L Gica Matem Tica 1743373553
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14 de março de 2025
Prefácio
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Sumário
1 Introdução e contexto 5
1.1 O paradoxo de Zenão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
1.2 O paradoxo do mentiroso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
1.3 O paradoxo da escolha . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6
1.4 O paradoxo do hotel de Hilbert . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7
1.5 Considerações finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
5 Álgebra proposicional 27
5.1 Porpriedades da conjunção e disjunção . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27
5.2 Propriedades da condicional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
5.3 Equivalências notáveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
5.4 Formas normais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
5.5 Obtenção da FNC via tabela verdade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
5.6 Obtenção da FND via tabela verdade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
5.7 Obtenção algébrica das formas normais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
5.8 Metodologia para obtenção algébrica das formas normais . . . . . . . . . . . . . . . 34
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5.9 O operador NAND e sua importância na computação . . . . . . . . . . . . . . . . . 37
5.10 Considerações finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
6 Inferência lógica 39
6.1 Regras de inferência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
6.1.1 Modus Ponens (MP) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
6.1.2 Modus Tollens (MT) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
6.1.3 Silogismo Hipotético (SH) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
6.1.4 Silogismo Disjuntivo (SD) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42
6.1.5 Silogismo de Alternância (SA) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42
6.2 Outras regras de inferência lógica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43
6.3 Exemplos e exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43
6.4 Considerações finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53
7 Técnicas dedutivas 55
7.1 Prova direta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55
7.2 Inconsistência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57
7.3 Prova condicional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59
7.4 Prova por redução ao absurdo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62
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11 Técnicas dedutivas na lógica de predicados 99
11.1 Prova condicional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105
11.2 Prova por redução ao absurdo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 108
11.3 Considerações finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 110
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1 Introdução e contexto
Antes de inicarmos nossos estudos, a primeira pergunta que surge é: o que exatamente é lógica?
Não há uma resposta simples para essa questão, mas podemos entender a lógica como uma ferramenta
matemática para formalização do estudo de formas de raciocínio. Em outras palavras, a lógica está
diretamente relacionada com a corretude do pensamento.
Mas afinal para que serve a lógica? Ela define a base para diversas áreas da ciência, como a
filosofia, a linguística, a matemática e a computação. Em especial, na ciência da computação, a
lógica desempenha um papel fundamental em diversas subáreas, como o projeto e desenvolvimento
de circuitos digitais, a construção e análise de algoritmos via lógica de programação e a inteligência
artificial.
As origens da lógica datam de 350 A.C na Grécia antiga com Aristóteles, discípulo de Platão.
Ele é considerado o pai da lógica, pois estabeleceu os alicerces do pensamento lógico e formal. Foi
também o primeiro a sistematizar a arte de argumentar e raciocinar de maneira estruturada, através
de seu trabalho no campo da lógica formal, especialmente no desenvolvimento do silogismo. Seus
estudos, compilados na obra Órganon, introduziram as primeiras formas de raciocínio dedutivo, que se
tornaram a base para a lógica matemática moderna. Aristóteles enfatizou a importância da validade
dos argumentos e a relação entre premissas e conclusões, conceitos que continuam a ser centrais
no estudo da lógica até os dias de hoje. Assim, a lógica aristotélica não só moldou o pensamento
filosófico da época, como também estabeleceu um padrão para as investigações posteriores nas áreas
de filosofia, matemática e ciência da computação.
Ao estabelecer as bases da lógica formal, Aristóteles não só possibilitou o estudo rigoroso dos
argumentos válidos, mas também lançou as bases para a análise crítica de falácias e paradoxos, ele-
mentos essenciais no desenvolvimento da filosofia e da lógica ao longo da história. Falácias são erros
de raciocínio que, embora possam parecer convincentes, não são logicamente válidos, ao passo que
paradoxos são situações em que a lógica leva a conclusões contraditórias ou aparentemente irracio-
nais, mas que de alguma forma, são válidas.
A seguir, discutiremos alguns paradoxos interessantes que permanecem relevantes até os dias de
hoje.
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Em uma explicação moderna, a soma infinita das frações de distância percorrem um valor finito.
O conceito de série convergente, formalizado no cálculo, resolve essa aparente contradição ao mostrar
que a soma dessas distâncias tem um limite.
• Teorias de hierarquia da linguagem (Tarski): Alfred Tarski propôs que enunciados autorrefe-
rentes sobre a verdade são problemáticos porque misturam diferentes níveis de linguagem. Ele
sugeriu que a verdade deveria ser definida apenas em um nível superior, evitando contradições.
• Lógica paraconsistente: Algumas abordagens modernas aceitam que certas proposições podem
ser verdadeiras e falsas ao mesmo tempo, permitindo lidar com paradoxos sem contradições
explosivas.
• Abordagem dialeteísta (Priest): Graham Priest argumenta que a melhor solução é aceitar que
algumas afirmações podem ser simultaneamente verdadeiras e falsas, desafiando a lógica clás-
sica.
O paradoxo do mentiroso continua sendo um dos problemas mais intrigantes da filosofia da lógica,
influenciando o desenvolvimento da matemática, computação e teoria da linguagem.
1. Gerar sobrecarga cognitiva – O indivíduo precisa analisar muitas alternativas, o que pode ser
exaustivo.
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2. Criar arrependimento – Após a escolha, pode-se pensar nas opções rejeitadas e se arrepender.
3. Aumentar expectativas irreais – Com muitas opções, há a sensação de que sempre existe uma
escolha "perfeita", gerando frustração quando a realidade não corresponde.
• Marketing e consumo: Empresas reduzem a quantidade de opções para facilitar decisões dos
clientes.
• Design e tecnologia: Interfaces mais intuitivas evitam sobrecarga de decisão (exemplo: Netflix
sugere filmes ao invés de listar todos).
Uma solução sugerida por Schwartz é encontrar um equilíbrio: ter opções suficientes para garantir
liberdade, mas não tantas a ponto de gerar estresse ou paralisia decisória.
O Hotel de Hilbert nos traz lições importantes que ilustram as propriedades estranhas do infinito:
• Infinitos conjuntos podem ter o mesmo tamanho, mesmo que um contenha o outro (exemplo:
os números pares têm a mesma cardinalidade dos números naturais).
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• Adicionando elementos a um conjunto infinito, ele continua tendo a mesma cardinalidade.
A manipulação do infinito desafia nossa intuição sobre espaço e limite. Esse paradoxo é funda-
mental para entender os conceitos de infinito enumerável e infinito maior da teoria de conjuntos de
Georg Cantor.
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2 A linguagem da lógica proposicional
A lógica proposicional é uma linguagem formal para o cálculo de proposições. Sendo assim, é
preciso definir suas componentes principais. Os objetivos deste capítulo são:
4. símbolos de pontuação: ( e );
Definição 2 (Proposição) Uma proposição é uma sentença que exprime um pensamento de sentido
completo. Proposições afirmam fatos sobre entidades.
1. 𝑝 : 𝜋 > 3.
Toda proposição 𝑝 possui um valo lógico 𝑉𝐿 (𝑝) que pode ser 𝑇 (verdadeiro) ou 𝐹 (falso). Por
exemplo, para as proposições anteriores, temos 𝑉𝐿 (𝑝) = 𝑇 , 𝑉𝐿 (𝑞) = 𝑇 , 𝑉𝐿 (𝑟) = 𝐹 e 𝑉𝐿 (𝑠) = 𝐹 . As
proposições anteriores são simples (átomos), mas podemos ter proposições compostas (geralmente
denotadas por letras maiúsculas).
• 𝑅 : Se um jogador de futebol recebe 2 cartões amarelos no mesmo jogo, então ele deve ser
expulso.
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2.1 Princípios fundamentais da lógica clássica
A lógica matemática é baseada em princípios fundamentais que garantem a coerência e a validade
do raciocínio formal. Esses princípios são essenciais porque estabelecem as regras básicas para a
construção de argumentos corretos e para a fundamentação da matemática e da computação. A seguir,
listamos os princípios básicos da lógica matemática:
1. Princípio da identidade: uma proposição 𝑝 sempre é idêntica a si mesma (este princípio ga-
rante consistência no raciocínio lógico, pois sem ele não poderíamos reconhecer que uma afir-
mação dita em momentos diferentes continua tendo o mesmo significado.)
2. Princípio da não contradição: uma proposição 𝑝 não pode ser verdadeira e falsa ao mesmo
tempo.
Sem esses princípios, a lógica perderia sua função como ferramenta confiável para a dedução e a
tomada de decisões.
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• se 𝑝 e 𝑞 são duas FBF’s, 𝑝 ∧ 𝑞, 𝑝 ∨ 𝑞, 𝑝 → 𝑞 e 𝑝 ⇐⇒ 𝑞 também são FBF’s.
Definição 3 (Cláusula) Uma cláusula é uma disjunção de proposições atômicas (ou suas negações).
Definição 4 O valor lógico de qualquer proposição composta depende unicamente dos valores lógi-
cos das proposições atômicas que as compõem.
A enumeração de todas as atribuições de valores lógicos a cada proposição atômica de uma pro-
posição composta 𝑃 é realizada com a construção de tabelas verdade (T.V.), sendo que cada linha da
T.V. define uma interpretação de 𝑃 .
Se 𝑝 é uma proposição, então ¬𝑝 denota sua negação, ou seja, esse operador inverte o valor lógico
de 𝑝.
𝑝 ¬𝑝
T F
F T
Por exemplo, se 𝑝 denota a proposição A Terra é redonda, o que é verdade, sua negação ¬𝑝 denota
a proposição A Terra não é redonda, o que é falso.
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2.3.2 Conjunção (AND)
Se 𝑝 e 𝑞 são duas proposições, então 𝑝 ∧ 𝑞 denota sua conjunção, ou seja, esse operador realiza
um E-lógico entre 𝑝 e 𝑞.
𝑝 𝑞 𝑝∧𝑞
T T T
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F T F
F F F
Se 𝑝 e 𝑞 são duas proposições, então 𝑝 ∨ 𝑞 denota sua disjunção, ou seja, esse operador realiza um
OU-lógico entre 𝑝 e 𝑞.
𝑝 𝑞 𝑝∨𝑞
T T T
T F T
F T T
F F F
Note que a semântica do operador disjunção é a seguinte: o valor lógico de 𝑝∨𝑞 é verdade, se uma
das proposições 𝑝 ou 𝑞 forem verdade. Podemos fazer uma analogia entre a disjunção e um circuito
em paralelo.
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Figura 2: Interpretação do operador lógico disjunção (OR) como um circuito em paralelo.
Se 𝑝 e 𝑞 são duas proposições, então 𝑝 → 𝑞 denota uma condicional, ou seja, indica que a propo-
sição 𝑝 implica a proposição 𝑞. Dizemos que 𝑝 é o antecedente e 𝑞 é o consequente da condicional.
𝑝 𝑞 𝑝→𝑞
T T T
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F T T
F F T
Note que a semântica do operador condicional é a seguinte: o valor lógico de 𝑝 ∨ 𝑞 é falso apenas
se o antecedente 𝑝 é verdade e o consequente 𝑞 é falso. Note ainda que:
• se o antecedente 𝑝 é falso, não importa o valor lógico do consequente 𝑞, pois a condicional será
sempre verdadeira.
Exemplos clássicos de proposicões condicionais são regras em geral, como por exemplo: Se a
média final de um aluno na disciplina for maior ou igual a seis, então ele será aprovado.
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𝑝 𝑞 𝑝 ⇐⇒ 𝑞
T T T
T F F
F T F
F F T
Uma pergunta natural neste momento é: em uma proposição composta 𝑃 quais operações ló-
gicas devem ser realizadas primeiro? A recomendação é sempre utilizar parêntesis para agrupar as
operações lógicas, de modo a evitar qualquer tipo de ambiguidade.
De qualquer forma, na ausência de uma parentização adequada, a precedência dos operadores é
sempre a seguinte:
1. Negação (¬)
2. Conjunção (∧)
3. Disjunção (∨)
4. Condicional (→)
5. Bicondicional ( ⇐⇒ )
Por exemplo, as proposições a seguir indicam algumas equivalências entre a notação sem parên-
tesis (a esquerda) e com parêntesis (a direita):
𝑝 ∧ 𝑞 ∨ 𝑟 ≡ (𝑝 ∧ 𝑞) ∨ 𝑟 (1)
𝑝 → 𝑞 ∨ 𝑟 ≡ 𝑝 → (𝑞 ∨ 𝑟) (2)
𝑝 ⇐⇒ 𝑞 → 𝑟 ≡ 𝑝 ⇐⇒ (𝑞 → 𝑟) (3)
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2.4 Considerações finais
Neste capítulo, exploramos os dois pilares fundamentais da lógica proposicional: sintaxe e se-
mântica. A sintaxe define as regras formais para a construção de fórmulas bem formadas (FBFs),
garantindo que apenas expressões logicamente válidas sejam manipuladas dentro do sistema. Já a se-
mântica estabelece o significado dessas expressões, determinando seus valores de verdade com base
na interpretação das proposições atômicas e nas regras dos conectivos lógicos.
A relação entre sintaxe e semântica é essencial para a formalização do raciocínio lógico. Enquanto
a sintaxe permite estruturar proposições de maneira rigorosa, a semântica possibilita a análise de sua
validade e verdade em diferentes contextos. Conceitos como tabelas-verdade, modelos, satisfatibili-
dade e tautologias serão discutidos futuramente, mostrando como a lógica proposicional fornece um
método sistemático para avaliar a coerência e a correção de argumentos.
O estudo da sintaxe e da semântica da lógica proposicional é um passo fundamental para aprofundar-
se em sistemas lógicos mais avançados, como a lógica de predicados e a lógica modal. Nos próximos
capítulos, ampliaremos essas noções, explorando novas estruturas e métodos de inferência que forta-
lecem a capacidade da lógica matemática de representar e analisar o pensamento formal.
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3 Tautologias, contradições e contingências
Durante o estudo da lógica proposicional, devemos ser capazes de construir diversas tabelas ver-
dade de proposições compostas. Uma pergunta motivadora para este capítulo é: será que existem
proposições compostas para as quais todas as suas interpretações são verdadeiras ou falsas, indepen-
dentemente dos valores lógicos de seus átomos? Veremos que sim!
Para construirmos uma tabela verdade referente a uma proposição composta 𝑃 devemos seguir os
passos abaixo:
2. Respeitar a precedência dos operadores lógicos, pois ela determina a ordem da construção das
colunas da T.V.
𝑝 𝑞 ¬𝑞 𝑝 ∧ ¬𝑞 ¬(𝑝 ∧ ¬𝑞)
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𝑝 𝑞 𝑟 ¬𝑟 𝑝 ∨ ¬𝑟 𝑞 ∧ ¬𝑟 (𝑝 ∨ ¬𝑟) → (𝑞 ∧ ¬𝑟)
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3.1 Tautologias
Definição 6 (Tautologia) Uma tautologia é uma proposição composta para a qual todas interpre-
tações são verdadeiras, ou seja, a última coluna de sua T.V. é composta apenas por valores lógicos
verdade. Em outras palavras, é uma proposição verdadeira independentemente dos valores lógicos
de seus átomos.
𝑝 𝑞 ¬𝑞 𝑞 ∧ ¬𝑞 𝑝 ∨ (𝑞 ∧ ¬𝑞) (𝑝 ∨ (𝑞 ∧ ¬𝑞)) ⇐⇒ 𝑝
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𝑝 𝑞 𝑟 ¬𝑞 𝑝∧𝑟 ¬𝑞 ∨ 𝑟 (𝑝 ∧ 𝑟) → (¬𝑞 ∨ 𝑟)
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3.2 Contradições
Definição 7 (Contradição) Uma contradição é uma proposição composta para a qual todas inter-
pretações são falsas, ou seja, a última coluna de sua T.V. é composta apenas por valores lógicos falso.
Em outras palavras, é uma proposição falsa independentemente dos valores lógicos de seus átomos.
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𝑝 𝑞 ¬𝑝 ¬𝑞 𝑝 ∧ ¬𝑞 ¬(𝑝 ∧ ¬𝑞)
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3.3 Contingências
Definição 8 (Contingência) Uma contingência é uma proposição composta que não é tautologia,
nem contradição, ou seja, possui tanto interpretações verdadeiras quanto falsas.
𝑝 𝑞 𝑟 𝑞→𝑟 𝑝 → (𝑞 → 𝑟)
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4 Consequência e equivalência lógicas
A esta altura, desejamos saber como determinar se uma proposição 𝑃𝑛 é consequência lógica de
um conjunto de proposições 𝑃1 , 𝑃2 , ..., 𝑃𝑛−1 . Saber isso é fundamental, pois o conceito de consequên-
cia lógica está diretamente relacionado com processos de dedução e prova formal, o que é a base para
a verificação da validade de argumentos.
𝑃1 , 𝑃2 , 𝑃3 , ..., 𝑃𝑛 ⊨ 𝑄 (5)
𝑃 :𝑝→𝑞 (6)
𝑄:𝑟→𝑠 (7)
𝑅 : (𝑝 ∨ 𝑟) → (𝑞 ∨ 𝑠) (8)
é uma tautologia.
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𝑝 𝑞 𝑟 𝑠 𝑝→𝑞 𝑟→𝑠 𝑝∨𝑟 𝑞∨𝑠 (𝑝 ∨ 𝑟) → (𝑞 ∨ 𝑠)
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Prova:
1. (ida)
Se 𝑃1 , 𝑃2 , ..., 𝑃𝑛 ⊨ 𝑄, então (𝑃1 ∧ 𝑃2 ∧ 𝑃3 ∧ ... ∧ 𝑃𝑛 ) → 𝑄 é uma tautologia.
a) Assuma que 𝑄 é consequência lógica de 𝑃1 , 𝑃2 , ..., 𝑃𝑛 .
b) Isso implica que se 𝑃1 , 𝑃2 , ..., 𝑃𝑛 forem conjuntamente verdade, então 𝑄 também será verdade.
c) Assuma que de fato 𝑉𝐿 (𝑃1 ∧ 𝑃2 ∧ ... ∧ 𝑃𝑛 ) = 𝑇 .
d) Pela semântica do operador condicional, 𝑇 → 𝑇 é sempre verdade.
e) Portanto, (𝑃1 ∧ 𝑃2 ∧ 𝑃3 ∧ ... ∧ 𝑃𝑛 ) → 𝑄 é uma tautologia.
2. (volta)
Se (𝑃1 ∧ 𝑃2 ∧ 𝑃3 ∧ ... ∧ 𝑃𝑛 ) → 𝑄 é uma tautologia, então 𝑃1 , 𝑃2 , ..., 𝑃𝑛 ⊨ 𝑄.
a) Nos interessa a análise do caso em que 𝑃1 , 𝑃2 , ..., 𝑃𝑛 são conjuntamente verdade.
b) Isso implica que 𝑉𝐿 (𝑃1 ∧ 𝑃2 ∧ ... ∧ 𝑃𝑛 ) = 𝑇 .
c) Assim, pela semântica do operador condicional, para que (𝑃1 ∧ 𝑃2 ∧ 𝑃3 ∧ ... ∧ 𝑃𝑛 ) → 𝑄 seja uma
tautologia, então 𝑄 deve ser verdade, o que significa que 𝑃1 , 𝑃2 , ..., 𝑃𝑛 ⊨ 𝑄.
• 𝑃 :𝑝→𝑞
• 𝑄:𝑞→𝑟
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• 𝑅:𝑝→𝑟
Mostre que 𝑃, 𝑄 ⊨ 𝑅.
Note que para provar isso, basta mostrar que (𝑃 ∧ 𝑄) → 𝑅 é uma tautologia.
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Essa é justamente uma das regras de inferência que iremos estudar mais adiante, chamada de
Silogismo Hipotético. A seguir, definiremos um outro conceito importante na lógica proposicional: a
equivalência lógica.
