PROJETO DE MOTOPLANADOR R/C CATEGORIA F5J
Oswaldo Palomba Neto
Fernanda Signor
Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) - Av. Roraima, 1000
[email protected][email protected]Resumo. Propõe-se o projeto, análise aerodinâmica e construção de um motoplanador elétrico R/C para a categoria FAI
F5J com estrutura mista em madeira e isopor. O projeto se dá através da análise da polar de velocidades objetivando-
se fazer um planador que seja capaz de voar na mínima carga alar permitida e que minimize o mínimo afundamento
melhorando a subida em térmicas.
Palavras chave: Aerodinâmica, F5J, Aeromodelo, Planadores
1. INTRODUÇÃO 2.1 Categoria FAI F5J
A classe de competição FAI F5J atualmente é dominada A categoria F5J consiste em uma competição de mo-
por planadores de altíssimo desempenho que empregam uso toplanadores radiocontrolados regidos pela FAI (Federação
extensivo de material composto. O projeto de um motopla- Aeronáutica Internacional).
nador com estrutura tradicional empregando madeira balsa A competição consiste na realização de voos de no má-
se torna um grande desafio, visto que devido às proprieda- ximo 10 minutos, com uso de motor permitido somente uma
des mecânicas inferiores se torna inviável o projeto de pla- vez, desde que o tempo não exceda os 30 segundos iniciais
nadores com alongamentos iguais aos planadores de com- do voo. A pontuação é atribuída de acordo com a altura em
pósitos. O custo de um motoplanador topo de linha bem que foi realizado o corte do motor, tempo de voo e proximi-
como o emprego de materiais compósitos em projeto na- dade do alvo após o pouso.
cionais é demasiadamente alto e por isso no Brasil mode- As restrições propostas pelo regulamento e que são apli-
los de balsa com menor envergadura ainda são maioria nas cáveis ao projeto do planador estão expostas na Tabela 1.
competições.
Propôs-se, portanto, um projeto aerodinâmico e a cons-
trução de um planador com 2,5 m de envergadura com es- Tabela 1: Restrições da categoria FAI F5J
trutura mista de madeira e isopor. O projeto tomou como Requisito Valor
base o planador nacional Tera V5. Estabeleceu-se como Área máxima sustentadora (i) 150 dm2
objetivo o uso da polar de velocidades trimada como pa- Massa total máxima (ii) 5 kg
râmetro de análise de desempenho e buscou-se minimizar Máxima envergadura (iii) 4m
o mínimo afundamento através de uma maior área de asa. Carregamento total (iv) 12 à 75 g/dm2
Isso permite que a estrutura fique no limite inferior de carga
alar da categoria, mesmo quando construído sem madeiras
ou materiais tão leves.
É interessante pontuar algumas restrições que não são
2. PROJETO usuais, sendo essas (i) e (iv):
• (i) → Esse valor de área máxima se refere à todas
superfícies sustentadoras portanto engloba área das
O projeto se deu através da análise dos requerimentos da
empenagens e canard’s;
categoria FAI F5J, apresentados em Internationale (2023)
e também de comparativo com o planador nacional Tera • (iv) → Esse valor é diferente do usual, carga alar, o
V5. Para o projeto aerodinâmico, empregou-se o XFOIL cômputo é realizado levando em conta também a área
calibrado com dados de túnel conforme o proposto por Ku- de todas superfícies sustentadoras portanto no caso de
brynski (2012) para o cálculo das polares de perfil acoplado um planador com empenagem convencional a carga
com deduções da Lifting Line Theory (LLT) para a obtenção alar real será maior que 12 g/dm2 .
de polares de velocidade trimadas e de Reynolds variável
2.2 Tera V5
conforme de Freitas Pinto et al. (1999).
O planador Tera V5 é um projeto nacional em madeira
balsa que obteve grande sucesso nas competições, a Tabela
2 e Figura 1 apresentam as características gerais do plana-
dor.
