceitos presentes na formulação do algoritmo e à qualidade da informação
relacionada à sua aplicação.
No campo de pesquisas da informática, há um termo que descreve a
dificuldade: GIGO. Trata-se de uma expressão em inglês que faz referência ao fato
de que, se inseridos dados incorretos em uma simulação, o resultado será de má
qualidade, ou seja, não há uma boa utilização destas ferramentas se o usuário não
tiver informações de qualidade para inserir no programa (PAIVA, 2010). Os
programas ainda não conseguem, por enquanto, discernir acerca da aplicabilidade
ou da coerência dos dados inseridos, e se estão de acordo com o objetivo de
solução de um determinado problema, mas podem otimizar rotas, por exemplo.
34
No século passado, o conceito de algoritmo foi formalizado para que se resolvessem
problemas matemáticos ligados à tomada de decisão, formulados por David Hilbert (1862 -
1943), em 1928, e em outras sucessivas formulações que ocorreram a partir do
desenvolvimento dos conceitos de calculabilidade efetiva. As formalizações matemáticas
mais famosas são as funções recorrentes de Gödel–Herbrand–Kleene de 1930, 1934 e
1935. O cálculo Lambda de Alonzo Church e a Formulação 1 de Emil Post, de 1936, são
igualmente importantes e, finalmente, a Máquina de Turing de 1937, que possibilitou aos
aliados decifrarem os códigos alemães, auxiliando na vitória contra Hitler na Segunda
Grande Guerra. Disponível em:
<http://www.fatece.edu.br/arquivos/arquivos%20revistas/perspectiva/volume1/2.pdf>.
Acesso em: 05 jun.2017.
77
Figura 15 - Redes de inteligência artificial
France Éducation: Disponível em: <http://www.universcience.tv/categorie-nature-futur-
935.html>. Acesso em: 05 jun.2017.
Os algoritmos biomiméticos, inspirados em sistemas naturais de inteligência
coletiva, dependem menos da correta inserção de dados por parte do usuário. O
sistema de rotas do GPS35 utiliza um algoritmo de otimização bioinspirado. A
pesquisa se inicia nos anos 90, com a observação do comportamento das formigas,
que determinam rotas otimizadas ou percursos otimizados entre fontes de alimento e
suas colônias.
Esses estudos transferiram a problemática para pontos gráficos,
desenvolvendo conjuntos de regras a serem executados por computadores para
otimização de rotas. O resultado já é utilizado na França para otimização de rotas
nas logísticas de coleta de lixo, distribuição dos correios, etc.
35
GPS é a sigla para Global Positioning System (em português: Sistema de Posicionamento
Global),
78
Fotografia 9 - Relações “econômicas” naturais
France Éducation. Disponível em: <http://www.universcience.tv/categorie-nature-futur-
935.html>. Acesso em: 05 jun.2017.
Além de fornecer parâmetros que possam ser utilizados em algoritmos de
otimização de rotas, algumas espécies podem oferecer modelos de sistemas
equilibrados, nos quais os indivíduos ganham em relações simbióticas ou
mutualísticas. Abelhas, por exemplo, praticam modelos “econômicos” com as
plantas, “vendendo” serviços de polinização às plantas, que pagam com pólen e
néctar, poupando energia em frutos e gerando serviços ambientais. Modelos assim
podem servir de inspiração para novas formas de atuação econômica na sociedade,
objetivando a solução de problemas, como aqueles presentes na produção de
ambiente construído. Pode-se quantificar e precificar serviços ambientais dados por
edifícios, equipamentos urbanos, em partes ou em sua totalidade, gerando comércio
por meio de pagamentos que podem ser diretos ou por meio de incentivos fiscais,
compensações ambientais, trocas ou outras formas, avançando no comércio de
créditos de carbono e ampliando-o para outras modalidades de outorgas
relacionadas a compensações ambientais. Poder-se-ia iniciar esse percurso por
79
meio de recursos ligados ao REDD+36: o governo plantaria florestas, o crédito
poderia ser usado em arranjos de produção de habitação com tecnologias que
utilizem madeira como matéria-prima; empresas poluidoras compensariam suas
emissões, ou seja, ciclos complexos que determinariam inteiros ecossistemas
atrelando vários interesses e demandas da sociedade.