• 𝑃 : 𝑝 → (𝑞 ∧ 𝑟)
• 𝑄 : (𝑝 → 𝑞) ∧ (𝑝 → 𝑟)
Mostre que 𝑃 ≡ 𝑄.
Para mostrar que 𝑃 ≡ 𝑄 devemos mostrar que 𝑃 ⇐⇒ 𝑄 é uma tautologia.
𝑝 𝑞 𝑟 𝑞∧𝑟 𝑃 (𝑝 → 𝑞) 𝑝→𝑟 𝑄 𝑃 ⇐⇒ 𝑄
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A T.V. anterior mostra que de fato 𝑃 ≡ 𝑄. Sabendo da existência do conceito de equivalência
lógica, o resultado a seguir mostra outra forma de verificar consequências lógicas, baseada no conceito
de contradição.
Prova:
1. (ida)
a) Do teorema anterior, sabemos que se 𝑃1 , 𝑃2 , ..., 𝑃𝑛 ⊨ 𝑄, então (𝑃1 ∧ 𝑃2 ∧ 𝑃3 ∧ ... ∧ 𝑃𝑛 ) → 𝑄 é
uma tautologia.
b) A negação da tautologia é uma contradição, de modo que, neste caso:
𝑝 𝑞 ¬𝑝 𝑝→𝑞 ¬𝑝 ∨ 𝑞
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d) Então, a expressão aanterior, que é uma contradição, pode ser expressa como:
𝑝 𝑞 ¬𝑝 ¬𝑞 ¬𝑝 ∨ 𝑞 ¬(¬𝑝 ∨ 𝑞) 𝑝 ∧ ¬𝑞
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2. (volta)
a) Se (𝑃1 ∧ 𝑃2 ∧ ... ∧ 𝑃𝑛 ) ∧ ¬𝑄 é uma contradição, então 𝑃1 , 𝑃2 , ..., 𝑃𝑛 ⊨ 𝑄.
b) Note que se (𝑃1 ∧ 𝑃2 ∧ ... ∧ 𝑃𝑛 ) ∧ ¬𝑄 é uma contradição, então sua negação é uma tautologia:
c) Mas, pela equivalência obtida na primeira parte do teorema, sabemos que (𝑝 ∧ ¬𝑞) ≡ ¬(¬𝑝 ∨ 𝑞).
Aplicando a negação em ambos os lados, a equivalência continua válida, o que nos leva a seguinte
conclusão: ¬(𝑝 ∧ ¬𝑞) ≡ ¬𝑝 ∨ 𝑞.
d) Sendo assim, a tautologia anterior pode ser expressa como:
• A recíproca: 𝑞 → 𝑝
• A contrária: ¬𝑝 → ¬𝑞
• A contrapositiva: ¬𝑞 → ¬𝑝
Teorema 3 Uma proposição condicional e sua contrapositiva são logicamente equivalentes, ou seja,
𝑝 → 𝑞 ≡ ¬𝑞 → ¬𝑝.
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Teorema 4 A recíproca e a contrária de uma proposição condicional são logicamente equivalentes,
ou seja, 𝑞 → 𝑝 ≡ ¬𝑝 → ¬𝑞.
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2. Leis idempotentes: 𝑝 ∨ 𝑝 ≡ 𝑝 e 𝑝 ∧ 𝑝 ≡ 𝑝
3. Leis comutativas: 𝑝 ∨ 𝑞 ≡ 𝑞 ∨ 𝑝 e 𝑝 ∧ 𝑞 ≡ 𝑞 ∧ 𝑝
4. Leis associativas: 𝑝 ∨ (𝑞 ∨ 𝑟) ≡ (𝑝 ∨ 𝑞) ∨ 𝑟 e 𝑝 ∧ (𝑞 ∧ 𝑟) ≡ (𝑝 ∧ 𝑞) ∧ 𝑟
5. Regra da bicondicional: 𝑝 ⇐⇒ 𝑞 ≡ (𝑝 → 𝑞) ∧ (𝑞 → 𝑝)
Se Maria for a escola, então Gabriel ou Paula irão, e se Maria não for a escola, então Paula e
Rafael irão.
Podemos escrever a sentença como uma conjunção de duas condicionais 𝑃 e 𝑄, dadas por:
• 𝑃 : 𝑚 → (𝑔 ∨ 𝑝)
• 𝑄 : ¬𝑚 → (𝑝 ∧ 𝑟)
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b) É possível chegar a conclusão sobre quem certamente irá a escola?
Para isso, devemos verificar se algum dos átomos 𝑝, 𝑞 ou 𝑟 é consequência lógica da sentença 𝑆.
Devemos construir a T.V. para 𝑆 e verificar se 𝑆 → 𝑝, 𝑆 → 𝑔 ou 𝑆 → 𝑟 são tautologias.
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Podemos identificar que 𝐹1 é uma tautologia e 𝐹16 é uma contradição. Além disso, é possível
reconhecer algumas das operações lógicas que discutimos até o momento. Note que 𝐹8 corresponde
a conjunção, 𝐹2 corresponde a disjunção, 𝐹5 corresponde a condicional (𝑝 → 𝑞) e 𝐹7 corresponde
25
a bicondicional (𝑝 ⇐⇒ 𝑞). Há alguns operadores que não discutimos, mas são bem conhecidos
na literatura, como por exemplo, o operador 𝐹10 denominado como ou-exclusivo (XOR). Repare que
operador 𝐹9 é a negação da conjunção, e por essa razão, é conhecido como não-e (NAND). Da mesma
forma, o operador 𝐹15 é a negação da disjunção, conhecido como não-ou (NOR).
26
5 Álgebra proposicional
As tabelas verdade são ferramentas poderosas para a análise de proposições lógicas. No entanto,
quando o número de átomos cresce, a construção de T.V.’s torna-se inviável pois requer 2𝑛 linhas
(complexidade exponencial). Sendo assim, a definição de um mecanismo mais eficiente torna-se
necessário: uma álgera das proposições, como uma forma matemática de manipular sentenças.
Pergunta: é possível manipular proposições lógicas de modo a simplificá-las ou escrevê-las em
outra representação? Sim, a partir das regras da álgebra proposicional.
1. Lei da contradição: 𝑝 ∧ ¬𝑝 ≡ 𝐹
3. Leis da dominação:
• 𝑝∧𝑇 ≡𝑝
• 𝑝∨𝐹 ≡𝑝
4. Leis idempotentes:
• 𝑝∧𝑝≡𝑝
• 𝑝∨𝑝≡𝑝
6. Leis comutativas:
• 𝑝∧𝑞 ≡𝑞∧𝑝
• 𝑝∨𝑞 ≡𝑞∨𝑝
7. Leis associativas:
• 𝑝 ∨ (𝑞 ∨ 𝑟) ≡ (𝑝 ∨ 𝑞) ∨ 𝑟
• 𝑝 ∧ (𝑞 ∧ 𝑟) ≡ (𝑝 ∧ 𝑞) ∧ 𝑟
8. Leis distributivas:
27
• 𝑝 ∨ (𝑞 ∧ 𝑟) ≡ (𝑝 ∨ 𝑞) ∧ (𝑝 ∨ 𝑟)
• 𝑝 ∧ (𝑞 ∨ 𝑟) ≡ (𝑝 ∧ 𝑞) ∨ (𝑝 ∧ 𝑟)
9. Leis de De Morgan:
• ¬(𝑝 ∧ 𝑞) ≡ ¬𝑝 ∨ ¬𝑞
• ¬(𝑝 ∨ 𝑞) ≡ ¬𝑝 ∧ ¬𝑞
• A negação de duas proposições que são simultaneamente verdade equivale a afirmar que ao
menos uma delas é falsa.
• Negar que ao menos uma de duas proposições é verdadeira equivale a afirmar que ambas são
falsas.
Em resumo, a negação de uma conjunção é a disjunção das negações e a negação de uma disjunção
é a conjunção das negações.
Exercício: Sabendo da validade das leis de De Morgan para duas proposições, prove as leis de
De Morgan para 3 proposições.
a) ¬(𝑝 ∧ 𝑞 ∧ 𝑟) ≡ ¬𝑝 ∨ ¬𝑞 ∨ ¬𝑟
Iniciando com a associativa, temos:
¬(𝑝 ∧ 𝑞) ∨ ¬𝑟 ≡ ¬𝑝 ∨ ¬𝑞 ∨ ¬𝑟 (19)
b) ¬(𝑝 ∨ 𝑞 ∨ 𝑟) ≡ ¬𝑝 ∧ ¬𝑞 ∧ ¬𝑟 (demonste)
• 𝑝 → 𝑞 ≡ ¬𝑝 ∨ 𝑞
28
• 𝑝 ⇐⇒ 𝑞 ≡ (𝑝 → 𝑞) ∧ (𝑞 → 𝑝) ≡ (¬𝑝 ∨ 𝑞) ∧ (¬𝑞 ∨ 𝑝)
a) 𝑝 ∨ (𝑝 ∧ 𝑞) ≡ 𝑝
Note que a proposição do lado esquerdo equivale a:
(𝑝 ∧ 𝑇 ) ∨ (𝑝 ∧ 𝑞) (20)
𝑝 ∧ (𝑇 ∨ 𝑞) ≡ 𝑝 ∧ 𝑇 ≡ 𝑝 (21)
b) 𝑝 ∧ (𝑝 ∨ 𝑞) ≡ 𝑝
Note que a proposição do lado esquerdo equivale a:
(𝑝 ∨ 𝐹 ) ∧ (𝑝 ∨ 𝑞) (22)
𝑝 ∨ (𝐹 ∧ 𝑞) ≡ 𝑝 ∨ 𝐹 ≡ 𝑝 (23)
a) (𝑝 ∧ 𝑞) ∨ (¬𝑝 ∧ 𝑞) ≡ 𝑞
Note que aplicando a distributiva, temos que o lado esquerdo da expressão fica:
(𝑝 ∨ 𝑞) ∧ 𝑞 ≡ 𝑞 ∧ (𝑞 ∨ 𝑝) ≡ 𝑞 (26)
29
b) (𝑝 ∨ 𝑞) ∧ (¬𝑝 ∨ 𝑞) ≡ 𝑞
Note que aplicando a distributiva, temos que o lado esquerdo da expressão fica:
(𝑝 ∧ 𝑞) ∨ 𝑞 ≡ 𝑞 ∨ (𝑞 ∧ 𝑝) ≡ 𝑞 (29)
¬(𝑝 ∧ 𝑞) ∨ 𝑟 ≡ ¬𝑝 ∨ (𝑞 → 𝑟) (31)
¬(𝑝 ∧ 𝑞) ∨ 𝑟 ≡ 𝑝 → (𝑞 → 𝑟) (32)
Vimos que existem diversas maneiras logicamente equivalentes de escrever uma fórmula. A per-
gunta que surge é: seria possível escrever qualquer fórmula da lógica proposicional utilizando apenas
conjunções, disjunções e negações? Veremos a seguir que sim, através das Formas Normais Conjun-
tiva e Disjuntiva.
Definição 12 (Forma Normal Conjuntiva) Dizemos que uma fórmula 𝑃 está na Forma Normal
Conjuntiva (FNC), quando P for uma conjunção da forma:
𝑝1 ∧ 𝑝2 ∧ 𝑝3 ∧ ... ∧ 𝑝𝑛 (33)
em que cada 𝑝𝑖 é uma cláusula, ou seja, uma disjunção de átomos, ou um único átomo.
30
Em outras palavras, 𝑃 está na FNC se e somente se:
Teorema 5 Uma FNC é uma tautologia se e somente se cada elemento 𝑝𝑖 da conjunção for uma
tautologia (cada cláusula individual for uma tautologia).
Prova:
1. (ida)
a) Se a FNC é uma tautologia, então para toda atribuição de valores lógicos dos átomos teremos um
valor lógico verdade para a fórmula.
b) Logo, pela semântica do operador conjunção, cada cláusula individual deve assumir valor lógico
verdade, pois caso contrário, a conjunção resultaria em valor lógico falso (e não teríamos a FNC).
2. (volta)
a) Se cada cláusula da FNC é uma tautologia, então pela semântica do operador conjunção, a fórmula
terá valor lógico verdade, pois a única forma da conjunção de várias fórmulas resultar em verdade é
justamente quando todas elas são verdadeiras.
1. Construa a T.V. de 𝑃 .
3. Para cada uma dessas linhas, construa uma disjunção da seguinte forma:
• Para cada átomo na fórmula, se seu valor lógico é 𝑉 , tome ¬𝑝, e se for 𝐹 , tome 𝑝.
31
𝑝 𝑞 𝑟 ¬𝑝 ¬𝑝 ∨ 𝑞 (¬𝑝 ∨ 𝑞) → 𝑟
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• 𝑝1 : ¬𝑝 ∨ ¬𝑞 ∨ 𝑟
• 𝑝2 : 𝑝 ∨ ¬𝑞 ∨ 𝑟
• 𝑝3 : 𝑝 ∨ 𝑞 ∨ 𝑟
Observe que podemos ter átomos no lugar de algumas cláusulas na FNC. Por exemplo, a fórmula
¬𝑝 ∧ (¬𝑞 ∨ ¬𝑟) ∧ 𝑠 está na FNC. Por outro lado, não é permitido que o operador ∨ tenha alcance
sobre o operador ∧, de modo que a fórmula 𝑝 ∧ (𝑟 ∨ (𝑝 ∧ 𝑠)) não está na FNC.
Definição 13 (Forma Normal Disjuntiva) Dizemos que uma fórmula 𝑃 está na Forma Normal Dis-
juntiva (FND), quando P for uma disjunção da forma:
𝑝1 ∨ 𝑝2 ∨ 𝑝3 ∨ ... ∨ 𝑝𝑛 (35)
32
• (𝑝 ∧ 𝑞) ∨ (𝑝 ∧ ¬𝑞)
• 𝑝∨𝐹
• ¬𝑝 ∨ (¬𝑞 ∧ ¬𝑟) ∨ 𝑠
• (𝑝 ∧ 𝑞) ∨ (𝑟 ∧ 𝑝 ∧ ¬𝑞) ∨ ¬𝑠
1. Construa a T.V. de 𝑃 .
3. Para cada uma dessas linhas, construa uma conjunção da seguinte forma:
• Para cada átomo na fórmula, se seu valor lógico é 𝑉 , tome 𝑝, e se for 𝐹 , tome ¬𝑝.
𝑝 𝑞 𝑟 𝑞∨𝑟 𝑝∨𝑟 (𝑞 ∨ 𝑟) → 𝑝 (𝑝 ∨ 𝑟) → 𝑞 P
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F F T T T F F F
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• 𝑝1 : 𝑝 ∧ 𝑞 ∧ 𝑟
• 𝑝2 : 𝑝 ∧ 𝑞 ∧ ¬𝑟
• 𝑝3 : ¬𝑝 ∧ ¬𝑞 ∧ ¬𝑟
33
Portanto, a FND é dada por:
𝑄 = 𝐹 𝑁 𝐶(𝑃 ) = (𝑝 ∨ 𝑟) ∧ (𝑝 ∨ 𝑠 ∨ 𝑡) ∧ (𝑞 ∨ 𝑟) ∧ (𝑞 ∨ 𝑠 ∨ 𝑡) (42)
• 𝑝 → 𝑞 ≡ ¬𝑝 ∨ 𝑞
34
• 𝑝 ⇐⇒ 𝑞 ≡ (¬𝑝 ∨ 𝑞) ∧ (¬𝑞 ∨ 𝑝)
• ¬(𝑝 ∧ 𝑞) ≡ ¬𝑝 ∨ ¬𝑞
• ¬(𝑝 ∨ 𝑞) ≡ ¬𝑝 ∧ ¬𝑞
• 𝑝 ∨ (𝑞 ∧ 𝑟) ≡ (𝑝 ∨ 𝑞) ∧ (𝑝 ∨ 𝑟)
• (𝑝 ∧ 𝑞) ∨ 𝑟 ≡ (𝑝 ∨ 𝑟) ∧ (𝑞 ∨ 𝑟)
• 𝑝 ∧ (𝑞 ∨ 𝑟) ≡ (𝑝 ∧ 𝑞) ∨ (𝑝 ∧ 𝑟)
• (𝑝 ∨ 𝑞) ∧ 𝑟 ≡ (𝑝 ∧ 𝑟) ∨ (𝑞 ∧ 𝑟)
𝑝 𝑞 𝑟 ¬𝑝 ¬𝑝 ∨ 𝑞 (¬𝑝 ∨ 𝑞) → 𝑟
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T F F F F T
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F T F T T F
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Para mostrar a equivalência entre 𝑄𝑇 𝑉 e 𝑄𝐴𝐿𝐺 , primeiramente lembre-se das leis associativas:
35
𝑄𝑇 𝑉 = (¬𝑞 ∨ 𝑟 ∨ ¬𝑝) ∧ (𝑝 ∨ 𝑟 ∨ ¬𝑞) ∧ (𝑝 ∨ 𝑟 ∨ 𝑞) (45)
Em seguida, note que podemos aplicar a lei da absorção no primeiro parêntesis para cancelar 𝑝
com ¬𝑝 e no segundo parêntesis para cancelar 𝑞 com ¬𝑞:
Exercício: O problema de Post consiste em determinar se para toda T.V. existe uma fórmula que a
defina. Em termos práticos, dada uma T.V., deseja-se saber qual é a expressão lógica resultante. Este
problema é muito importante para a ciência da computação, pois é a base para o projeto de circuitos
digitais. Considere a T.V. a seguir:
𝑝 𝑞 𝑟 P
T T T T
T T F T
T F T F
T F F F
F T T F
F T F F
F F T F
F F F T
36
Aplicando a regra da absorção composta nos dois primeiros termos, temos o cancelamento de 𝑟
com ¬𝑟:
Pela lei do terceiro excluído, sabemos que 𝑝 ∨ ¬𝑝 ≡ 𝑇 , e pela lei da dominação temos que
𝑝 ∧ 𝑇 ≡ 𝑝, o que nos permite simplificar a expressão para:
Pela lei distributiva, mas caminhando no sentido inverso, ou seja, "colocando p em evidência" e
"colocando q em evidência", temos:
Existe um resultado teórico (teorema) na lógica matemática que garante que qualquer uma das 16
funções lógicas de duas variáveis 𝑝 e 𝑞 pode ser definida apenas em termos do operador não-e.
Esse resultado tem uma série de implicações práticas na ciência da computação, uma vez que
qualquer circuito digital pode ser construído com apenas um tipo de componente eletrônico básico:
37
as portas lógicas NAND. Isso representa uma grande economia no custo de produção de placas e
dispositivos digitais.
Por exemplo, as funções lógicas elementares ¬, ∧, ∨ e → são definidas como (verifique isso!):
• ¬𝑝 ≡ 𝑝|𝑝
• 𝑝 ∧ 𝑞 ≡ (𝑝|𝑞)|(𝑝|𝑞)
• 𝑝 ∨ 𝑞 ≡ (𝑝|𝑝)|(𝑞|𝑞)
Exercício: Verifique que a bicondicional 𝑝 ⇐⇒ 𝑞 pode ser expressa usando apenas o operador
NAND como ((𝑝|𝑞)|(𝑝|𝑞))|((𝑝|𝑝)|(𝑞|𝑞)).
38
6 Inferência lógica
O estudo da lógica compreende a análise formal de mecanismos de dedução de conhecimento.
Em outras palavras, o principal objetivo da lógica consiste na verificação da validade de uma conclu-
são lógica a partir de um conjunto de proposições (premissas). Para isso, iremos estudar regras de
inferência, que nos permitem verificar a validade de argumentos sem a necessidade da construção de
tabelas verdade.
Podemos tentar verificar a validade de argumentos mediante a construção de tabelas verdade, mas
como o número de linhas de uma T.V. cresce exponencialmente com o número de átomos 𝑛, esse
processo torna-se inviável em diversas situações.