SEAM 2023
Anais do II Simpósio Gaúcho de Engenharia Aeroespacial e Mecânica, UFSM
Santa Maria, RS, 24 a 26 de outubro de 2023
Organização: Centro de Tecnologia, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Mecânica e Departamento de Engenharia Mecânica
2.3 Calibração XFOIL
Para a alimentação do cálculo aerodinâmico optou-se
por análises realizadas no XFOIL com a calibração pro-
posta por Kubrynski (2012). Realizou-se a simulação com o
perfil AG35, amplamente utilizado na categoria, e os dados
de túnel disponíveis em Lyon et al. (2012) para Reynolds -
100000, compatível com o do planador em voo. Conforme
a Figura 3, obteve-se boa concordância com os dados expe-
rimentais, em azul, utilizando-se CFAC igual à 2 sendo este
o valor adotado para a geração das polares de perfil.
Figura 1: Planador Tera V5
Tabela 2: Características do planador Tera V5
Parâmetro Valor
Envergadura [m] 2,25
Comprimento [m] 1,03
Figura 3: Calibração XFOIL
Área de asa [m2 ] 33,8
Alongamento [-] 15,0
Peso mínimo de voo [g] 568 2.4 Forma em planta da asa
Carga alar FAI [g/dm2 ] 15,72
Adotou-se forma em planta elíptica para empenagens e
Carga alar [g/dm2 ] 16,81
para asa a forma em planta de Schuemman, Gudmundsson
(2013), devido à limitação do método de fabricação esco-
Apesar do excelente desempenho, alguns pontos de me- lhido para as asas. Como essas serão fabricadas com estru-
lhoria foram pontuados para serem incorporados no projeto tura em isopor através de corte com fio quente, só é possível
aqui apresentado sendo esses: a realização de formas em plantas trapezoidais. A forma
em planta de Schuemman aproxima-se da elíptica através
• Minimizar a relação de braço entre cauda e na-
do uso de três seções trapezoidais com afilamento variável.
riz → no Tera V5 esse braço é de 7/1, ou seja, para
Para a definição do alongamento ótimo considerando o caso
cada grama na cauda são necessários 7 gramas no na-
de envergadura fixa, realizou-se uma varredura conforme
riz para compensar o CG. Isso dificulta bastante que o
proposto Thomas and Milgram (1999). Vale pontuar que,
planador final esteja na carga alar mínima FAI e exige
devido à envergadura fixa em 2,5 m, o aumento de alon-
o uso de materiais muito leves na cauda;
gamento - que é responsável pela redução do arrasto indu-
• Articulação do leme e do profundor → O ponto de zido - ocorre através da redução de cordas da asa portanto,
articulação do leme se encontra justamente em um há uma redução do Reynolds com subsequente aumento do
ponto que não é dobradiçado, conforme Figura 2, isso arrasto parasito. Assim, existe um alongamento ótimo de
acarreta em folgas no comando. acordo com o parâmetro avaliado.
Avaliou-se varreduras de alongamento em busca do má-
ximo planeio e do índice de mínimo afundamento, os resul-
tados são apresentados nas Figuras 5 e 4 com o perfil AG35.
Figura 2: Articulação do leme - Tera V5 Figura 4: Máximo planeio x Alongamento
2
nariz, chegando-se ao braço de 2,73 / 1.
2.6 Desempenho do planador completo
Para o cálculo da aerodinâmica do planador completo
empregou-se a metodologia proposta por de Freitas Pinto
et al. (1999) alimentando-se a asa e a empenagem horizon-
tal com dados numéricos obtidos com o software XFLR5 e
polares de perfil calibradas obtidas via XFOIL conforme o
apresentado na Seção 2.3 calculando-se o arrasto da fusela-
gem e empenagem vertical através das metodologias empí-
ricas apresentadas em Gudmundsson (2013). As caracterís-
Figura 5: Mínimo afundamento x Alongamento ticas finais são apresentadas na Tabela 3 abaixo e pode-se
visualizar o modelo CAD na Figura 7.
Optou-se, portanto, por adotar uma forma em planta
com alongamento intermediário entre o de máximo planeio
e o de mínimo afundamento. A forma em planta e seus pa-
râmetros podem ser visualizados na Tabela 3.