Outro exemplo de tecnologia em pesquisa que pode contribuir do ponto de
vista energético e ambiental é inspirado no movimento ondulatório dos peixes. Em
função de suas formas, eles conseguem eficiência na propulsão com o mínimo de
gasto energético possível. Os movimentos ondulatórios estão sendo aplicados na
produção de energia em usinas de propulsão por movimentos ondulatórios nas
correntes de água.
Fotografia 10 - Movimento ondulatório dos peixes
France Éducation. Disponível em: <http://www.universcience.tv/categorie-nature-futur-
935.html>. Acesso em: 06 jun.2017.
36 REDD+ é um incentivo econômico desenvolvido no âmbito da Convenção-Quadro das Nações
Unidas sobre Mudança do Clima para recompensar financeiramente países em desenvolvimento por
seus resultados no combate ao desmatamento e à degradação florestal e na promoção do aumento
de cobertura florestal. Por meio desse instrumento, países em desenvolvimento que apresentarem
reduções de emissões de gases de efeito estufa e aumento de estoques de carbono verificados por
especialistas apontados pelo Secretariado da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança
do Clima serão elegíveis a receber “pagamentos por resultados” de diversas fontes internacionais, em
particular do Fundo Verde para o Clima (GCF, na sigla em inglês) (MMA, 2014).
80
GRÁFICO 1 - Movimento ondulatório dos peixes
France Éducation. Disponível em: <http://www.universcience.tv/categorie-nature-futur-
935.html>. Acesso em: 05 jun.2017.
As centrais de produção de energia elétrica aproveitariam as correntes,
marinhas ou fluviais, utilizando membranas articuladas que, por meio de movimentos
ondulatórios, produzem movimento que gera energia elétrica. Há também pesquisas
que buscam determinar a capacidade de brejos artificiais na depuração de poluentes
emergentes, utilizando plantas e bactérias específicas, cujas propriedades e
características possibilitam o auxílio na depuração de substâncias que não são
depuradas em sistemas de saneamento tradicionais. Os poluentes chamados de
emergentes são principalmente resíduos de medicamentos, drogas, hormônios e
substâncias presentes em cosméticos, amplamente utilizados pelas populações e
lançados nos sistemas de esgotamento sanitário, cujas estações de tratamento
(ETE), quando existem, não são tecnicamente capazes de remover estas
substâncias dos efluentes, lançando o resultado do tratamento de esgotos nos rios,
contaminando as águas que podem ser utilizadas para consumo novamente, criando
um problema de saúde pública para a sociedade, uma vez que muitas das
captações de água em rios para estações de tratamento de águas (ETA) se dão a
jusante dos pontos de lançamento de esgotos tratados.
81
A foto a seguir mostra um brejo artificial que utiliza algas para a depuração de
substâncias emergentes em um percurso da água que é feito a partir de
parametrização com algoritmos bioinspirados (aparelho digestivo) para otimização
de infraestrutura de saneamento, com, segundo estudos apresentados no
Congresso sobre Biomimetismo do CEEBIOS de 2017, uma redução de 38% na
área ocupada pelo sistema de depuração em comparação a plantas tradicionais, de
áreas reticuladas. Trata-se de um exemplo de tecnologia que agrega melhoria da
qualidade de vida das populações (aspecto social), da qualidade do espaço
construído (pelo aspecto ambiental), além da diminuição dos impactos da
antropização no meio ambiente (aspecto paisagístico).
Figura 16 - Estação de tratamento esgotos biomimética
France Éducation. Disponível em: <http://www.universcience.tv/categorie-nature-futur-
935.html>. Acesso em: 05 jun.2017.