• Garantem argumentos válidos: São a base para a dedução lógica, permitindo concluir correta-
mente a partir de premissas.
• Base da prova matemática: São usadas para demonstrar teoremas e propriedades matemáticas.
As regras de inferência são, portanto, fundamentais para qualquer sistema lógico e desempenham
um papel central na formalização do conhecimento e na tomada de decisões baseadas na lógica. A
seguir apresentaremos uma série de regras de inferência conhecidas.
39
6.1.1 Modus Ponens (MP)
𝑝 → 𝑞, 𝑝 ⊨ 𝑞 (61)
• Faz frio.
Podemos verificar que essa regra é um argumento válido a partir da construção da tabela verdade.
A ideia é que se o argumento, em sua forma condicional, o que é representado como ((𝑝 → 𝑞)∧𝑝) → 𝑞
for uma tautologia, então ele é válido.
𝑝 𝑞 𝑝→𝑞 (𝑝 → 𝑞) ∧ 𝑝 ((𝑝 → 𝑞) ∧ 𝑝) → 𝑞
T T T T T
T F F F T
F T T F T
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Essa regra nos permite deduzir ¬𝑝 a partir das premissas 𝑝 → 𝑞 e ¬𝑞, ou seja:
𝑝 → 𝑞, ¬𝑞 ⊨ ¬𝑝 (62)
Podemos verificar que essa regra é um argumento válido a partir da construção da tabela verdade.
A ideia é que se o argumento, em sua forma condicional, o que é representado como ((𝑝 → 𝑞)∧¬𝑞) →
¬𝑝 for uma tautologia, então ele é válido.
40
𝑝 𝑞 ¬𝑝 ¬𝑞 𝑝→𝑞 (𝑝 → 𝑞) ∧ ¬𝑞 ((𝑝 → 𝑞) ∧ ¬𝑞) → ¬𝑝
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F T T F T F T
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Essa regra é como a propriedade transitiva do operador condicional. Em resumo, ela nos permite
concluir 𝑝 → 𝑟 a partir das premissas 𝑝 → 𝑞 e 𝑞 → 𝑟, ou seja:
𝑝 → 𝑞, 𝑞 → 𝑟 ⊨ 𝑝 → 𝑟 (63)
Podemos verificar que essa regra é um argumento válido a partir da construção da tabela verdade.
A ideia é que se o argumento, em sua forma condicional, o que é representado como ((𝑝 → 𝑞) ∧ (𝑞 →
𝑟)) → (𝑝 → 𝑟) for uma tautologia, então ele é válido.
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F T F T F T F T
F F T T T T T T
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41
6.1.4 Silogismo Disjuntivo (SD)
Essa regra nos permite concluir 𝑝 a partir das premissas 𝑝 ∨ 𝑞 e ¬𝑞, ou seja:
𝑝 ∨ 𝑞, ¬𝑞 ⊨ 𝑝 (64)
Podemos verificar que essa regra é um argumento válido a partir da construção da tabela verdade.
A ideia é que se o argumento, em sua forma condicional, o que é representado como ((𝑝∨𝑞)∧¬𝑞) → 𝑝
for uma tautologia, então ele é válido.
T T F T F T
T F T T T T
F T F T F T
F F T F F T
Essa regra nos diz que a partir de duas premissas condicionais com mesmo consequente e antece-
dentes complementares podemos concluir o consequente em comum destas condicionais, ou seja:
𝑝 → 𝑞, ¬𝑝 → 𝑞 ⊨ 𝑞 (65)
42
6.2 Outras regras de inferência lógica
A seguir apresentamos diversas regras de inferência que podem ser utilizadas na validação de
argumentos.
• Contraposição: 𝑝 → 𝑞 ⊨ ¬𝑞 → ¬𝑝
• Inconsistência: 𝑝, ¬𝑝 ⊨ 𝑞
• Simplificação (Simp): 𝑝 ∧ 𝑞 ⊨ 𝑝 e 𝑝 ∧ 𝑞 ⊨ 𝑞
• Conjunção (Conj): 𝑝, 𝑞 ⊨ 𝑝 ∧ 𝑞
• Adição (Adi): 𝑝 ⊨ 𝑝 ∨ 𝑞
• Absorção (Abs): 𝑝 → 𝑞 ⊨ 𝑝 → (𝑝 ∧ 𝑞)
• Exportação (Exp): 𝑝 → (𝑞 → 𝑟) ⊨ (𝑝 ∧ 𝑞) → 𝑟 e (𝑝 ∧ 𝑞) → 𝑟 ⊨ 𝑝 → (𝑞 → 𝑟)
• 𝑞: Carlos come.
𝑝 → 𝑞, ¬𝑟 ∨ ¬𝑞, 𝑟 ⊢ ¬𝑝 (68)
43
A seguir apresentamos uma prova formal da validade do argumento.
1. 𝑝→𝑞 Premissa
2. ¬𝑟 ∨ ¬𝑞 Premissa
3. 𝑟 Premissa
4. ¬𝑞 SD (2,3)
5. ¬𝑝 MT (1,4)
Se o mercado de trabalho for uma meritocracia, então a pessoa mais qualificada sempre consegue o
emprego.
Mas a pessoa mais qualificada nem sempre consegue o emprego, se o networking desempenha um
papel relevante no mercado de trabalho.
Pesquisas apontam que de fato o networking desempenha um papel relevante no mercado.
Portanto, o mercado de trabalho não é uma meritocracia.
𝑚 → 𝑞, 𝑛 → ¬𝑞, 𝑛 ⊢ ¬𝑚 (69)
1. 𝑚→𝑞 Premissa
2. 𝑛 → ¬𝑞 Premissa
3. 𝑛 Premissa
4. ¬𝑞 MP (2,3)
5. ¬𝑚 MT (1,4)
𝑝 → 𝑞, (𝑝 ∧ 𝑞) → 𝑟, ¬(𝑝 ∧ 𝑟) ⊢ ¬𝑝 (70)
44
1. 𝑝→𝑞 Premissa
2. (𝑝 ∧ 𝑞) → 𝑟 Premissa
3. ¬(𝑝 ∧ 𝑟) Premissa
4. 𝑝 → (𝑝 ∧ 𝑞) Abs (1)
5. 𝑝→𝑟 SH (4, 2)
6. 𝑝 → (𝑝 ∧ 𝑟) Abs (5)
7. ¬𝑝 MT (3, 6)
(𝑝 ∨ 𝑞) → 𝑟, (𝑟 ∨ 𝑞) → (𝑝 → (𝑠 ⇐⇒ 𝑡)), 𝑝 ∧ 𝑠 ⊢ 𝑠 ⇐⇒ 𝑡 (71)
1. (𝑝 ∨ 𝑞) → 𝑟 Premissa
2. (𝑟 ∨ 𝑞) → (𝑝 → (𝑠 ⇐⇒ 𝑡)) Premissa
3. 𝑝∧𝑠 Premissa
4. 𝑝 Simp (3)
5. 𝑝∨𝑞 Adi (4)
6. 𝑟 MP (1, 5)
7. 𝑟∨𝑞 Adi (6)
8. (𝑝 → (𝑠 ⇐⇒ 𝑡)) MP (2, 7)
9. 𝑠 ⇐⇒ 𝑡 MP (4, 8)
(𝑝 ∧ 𝑞) → 𝑟, 𝑟 → 𝑠, 𝑡 → ¬𝑢, 𝑡, ¬𝑠 ∨ 𝑢 ⊢ ¬𝑝 ∨ ¬𝑞 (72)
1. (𝑝 ∧ 𝑞) → 𝑟 Premissa
2. 𝑟→𝑠 Premissa
3. 𝑡 → ¬𝑢 Premissa
4. 𝑡 Premissa
5. ¬𝑠 ∨ 𝑢 Premissa
6. ¬𝑢 MP (3, 4)
7. ¬𝑠 SD (5, 6)
8. ¬𝑟 MT (2, 7)
9. ¬(𝑝 ∧ 𝑞) MT (1, 8)
10. ¬𝑝 ∨ ¬𝑞 DM (9)
45
Portanto, o argumento é válido!
1. (𝑝 → 𝑞) ∧ (𝑟 → 𝑠) Premissa
2. 𝑡→𝑢 Premissa
3. 𝑢→𝑣 Premissa
4. ¬(𝑞 ∧ 𝑣) Premissa
5. 𝑡→𝑣 SH (2, 3)
6. ¬𝑞 ∨ ¬𝑣 DM (4)
7. 𝑝→𝑞 Simp (1)
8. ¬𝑝 ∨ ¬𝑡 DD (5, 6, 7)
9. ¬(𝑝 ∧ 𝑡) DM (8)
• 𝑝: as uvas caem.
𝑝 → 𝑞, 𝑞 → 𝑟, ¬𝑟 ∨ 𝑝 ⊢ 𝑝 ⇐⇒ 𝑞 (74)
46
1. 𝑝→𝑞 Premissa
2. 𝑞→𝑟 Premissa
3. ¬𝑟 ∨ 𝑝 Premissa
4. 𝑟→𝑝 IC (3)
5. 𝑞→𝑟 SH (2, 4)
6. (𝑝 → 𝑞) ∧ (𝑞 → 𝑝) Conj (1, 5)
7. 𝑝 ⇐⇒ 𝑞 IE (6)
𝑝 ∨ ¬𝑞, ¬𝑞 → 𝑟, 𝑝 → 𝑠, ¬𝑟 ⊢ 𝑠 (75)
1. 𝑝 ∨ ¬𝑞 Premissa
2. ¬𝑞 → 𝑟 Premissa
3. 𝑝→𝑠 Premissa
4. ¬𝑟 Premissa
5. 𝑞 MT (2, 4)
6. 𝑝 SD (1, 5)
7. 𝑠 MP (3, 6)
1. 𝑝→𝑞 Premissa
2. ¬𝑞 ∧ ¬𝑟 Premissa
3. ¬𝑟 → ¬𝑠 Premissa
4. ¬𝑞 Simp (2)
5. ¬𝑟 Simp (2)
6. ¬𝑠 MP (3, 5)
7. ¬𝑝 MT (1, 4)
8. ¬𝑝 ∧ ¬𝑠 Conj (6, 7)
9. ¬(𝑝 ∨ 𝑠) DM (8)
47
Exemplo: Considere o seguinte argumento em linguagem natural:
• 𝑢: o iniverso é finito.
• 𝑐: a vida é curta.
• 𝑥: a vida é complexa.
𝑢 → 𝑐, 𝑣 → 𝑥, (𝑐 ∨ 𝑥) → 𝑠, ¬𝑠 ⊢ ¬(𝑢 ∨ 𝑣) (77)
1. 𝑢→𝑐 Premissa
2. 𝑣→𝑥 Premissa
3. (𝑐 ∨ 𝑥) → 𝑠 Premissa
4. ¬𝑠 Premissa
5. ¬(𝑐 ∨ 𝑥) MT (3, 4)
6. ¬𝑐 ∧ ¬𝑥 DM (5)
7. ¬𝑐 Simp (6)
8. ¬𝑥 Simp (6)
9. ¬𝑢 MT (1, 7)
10. ¬𝑣 MT (2, 8)
11. ¬𝑢 ∧ ¬𝑣 Conj (9, 10)
12. ¬(𝑢 ∨ 𝑣) DM (11)
Exemplo: Ao sair para a universidade de manhã, você percebe que não está usando os seus
óculos. Ao tentar descobrir onde estão os seus óculos, você se lembra dos seguintes fatos, que são
todos verdadeiros:
48
Se meus óculos estão na bancada da cozinha, então eu os vi durante o café da manhã.
Eu estava lendo o jornal na sala ou na cozinha.
Se eu estava lendo o jornal na sala, então meus óculos estão na mesinha de centro.
Eu não vi os meus óculos durante o café da manhã.
Se eu estava lendo um livro na cama, então meus óculos estão no criado mudo.
Se eu estava lendo o jornal na cozinha, então meus óculos estão na bancada da cozinha.
𝑝 → 𝑞, 𝑟 ∨ 𝑠, 𝑟 → 𝑡, ¬𝑞, 𝑢 → 𝑣, 𝑠 → 𝑝 ⊢ 𝑋 (78)
onde 𝑋 pode ser igual a 𝑝, 𝑡 ou 𝑣, dependendo de onde os óculos estavam. A pergunta é: podemos
chegar a alguma conclusão sobre 𝑋? A seguir apresentamos uma prova formal de que é possível
concluir que 𝑋 é 𝑡, ou seja, os óculos estão na mesinha de centro.
1. 𝑝 → 𝑞 Premissa
2. 𝑟 ∨ 𝑠 Premissa
3. 𝑟 → 𝑡 Premissa
4. ¬𝑞 Premissa
5. 𝑢 → 𝑣 Premissa
6. 𝑠 → 𝑝 Premissa
7. ¬𝑝 MT (1, 4)
8. ¬𝑠 MT (6, 7)
9. 𝑟 SD (2, 8)
10. 𝑡 MP (3, 9)
Como foi possível concluir 𝑡 a partir das premissas, então os óculos estão na mesinha de centro.
49
Exemplo: Prove a validade do seguinte argumento:
𝑝 → (𝑞 → ¬𝑟), 𝑟 ⊢ ¬𝑝 ∨ ¬𝑞 (79)
1. 𝑝 → (𝑞 → ¬𝑟) Premissa
2. 𝑟 Premissa
3. (𝑝 ∧ 𝑞) → ¬𝑟 Exp (1)
4. ¬¬𝑟 DN (2)
5. ¬(𝑝 ∧ 𝑞) MT (3, 4)
6. ¬𝑝 ∨ ¬𝑞 DM (5)
(¬𝑝 ∨ 𝑞) ∨ 𝑟, (𝑞 ∨ 𝑟) → 𝑠 ⊢ 𝑝 → 𝑠 (80)
1. (¬𝑝 ∨ 𝑞) ∨ 𝑟 Premissa
2. (𝑞 ∨ 𝑟) → 𝑠 Premissa
3. ¬𝑝 ∨ (𝑞 ∨ 𝑟) Assoc (1)
4. 𝑝 → (𝑞 ∨ 𝑟) IC (3)
5. 𝑝→𝑠 SH (4, 2)
¬𝑝 ∨ ¬𝑞, 𝑟 → 𝑝, 𝑞 ∨ ¬𝑠 ⊢ ¬𝑠 ∨ ¬𝑟 (81)
1. ¬𝑝 ∨ ¬𝑞 Premissa
2. 𝑟→𝑝 Premissa
3. 𝑞 ∨ ¬𝑠 Premissa
4. ¬𝑝 → ¬𝑟 CP (2)
5. ¬¬𝑞 ∨ ¬𝑠 DN (3)
6. ¬𝑞 → ¬𝑠 IC (5)
7. ¬𝑠 ∨ ¬𝑟 DC (1, 4, 6)
50
Exemplo: Prove a validade do seguinte argumento:
(𝑝 ∨ 𝑞) ∧ (𝑝 ∨ 𝑟), 𝑝 → 𝑠, 𝑞 → 𝑠, 𝑝 → 𝑡, 𝑟 → 𝑡 ⊢ 𝑠 ∧ 𝑡 (82)
1. (𝑝 ∨ 𝑞) ∧ (𝑝 ∨ 𝑟) Premissa
2. 𝑝 → 𝑠 Premissa
3. 𝑞 → 𝑠 Premissa
4. 𝑝 → 𝑡 Premissa
5. 𝑟 → 𝑡 Premissa
6. 𝑝 ∨ 𝑞 Simp (1)
7. 𝑝 ∨ 𝑟 Simp (1)
8. 𝑠 ∨ 𝑠 DC (2, 3, 6)
9. 𝑠 Idemp (8)
10. 𝑡 ∨ 𝑡 DC (4, 5, 7)
11. 𝑡 Idemp (10)
12. 𝑠 ∧ 𝑡 Conj (9, 11)
• 𝑝: o mordomo é inocente.
• 𝑞: o mordomo é culpado.
• 𝑟: a testeminha mentiu.
51
1. 𝑝∨𝑞 Premissa
2. 𝑝→𝑟 Premissa
3. 𝑠 → ¬𝑟 Premissa
4. (𝑟 ∨ ¬𝑟) → 𝑠 Premissa
5. 𝑇 →𝑠 Equiv (4)
6. 𝑠 Cond (5)
7. ¬𝑟 MP (3, 6)
8. ¬𝑝 MT (2, 7)
9. 𝑞 SD (1, 8)
• 𝑝: chove.
• 𝑟: faz sol.
1. 𝑝→𝑞 Premissa
2. 𝑟→𝑠 Premissa
3. ¬(𝑞 ∨ 𝑠) Premissa
4. ¬𝑞 ∧ ¬𝑠 DM (3)
5. ¬𝑞 Simp (4)
6. ¬𝑠 Simp (4)
7. ¬𝑝 MT (1, 5)
8. ¬𝑟 MT (2, 6)
9. ¬𝑝 ∧ ¬𝑟 Conj (7, 8)
10. ¬(𝑝 ∨ 𝑟) DM (9)
52
Exemplo: Prove a validade do seguinte argumento:
(𝑝 ∨ 𝑞) → ¬𝑟, 𝑠 → 𝑝, 𝑡 → 𝑞, 𝑠 ∨ 𝑡 ⊢ 𝑢 ∨ ¬𝑟 (85)
1. (𝑝 ∨ 𝑞) → ¬𝑟 Premissa
2. 𝑠→𝑝 Premissa
3. 𝑡→𝑞 Premissa
4. 𝑠∨𝑡 Premissa
5. 𝑝∨𝑞 DC (2, 3, 4)
6. ¬𝑟 MP (1, 5)
7. 𝑢 ∨ ¬𝑟 Adição (6)
(𝑏 ∨ 𝑛) → 𝑝, (𝑝 ∧ 𝑔) → 𝑎, 𝑎 → 𝑐, 𝑛 ∧ ¬𝑐 ⊢ ¬𝑔 (86)
1. (𝑏 ∨ 𝑛) → 𝑝 Premissa
2. (𝑝 ∧ 𝑔) → 𝑎 Premissa
3. 𝑎→𝑐 Premissa
4. 𝑛 ∧ ¬𝑐 Premissa
5. ¬𝑐 Simp (4)
6. ¬𝑎 MT (3, 5)
7. ¬(𝑝 ∧ 𝑔) MT (2, 6)
8. ¬𝑝 ∨ ¬𝑔 DM (7)
9. 𝑛 Simp (4)
10. 𝑛∨𝑏 Adi (9)
11. 𝑏∨𝑛 Comut (10)
12. 𝑝 MP (1, 11)
13. ¬𝑔 SD (8, 12)
53
ferenciais, desde sistemas dedutivos clássicos, como a dedução natural e o cálculo de sequentes, até
abordagens modernas que integram lógicas não clássicas e aplicações computacionais.
Um dos pilares discutidos foi a importância da rigorosa definição de regras de inferência, que
assegura a integridade dos argumentos, evitando falácias e ambiguidades. Sistemas como o Modus
Ponens e o Silogismo Hipotético exemplificam como estruturas formais podem capturar a essência
do pensamento lógico, enquanto metateoremas como os de Soundness e Completude reforçam a
correlação entre sintaxe e semântica na validade das demonstrações.
Por fim, é crucial reconhecer que a inferência lógica, embora fundamentada em princípios imu-
táveis, continua a evoluir. Novas lógicas (como as modais, difusas ou paraconsistentes) expandem
as fronteiras do que pode ser formalizado, respondendo a demandas da filosofia, da ciência da com-
putação e da matemática pura. Assim, o estudo da inferência não apenas consolida o conhecimento
existente, mas também abre caminhos para investigações futuras, desafiando-nos a refinar nossas fer-
ramentas e a questionar os limites do raciocínio formal.