A Figura 6 apresenta um comparativo entre a polar de Tabela 3: Características do planador
velocidades da asa projetada, F5J de ponta e do Tera V5. Parâmetro Valor
Vale pontuar que essa polar de velocidades diferente das Envergadura [m] 2,50
calculadas pela varredura é destrimada, levando em conta Comprimento [m] 1,22
somente a aerodinâmica estimada da asa. Isso é feito já que Área de asa [dm2 ] 51,0
a polar de velocidades completa não é fornecida pelos fa- CMA [m] 0,220
bricantes. Logo, devido à essa limitação, espera-se que os SHT [dm2 ] 7,34
valores apresentados sejam otimistas, mas ainda assim sir- SVT [dm2 ] 3,53
vam para comparações qualitativas. Pode-se visualizar os Alongamento [-] 12,2
dados finais nas Figuras 8 e Tabela 3. Peso mínimo de voo [g] 693
Carga alar FAI [g/dm2 ] 12,06
Carga alar [g/dm2 ] 13,59
Melhor Planeio [-] 19,3 / 1
Mínimo afundamento [m/s] - 0,28
Figura 6: Comparativo de polares de velocidade
Nota-se que, conforme proposto, foi possível obter um
mínimo afundamento mais próximo do de um F5J de ponta.
Ainda, vale destacar que a diferença de desempenho se deve
ao fato dos F5J’s de ponta possuírem flaps, envergadura pró-
xima ao limite de 4 m e também estrutura em material com-
pósito, permitindo que mantenham a mínima carga alar da
FAI apesar da maior envergadura.
Figura 7: Vista isométrica do planador em CAD
2.5 Projeto da fuselagem
A fuselagem foi projetada com o estabilizador horizon-
tal à frente do estabilizador vertical, permitindo assim que
o leme esteja integrado na estrutura, melhorando a fixação e A polar de velocidades e a decomposição de arrasto da
reduzindo folgas. Além disso, projetou-se a fuselagem tam- configuração completa está apresentada nas Figuras 8 e 9
bém de modo a reduzir bastante o braço entre a cauda e o abaixo.
3
Na Figura 11 visualiza-se o planador montado e na Fi-
gura 12 é apresentado o planador em voo.
Figura 8: Polar de velocidades Figura 11: Planador montado
(a) (b)
Figura 12: Planador em voo
Figura 9: Porcentagem do arrasto total x coeficiente de sus-
tentação 4. RESULTADOS
Nota-se que o arrasto total do planador é dominado pelo Conclui-se que os objetivos propostos foram alcançados
arrasto parasita e há possibilidade de melhoria no desempe- e conforme a Tabela 3, nota-se que o protótipo em sua con-
nho através da otimização do perfil. figuração atual ficou muito próxima da carga alar mínima
prevista pela FAI. Portanto, com 0,28 m/s de mínimo afun-
3. FABRICAÇÃO E VOO damento apresenta rendimento muito próximo aos 0,20 m/s
de afundamento de um F5J de compósito e maior enver-
As Figuras 10 ilustram a construção do protótipo. Para a gadura. Além disso, em voo, o planador apresentou boas
asa com estrutura primária em isopor e reforços de madeira características de estabilidade e controle e desempenho sa-
balsa e varetas de fibra de vidro, optou-se pela fabricação tisfatório.
através do corte em fio quente, cortando-se as 6 seções tra-
pezoidais que compõem a forma em planta da asa. de Freitas Pinto, R.L.U., de Barros, C.P. and de Oliveira,
A fuselagem foi construída com estrutura de balsa e re- P.H.I.A., 1999. “Um procedimento alternativo para cál-
forços em acrílico, ambos cortados à laser e dispondo de culo aerodinâmico de aeronaves leves subsônicas”.
encaixe e juntas chanfradas para a fixação da estrutura. Gudmundsson, S., 2013. General aviation aircraft de-
sign: Applied Methods and Procedures. Butterworth-
Heinemann.
Internationale, F.A., 2023. “Fai sporting code - volume f5
radio control electric powered motor gliders”.
Kubrynski, K., 2012. “Design of a flapped laminar airfoil
for high performance sailplane”. In 30th AIAA Applied
Aerodynamics Conference. p. 2662.
Lyon, C.A., Broeren, A.P., Giguere, P., Gopalarathnam, A.
and Selig, M.S., 2012. Summary of Low Speed Airfoil
Data: Volume 5. University of Illinois.
Thomas, F. and Milgram, J., 1999. Fundamentals of sail-
(a) (b) plane design. College Park Press College Park, MD,
Figura 10: Planador em voo New York.