Esses algoritmos bioinspirados podem, ainda, ajudar na diminuição dos
percursos em sistemas de tubulações em indústrias. O exemplo a seguir é retirado
de uma pesquisa na qual, por meio do desenvolvimento de um software também
baseado em algoritmos inspirados em sistemas digestivos, otimizam-se os percursos
82
de tubulações em plantas industriais. O primeiro quadro mostra a planta de uma
indústria química elaborada com base em tubulações e conexões que descrevem
percursos em função das suas capacidades em fazer curvas, de forma ortogonal. O
segundo quadro mostra os percursos otimizados pelo software, evidenciando a
necessidade de se desenvolverem tecnologias de tubos e conexões adequadas a
essa nova condição de planta. Os desdobramentos dessa pesquisa são inúmeros;
desde necessidades ligadas à permanência de áreas para segurança, logística e
manutenção do sistema, até questões de relacionadas à redução de percursos dos
gases e líquidos que podem produzir calor ou resfriamento diferentes dos
apresentados historicamente com a tecnologia “antiga”. Isso significa que muitas
pesquisas ainda serão necessárias para a implementação desses sistemas. O que
ficou evidenciado é que o desempenho se altera sensivelmente a partir da
observação da natureza.
Figura 17 - Planta de indústria
Disponível em: http://ceebios.com/. Acesso em: 06 jun.2017.
83
Figura 18 - Planta de indústria após aplicação de algoritmo bioinspirado
Disponível em: <http://ceebios.com/>. Acesso em: 06 jun.2017.
84
6 APLICAÇÃO DO BIOMIMETISMO PARA O DESENVOLVIMENTO E A
SISTEMATIZAÇÃO DE CRITÉRIOS SOCIOURBANÍSTICO AMBIENTAIS NA
MELHORIA DA QUALIDADE E AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DO AMBIENTE
CONSTRUÍDO
O presente estudo não se propõe à determinação de todas as hipóteses de
aplicação do biomimetismo no desenvolvimento e na sistematização de critérios
sociourbanísticos ambientais para a melhoria e avaliação de desempenho do
ambiente construído, condição que seria totalmente descabida para a dimensão do
presente estudo e da capacidade do autor. Pretende, sim, contribuir com uma
pesquisa que possibilite o desenvolvimento e a sistematização que possam ser úteis
em estudos futuros, favorecendo uma conceituação que dê consistência a hipóteses
e estudos outros.
Entretanto, por razões epistemológicas, para validação das escolhas dos
conceitos aqui apresentados e para o encaminhamento de uma discussão que ajude
a balizar os aspectos a serem levados em consideração no futuro, essa etapa do
trabalho simula algumas hipóteses de desenvolvimento e sistematização,
transpondo alguns conceitos postulados por Benyus (2007), para o estabelecimento
de critérios. São eles:
usar resíduos como recursos;
diversificar e cooperar como forma de usar completamente o ambiente;
assimilar e usar energia eficientemente;
aperfeiçoar ao invés de explorar ao máximo;
usar materiais parcimoniosamente;
não esgotar recursos;
operar com base em informações;
consumir os recursos do próprio ambiente.
Como sugestão para a adoção de critérios que podem ser incorporados
àqueles existentes na legislação brasileira na produção de arquitetura, elemento
preponderante na qualificação do ambiente construído, com relação a três
dimensões (social, urbana e ambiental), seguem algumas questões.
Para a dimensão social, podemos levantar os seguintes aspectos:
gera renda ou custo ao usuário?
85
Há controle dessa variável por parte do usuário?
Qual o nível de certeza/garantia dessas informações?
Para a dimensão urbana e construtiva, os seguintes aspectos:
gera melhoria na qualidade da arquitetura (aumento de desempenho,
facilitação ao acesso por parte da população, etc.)?
Há reversibilidade da condição?