Este capítulo, portanto, não encerra o tema, mas convida o leitor a aprofundar-se nesse universo,
onde clareza, precisão e criatividade coexistem para desvendar os mistérios da verdade lógica.
54
7 Técnicas dedutivas
As técnicas dedutivas na lógica proposicional são métodos formais que permitem demonstrar a
validade de argumentos e a derivação de proposições a partir de premissas. Diferente da verificação
por tabelas-verdade, que é um processo exaustivo, as técnicas dedutivas seguem um conjunto de regras
bem definidas para construir sequências de inferências lógicas corretas.
O objetivo da dedução lógica é garantir que, se as premissas forem verdadeiras, a conclusão
também seja necessariamente verdadeira. Para isso, utilizamos técnicas para sistemas formais de
prova, como:
• Prova direta: sistemas de dedução natural baseados em regras de inferência como Modus
Ponens, Modus Tollens, Silogismo Hipotético, entre outras.
• Prova condicional: técnica para demonstrar argumentos em que a conclusão é uma condicio-
nal, ou seja, está na forma 𝑝 → 𝑞.
• Prova por redução ao absurdo: técnica baseada no conceito de contradição para demonstrar
a validade de argumentos.
Definição 16 Uma teoria é um conjunto de sentenças {𝑠1 , 𝑠2 , ..., 𝑠𝑛 } que é fechado sob a operação
de implicação lógica. Dado um subconjunto de sentenças {𝑠1 , 𝑠2 , ..., 𝑠𝑘 }, 𝑘 ≤ 𝑛, da teoria, se uma
sentença 𝑟 é uma consequência lógica de {𝑠1 , 𝑠2 , ..., 𝑠𝑘 }, então 𝑟 deve ser parte da teoria (teorema).
Definição 17 Uma teoria axiomática é dita completa se cada sentença válida na teoria pode ser
provada verdadeira ou falsa.
Definição 18 (Prova formal) Sejam 𝑃1 , 𝑃2 , ..., 𝑃𝑛 e 𝑄 fórmula válidas da lógica proposicional. Di-
zemos que uma dedução (ou prova formal) de 𝑄 a partir de 𝑃1 , 𝑃2 , ..., 𝑃𝑛 é uma sequência finita de
proposições 𝐶1 , 𝐶2 , ..., 𝐶𝑘 , se e somente se 𝐶𝑘 ≡ 𝑄 e:
55
• cada 𝐶𝑖 que não é uma premissa for derivada via regras de inferênci lógica; ou
• cada 𝐶𝑖 que não for uma premissa for obtida por uma equivalência lógica.
Em reumo, uma prova formal é um procedimento rigoroso e sistemático para prova de teoremas e
deduções de consequências lógicas. Dizemos que 𝑄 é um teorema, se é uma consequência lógica das
premissas 𝑃1 , 𝑃2 , ..., 𝑃𝑛 .
𝑠 ∧ 𝑞, 𝑡 → ¬𝑞, ¬𝑡 → 𝑟 (87)
1. 𝑠∧𝑞 Axioma
2. 𝑡 → ¬𝑞 Axioma
3. ¬𝑡 → 𝑟 Axioma
4. 𝑞 Simp (1)
5. ¬𝑡 MT (2, 4)
6. 𝑟 MP (3, 5)
7. 𝑟 ∨ ¬𝑠 Adição (6)
¬𝑎 → 𝑐, 𝑐 → ¬𝑚, 𝑚 ∨ 𝑟, ¬𝑟 (88)
1. ¬𝑎 → 𝑐 Axioma
2. 𝑐 → ¬𝑚 Axioma
3. 𝑚∨𝑟 Axioma
4. ¬𝑟 Axioma
5. ¬𝑎 → ¬𝑚 SH (1, 2)
6. 𝑚 SD (3, 4)
7. 𝑎 MT (5, 6)
56
Gabriel estuda ou não está cansado.
Se Gabriel estuda, então dorme tarde.
Gabriel não dorme tarde ou está cansado.
Logo, Gabriel está cansado se e somente se estuda.
• 𝑝: Gabriel estuda.
𝑝 ∨ ¬𝑞, 𝑝 → 𝑟, ¬𝑟 ∨ 𝑞 ⊢ 𝑝 ⇐⇒ 𝑞 (89)
1. 𝑝 ∨ ¬𝑞 Premissa
2. 𝑝→𝑟 Premissa
3. ¬𝑟 ∨ 𝑞 Premissa
4. 𝑟→𝑞 IC (3)
5. 𝑝→𝑞 SH (2, 4)
6. 𝑞→𝑝 IC (1)
7. (𝑝 → 𝑞) ∧ (𝑞 → 𝑝) Conj (5, 6)
8. 𝑝 ⇐⇒ 𝑞 IE (7)
7.2 Inconsistência
Uma teoria não pode ser inconsistente, uma vez que, se isso ocorrer, qualquer proposição pode ser
derivada como verdadeira, tornando o sistema trivial e inutilizável. Esse princípio é conhecido como
explosão lógica (Principium Explosionis).
Definição 19 Uma teoria axiomática é consistente se não é possível gerar uma contradição a partir
das sentenças na teoria.
Definição 20 Denomina-se de argumento inconsistente aquele em que suas premissas não podem
ser simultaneamente verdadeiras, ou seja, na tabela verdade não existe sequer uma linha na qual as
proposiçoes assumam valor lógico 𝑇 ao mesmo tempo.
57
Exemplo: Mostre que as proposições ¬(𝑝 ∨ ¬𝑞), 𝑝 ∨ ¬𝑟 e 𝑞 → 𝑟 inconsistentes.
T T T F F T F T T
T T F F T T F T F
T F T T F T F T T
T F F T T T F T T
F T T F F F T F T
F T F F T F T T F
F F T T F T F F T
F F F T T T F T T
Note que não há nenhuma linha sequer da T.V. em que as 3 proposições ¬(𝑝 ∨ ¬𝑞), 𝑝 ∨ ¬𝑟 e 𝑞 → 𝑟
são conjuntamente verdadeiras. Isso signfica que esse conjunto de proposições á inconsistente. Se
uma teoria fosse baseada nessas 3 premissas, ela seria inconsistente.
Como sabemos, a construção de tabelas verdade não é um processo computacionalmente eficiente,
muito pelo contrário, uma vez que se o conjunto de proposições é definido em função de 𝑛 átomos, o
total de linhas será igual a 2𝑛 , o que é inviável até para valores pequenos de 𝑛.
Outra maneira de demonstrar que um conjunto de propsições {𝑃1 , 𝑃2 , ..., 𝑃𝑛 } é inconsistente é: se
a partir de {𝑃1 , 𝑃2 , ..., 𝑃𝑛 } for possível deduzir uma contradição qualquer, como por exemplo, 𝑝 ∧ ¬𝑝,
esse conjunto de proposições é inconsistentes.
Note que chegamos à contradição 𝑟 ∧ ¬𝑟, o que significa que o conjunto de proposições é de fato
inconsistente.
58
1. ¬𝑝 ∨ ¬𝑞 Premissa
2. 𝑝 ∧ 𝑠 Premissa
3. ¬𝑠 ∨ 𝑟 Premissa
4. 𝑟 → (𝑟 ∧ 𝑞) Premissa
5. 𝑝 Simp (4)
6. 𝑠 Simp (4)
7. ¬𝑞 SD (1, 5)
8. 𝑟 SD (3, 6)
9. 𝑟 ∧ 𝑞 MP (4, 8)
10. 𝑞 Simp (9)
11. 𝑞 ∧ ¬𝑞 Conj (7, 10)
Note que chegamos à contradição 𝑞 ∧ ¬𝑞, o que significa que o conjunto de proposições é de fato
inconsistente.
59
O resultado que acabamos de apresentar nos mostra que: se (𝑝1 ∧ 𝑝2 ∧ ... ∧ 𝑝𝑛 ) → (𝑝 → 𝑞) é uma
tautologia, então (𝑝1 ∧ 𝑝2 ∧ ... ∧ 𝑝𝑛 ∧ 𝑝) → 𝑞 também é uma tautologia. Isso nos permite definir o
Teorema da dedução, como segue.
ou seja, para provar uma condicional 𝑝 → 𝑞, podemos iintroduzir 𝑝 como hipótese (trabalhar no lado
direito da bicondicional), deduzir 𝑞 e no final da prova, descartar 𝑝, indicando que a hipótese pode
voltar para o antecedente da condicional (lado esquerdo da bicondicional).
1. 𝑏 → ¬𝑐 Premissa
2. ¬(𝑑 ∧ ¬𝑏) Premissa
3. 𝑐 Hip.
4. ¬𝑏 MT (1, 3)
5. ¬𝑑 ∨ 𝑏 DM (2)
6. ¬𝑑 SD (4, 5)
7. 𝑐 → ¬𝑑 Elim. Hip. (3)
Portanto, pelo Teorema da dedução, temos que 𝑐 → ¬𝑑 é consequência lógica das premissas.
1. (𝑎 ∨ 𝑗) → 𝑔 Premissa
2. 𝑗 → (¬𝑔 ∧ ¬𝑗) Premissa
3. 𝑗∨𝑏 Premissa
4. 𝑎 Hip.
5. 𝑎∨𝑗 Adi (4)
6. 𝑔 MP (1, 5)
7. 𝑔∨ℎ Adi (6)
8. ¬(¬(𝑔 ∨ ℎ)) DN (7)
9. ¬(¬𝑔 ∧ ¬ℎ) DM (8)
10. ¬𝑗 MT (2, 9)
11. 𝑏 SD (3, 10)
12. 𝑎→𝑏 Elim. Hip. (4)
Portanto, pelo Teorema da dedução, temos que 𝑎 → 𝑏 é consequência lógica das premissas.
Exemplo: Suponha que seu amigo machucou o tornozelo uma semana antes de uma grande
corrida e sua intenção seja persuadí-lo a parar de correr por alguns dias, a fim de que o seu tornozelo
60
melhore. Você pode alertá-lo fazendo a seguinte afirmação condicional: Se você continuar a correr,
não estará apto a disputar a corrida. A resposta de seu amigo pode ser: prove isso!
Você então elabora o argumento com base em 3 suposições:
• Seu tornozelo está muito inchado.
• Se seu tornozelo está muito inchado e você continuar a correr, então seu tornozelo não irá sarar
em uma semana.
• Se seu tornozelo não sarar em uma semana, então você não estará apto a disputar a corrida.
Prove a validade do argumento usando:
a) Uma prova condicional invocando o Teorema da dedução.
b) Uma prova direta, sem invocar o Teorema da dedução.
Primeiramente, devemos escrever o argumento na linguagem da lógica proposicional:
• 𝑝: seu tornozelo está muito inchado.
𝑝, (𝑝 ∧ 𝑞) → ¬𝑟, ¬𝑟 → ¬𝑠 ⊢ 𝑞 → ¬𝑠 (97)
1. 𝑝 Premissa
2. (𝑝 ∧ 𝑞) → ¬𝑟 Premissa
3. ¬𝑟 → ¬𝑠 Premissa
4. 𝑞 Hip.
5. 𝑝∧𝑞 Conj (1, 4)
6. ¬𝑟 MP (2, 5)
7. ¬𝑠 MP (3, 6)
8. 𝑞 → ¬𝑠 Elim. Hip. (4)
1. 𝑝 Premissa
2. (𝑝 ∧ 𝑞) → ¬𝑟 Premissa
3. ¬𝑟 → ¬𝑠 Premissa
4. 𝑝 → (𝑞 → ¬𝑟) Exp (2)
5. 𝑞 → ¬𝑟 MP (1, 4)
6. 𝑞 → ¬𝑠 SH (5, 3)
61
Portanto, demonstramos que o argumento é válido de duas maneiras distintas: com e sem a apli-
cação da prova condicional via o Teorema da dedução.
(𝑝 ∧ 𝑞) → 𝑟 ⊢ 𝑝𝑡𝑜(𝑞 → 𝑟) (98)
1. (𝑝 ∧ 𝑞) → 𝑟 Premissa
2. 𝑝 Hip.
3. 𝑞 Hip.
4. 𝑝∧𝑞 Conj (2, 3)
5. 𝑟 MP (1, 4)
6. 𝑞→𝑟 Elim. Hip. (3)
7. 𝑝 → (𝑞 → 𝑟) Elim. Hip. (2)
𝑝1 , 𝑝2 , ..., 𝑝𝑛 ⊢ 𝑞 (99)
Então, basta mostrar que (𝑝1 ∧𝑝2 ∧...∧𝑝𝑛 ) → 𝑞 é uma tautologia. Mas, por algumas equivalências
lógicas, sabemos que:
𝑞 ≡ 𝑞 ∨ 𝑞 ≡ ¬¬𝑞 ∨ 𝑞 ≡ ¬𝑞 → 𝑞 (100)
Mas, pelo Teorema da dedução, a inclusão de ¬𝑞 como hipótese nos permite deduzir 𝑞, o que
implica em dizer que:
62
Exemplo: Prove 𝑟 por redução ao absurdo, dado {¬𝑝 → 𝑟, ¬𝑟 → 𝑞, ¬(𝑝 ∧ 𝑞)}.
1. ¬𝑝 → 𝑟 Premissa
2. ¬𝑟 → 𝑞 Premissa
3. ¬(𝑝 ∧ 𝑞) Premissa
4. ¬𝑟 PP
5. 𝑞 MP (2, 4)
6. ¬𝑝 ∨ ¬𝑞 DM (3)
7. ¬¬𝑞 DN (5)
8. ¬𝑝 SD (6, 7)
9. 𝑟 MP (1, 8)
10. 𝑟 ∧ ¬𝑟 Conj (4, 9)
Portanto, pelo prova por redução ao absurdo, temos que 𝑟 é consequência lógica das premissas.
Uma observação importante é que nem sempre a contradição envolve diretamente a proposição 𝑟 e
sua negação, ou seja, ao adicionar ¬𝑟 como premissa provisória, podemos chegar em uma contradição
que envolve 𝑝 e ¬𝑝 e mesmo assim a prova por redução terminará com sucesso.
Exemplo: Prove ¬𝑝 por redução ao absurdo, dado o conjunto de premissas {¬𝑞 ∨ 𝑟, 𝑝 → ¬𝑟, 𝑞}.
1. ¬𝑞 ∨ 𝑟 Premissa
2. 𝑝 → ¬𝑟 Premissa
3. 𝑞 Premissa
4. 𝑝 PP
5. ¬𝑟 MP (2, 4)
6. ¬𝑞 SD (1, 5)
7. 𝑞 ∧ ¬𝑞 Conj (3, 6)
8. ¬𝑝 RA
𝑝 ⇐⇒ ¬𝑞 ⊢ ¬(𝑝 ∧ 𝑞) (103)
1. 𝑝 ⇐⇒ ¬𝑞 Premissa
2. ¬(¬(𝑝 ∧ 𝑞)) PP
3. 𝑝∧𝑞 DN (2)
4. 𝑝 Simp (3)
5. 𝑞 Simp (3)
6. (𝑝 → ¬𝑞) ∧ (¬𝑞 → 𝑝) Bicond. (1)
7. (𝑝 → ¬𝑞) Simp (6)
8. ¬𝑞 MP (4, 7)
9. 𝑞 ∧ ¬𝑞 Conj (5, 8)
10. ¬(𝑝 ∧ 𝑞) RA
63
Exemplo: Prove o argumento a seguir utilizando redução ao absurdo:
Exemplo: Demonstre o argumento a seguir utilizando prova condicional e prova por redução ao
absurdo:
1. ¬𝑝 ∨ 𝑞 Premissa
2. ¬𝑞 Premissa
3. ¬𝑟 → 𝑠 Premissa
4. ¬𝑝 → (𝑠 → ¬𝑡) Premissa
5. 𝑡 Hip.
6. ¬𝑟 PP
7. ¬𝑝 SD (1, 2)
8. 𝑠 → ¬𝑡 MP (4, 7)
9. 𝑠 MP (3, 6)
10. ¬𝑡 MP (8, 9)
11. 𝑡 ∧ ¬𝑡 Conj (5, 10)
12. 𝑟 RA
13. 𝑡→𝑟 Elim. Hip. (5)
64
8 O método do tableaux analítico
As tabelas verdade são um método semântico poderoso para a validação de argumentos na lógica
proposicional, mas possui um grande problema: são altamente ineficientes. O método do tableaux
analítico também é semântico, mas, em geral, é mais eficiente para fórmulas com muitas variáveis ou
estrutura complexa. Enquanto as tabelas verdade são úteis para fins didáticos ou fórmulas pequenas,
os tableaux destacam-se em aplicações reais onde a eficiência computacional é crítica.
O método do tableaux analítico (ou tableaux semântico) é uma técnica de prova formal na ló-
gica proposicional que utiliza uma estrutura de árvore para verificar a validade de argumentos ou a
satisfatibilidade de fórmulas. Esse método opera decompondo sistematicamente fórmulas em seus
componentes mais simples, seguindo regras de expansão que refletem a semântica dos conectivos ló-
gicos. Cada ramo da árvore representa uma possível interpretação das fórmulas, e o fechamento de
todos os ramos indica que a fórmula inicial é uma contradição.
Este método destaca-se por sua clareza visual e abordagem semântica, sendo uma ferramenta
poderosa tanto para ensino quanto para aplicações práticas em ciência da computação. Enquanto
métodos baseados em regras de inferência enfatizam a sintaxe e a construção de provas, os tableaux
oferecem uma perspectiva complementar, focada na análise de modelos e contradições.
O método do tableaux analítico para provar que um argumento é válido é uma técnica baseada
em uma árvore de refutação. Cada fórmula 𝛼 é antecedida por 𝑠 : para significar que ela deve ser
satisfeita, ou por 𝑓 : para significar que ela deve ser falseada. Esse método é baseado em um conjunto
de regras semânticas baseadas nos operadores lógicos ¬, ∧, ∨, → e ⇐⇒ .
65
𝑓 :𝛼∨𝛽
𝑠:𝛼∨𝛽
(111) 𝑓 :𝛼 (112)
𝑠:𝛼|𝑠:𝛽
𝑓 :𝛽
Um tableaux analítico é uma árvore de refutação cujo processo de construção é top-down, ou seja,
iniciamos em um nó raiz e a partir da aplicação das regras semânticas vamos ramificando a árvore.
Um ramo fechado de um tableaux é um ramo que contém uma fórmula 𝛼 e sua negação ¬𝛼. Um
tableaux fechado é aquele em que todos os ramos são fechados.
A intuição do método do tableaux analítico é que se uma formula 𝛼 é uma tautologia, então sua ne-
gação ¬𝛼 é uma contradição. Sabemos que em um argumento válido na sua forma condicional é uma
tautologia, portanto, a negação de um argumento válido na sua forma condicional é uma contradição,
ou seja, deve existir um tableaux fechado para ele.
𝑝 ⇐⇒ (¬𝑞 ∨ 𝑟) ⊢ ¬𝑝 → 𝑞 (117)
Para isso devemos encontrar um tableaux fechado que falseie o argumento na forma condicio-
nal (falsear uma tautologia, gera uma contradição), ou seja, devemos iniciar a árvore de refutação
falseando a fórmula:
66
1. 𝑓 : (𝑝 ⇐⇒ (¬𝑞 ∨ 𝑟)) → (¬𝑝 → 𝑞)
2. 𝑠 : 𝑝 ⇐⇒ (¬𝑞 ∨ 𝑟) (1)
3. 𝑓 : ¬𝑝 → 𝑞 (1)
4. 𝑠 : ¬𝑝 (3)
5. 𝑓 :𝑞 (3)
6. 𝑓 :𝑝 (4)
7. 𝑠:𝑝 𝑓 :𝑝 (2)
8. 𝑠 : ¬𝑞 ∨ 𝑟 𝑓 : ¬𝑞 ∨ 𝑟
9. ⊗ 𝑓 : ¬𝑞 (8)
10. 𝑓 :𝑟 (8)
⊗
Como ambos os ramos do tableaux estão fechados, a conclusão é de que o argumento é válido.