Qual o nível de certeza/garantia dessas informações?
Para a dimensão ambiental, os seguintes aspectos:
gera que tipo de impacto no meio ambiente?
Há controle dessa variável por parte das autoridades competentes?
Há reversibilidade da condição?
Qual o nível de certeza/garantia dessas informações?
Qual a sua função, como e em quais fluxos se insere e em qual sistema?
A tabela a seguir traz alguns dos conceitos postulados por Benyus (2007), já
apresentados na tabela 1, que compara tipos de ecossistemas mais ou menos
avançados. Aqui, contudo, estão simplificados para o ambiente construído e
apresentados como possíveis critérios voltados à sua qualidade. A tabela apresenta
vários conceitos como sendo benéficos, como, por exemplo, o de fluxos de massa
longos e complexos. Esse exemplo de fluxo de massa longo e complexo para o
ambiente construído pode ser dado pela superação da vida útil de sistemas e
subsistemas construtivos que compõem os edifícios, ou seja, o sistema e/ou
subsistema deverá ter uma vida útil muito mais longa do que a arquitetura que
produz.
86
Tabela 2 - Atributos e caracterização do ambiente construído
ATRIBUTOS DO AMBIENTE CONSTRUÍDO CARACTERIZAÇÃO
Abastecimento energético Em forma de rede
Diversidade de usos Grande
Adensamento Grande
Fluxo de massa Longos e complexos
Ênfase no controle de feedback (seleção
Estratégia de crescimento (como multiplicar-se)
–K)
Produção de unidades Qualitativa
Simbiose interna (relações de cooperação) Desenvolvida
Conservação de recursos Boa
Diversidade de padrões Complexa
Resiliência Grande
Especializações Poucas
Fluxos de massa Fechados
Custos de manutenção Baixos
Papel dos resíduos (matéria orgânica) na
Importante
regeneração de energia e recursos.
Papel dos resíduos (matéria inorgânica) Alto índice de reuso
% de áreas verdes para cultivo de alimentos Grande
Entropia (perda de energia) Baixa
Informação (feedback sociocultural) Alto
Adaptado pelo autor, de Benyus (2007).
A materialidade, a arquitetura e os bens de consumo também devem alterar-se
com o tempo, ter suas características atualizadas, uma vez que tanto a sociedade,
como suas demandas, igualmente se alteram no tempo, criando uma dificuldade de
produção de tecnologias que superem o conceito de obsolescência programada.
Assim, são necessários novos modelos de negócios ligados aos mercados e à
produção da arquitetura e do design, viabilizando sua expansão e afugentando
alguns dos entraves criados pela escassez de recursos e pelos problemas
ambientais.
87
7 CONSIDERAÇÕES CRÍTICAS
A pesquisa foi realizada com base em um amplo levantamento de dados
secundários e teve, como decorrência, uma série de questões que foram suscitadas,
explicitadas nas presentes considerações e análises críticas. O biomimetismo surge
apenas na contemporaneidade, em função do desenvolvimento das tecnologias de
informática, do desenvolvimento de softwares e de hardwares mais potentes e
baratos, que viabilizaram o acesso a muitos centros de pesquisa.
Essa nova realidade tecnológica possibilitou o avanço de pesquisas nas áreas
ligadas às ciências naturais que, retroalimentadas pelas novas tecnologias de
informática, permitem estudos complexos em tempo reduzido, condição que
favoreceu o surgimento do biomimetismo como área de estudo viável. Para o
ambiente construído e, principalmente, para a arquitetura e design, o biomimetismo
pode ser utilizado como metodologia para o aumento de desempenho, entendido
como atendimento às necessidades dos usuários em função dos atuais níveis de
conhecimento em diversas áreas, sobretudo quando são observados os aspectos
sociourbanístico ambientais descritos por Benyus, por exemplo.