Uma observação relevante é que, para gerar um tableaux mais conciso, recomenda-se dar prioridade
as regras que não causam bifurcação nos ramos atuais.
𝑝 → 𝑞, ¬𝑝 → 𝑟, ¬𝑞 ⊢ 𝑟 (119)
Para isso devemos encontrar um tableaux fechado que falseie o argumento na forma condicio-
nal (falsear uma tautologia, gera uma contradição), ou seja, devemos iniciar a árvore de refutação
falseando a fórmula:
8. 𝑓 :𝑝 𝑠:𝑞 (4)
⊗
9. 𝑓 : ¬𝑝 𝑠:𝑟 (5)
⊗ ⊗
67
Como todos os ramos do tableaux estão fechados, a conclusão é de que o argumento é válido.
𝑝 → 𝑞, (𝑝 ∧ 𝑞) → 𝑟, ¬(𝑝 ∧ 𝑟) ⊢ ¬𝑝 (121)
Para isso devemos encontrar um tableaux fechado que falseie o argumento na forma condicio-
nal (falsear uma tautologia, gera uma contradição), ou seja, devemos iniciar a árvore de refutação
falseando a fórmula:
8. 𝑓 :𝑝 𝑠:𝑞 (4)
⊗
9. 𝑓 :𝑝∧𝑞 𝑠:𝑟 (5)
10. 𝑓 :𝑝 𝑓 :𝑞 (9)
11. ⊗ ⊗ |
12. 𝑓 :𝑝∧𝑟 (7)
13. 𝑓 :𝑝 𝑓 :𝑟
⊗ ⊗
Como todos os ramos do tableaux estão fechados, a conclusão é de que o argumento é válido.
Podemos adotar uma notação simplificada alternativa, sem a necessidade dos prefixos 𝑠 : e 𝑓 :, a
partir das seguintes definições:
• o prefixo 𝑠 : é descartado.
• o prefixo 𝑓 : é substituído pela negação ¬ (pois para falsear 𝛼, basta satisfazer ¬𝛼).
Dessa forma, as regras semânticas são ajustadas para uma nova notação. A seguir apresentamos
as novas regras semânticas modificadas.
68
1. Negação: Essa simples regra nos diz que para satisfazer ¬¬𝛼 devemos satisfazer 𝛼.
¬¬𝛼
(123)
𝛼
2. Conjunção: Essas regras nos dizem que para satisfazer 𝛼 ∧ 𝛽, devemos satisfazer ambos 𝛼 e 𝛽
simultaneamente, e para satisfazer ¬(𝛼 ∧ 𝛽), basta satisfazer ¬𝛼 ou ¬𝛽.
𝛼∧𝛽
¬(𝛼 ∧ 𝛽)
𝛼 (124) (125)
¬𝛼 | ¬𝛽
𝛽
3. Disjunção: Essas regras nos dizem que para satisfazer 𝛼 ∨ 𝛽, devemos satisfazer 𝛼 ou 𝛽, e para
satisfazer ¬(𝛼 ∨ 𝛽) devemos satisfazer ¬𝛼 e ¬𝛽 simultaneamente.
¬(𝛼 ∨ 𝛽)
𝛼∨𝛽
(126) ¬𝛼 (127)
𝛼|𝛽
¬𝛽
4. Condicional: Essas regras nos dizem que para satisfazer 𝛼 → 𝛽, basta satisfazer ¬𝛼 ou 𝛽 e
para satisfazer ¬(𝛼 → 𝛽) devemos satisfazer 𝛼 e ¬𝛽 simultaneamente.
¬(𝛼 → 𝛽)
𝛼→𝛽
(128) 𝛼 (129)
¬𝛼 | 𝛽
¬𝛽
5. Bicondicional: Essas regras nos dizem que para satisfazer 𝛼 ⇐⇒ 𝛽 devemos satisfazer 𝛼
e 𝛽 simultaneamente ou satisfazer ¬𝛼 e ¬𝛽 simultaneamente, e para satisfazer ¬(𝛼 ⇐⇒ 𝛽)
devemos satisfazer 𝛼 e ¬𝛽 simultaneamente ou satisfazer ¬𝛼 e 𝛽 simultaneamente.
𝛼 ⇐⇒ 𝛽 ¬(𝛼 ⇐⇒ 𝛽)
𝛼 ¬𝛼 (130) 𝛼 ¬𝛼 (131)
𝛽 ¬𝛽 ¬𝛽 𝛽
Exemplo: Utilizando o método do tableaux analítico, prove o seguinte argumento (regra Silo-
gismo Hipotético):
𝑝 → 𝑞, 𝑞 → 𝑟 ⊢ 𝑝 → 𝑟 (132)
Para isso devemos encontrar um tableaux fechado para a negação do argumento na forma condi-
cional, ou seja, devemos iniciar a árvore de refutação com a negação da seguinte fórmula:
69
1. ¬(((𝑝 → 𝑞) ∧ (𝑞 → 𝑟)) → (𝑝 → 𝑟))
2. (𝑝 → 𝑞) ∧ (𝑞 → 𝑟) (1)
3. ¬(𝑝 → 𝑟) (1)
4. 𝑝→𝑞 (2)
5. 𝑞→𝑟 (2)
6. 𝑝 (3)
7. ¬𝑟 (3)
8. ¬𝑝 𝑞 (4)
⊗
9. ¬𝑞 𝑟 (5)
⊗ ⊗
Como todos os ramos do tableaux estão fechados, o argumento é válido. Essa é uma possível
demonstração para a regra de inferência Silogismo Hipotético sem utilizar tabelas verdade.
Exemplo: Utilizando o método do tableaux analítico, prove o seguinte argumento (Lei da Expor-
tação):
𝑝 → (𝑞 → 𝑟) ⊢ (𝑝 ∧ 𝑞) → 𝑟 (134)
Para isso devemos encontrar um tableaux fechado para a negação do argumento na forma condi-
cional, ou seja, devemos iniciar a árvore de refutação com a negação da seguinte fórmula:
8. ¬𝑝 𝑞→𝑟 (2)
9. ⊗ ¬𝑞 (8)
10. 𝑟 (8)
⊗
Como todos os ramos do tableaux estão fechados, o argumento é válido. Essa é uma possível
demonstração para Lei da Exportação sem utilizar tabelas verdade.
70
Exemplo: Utilizando o método do tableaux analítico, prove o seguinte argumento (Regra Dilema
Destrutivo):
Para isso devemos encontrar um tableaux fechado para a negação do argumento na forma condi-
cional, ou seja, devemos iniciar a árvore de refutação com a negação da seguinte fórmula:
9. ¬𝑝 𝑞 (4)
⊗
10. 𝑝 𝑟 (3)
⊗
11. ¬𝑟 𝑠 (5)
⊗ ⊗
• 𝑐: o técnico é culpado.
71
• 𝑡: os torcedores ficam contentes.
𝑗 → 𝑔, ¬𝑗 → 𝑐, 𝑔 → 𝑡, ¬𝑡 ⊢ 𝑐 (138)
Para isso devemos encontrar um tableaux fechado para a negação do argumento na forma condi-
cional, ou seja, devemos iniciar a árvore de refutação com a negação da seguinte fórmula:
8. ¬𝑔 𝑡 (6)
⊗
9. ¬𝑗 𝑔 (4)
⊗
10. 𝑗 𝑐 (5)
⊗ ⊗
72
os tableaux organizam-se em árvores ramificadas, que explicitam possíveis cenários semânticos, en-
quanto os sistemas de regras seguem uma sequência linear, priorizando a correção sintática de cada
passo.
Outro contraste relevante é o foco metodológico. Os tableaux analíticos são essencialmente se-
mânticos, pois vinculam-se diretamente à noção de modelos e interpretações. Cada ramo aberto, por
exemplo, corresponde a um modelo possível para as fórmulas analisadas, enquanto o fechamento de
todos os ramos indica insatisfatibilidade. Já as regras de inferência são sintáticas, preocupando-se
com a manipulação simbólica das fórmulas, independentemente de seu significado. Essa dualidade
enriquece o estudo da lógica, permitindo abordar problemas sob perspectivas complementares: os ta-
bleaux são ideais para identificar contraexemplos e explorar cenários, enquanto as regras de inferência
destacam-se na construção explícita de argumentos válidos.
Além disso, o método dos tableaux demonstra-se particularmente eficaz em contextos pedagógi-
cos e computacionais. Sua natureza visual e algorítmica facilita a compreensão de conceitos como
contradição e consistência, sendo amplamente utilizado em ferramentas de automação de provas. Em
contrapartida, sistemas baseados em regras de inferência são mais adequados para formalizações rigo-
rosas e para o estudo de metateoremas (como completude e correção), já que espelham a arquitetura
axiomática da lógica.
Por fim, é importante ressaltar que essas abordagens não são rivais, mas complementares. En-
quanto os tableaux revelam a "anatomia" das contradições, os métodos dedutivos tradicionais ex-
põem a "engrenagem" interna das demonstrações. Dominar ambas as técnicas permite ao estudante
não apenas resolver problemas de maneira versátil, mas também desenvolver uma visão crítica sobre
os limites e as potencialidades da lógica formal.
Este capítulo, ao desvendar os tableaux analíticos, convida o leitor a reconhecer a pluralidade de
métodos que sustentam a Lógica Matemática. Cada técnica, com suas particularidades, reforça que a
busca pela verdade lógica é tanto uma ciência quanto uma arte — onde clareza, criatividade e rigor
se entrelaçam para desvendar os fundamentos do raciocínio válido.
73
9 Prova por resolução
A prova por resolução é um método de inferência fundamental na lógica proposicional, ampla-
mente utilizado em sistemas automatizados de demonstração de teoremas e em aplicações práticas
como verificação formal e inteligência artificial. Desenvolvida por John Alan Robinson em 1965,
a resolução baseia-se na ideia de simplificar fórmulas lógicas combinando cláusulas (disjunções de
literais) que contenham literais complementares (por exemplo, 𝑎 e ¬𝑎), gerando novas cláusulas até
que se derive uma contradição explícita (cláusula vazia).
Sua relevância reside na eficiência algorítmica e na completude: qualquer contradição expressa na
forma normal conjuntiva (CNF) pode ser refutada através da aplicação sistemática da regra de reso-
lução. Esse método é particularmente útil para verificar a validade de argumentos ou a inconsistência
de conjuntos de cláusulas, sendo a base de algoritmos como o DPLL (Davis-Putnam-Logemann-
Loveland), essenciais em solucionadores SAT (Boolean Satisfiability Problem), ferramentas críticas
em otimização, síntese de circuitos e planejamento automatizado.
Diferente de métodos como os tableaux analíticos ou a dedução natural, a resolução opera exclusi-
vamente em cláusulas, dispensando regras complexas de inferência. Sua simplicidade sintática e foco
na eliminação de literais complementares permitem uma implementação computacional altamente
otimizada, consolidando-a como um pilar da lógica computacional. Assim, a prova por resolução
não apenas aprofunda o entendimento teórico da estrutura das demonstrações, mas também conecta a
lógica proposicional a desafios tecnológicos contemporâneos, reforçando seu papel central na ciência
da computação e na matemática discreta.
𝑟𝑒𝑠𝑜𝑙𝑣𝑒𝑛𝑡𝑒(𝑃, 𝑄; 𝑟) = ¬𝑝 ∨ 𝑞 (141)
Pode-se mostrar que o resolvente de duas cláusulas tem ligação direta com as regras de inferência
que vimos anteriormente.
74
• Modus Ponens: 𝑝 → 𝑞, 𝑝 ⊨ 𝑞
𝑃 : 𝑝 → 𝑞 ≡ ¬𝑝 ∨ 𝑞 (142)
𝑄:𝑝 (143)
𝑟𝑒𝑠𝑜𝑙𝑣𝑒𝑛𝑡𝑒(𝑃, 𝑄; 𝑝) = 𝑞 (144)
• Modus Tollens: 𝑝 → 𝑞, ¬𝑞 ⊨ ¬𝑝
𝑃 : 𝑝 → 𝑞 ≡ ¬𝑝 ∨ 𝑞 (145)
𝑄 : ¬𝑞 (146)
𝑟𝑒𝑠𝑜𝑙𝑣𝑒𝑛𝑡𝑒(𝑃, 𝑄; 𝑞) = ¬𝑝 (147)
• Silogismo Hipotético: 𝑝 → 𝑞, 𝑞 → 𝑟 ⊨ 𝑝 → 𝑟
𝑃 : 𝑝 → 𝑞 ≡ ¬𝑝 ∨ 𝑞 (148)
𝑄 : 𝑞 → 𝑟 ≡ ¬𝑞 ∨ 𝑟 (149)
𝑟𝑒𝑠𝑜𝑙𝑣𝑒𝑛𝑡𝑒(𝑃, 𝑄; 𝑞) = ¬𝑝 ∨ 𝑟 ≡ 𝑝 → 𝑟 (150)
• Silogismo Disjuntivo: 𝑝 ∨ 𝑞, ¬𝑝 ⊨ 𝑞
𝑃 :𝑝∨𝑞 (151)
𝑄 : ¬𝑝 (152)
𝑟𝑒𝑠𝑜𝑙𝑣𝑒𝑛𝑡𝑒(𝑃, 𝑄; 𝑝) = 𝑞 (153)
𝑃, 𝑄 ⊨ 𝑟𝑒𝑠𝑜𝑙𝑣𝑒𝑛𝑡𝑒(𝑃, 𝑄; 𝑎) (154)
Em outras palavras, o resolvente de duas cláusulas arbitrárias sempre é consequência lógica delas.
Portanto, podemos utilizar essa operação para demonstrar a validade de argumentos. Porém, no
processo de prova por resolução, nem sempre as proposições são clásulas. Se não forem, devemos
primeiro convertê-las para a FNC (Forma Normal Conjuntiva). A aplicação da prova por resolução
está diretamente relacionada com a prova por redução ao absurdo. Existem duas formas variantes
para deduções baseadas em contradições:
75
A seguir apresentamos um algoritmo para aplicar a prova por resolução a um conjunto de premis-
sas arbitrárias.
Algoritmo para resolução
A entrada deve ser um conjunto de proposições {𝑃1 , 𝑃2 , ..., 𝑃𝑛 }.
4. Repita o passo anterior até que se tenha 2 cláusulas compostas por um único átomo: 𝐶𝑖 : 𝑝 e
𝐶𝑗 : ¬𝑝. Obtenha 𝑟𝑒𝑠𝑜𝑙𝑣𝑒𝑛𝑡𝑒(𝐶𝑖 , 𝐶𝑗 ; 𝑝) para obter a clásula vazia NIL, que representa uma
contradição (o que implica que o argumento é válido!).
Exemplo: Demonstre o argumento a seguir utilizando a prova por resolução com a negação da
conclusão.
¬𝑝 → 𝑞, 𝑞 → 𝑟, 𝑟 → 𝑠, ¬𝑠 ⊢ 𝑝 (155)
• 𝑃 : ¬𝑝 → 𝑞
• 𝑄:𝑞→𝑟
• 𝑅:𝑟→𝑠
• 𝑆 : ¬𝑠
• 𝑇 :𝑝
• 𝐹 𝑁 𝐶(𝑃 ) = ¬¬𝑝 ∨ 𝑞 ≡ 𝑝 ∨ 𝑞
• 𝐹 𝑁 𝐶(𝑄) = ¬𝑞 ∨ 𝑟
• 𝐹 𝑁 𝐶(𝑅) = ¬𝑟 ∨ 𝑠
• 𝐹 𝑁 𝐶(𝑆) = ¬𝑠
• 𝐹 𝑁 𝐶(¬𝑇 ) = ¬𝑝
76
A seguir, temos a prova por resolução ilustrada em detalhes. Note que devemos partir das 5
proposições convertidas para a FNC:
1. 𝑝∨𝑞 Premissa
2. ¬𝑞 ∨ 𝑟 Premissa
3. ¬𝑟 ∨ 𝑠 Premissa
4. ¬𝑠 Premissa
5. ¬𝑝 PP
6. 𝑞 resolvente(1, 5)
7. 𝑟 resolvente(2, 6)
8. 𝑠 resolvente(3, 7)
9. 𝑁 𝐼𝐿 resolvente(4, 8)
Como a prova por resolução encontrou a cláusula vazia NIL, o argumento em questão é válido.
É possível visualizar a prova por resolução através de uma árvore de refutação construída de maneira
bottom-up, isto é, em cada uma das folhas adicionamos uma cláusula inicial e a cada resolvente,
combinamos duas folhas, gerando um nó intermediário. Se ao final do processo atingirmos uma raiz
NIL, o argumento é válido. A figura a seguir ilustra a árvore de refutação obtida para o exemplo em
questão.
Figura 3: Árvore de refutação referente ao processo de prova por resolução do exemplo em questão.
Uma observação importante é que a sequência de passos necessárias para chegar na cláusula vazia
NIL em uma prova por resolução não é única, ou seja, na grande maioria dos casos pode haver mais
de uma sequência possível.
Exemplo: Demonstre o argumento a seguir utilizando a prova por resolução com a negação da
forma condicional do argumento.
77
¬𝑝 → 𝑞, 𝑞 → 𝑟, 𝑟 → 𝑠, ¬𝑠 ⊢ 𝑝 (156)
(¬𝑝 → 𝑞) ∧ (𝑞 → 𝑟) ∧ (𝑟 → 𝑠) ∧ ¬𝑠 ∧ ¬𝑝 (160)
• 𝐶2 : ¬𝑞 ∨ 𝑟
• 𝐶3 : ¬𝑟 ∨ 𝑠
• 𝐶4 : ¬𝑠
• 𝐶5 : ¬𝑝
A seguir, temos a prova por resolução ilustrada em detalhes. Note que utilizaremos outra sequên-
cia de operações em comparação com o exemplo anterior:
1. 𝑝∨𝑞 Premissa
2. ¬𝑞 ∨ 𝑟 Premissa
3. ¬𝑟 ∨ 𝑠 Premissa
4. ¬𝑠 Premissa
5. ¬𝑝 Premissa
6. 𝑝∨𝑟 resolvente(1, 2)
7. ¬𝑟 resolvente(3, 4)
8. 𝑝 resolvente(6, 7)
9. 𝑁 𝐼𝐿 resolvente(5, 8)
78
Como a prova por resolução encontrou a cláusula vazia NIL, o argumento em questão é válido. A
figura a seguir ilustra a árvore de refutação obtida para o exemplo em questão.
Figura 4: Árvore de refutação referente ao processo de prova por resolução do exemplo em questão.
Exemplo: Demonstre o argumento a seguir utilizando a prova por resolução com a negação da
conclusão.
¬𝑝 → 𝑞, 𝑟 → 𝑠, (𝑞 ∨ 𝑠) → 𝑡, ¬𝑡 ⊢ ¬𝑝 ∧ ¬𝑟 (162)
• 𝑃 :𝑝→𝑞
• 𝑄:𝑟→𝑠
• 𝑅 : (𝑞 ∨ 𝑠) → 𝑡
• 𝑆 : ¬𝑡
• 𝑇 : ¬𝑝 ∧ ¬𝑟
• 𝐹 𝑁 𝐶(𝑃 ) = ¬𝑝 ∨ 𝑞
• 𝐹 𝑁 𝐶(𝑄) = ¬𝑟 ∨ 𝑠
• 𝐹 𝑁 𝐶(𝑆) = ¬𝑡
79
A seguir, temos a prova por resolução ilustrada em detalhes. Note que devemos partir de 6 cláu-
sulas, uma vez que a proposição 𝑅 gerou duas delas:
1. ¬𝑝 ∨ 𝑞 Premissa
2. ¬𝑟 ∨ 𝑠 Premissa
3. ¬𝑞 ∨ 𝑡 Premissa
4. ¬𝑠 ∨ 𝑡 Premissa
5. ¬𝑡 Premissa
6. 𝑝∨𝑟 Premissa
7. ¬𝑝 ∨ 𝑡 resolvente(1, 3)
8. ¬𝑝 resolvente(5, 7)
9. ¬𝑠 resolvente(4, 5)
10. ¬𝑟 resolvente(2, 9)
11. 𝑝 resolvente(6, 10)
12. 𝑁 𝐼𝐿 resolvente(8, 11)
Como a prova por resolução encontrou a cláusula vazia NIL, o argumento em questão é válido. A
figura a seguir ilustra a árvore de refutação obtida para o exemplo em questão.
Figura 5: Árvore de refutação referente ao processo de prova por resolução do exemplo em questão.
Note que no processo de construção da árvore de refutação na prova por resolução, podemos
utilizar uma cláusula mais de uma vez no caminho até a cláusula vazia NIL. Por exemplo, a cláusula
¬𝑡 é usada primeiramente com a cláusula ¬𝑠 ∨ 𝑡 e depois com a cláusula ¬𝑝 ∨ 𝑡.
Exemplo: Demonstre o argumento a seguir em linguagem natural utilizando a prova por resolução
com a negação da conclusão.
80
O participante vai ao paredão se o lider indica ou se os colegas indicam.
Se o participante vai ao paredão e chora, então ele conquista o público.
Se o participante conquista o público, ele não é eliminado.
O líder indicou um participante e ele foi eliminado.
Logo, o participante não chorou.
• 𝑙: o líder indica.
• 𝑒: os colegas escolhem.
• 𝑐: o participante chora.
• 𝑚: o participante é eliminado.
(𝑙 ∨ 𝑒) → 𝑝, (𝑝 ∧ 𝑐) → 𝑞, 𝑞 → ¬𝑚, 𝑙 ∧ 𝑚 ⊢ ¬𝑐 (163)
• 𝑃1 : (𝑙 ∨ 𝑒) → 𝑝
• 𝑃2 : (𝑝 ∧ 𝑐) → 𝑞
• 𝑃3 : 𝑞 → ¬𝑚
• 𝑃4 : 𝑙 ∧ 𝑚
• 𝑃5 : ¬𝑐
• 𝐹 𝑁 𝐶(𝑃2 ) = ¬(𝑝 ∧ 𝑐) ∨ 𝑞 ≡ ¬𝑝 ∨ ¬𝑐 ∨ 𝑞
• 𝐹 𝑁 𝐶(𝑃3 ) = ¬𝑞 ∨ ¬𝑚
81
A seguir, temos a prova por resolução ilustrada em detalhes. Note que devemos partir de 7 cláu-
sulas, uma vez que as proposições 𝑃1 e 𝑃4 geraram duas delas:
1. ¬𝑙 ∨ 𝑝 Premissa
2. ¬𝑒 ∨ 𝑝 Premissa
3. ¬𝑝 ∨ ¬𝑐 ∨ 𝑞 Premissa
4. ¬𝑞 ∨ ¬𝑚 Premissa
5. 𝑙 Premissa
6. 𝑚∨𝑟 Premissa
7. 𝑐 Premissa
8. 𝑝 resolvente(1, 5)
9. ¬𝑐 ∨ 𝑞 resolvente(3, 8)
10. 𝑞 resolvente(7, 9)
11. ¬𝑚 resolvente(4, 10)
12. 𝑁 𝐼𝐿 resolvente(6, 11)
Como a prova por resolução encontrou a cláusula vazia NIL, o argumento em questão é válido. A
figura a seguir ilustra a árvore de refutação obtida para o exemplo em questão.
Figura 6: Árvore de refutação referente ao processo de prova por resolução do exemplo em questão.
Note que neste exemplo não foi preciso utilizar todas as cláusulas para atingir a cláusula vazia
NIL. Não há problema algum com essa situação, uma vez que isso indica que há mais informação
disponível no argumento do que o necessário para provar sua validade.
82
9.2 Considerações finais
A prova por resolução consolida-se como um dos pilares metodológicos mais elegantes e eficien-
tes da lógica proposicional. Ao longo deste capítulo, exploramos sua estrutura minimalista, funda-
mentada na combinação estratégica de cláusulas e na busca pela cláusula vazia, símbolo máximo da
contradição. Sua simplicidade sintática, que dispensa regras complexas de inferência, contrasta com
seu poder decisório: a resolução é um método completo, capaz de demonstrar qualquer argumento
válido.
A relevância desse método transcende o âmbito teórico. Na prática, a resolução tornou-se a base
de algoritmos revolucionários na ciência da computação, como os solucionadores SAT (Boolean Sa-
tisfiability Problem), ferramentas essenciais para verificação formal de circuitos, planejamento auto-
matizado e inteligência artificial. Sua eficiência em lidar com problemas NP-completos, ainda que
limitada pela complexidade exponencial no pior caso, reforça a importância de otimizações heurísti-
cas e do pré-processamento de fórmulas em forma normal conjuntiva (FNC).
Comparada a outros métodos, como os tableaux analíticos ou a dedução natural, a resolução
destaca-se por sua natureza algorítmica e foco na refutação. Enquanto os tableaux exploram ramifica-
ções semânticas e a dedução natural constrói argumentos passo a passo, a resolução opera como um
processo mecânico de eliminação de literais complementares, priorizando a economia de passos e a
automatização. Essa diferença não a torna superior, mas complementar: cada método ilumina facetas
distintas da lógica, seja pela perspectiva sintática, semântica ou pragmática.
É importante ressaltar, porém, que a resolução não é um método perfeito. Sua aplicação exige
a conversão prévia de fórmulas para FNC, etapa que pode gerar explosão exponencial de cláusulas.
Além disso, sua eficácia em larga escala depende criticamente de estratégias de ordenação e seleção
de cláusulas, como o uso da regra da pureza e da eliminação de cláusulas subsumidas, que evitam
derivações redundantes.
Por fim, a prova por resolução ensina-nos uma lição profunda sobre a lógica: mesmo sistemas
aparentemente austeros podem ser surpreendentemente poderosos quando combinados com intuição
estratégica e rigor formal. Seu legado persiste não apenas como ferramenta acadêmica, mas como
alicerce de tecnologias que moldam o mundo contemporâneo. Assim, este capítulo não se encerra
aqui, mas convida o leitor a explorar horizontes mais amplos — como a resolução em lógica de
primeira ordem ou suas aplicações em sistemas de raciocínio automatizado —, onde a busca pelo
conhecimento continua a desafiar e inspirar.
83
10 Lógica de predicados: sintaxe, semântica e linguagem natural
A lógica de predicados (ou lógica de primeira ordem) é uma extensão da lógica proposicional que
permite analisar a estrutura interna das proposições, incorporando elementos como quantificadores,
predicados e variáveis. Enquanto a Lógica Proposicional trata proposições como átomos indivisíveis
(i.e., 𝑃 e 𝑄), a Lógica de Predicados decompõe essas proposições em sujeitos e propriedades (i.e.,
𝑃 (𝑥), 𝑅(𝑥, 𝑦)), onde 𝑥 e 𝑦 são variáveis que representam objetos em um domínio de discurso.
A grande vantagem da lógica de predicados é permitir uma expressividade muito mais rica que a
da lógica proposicional, que é limitada a expressar relações verdadeiras/falsas entre proposições atô-
micas. Já a lógica de predicados permite descrever relações complexas entre objetos e generalizações
sobre domínios finitos ou infinitos. Em resumo, a lógica proposicional é limitada pois:
Note que não conseguimos modelar relações entre as partes da sentenças. Considere o predicado
a seguir:
• 𝑀 (𝑥, 𝑦) : 𝑥 é mãe de 𝑦
Deseja-se chegar na conclusão de que a mãe de Pedro é a mesma mãe de Maria. Observe que
a lógica proposicional não nos permite chegar a essa conclusão. Na lógica de predicados, podemos
definir os três predicados a seguir:
84
• 𝑃 (𝑥, 𝑦) : 𝑥 é pai de 𝑦
• 𝐼(𝑥, 𝑦) : 𝑥 é irmão de 𝑦
• 𝑀 (𝑥, 𝑦) : 𝑥 é mãe de 𝑦
Sejam os símbolos João, Pedro, Paulo e Maria definidos pelas constantes 𝑗, 𝑝, 𝑘 e 𝑚. Dessa forma,
supondo que 𝑥 é uma variável do domínio do discurso, podemos expressar os fatos anteriores como:
• 𝑃 (𝑗, 𝑝)
• 𝑃 (𝑘, 𝑚)
• 𝐼(𝑝, 𝑚)
• 𝑀 (𝑥, 𝑝) ∧ 𝑀 (𝑥, 𝑚)
Perceba que na lógica de predicados, nossa atenção se volta para a estrutura das proposições.
Como qualquer linguagem, a lógica de predicados é composta por uma sintaxe e uma semântica:
1. Sintaxe: especifica como os símbolos do alfabeto se combinam para formar sequências válidas.
2. Semântica: especifica como as sequências válidas se relacionam entre si e qual o valor verdade
dessa relação.
85
1. Alfabeto
2. Regras sintáticas
86
– ∀𝑥𝜑 também é uma fórmula
– ∃𝑥𝜑 também é uma fórmula
* Todos são felizes: ∀𝑥𝐹 (𝑥)
* Alguém ama John: ∃𝑥𝐴(𝑥, 𝑗)
* Todo mundo ama alguém: ∀𝑥∃𝑦𝐴(𝑥, 𝑦)
A partir da definição da sintaxe, pode-se perceber que a lógica de predicados é uma generalização
da lógica proposicional no sentido de que a estrutura da lógica proposicional está imersa na estrutura
da lógica de predicados. Nesse contexto, funções atômicas da lógica proposicional são predicados de
aridade zero e termos na lógica de predicados são como proposições átomos na lógica proposicional.
Considere a proposição a seguir: Se Ana é mãe de Maria, então Maria não é mãe de Ana.
Na lógica proposicional, temos a representação 𝑝 → ¬𝑞, onde 𝑝: Ana é mãe de Maria e 𝑞: Maria
é mãe de Ana. Já na lógica de predicados, temos mais informação. Seja 𝑀 (𝑥, 𝑦) o predicado 𝑥 é mãe
de 𝑦. Então, a representação fica 𝑀 (𝑎, 𝑚) → ¬𝑀 (𝑚, 𝑎) (substituímos átomos por predicados que
indicam propriedades).
Uma observação importante é quanto a diferença entre uma função e um predicado. Em uma
função, o contra-domínio é um conjunto arbitrário (podendo inclusive ser infinito, como os naturais
ou os reais), enquanto que em um predicado, o contra-domínio é sempre o conjunto {𝑇, 𝐹 }. Em
outras palavras, uma função pode retornar um valor qualquer, já um predicado pode retornar apenas
valores lógicos 𝑇 ou 𝐹 .
Definição 22 Uma variável que ocorre dentro do escopo de um quatificador é dita ligada.
Definição 23 Uma variável que ocorre fora do escopo de um quatificador é dita livre.
a primeira ocorrência de 𝑥 é uma variável ligada pois está no escopo do quantificador universal e a
segunda ocorrência de 𝑥 é uma variável livre.
Definição 24 Uma fórmula fechada é uma fórmula que não contém nenhuma ocorrência de variáveis
livres.
87
10.3 Enunciados categóricos
Antes de estudarmos como realizar o mapeamento de linguagem natural para a linguagem da
lógica de predicados, apresentaremos a seguir alguns enunciados categóricos, que definem 4 tipos de
sentenças amplamente utilizadas em argumentos.
1. Universal afirmativa: são sentenças da forma "Todos os homens são mortais", que podem ser
traduzidas como:
∀𝑥(𝐻(𝑥) → 𝑀 (𝑥)) (165)
2. Universal negativa: são sentenças da forma "Nenhum homem possui asas", que podem ser
traduzidas como:
∀𝑥(𝐻(𝑥) → ¬𝐴(𝑥)) (166)
3. Particular afirmativa: são sentenças da forma "Alguns homens são inteligentes", que podem
ser traduzidas como:
∃𝑥(𝐻(𝑥) → 𝐼(𝑥)) (167)
88
Figura 10: Diagrama de Venn da sentença particular afirmativa.
4. Particular negativa: são sentenças da forma "Alguns homens não são bondosos", que podem
ser traduzidas como:
∃𝑥(𝐻(𝑥) → ¬𝐵(𝑥)) (168)
1. Definir o domínio do discurso: estabelecer o conjunto de objetos sobre os quais se fala: pes-
soas, animais, números, etc.
3. Traduzir quantificadores: universais como todo, cada e qualquer ou existenciais como algum,
existe, pelo menos um.
4. Representar predicados e relações: predicados unários são usados para representar uma pro-
priedade de um objeto, enquanto predicados de maior aridade são usados para representar rela-
ções entre dois ou mais objetos.
89
5. Lidar com conectivos lógicos: conectar predicados e relações com operadores negação, con-
junção, disjunção, condicional e bicondicional.
A seguir ilustramos alguns exemplos de como traduzir sentenças em linguagem natural para a
linguagem da lógica de predicados.
Exemplo: Traduza as sentenças em linguagem natural para a linguagem da lógica de predicados.
a) Existem pessoas que não gostam de viver.
Assumiremos que o domínio 𝐷 é o conjunto dos seres vivos. Sendo assim, podemos definir dois
predicados:
• 𝐿(𝑥): 𝑥 late.
90
d) Nem todos os pássaros podem voar.
Assumiremos que o domínio 𝐷 é o conjunto dos animais. Sendo assim, podemos definir os
predicados:
• 𝑃 (𝑥): 𝑥 é um passaro.
e) Todos que são alegres ou tolerantes são felizes se e seomente se não forem egoístas.
Assumiremos que o domínio 𝐷 é o conjunto das pessoas. Sendo assim, podemos definir os
predicados:
• 𝐴(𝑥): 𝑥 é alegre.
• 𝑇 (𝑥): 𝑥 é tolerante.
• 𝐹 (𝑥): 𝑥 é feliz.
• 𝐸(𝑥): 𝑥 é egoísta.
• 𝐴(𝑥): 𝑥 se apresentou.
91
10.5 Semântica da lógica de predicados
A semântica da Lógica de Predicados (ou Lógica de Primeira Ordem) define como as fórmulas
são interpretadas em estruturas matemáticas, atribuindo significado aos símbolos e determinando se
uma proposição é verdadeira ou falsa em um contexto específico. Enquanto a sintaxe trata da forma
das fórmulas, a semântica lida com seu significado e validade em relação a um modelo (ou estrutura).
A dificuldade em verificar se uma fórmula da lógica de predicados é verdadeira ou falsa surge
devido à complexidade inerente à Lógica de Predicados, especialmente quando comparada à Lógica
Proposicional. Os principais motivos são:
• Constante (𝐷).
• Função n-ária (𝐷𝑛 → 𝐷).
• Predicado n-ário (𝐷𝑛 → 𝑛).
Observação: Iremos denotar por 𝐴(𝑥/𝑑) a atribuição de variável que mapeia 𝑥 para 𝑑 ∈ 𝐷.
Seja 𝐼 uma interpretação de uma linguagem de primeira ordem Λ com domínio 𝐷. O valor verdade
de uma fórmula 𝛼 é dado por:
1. Se a fórmula é da forma ∃𝑥𝛼, seu valor lógico é 𝑇 se existe um 𝑑 ∈ 𝐷 tal que 𝛼 é verdadeira
quando 𝐴(𝑥/𝑑). Caso contrário, o seu valor lógico é 𝐹 .
92
2. Se a fórmula é da forma ∀𝑥𝛼, seu valor lógico é 𝑇 se para todo 𝑑 ∈ 𝐷 𝛼 é verdadeira quando
𝐴(𝑥/𝑑). Caso contrário, o seu valor lógico é 𝐹 .
• 𝑃 (𝑥): 𝑥 é par.
Como temos um quantificador universal, devemos verificar se a fórmula é verdadeira para todos
os valores de 𝑑 ∈ 𝐷.
• x = 1: 𝑃 (1) → 𝑄(1, 1) ≡ 𝐹 → 𝐹 ≡ 𝑇
• x = 2: 𝑃 (2) → 𝑄(2, 1) ≡ 𝑇 → 𝑇 ≡ 𝑇
• 𝑃 (𝑥): 𝑥 é par.
Como temos um quantificador universal, devemos verificar se a fórmula é verdadeira para todos
os valores de 𝑑 ∈ 𝐷.
93
• x = 1: 𝑃 (1) → (𝑄(1, 1) ∧ 𝑃 (2)) ≡ 𝐹 → (𝐹 ∧ 𝑇 ) ≡ 𝐹 → 𝐹 ≡ 𝑇
em que o domínio 𝐷 = {1, 2}, 𝑓 (𝑥) = 𝑥 é a função identidade e os predicados são definidos por:
• 𝑃 (𝑥): 𝑥 é par.
Como temos um quantificador universal, devemos verificar se a fórmula é verdadeira para todos
os valores de 𝑑 ∈ 𝐷.
• x=1
– y = 1: 𝑄(1, 1) ∨ 𝑃 (𝑓 (1)) ≡ 𝐹 ∨ 𝐹 ≡ 𝐹
– y = 2: 𝑄(2, 1) ∨ 𝑃 (𝑓 (1)) ≡ 𝑇 ∨ 𝐹 ≡ 𝑇
• x=2
– y = 1: 𝑄(1, 2) ∨ 𝑃 (𝑓 (2)) ≡ 𝐹 ∨ 𝑇 ≡ 𝑇
– y = 2: 𝑄(2, 2) ∨ 𝑃 (𝑓 (2)) ≡ 𝐹 ∨ 𝑇 ≡ 𝑇
Portanto, como tanto para 𝑥 = 1 quanto para 𝑥 = 2 existe um 𝑦 que satisfaz a fórmula (retorna
𝑇 ), a fórmula em questão é verdadeira!
Na lógica proposicional é possível enumerar todas as possíveis interpretações de uma proposição
composta 𝑃 via tabelas verdade: se 𝑃 é composta por 𝑛 átomos, então temos 2𝑛 interpretações.
Na lógica de predicados, não é possível enumerar todas as interptretações de uma fórmula 𝑃 (é um
problema indecidível pois em diversos cenários, o domínio é um conjunto infinito, i.e., naturais).
94
10.6 Equivalência entre quantificadores
Para provar a validade de argumentos na lógica de predicados é conveniente que os quantificadores
não se apresentem na forma negativa. Para isso, iremos apresentar como negar sentenças quantifica-
das. Note que para um domínio 𝐷 = {𝑎, 𝑏, 𝑐, ...}, temos que:
A primeira equivalência se traduz para: todo x possui a proriedade P é o mesmo que não existe
x que não possua a propriedade P. A segunda equivalência se traduz para: existe x que possui a
propriedade P é o mesmo que não é verdade que todo x não possui a propriedade P.
Exemplo: Reescreva a sentença a seguir: Não existe baleia que seja réptil.
Seja o domínio 𝐷 o conjunto dos animais e os predicados a seguir:
• 𝐵(𝑥): 𝑥 é baleia
• 𝑅(𝑥): 𝑥 é réptil
95
A sentença original fica:
• 𝑅(𝑥): 𝑥 reluz
• 𝑂(𝑥): 𝑥 é ouro
• 𝐴(𝑥): 𝑥 é ator
96
• 𝑀 (𝑥): 𝑥 é americano
• 𝐹 (𝑥): 𝑥 é famoso
97
10.7 Considerações finais
A lógica de predicados revela-se como um marco fundamental no estudo da lógica matemática,
integrando rigor formal, expressividade semântica e aplicações práticas. Ao longo deste capítulo,
exploramos suas três dimensões centrais - sintaxe, semântica e a interface com a linguagem natu-
ral - consolidando-a como um sistema capaz de modelar não apenas argumentos matemáticos, mas
também raciocínios cotidianos complexos.