A viabilidade econômica da aplicação do biomimetismo para a arquitetura, para
o design e para o ambiente construído é determinada especialmente pela
disponibilidade de inter, multi e transdisciplinar nos grupos de estudo e nas
empresas, uma vez que esta condição é primordial na área. A vantagem econômica
do biomimetismo reside no fato de que muitas das soluções inspiradas nos seres
vivos já estão prontas e testadas, eliminando boa parte do desenvolvimento de
novos produtos e tecnologias. Tal aspecto de antecipação nas soluções postas na
natureza, especialmente nos seres vivos, é o principal fator de viabilidade
econômica do biomimetismo para as várias áreas de aplicação.
Pela sua relevância, associada aos desdobramentos ambientais, o
biomimetismo deve ser ensinado nas escolas de arquitetura e design, como forma
de alternativa metodológica às demandas da atualidade. Também é necessário que
esses conceitos sejam popularizados nas instituições de pesquisa e ensino,
sobretudo naquelas de design e arquitetura, promovendo uma discussão necessária
ao seu amadurecimento e à sua consolidação como área do saber. O conteúdo deve
ser oferecido de forma transversal e apoiado por profissionais capazes de dar
suporte nas várias áreas do conhecimento envolvidas, de acordo com a dimensão
88
da linha de pesquisa que se pretende atuar, como a física, a química, a biologia, a
computação e a filosofia.
O estudo do biomimetismo e suas aplicações deve ser monitorado, como nas
demais áreas sensíveis a aspectos éticos, ou seja, submetidos a uma constante
vigilância dos comitês de ética, para que não se incorra em falha ética, voluntária ou
involuntariamente, uma vez que a transposição dos conceitos de humanidade e
naturalidade podem gerar tensões. Nesses casos, que são notadamente
relacionados à arquitetura e ao espaço construído e não a tecnologias específicas, o
biomimetismo não será uma opção válida como metodologia.
89
CONCLUSÃO
São muitos os desafios para que o biomimetismo se consolide como um campo
do conhecimento voltado à aplicação para o desenvolvimento e sistematização de
critérios sociourbanísticos ambientais na melhoria da qualidade e avaliação de
desempenho da arquitetura. Apesar disso, a velocidade com que as mudanças
relacionadas à popularização de novas tecnologias e aos avanços da ciência em
diversos campos pode estar mudando a realidade na qual essa afirmação foi
gerada. Estudiosos de diversas áreas do conhecimento estimam que as
transformações que se verificam na atualidade estão alterando nosso modo de vida,
nossa maneira de pensar e de perceber o mundo, de forma muito rápida.
No início do século XX, cerca de 60% da população mundial vivia em
condições que, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), eram de
pobreza extrema. Esses indivíduos eram, em sua maioria, agricultores, analfabetos,
que dispunham de meios de produção rudimentares, excluídos dos grandes circuitos
de comércio mundiais. Atualmente, mesmo considerando-se que muitos países
ainda possuem uma parcela significativa de população em situação de extrema
pobreza, o percentual hoje é de cerca de 30% da população mundial. Em termos
absolutos, é evidente que a situação ainda se configura como uma tragédia
humanitária de proporções gigantescas. Por outro lado, também demonstra uma
mudança significativa nas condições econômicas e sociais, o que pode ser um
indicador de que mudanças paradigmáticas podem vir a acontecer ou que já estão
em curso.
A evolução histórica mostra uma grande capacidade humana de se organizar e
de melhorar suas condições de vida. Isso pode abarcar parcelas imensas de
população, aumentando a expectativa de vida, diminuindo os níveis de mortalidade
infantil e oferecendo mais acesso regular a alimentos, à educação, à saúde e à
moradia digna, ou seja, melhorando a qualidade de vida em todos os aspectos
tangíveis e intangíveis.