A sintaxe, com sua estrutura hierárquica de termos, predicados e quantificadores, oferece um ar-
cabouço preciso para representar relações e generalizações. Ao definir regras claras para a construção
de fórmulas, ela permite formalizar afirmações que a lógica proposicional não poderia capturar, como
"Todo número tem um sucessor", ∀𝑥∃𝑦(𝑦 = 𝑥+1). No entanto, essa riqueza estrutural exige cuidado:
a complexidade de fórmulas com quantificadores aninhados ou funções evidencia a necessidade de
disciplina na manipulação simbólica.
Já a semântica conecta a sintaxe ao significado, atribuindo vida às fórmulas por meio de modelos,
domínios e interpretações. A noção de verdade em um modelo mostra que a validade lógica não
é absoluta, mas relativa a contextos. Esse poder descritivo, porém, traz desafios intransponíveis:
a indecidibilidade da lógica de predicados, estabelecida por Church, revela que não há algoritmo
geral para determinar a validade de todas as fórmulas. Assim, enquanto a lógica proposicional é
mecanicamente verificável (via tabelas-verdade), a Lógica de Predicados exige métodos heurísticos,
aproximações ou restrições a fragmentos decidíveis (como a lógica monádica).
A tradução da linguagem natural para a lógica de predicados ilustra tanto sua utilidade quanto
suas limitações. Ao mapear frases como "Algum estudante ama todos os livros", percebemos sua
capacidade de desvendar a estrutura lógica oculta na comunicação humana. Contudo, ambiguidades,
pronomes implícitos e generalizações vagas (ex.: "quase todos") expõem fronteiras onde a formaliza-
ção clássica é insuficiente, demandando extensões como lógicas modais ou difusas.
Essa tensão entre expressividade e complexidade é central na lógica de predicados. Seu poder de
representação a torna indispensável em campos como inteligência artificial (para bancos de dados e
planejamento), filosofia (para análise de argumentos) e ciência da computação (em verificação formal
de sistemas). Por outro lado, sua indecidibilidade lembra-nos que a busca por automação total esbarra
em limites teóricos intransponíveis, exigindo criatividade e adaptação.
Por fim, este capítulo não apenas descreve um sistema lógico, mas convida à reflexão sobre a
natureza do pensamento estruturado. A lógica de predicados não é apenas uma ferramenta técnica
— é uma linguagem que desvenda como organizamos e comunicamos conhecimento. Seu estudo
prepara o terreno para explorar temas avançados, como lógicas de ordem superior, teorias de modelos
e aplicações em linguística computacional, onde a dança entre forma e significado continua a inspirar
descobertas. Assim, concluímos que a lógica de predicados é tanto um fim quanto um meio. Como
fim, consolida-se como a linguagem padrão da matemática; como meio, desafia-nos a transcender
limites, questionar pressupostos e, acima de tudo, manter viva a curiosidade pelo fundamento lógico
que sustenta o mundo das ideias.
98
11 Técnicas dedutivas na lógica de predicados
As técnicas dedutivas na lógica de predicados são métodos formais para derivar conclusões válidas
a partir de premissas, utilizando regras que manipulam fórmulas com quantificadores, variáveis e
predicados. Essas técnicas estendem os sistemas de prova da lógica proposicional, incorporando
mecanismos para lidar com generalizações universais e existenciais, além de relações complexas
entre objetos.
A importância dessas técnicas reside em sua capacidade de formalizar argumentos matemáticos,
verificar consistência em bancos de dados e suportar aplicações em inteligência artificial (i.e., pla-
nejamento automatizado). Assim, as técnicas dedutivas equilibram rigor formal e eficiência prática,
consolidando-se como pilares para a fundamentação da lógica, da computação teórica e da filosofia
analítica.
Para provar a validade de argumentos com quantificadores, precisamos transformar tais argumen-
tos por meio das operações de exemplificação e generalização. A exemplificação nada mais é que
a passagem de funções proposicionais para proposições, e a generalização reverte o processo, trans-
formando proposições em funções proposicionais. Existem 2 tipos de exemplificação e 2 tipos de
generalização, conforme veremos a seguir:
A seguir, veremos diversos exemplos de como provar argumentos na lógica de predicados utili-
zando regras de inferência, exemplificação e generalização.
99
Exemplo: Prove a validade do seguinte argumento:
Todos os jogadores de futebol são atletas.
Todos os atletas sofrem contusões.
Logo, todos os jogadores sofrem contusões.
Considere o domínio 𝐷 como o conjunto das pessoas e os seguintes predicados:
• 𝐴(𝑥): 𝑥 é atleta.
100
Exemplo: Prove a validade do seguinte argumento:
Todos que gostam de mar bravo são surfistas.
Alguns gostam de mar bravo e não gostam de jogar futebol.
Logo, há alguns surfistas que não gostam de jogar futebol.
Considere o domínio 𝐷 como o conjunto das pessoas e os seguintes predicados:
• 𝑆(𝑥): 𝑥 é surfista.
• 𝐴(𝑥): 𝑥 é ácido.
• 𝐵(𝑥): 𝑥 é base.
101
Assim, podemos escrever o argumento na linguagem da lógica de predicados como:
• 𝐴(𝑥): 𝑥 é apropriado.
• 𝑀 (𝑥): 𝑥 é metal.
102
Exemplo: Prove o argumento a seguir:
∀𝑥(𝑃 (𝑥) → ¬𝐷(𝑥)), ∀𝑥(𝐹 (𝑥) → 𝐷(𝑥)) ⊢ ∀𝑥(𝑃 (𝑥) → ¬𝐹 (𝑥)) (209)
103
Exemplo: Construa uma prova formal para o argumento a seguir:
Todos os jogadores do time trouxeram contrabando.
Todos contrabandista desobedece a lei.
Se alguém desobedece a lei, então deve ser punido.
Robinho é jogador.
Logo, Robinho deve ser punido.
Considere o domínio 𝐷 como o conjunto das pessoas, 𝑟 a constante que representa o elemento
Robinho em 𝐷 e os seguintes predicados:
• 𝐹 (𝑥): 𝑥 é francês.
104
• 𝐴(𝑥): 𝑥 é amável.
• 𝐺(𝑥): 𝑥 é generoso.
• 𝐻(𝑥): 𝑥 é honesto.
• 𝐼(𝑥): 𝑥 é industrial.
105
A prova condicional na lógica de predicados é uma técnica dedutiva usada para provar implicações
universais da forma ∀𝑥(𝑃 (𝑥) → 𝑄(𝑥)). Ela combina a estrutura da prova condicional da Lógica
Proposicional com as regras de quantificação, garantindo que a generalização universal seja válida.
Aqui está como funciona passo a passo:
1. Escolha de um elemento arbitrário: para provar ∀𝑥(𝑃 (𝑥) → 𝑄(𝑥)), selecione um elemento
arbitrário 𝑐 do domínio 𝐷. A arbitrariedade significa que 𝑐 não tem propriedades especiais além
de pertencer ao domínio.
2. Assunção da hipótese: assuma 𝑃 (𝑐) como hipótese temporária. Essa assunção é feita dentro
de um subprova ou contexto hipotético.
• Variável arbitrária: a variável 𝑐 não pode aparecer livre em nenhuma premissa. Se 𝑐 estiver
vinculada a alguma restrição externa, a generalização universal será inválida.
• Domínio não vazio: o domínio de discurso deve conter pelo menos um elemento, pois a prova
depende da existência de 𝑐.
106
Exemplo: Prove o seguinte argumento:
Exemplo: Construa uma prova formal para o argumento a seguir em linguagem natural:
Todos que estudam compreendem a matéria.
Todos que compreendem a matéria passam na prova.
Todos que passam na prova, ficam felizes.
Portanto, se Ana estuda, então ela fica feliz.
Considere o domínio 𝐷 como o conjunto dos estudantes, 𝑎 a constante que representa o elemento
Ana em 𝐷 e os seguintes predicados:
• 𝐸(𝑥): 𝑥 estuda.
∀𝑥(𝐸(𝑥) → 𝐶(𝑥)), ∀𝑥(𝐶(𝑥) → 𝑃 (𝑥)), ∀𝑥(𝑃 (𝑥) → 𝐹 (𝑥)) ⊢ 𝐸(𝑎) → 𝐹 (𝑎) (217)
107
1. ∀𝑥(𝐸(𝑥) → 𝐶(𝑥)) Premissa
2. ∀𝑥(𝐶(𝑥) → 𝑃 (𝑥)) Premissa
3. ∀𝑥(𝑃 (𝑥) → 𝐹 (𝑥)) Premissa
4. 𝐸(𝑎) Hip.
5. 𝐸(𝑎) → 𝐶(𝑎) EU (1)
6. 𝐶(𝑎) → 𝑃 (𝑎) EU (2)
7. 𝑃 (𝑎) → 𝐹 (𝑎) EU (3)
8. 𝐶(𝑎) MP (4, 5)
9. 𝑃 (𝑎) MP (6, 8)
10. 𝐹 (𝑎) MP (7, 9)
11. 𝐸(𝑎) → 𝐹 (𝑎) Elim. Hip. (4)
A prova por redução ao absurdo é uma técnica dedutiva que visa demonstrar a validade de uma
fórmula 𝜑 assumindo sua negação (¬𝜑) e derivando uma contradição. Na Lógica de Predicados, essa
técnica incorpora quantificadores e variáveis, exigindo atenção adicional ao escopo e às regras de
inferência. Em resumo, a prova por redução ao absurdo é composta por 3 passos:
A prova por redução ao absurdo na Lógica de Predicados é uma ferramenta poderosa, mas exige
rigor na manipulação de quantificadores e variáveis para evitar falhas lógicas. Ela reforça a ideia de
que a negação de uma verdade inevitavelmente leva ao caos lógico. A seguir apreentamos alguns
exemplos de como aplicar a prova por redução ao absurdo na validação de argumentos da lógica de
predicados.
108
1. ∀𝑥𝐹 (𝑥) → ∀𝑥𝐺(𝑥) Premissa
2. ¬𝐺(𝑎) Premissa
3. ¬¬∀𝑥𝐹 (𝑥) Hip.
4. ∀𝑥𝐹 (𝑥) DN (3)
5. ∀𝑥𝐺(𝑥) MP (1, 4)
6. 𝐺(𝑎) EU (5)
7. 𝐺(𝑎) ∧ ¬𝐺(𝑎) Conj (2, 6)
8. ¬∀𝑥𝐹 (𝑥) RA
109
11.3 Considerações finais
As técnicas dedutivas em Lógica de Predicados — a prova direta, a prova condicional e a prova por
redução ao absurdo — constituem os pilares fundamentais para a construção rigorosa de argumentos
formais. Ao longo deste capítulo, exploramos como cada método não apenas reflete a estrutura lógica
subjacente às afirmações matemáticas e filosóficas, mas também revela a riqueza e a flexibilidade da
Lógica de Predicados em lidar com generalizações, relações complexas e contradições.
A prova direta destaca-se por sua transparência e linearidade, permitindo derivar conclusões a par-
tir de premissas por meio da aplicação sistemática de regras de inferência e manipulação de quantifi-
cadores. Sua força reside na capacidade de construir demonstrações passo a passo, tornando explícita
a cadeia de raciocínio que liga axiomas a teoremas. No entanto, sua eficácia depende da clareza das
premissas e da habilidade em desvendar a estrutura interna das fórmulas, especialmente em contextos
com múltiplos quantificadores aninhados.
Já a prova condicional introduz uma camada estratégica ao permitir assumir hipóteses temporárias,
como no caso de implicações universais. Ao isolar um elemento arbitrário do domínio e trabalhar
dentro de um contexto hipotético, essa técnica ilustra como a generalização emerge da análise de
casos particulares. Sua elegância está na forma como harmoniza a abstração dos quantificadores com
a concretude das instâncias individuais, reforçando a importância do cuidado com variáveis livres e
escopo durante a generalização.
Por fim, a prova por redução ao absurdo revela-se como uma ferramenta poderosa para lidar com
afirmações cuja negação conduz a contradições inevitáveis. Ao assumir a falsidade da conclusão
desejada e derivar um absurdo, esse método não apenas valida teoremas de existência ou universali-
dade, mas também expõe a coerência intrínseca dos sistemas formais. Na Lógica de Predicados, essa
técnica ganha complexidade adicional devido à interação entre quantificadores e negação, exigindo
domínio de equivalências lógicas.
Apesar de suas diferenças, essas técnicas são complementares. Enquanto a prova direta e a con-
dicional enfatizam a construção positiva de argumentos, a redução ao absurdo opera pela negação
e refutação. Juntas, elas oferecem um repertório completo para abordar problemas que vão desde a
fundamentação da matemática até a verificação formal de algoritmos.
Este capítulo não esgota o estudo das técnicas dedutivas, mas abre portas para explorar horizontes
mais amplos. A prova direta, a condicional e a redução ao absurdo são mais que ferramentas —
são manifestações da busca humana por clareza e verdade em um universo de estruturas formais.
Ao dominá-las, o estudante não apenas adquire habilidades para resolver problemas complexos, mas
também desenvolve uma mentalidade crítica, capaz de discernir padrões, evitar falácias e apreciar a
beleza da lógica como linguagem universal do pensamento estruturado.
110
12 O método do tableaux analítico na lógica de predicados
O método do tableaux semântico é uma técnica de prova utilizada na lógica proposicional e na
lógica de predicados para determinar a validade de argumentos. Ele baseia-se na tentativa de cons-
truir um contraexemplo para a conclusão de um argumento, explorando sistematicamente todas as
possibilidades para verificar se existe um caso em que as premissas sejam verdadeiras e a conclusão
falsa.
É uma técnica de prova formal que utiliza uma estrutura de árvore para verificar a validade de
argumentos ou a consistência de fórmulas. Na Lógica de Predicados, ele estende o método proposi-
cional, incorporando regras para lidar com quantificadores universais (∀) e existenciais (∃), além de
variáveis, constantes e funções.
Relembrando as regras semânticas dos operadores lógicos, temos as seguintes possibilidades:
𝛼∧𝛽 ¬(𝛼 ∨ 𝛽)
¬¬𝛼 ¬(𝛼 ∧ 𝛽) 𝛼∨𝛽
𝛼 ¬𝛼
𝛼 ¬𝛼 ¬𝛽 𝛼 𝛽
𝛽 ¬𝛽
¬(𝛼 → 𝛽) 𝛼 ⇐⇒ 𝛽 ¬(𝛼 ⇐⇒ 𝛽)
𝛼→𝛽
𝛼 𝛼 ¬𝛼 𝛼 ¬𝛼
¬𝛼 𝛽
¬𝛽 𝛽 ¬𝛽 ¬𝛽 𝛽
A seguir, iremos apresentar diversos exemplos de como utilizar o método do tableaux analítico
na prova de argumentos na lógica de predicados. Ao invés de negar todo o argumento na sua forma
condicional, é possível apenas negar a conclusão, assim como fazemos na prova por resolução. O
exemplo a seguir ilustra essa abordagem.
Exemplo: Prove a validade do argumento a seguir utilizando o método do tableaux analítico com
a negação da conclusão:
Devemos iniciar copiando as premissas e a negação da conclusão e então aplicar as regras semân-
ticas para desenvolver o tableaux analítico.
111
Portanto, como todos os ramos estão fechados, o argumento é válido!
Exemplo: Prove a validade do argumento a seguir com o método do tableaux analítico com a
negação de todo argumento na forma condicional:
112
• Preserva a integridade das variáveis e constantes.
Essa abordagem é adotada em sistemas formais como dedução natural, tableaux semânticos e
métodos de resolução, garantindo coerência e eficácia na manipulação de argumentos complexos.
Exemplo: Prove a validade do argumento a seguir utilizando o método do tableaux analítico:
Devemos iniciar copiando as premissas e a negação da conclusão e então aplicar as regras semân-
ticas para desenvolver o tableaux analítico.
Devemos iniciar copiando as premissas e a negação da conclusão e então aplicar as regras semân-
ticas para desenvolver o tableaux analítico.
113
1. ∃𝑥(𝐹 (𝑥) ∧ 𝐺(𝑥)) Premissa
2. ¬(∃𝑥𝐹 (𝑥) ∧ ∃𝑥𝐺(𝑥)) Hip.
3. 𝐹 (𝑎) ∧ 𝐺(𝑎) IE (1)
4. 𝐹 (𝑎) (3)
5. 𝐺(𝑎) (3)
Exemplo: Construa uma dedução formal para o argumento a seguir em linguagem natural usando
a prova condicional:
Todos que estudam lógica compreendem argumentos válidos.
Todos que compreendem argumentos válidos são bons debatedores.
Todos que são bons debatedores são capazes de influenciar pessoas.
Maria estuda lógica.
Portanto, Maria é capaz de influenciar pessoas.
Considere o domínio 𝐷 como o conjunto das pessoas, 𝑚 a constante que representa o elemento
Maria em 𝐷 e os seguintes predicados:
Devemos iniciar copiando as premissas e a negação da conclusão e então aplicar as regras semân-
ticas para desenvolver o tableaux analítico.
114
1. ∀𝑥(𝐿(𝑥) → 𝐶(𝑥)) Premissa
2. ∀𝑥(𝐶(𝑥) → 𝐷(𝑥)) Premissa
3. ∀𝑥(𝐷(𝑥) → 𝐼(𝑥)) Premissa
4. 𝐿(𝑚) Premissa
5. ¬𝐼(𝑚) Hip.
6. 𝐿(𝑚) → 𝐶(𝑚) IU (1)
7. 𝐶(𝑚) → 𝐷(𝑚) IU (2)
8. 𝐷(𝑚) → 𝐼(𝑚) IU (3)
Como todos os ramos do tableaux estão fechados, a conclusão é de que o argumento é válido.
115
cia artificial — reforça sua relevância, especialmente quando combinado com técnicas heurísticas e
algoritmos de poda.
Comparado a outros métodos dedutivos, como a resolução ou a dedução natural, o tableaux ana-
lítico destaca-se por sua transparência. Enquanto a resolução opera em forma clausal e a dedução
natural requer uma sequência linear de passos, o tableaux expõe visualmente todas as possibilidades
lógicas, tornando erros mais fáceis de detectar e corrigir. Essa qualidade pedagógica o torna ideal
para o ensino de lógica, permitindo que estudantes visualizem o impacto de cada regra de inferência
e quantificador.
Por fim, é crucial reconhecer que o método dos tableaux não é apenas uma técnica mecânica,
mas uma janela para a estrutura profunda da lógica. Ao desvendar como contradições emergem
da interação entre quantificadores e predicados, ele revela a elegância e a coerência dos sistemas
formais. Seu estudo prepara o terreno para explorar temas avançados, como lógicas não clássicas
(modal, intuicionista) ou extensões para teorias matemáticas específicas.
Este capítulo, portanto, não encerra a jornada, mas convida o leitor a aprofundar-se na arte de
desmontar e reconstruir argumentos. Em um mundo onde a precisão lógica é essencial para a ciência,
a tecnologia e a filosofia, o método dos tableaux analíticos permanece uma bússola confiável —
guiando-nos entre as complexidades do pensamento formal e iluminando os caminhos da verdade
lógica.
116
13 Formas normais em lógica de predicados
A lógica de predicados, com sua capacidade de expressar generalizações e relações complexas por
meio de quantificadores e predicados, é uma ferramenta poderosa para a formalização de argumentos
matemáticos, filosóficos e computacionais. No entanto, a complexidade inerente a suas fórmulas —
especialmente quando combinam múltiplos quantificadores, conectivos lógicos e variáveis — pode
tornar desafiadora a análise direta de validade, consistência ou satisfatibilidade. É nesse contexto que
as formas normais emergem como instrumentos essenciais, oferecendo estruturas padronizadas que
simplificam a manipulação e o estudo sistemático de expressões lógicas.