O analfabetismo também foi reduzido globalmente nas últimas décadas, com
um aumento expressivo de alfabetização entre mulheres. Trata-se de um dado de
extrema relevância, uma vez que existe uma correlação entre alfabetização, acesso
ao mercado de trabalho e emancipação feminina. Por conseguinte, isso também
gera maior controle de natalidade, mais planejamento familiar e adoção de métodos
90
contraceptivos, fazendo com que alguns autores descrevam uma tendência à
estabilização do número de habitantes no mundo. Esses fatores aliados podem nos
abrir uma janela de oportunidade para que, finalmente, alcancemos uma adequação
dos níveis de consumo à quantidade de recursos naturais disponíveis no planeta.
A esse cenário, acrescente-se o fato de haver cada vez mais difusão de meios
eletrônicos de comunicação, remodelando os fundamentos materiais da sociedade
de consumo. A nova realidade tecnológica tem desencadeado uma nascente
realidade nas estruturas produtivas, nas relações sociais e, portanto, da vida
cotidiana, no ambiente construído. A renda per capita média mundial também foi
incrementada e o fenômeno da globalização fez aumentar a produtividade mundial
em mais de cinco vezes. Um dos aspectos negativos desse desenvolvimento global
é o do rompimento do equilíbrio natural, uma vez que a melhoria dos níveis de
consumo das populações significa também um aumento brutal no uso de recursos
naturais, criando uma emergência ambiental. Esse é hoje o maior desafio à
sobrevivência da humanidade.
O contexto de criação de uma possível janela de oportunidade, relacionada às
mudanças na sociedade e de um risco à sobrevivência da humanidade no planeta,
pode ser, contudo, o ambiente propício para uma conscientização difusa a respeito
da necessidade da observância dos problemas relacionados à produção de
arquitetura, de design e, por fim, do ambiente construído. É possível que essa
solução se dê de forma mais sistêmica e baseada em paradigmas que considerem
efetivamente todas as variáveis presentes nas questões relacionadas à escassez de
recursos e à qualidade socioambiental. O biomimetismo está inserido nesse
contexto como uma possibilidade efetiva de encaminhamento e inspiração, em
linhas de pesquisa que o utilizarão não apenas como uma metodologia, mas como
um paradigma para o enfrentamento dessas questões, aproveitando as lições que a
vida, na natureza, tão generosamente tem nos deixado em sua trajetória de
superação.
91
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Com forma humana; semelhante ao homem (espécie);
Antropomórfico
algo a que se atribuem características humanas.
Ambiente É o ambiente composto por edifícios, espaços públicos
construído abertos ou fechados, dentre outros.
Observação da natureza para utilização em processos
Bioinspiração
biomiméticos ou biomórficos.
Ramo da ciência que estuda as relações, ações e reações
Biomecânica físicas e mecânicas das estruturas biológicas ou seres
vivos.
Processo bioisnpirado, notadamente nos seres vivos e
Biomimetismo suas características, de desenvolvimento e pesquisa,
voltado a soluções sustentáveis.
Que possui formas inspiradas naquelas encontradas na
Biomórfico
natureza, notadamente nos seres vivos.
Estudo da relação evolutiva entre grupos de organismos
Filogenia descoberto por meio de sequenciamento de dados
moleculares e matrizes de dados morfológicos.
Framework Termo da língua inglesa que designa “quadro teórico”.
Corrente de pensamento que atribui a forma de um objeto
Funcionalismo
ou indivíduo às funções que este executa.
Espaço conceitual teórico capaz de compreender diversas
Hiperespaço
dimensões.
Relativo ao metabolismo (conjunto de processos e
Metabólico fenômenos físicos e químicos intrínsecos a um
organismo).
Referente à morfologia (à forma evolutiva e
Morfológico
desenvolvimental).
Relativo a um ou mais parâmetros (variáveis ou
Paramétrico dimensões que compõem ou ajudam a produzir uma
determinada forma ou característica).
Ramo da ecologia que estuda as inter-relações entre as
Sinecologia
comunidades de seres vivos e o meio ambiente.
Teleológico Orientado por um objetivo ou finalidade.