Neste capítulo, focaremos em duas formas normais fundamentais na lógica de predicados: a forma
normal prenex e a forma normal clausal. A primeira organiza as fórmulas de modo que todos os quan-
tificadores sejam deslocados para o início, separando-os de uma matriz livre de quantificadores. Essa
estrutura não apenas revela com clareza o escopo e a interação entre quantificadores, mas também
prepara o terreno para métodos de prova como os tableaux semânticos ou a resolução. Já a forma nor-
mal clausal, frequentemente utilizada em sistemas automatizados de prova, decompõe fórmulas em
cláusulas (disjunções de literais) precedidas por quantificadores universais, facilitando a aplicação de
algoritmos como o da resolução, que demanda uma estrutura uniforme para operar eficientemente.
A importância dessas formas normais vai além da mera simplificação sintática. Elas são funda-
mentais para os seguintes aspectos:
• Análise semântica: A forma prenex, por exemplo, permite isolar quantificadores, tornando
explícitas dependências entre variáveis.
Ao longo deste capítulo, exploraremos os algoritmos de conversão para cada forma normal, dis-
cutindo desafios como o tratamento de quantificadores existenciais (via Skolemização) e a eliminação
de conectivos redundantes. Além disso, ilustraremos como essas formas são aplicadas em problemas
reais, desde a verificação de consistência em bases de conhecimento até a otimização de consultas em
bancos de dados.
Ao dominar as formas normais prenex e clausal, o leitor não apenas aprofundará sua compreensão
da estrutura da lógica de predicados, mas também adquirirá ferramentas práticas para enfrentar desa-
fios em áreas como inteligência artificial, ciência da computação e matemática discreta. Prepare-se
para desvendar como a ordem, a padronização e a decomposição podem transformar a complexidade
em clareza.
117
13.1 Forma normal prenex
A forma normal prenex (FNP) é uma maneira padronizada de escrever fórmulas da lógica de
predicados, onde todos os quantificadores aparecem no início da expressão, seguidos por uma fórmula
quantificador-livre chamada de parte matriz. Essa organização permite separar claramente a parte
quantificada da parte proposicional da fórmula, facilitando sua análise e manipulação.
Definição 26 (Forma Normal Prenex) Uma fórmula bem formada da lógica de predicados está na
forma normal prenex (FNP) se e somente se:
onde cada 𝑄𝑖 é um quantificador existencial (∃) ou universal (∀) e 𝑀 é a matriz da fórmula, ou seja,
uma expressão que não contém quantificadores.
• Preparação para outras formas normais: a forma prenex é um passo intermediário para a
forma normal clausal (usada em resolução) e a forma normal de Skolem (para eliminar quanti-
ficadores existenciais).
118
Aplicando a lei de De Morgan, temos:
Em resumo, a forma normal prenex é uma ferramenta essencial para desvendar a estrutura quan-
tificacional de fórmulas complexas, tornando-as mais acessíveis para análise humana e automatizada.
Sua importância reside na capacidade de padronizar e simplificar expressões lógicas, servindo como
base para métodos avançados de dedução e aplicações práticas em ciência da computação e mate-
mática. Dominar essa forma é um passo crucial para quem busca trabalhar com sistemas formais,
automação de provas ou fundamentos da lógica.
Definição 27 (Forma Normal Clausal) Uma fórmula bem formada da lógica de predicados está na
forma normal clausal (FNC) se e somente se ela está na FNP e sua matriz 𝑀 for uma conjunção de
disjunções de fórmulas atômicas, negadas ou não.
A seguir apresentaremos um algoritmo para a obtenção da forma normal clausal de uma fórmula
arbitrária da lógica de predicados.
1. Eliminar variáveis livres: Se a fórmula 𝛼 tiver uma variável livre 𝑥, devemos substituir por
∃𝑥𝛼, ou seja:
∃𝑥(𝑃 (𝑥, 𝑦) ∨ 𝑄(𝑥)) (234)
2. Renomear variáveis quantificadas mais do que uma vez: cada quantificador deve ter sua
própria variável para que não haja ambiguidade, ou seja:
119
deve ser expressa como:
∀𝑥𝑃 (𝑥) → ∀𝑦𝑄(𝑦) (237)
¬(𝛼 ∧ 𝛽) ≡ ¬𝛼 ∨ ¬𝛽 (242)
¬(𝛼 ∨ 𝛽) ≡ ¬𝛼 ∧ ¬𝛽 (243)
¬¬𝛼 ≡ 𝛼 (244)
120
que após a Skolemização, torna-se:
6. Obter a FNC e remover quantificadores existenciais: neste ponto, cada quantificador uni-
versal tem sua própria variável, sendo que podemos mover todos os ∀ para a frente da fórmula e
deixar que o escopo deles inclua toda a fórmula. Portanto, podemos descartar os quantificadores
universais e trabalhar apenas com a matriz 𝑀 .
7. Converter M para a forma conjuntiva: devemos aplicar regras para diminuir o escopo do
operador ∨, como por exemplo:
A seguir discutimos alguns exemplos de como converter fórmulas da lógica de predicados para a
forma normal clausal (FNC).
Exemplo: Converta a expressão a seguir para a FNC.
121
∀𝑥∀𝑦∀𝑧(¬𝑃 (𝑥, 𝑧) ∨ ¬𝑃 (𝑦, 𝑧) ∨ 𝑄(𝑥, 𝑦, 𝑔(𝑥, 𝑦))) (258)
∀𝑥(∃𝑦(∀𝑧((𝐼(𝑧, 𝑦) → (𝐼(𝑧, 𝑥) ∧ 𝐼(𝑥, 𝑦))) ∧ ((𝐼(𝑧, 𝑥) ∧ 𝐼(𝑥, 𝑦)) → 𝐼(𝑧, 𝑦))))) (261)
∀𝑥(∃𝑦(∀𝑧((¬𝐼(𝑧, 𝑦) ∨ (𝐼(𝑧, 𝑥) ∧ 𝐼(𝑥, 𝑦))) ∧ (¬(𝐼(𝑧, 𝑥) ∧ 𝐼(𝑥, 𝑦)) ∨ 𝐼(𝑧, 𝑦))))) (262)
∀𝑥(∃𝑦(∀𝑧((¬𝐼(𝑧, 𝑦) ∨ 𝐼(𝑧, 𝑥)) ∧ (¬𝐼(𝑧, 𝑦) ∨ 𝐼(𝑥, 𝑦))) ∧ (¬𝐼(𝑧, 𝑥) ∨ ¬𝐼(𝑥, 𝑦) ∨ 𝐼(𝑧, 𝑦)))) (263)
∀𝑥∀𝑧((¬𝐼(𝑧, 𝑔(𝑥)) ∨ 𝐼(𝑧, 𝑥)) ∧ (¬𝐼(𝑧, 𝑔(𝑥)) ∨ 𝐼(𝑥, 𝑔(𝑥)) ∧ (¬𝐼(𝑧, 𝑥) ∨ ¬𝐼(𝑥, 𝑔(𝑥)) ∨ 𝐼(𝑧, 𝑔(𝑥)))))
(264)
em que temos 3 cláusulas, dadas por:
122
fórmulas arbitrárias nessas representações padronizadas e destacamos sua importância na manipula-
ção lógica e na automação de provas.
A forma normal prenex permite reescrever qualquer fórmula da lógica de predicados de maneira
que todos os quantificadores apareçam no início, seguidos por uma parte matriz livre de quantifi-
cadores. Essa estrutura facilita a análise lógica e serve como um passo intermediário para outras
transformações, como a Skolemização. Já a forma normal clausal, essencial para a técnica de resolu-
ção, expressa fórmulas como conjuntos de cláusulas disjuntivas, permitindo a aplicação de algoritmos
eficientes para a verificação de validade e satisfatibilidade.
Como veremos no próximo capítulo, com a prova por resolução, a padronização das fórmulas
nestas formas normais desempenha um papel fundamental na teoria da prova automática e na imple-
mentação de demonstradores de teoremas. O estudo dessas transformações nos fornece ferramentas
essenciais para lidar com argumentos lógicos de maneira estruturada e computacionalmente viável,
aproximando a lógica formal da prática computacional e da inteligência artificial.
123
14 Prova por resolução na lógica de predicados
A prova por resolução é um dos métodos dedutivos mais poderosos e elegantes da Lógica Matemá-
tica, permitindo verificar a validade de argumentos de maneira sistemática e automatizável. Enquanto
na lógica proposicional a resolução opera sobre cláusulas simples (disjunções de literais), na Lógica
de Predicados, ela enfrenta desafios adicionais: variáveis, quantificadores e a necessidade de lidar
com estruturas complexas de termos e predicados. Este capítulo explora como a resolução é adaptada
para esse contexto, destacando dois conceitos centrais — substituição e unificação — que permitem
harmonizar cláusulas aparentemente desconexas em busca de contradições.
A resolução na lógica de predicados baseia-se na conversão prévia de fórmulas para a forma
normal clausal, onde todas as expressões são transformadas em conjuntos de cláusulas universais. No
entanto, diferentemente da lógica proposicional, aqui as cláusulas podem conter variáveis, exigindo
mecanismos para tratar sua interdependência. É nesse ponto que a substituição — a troca de variáveis
por termos (constantes, funções ou outras variáveis) — e a unificação — o processo de encontrar
substituições que tornem dois literais complementares idênticos — se tornam indispensáveis.
14.1 Substituição
A substituição é uma operação fundamental na lógica de predicados que consiste em trocar variá-
veis por termos (constantes, funções ou outras variáveis) dentro de uma fórmula, respeitando regras
sintáticas e semânticas. Ela é essencial para manipular fórmulas com quantificadores, aplicar re-
gras de inferência e viabilizar métodos de prova como a resolução. Em resumo, a substituição é um
processo que serve para:
Em outras palavras, uma substituição troca variáveis por termos. Seja a expressão 𝐸 = 𝑃 (𝑥) ∨
𝑄(𝑥) e 𝜃 = {𝑎/𝑥}. Então, temos que:
124
𝐸𝜃 = 𝑃 (𝑎) ∨ 𝑄(𝑎) (269)
é a instanciação de 𝐸 por 𝜃. A substituição torna a cláusula menos geral, similar com o que ocorre
com as regras Exemplificação Existencial (EE) e Exemplificação Universal (EU).
A substituição é a espinha dorsal da manipulação de variáveis na lógica de predicados, permi-
tindo que regras de inferência e métodos de prova operem de forma dinâmica e precisa. Sem ela,
seria impossível instanciar quantificadores, unificar literais ou implementar sistemas automatizados
de raciocínio. Seu domínio é crucial para qualquer aplicação prática, desde inteligência artificial até
verificação formal de softwares, onde a precisão lógica é indispensável.
14.2 Unificação
A unificação é um processo fundamental na lógica de predicados que permite tornar dois termos
ou literais estruturalmente idênticos por meio da substituição de variáveis por termos. Ela é a base
para operações como resolução de cláusulas, aplicação de regras de inferência e algoritmos de prova
automatizados.
A unificação é um mecanismo para encontrar uma substituição 𝜎 que, quando aplicada a dois
termos ou literais, os torna idênticos. Formalmente, dados dois termos 𝑡1 e 𝑡2 , um unificador 𝜎 é
uma substituição tal que 𝜎(𝑡1 ) = 𝜎(𝑡2 ). Se tal substituição existir, os termos são unificáveis, caso
contrário, não são. Por exemplo, sejam os termos 𝑃 (𝑥, 𝑓 (𝑎)) e 𝑃 (𝑏, 𝑦). Definindo o unificador 𝜎
como 𝜎 = {𝑥 ↦→ 𝑏, 𝑦 ↦→ 𝑓 (𝑎)}, temos como resultado 𝑃 (𝑏, 𝑓 (𝑎)) = 𝑃 (𝑏, 𝑓 (𝑎)), mostrando que os
termos são de fato unificáveis.
O conceito de Unificador Mais Geral (UMG) é importante na lógica de predicados. Em resumo, o
UMG é uma substituição que torna dois termos ou literais idênticos, preservando ao máximo a gene-
ralidade das variáveis. Ele é a solução mais flexível para unificar expressões, evitando instanciações
desnecessárias de variáveis e permitindo que substituições adicionais sejam aplicadas posteriormente,
se necessário.
Dentre as características desejáveis do UMG, encontram-se:
• Generalidade máxima: o UMG não atribui valores específicos a variáveis, a menos que seja
estritamente necessário.
125
Exemplo: Unificar 𝑃 (𝑥, 𝑦) e 𝑃 (𝑎, 𝑏):
UMG: {𝑥 ↦→ 𝑎, 𝑦 ↦→ 𝑏}
Substituição menos geral (não UMG): {𝑥 ↦→ 𝑎, 𝑦 ↦→ 𝑏, 𝑧 ↦→ 𝑐}
• Evita conflitos: falha se os termos tiverem estruturas incompatíveis (i.e., 𝑓 (𝑥) vs. 𝑔(𝑦)) ou se
houver ocorrência circular (i.e., 𝑥 = 𝑓 (𝑥)).
Tipicamente, para encontrar o UMG realiza-se uma comparação recursiva para analisar a estrutura
dos termos e unificar componentes correspondentes. Por exemplo, suponha que desejamos unificar
𝑃 (𝑓 (𝑥), 𝑦) com 𝑃 (𝑧, 𝑔(𝑎)). Primeiro, unifica-se 𝑓 (𝑥) com 𝑧 pelo mapeamento 𝑧 ↦→ 𝑓 (𝑥) e em
seguida unifica-se 𝑦 com 𝑔(𝑎) pelo mapeamento 𝑦 ↦→ 𝑔(𝑎). Por fim, definimos o UMG criando o
conjunto {𝑧 ↦→ 𝑓 (𝑥), 𝑦 ↦→ 𝑔(𝑎)}.
O UMG é a substituição ótima para unificar termos em lógica de predicados, equilibrando preci-
são e generalidade. Ele é essencial para algoritmos de prova automatizados, sistemas de raciocínio
artificial e aplicações que demandam manipulação flexível de variáveis, como bancos de dados de-
dutivos e processamento de linguagem natural. Dominar esse conceito é fundamental para trabalhar
com lógicas computacionais e métodos formais.
126
Apesar de sua potência, a resolução na lógica de predicados enfrenta limitações intrínsecas. A
indecidibilidade deste sistema lógico (demonstrada por Church em 1936) implica que, para certas
fórmulas, nenhum algoritmo garantirá sempre uma resposta em tempo finito. Além disso, a com-
plexidade gerada por funções aninhadas e quantificadores múltiplos exige estratégias de otimização,
como heurísticas de escolha de literais e restrições a fragmentos decidíveis.
A seguir veremos uma série de exemplos de como aplicar a resolução na verificação da validade
de argumentos da lógica de predicados.
∀𝑥(𝑃 (𝑥) → 𝑄(𝑥)), ∀𝑥(𝑅(𝑥) → ¬𝑄(𝑥)), ∃𝑥(𝑅(𝑥) ∧ 𝑆(𝑥)) ⊢ ∃𝑥(𝑆(𝑥) ∧ ¬𝑃 (𝑥)) (270)
O primeiro passo consiste na identificação das premissas. Note que temos 3 premissas, 𝛼, 𝛽 e 𝛾,
e a conclusão, que deve ser negada e considerada como hipótese (𝛿):
Note que as premissas já encontram-se na forma normal prenex (FNP). Convertendo as matrizes
das fórmulas para a forma normal clausal (FNC), temos:
127
Renomeando as variáveis para que as cláusulas não as compartilhem, temos:
• 𝐶1 : ¬𝑃 (𝑥) ∨ 𝑄(𝑥)
• 𝐶2 : ¬𝑅(𝑦) ∨ ¬𝑄(𝑦)
• 𝐶3 : 𝑅(𝑎)
• 𝐶4 : 𝑆(𝑎)
• 𝐶5 : ¬𝑆(𝑧) ∨ 𝑃 (𝑧)
Figura 12: Árvore de refutação para a prova por resolução na lógica de predicados.
128
Exemplo: Considere o argumento a seguir em linguagem natural:
A) Todo número primo diferente de 2 é ímpar.
B) O quadrado de um número ímpar é ímpar.
C) O número 7 é primo.
D) O número 7 é diferente de 2.
E) O quadrado de 7 é ímpar.
Utilizando resolução, mostre que E é uma consequência lógica das premissas A, B, C e D.
Especificando o domínio 𝐷 como o conjunto dos naturais, podemos definir as seguintes funções
e predicados:
∀𝑥((𝑃 (𝑥) ∧ ¬𝑆(𝑥, 2)) → 𝐼(𝑥)), ∀𝑥(𝐼(𝑥) → 𝐼(𝑄(𝑥))), 𝑃 (7), ¬𝑆(7, 2) ⊢ 𝐼(𝑄(7))
Devemos converter as premissas para a FNC. Iniciando com a premissa A, podemos aplicar a
equivalência da condicional:
∀𝑥((𝑃 (𝑥) ∧ ¬𝑆(𝑥, 2)) → 𝐼(𝑥)) ≡ ∀𝑥(¬(𝑃 (𝑥) ∧ ¬𝑆(𝑥, 2)) ∨ 𝐼(𝑥)) (281)
∀𝑥(¬(𝑃 (𝑥) ∧ ¬𝑆(𝑥, 2)) ∨ 𝐼(𝑥)) ≡ ∀𝑥(¬𝑃 (𝑥) ∨ 𝑆(𝑥, 2) ∨ 𝐼(𝑥)) (282)
129
1. ¬𝑃 (𝑥) ∨ 𝑆(𝑥, 2) ∨ 𝐼(𝑥) Premissa
2. ¬𝐼(𝑧) ∨ 𝐼(𝑄(𝑧)) Premissa
3. 𝑃 (7) Premissa
4. ¬𝑆(7, 2) Premissa
5. ¬𝐼(𝑄(7)) Premissa
6. ¬𝑃 (7) ∨ 𝑆(7, 2) ∨ 𝐼(7) 𝜃 ← {7/𝑥}, 𝐶1 𝜃
7. ¬𝑃 (7) ∨ 𝐼(7) resolvente(4, 6)
8. 𝐼(7) resolvente(3, 7)
9. ¬𝐼(7) ∨ 𝐼(𝑄(7)) 𝜃 ← {7/𝑧}, 𝐶2 𝜃
10. ¬𝐼(7) resolvente(5, 9)
11. 𝑁 𝐼𝐿 resolvente(8, 10)
Como foi possível derivar a cláusula vazia NIL, temos que o argumento é válido. A figura a seguir
ilustra a árvore de refutação obtida para a prova de resolução.
Figura 13: Árvore de refutação para a prova por resolução na lógica de predicados.
130
Considerando o domínio 𝐷 como o conjunto das pessoas, a tradução das premissas é dada por:
O primeiro passo consiste na obtenção das FNC’s das premissas 𝛼 e 𝛽, e da negação da conclusão
¬𝛾. Usando a equivalência da condicional, sabemos que podemos expressar 𝛼 como:
O próximo passo consiste na dedução via prova por resolução, conforme o processo descrito a
seguir. Lembre-se de que devemos incluir como premissa a negação da conclusão.
131
1. ¬𝑃 (𝑥, 𝑦) ∨ ¬𝑃 (𝑦, 𝑧) ∨ 𝐴(𝑥, 𝑧) Premissa
2. 𝑃 (𝑤, 𝑔(𝑤)) Premissa
3. ¬𝐴(𝑢, 𝑣) Premissa
4. ¬𝑃 (𝑢, 𝑦) ∨ ¬𝑃 (𝑦, 𝑣) ∨ 𝐴(𝑢, 𝑣) 𝜃 ← {𝑢/𝑥, 𝑣/𝑧}, 𝐶1 𝜃
5. ¬𝑃 (𝑢, 𝑦) ∨ ¬𝑃 (𝑦, 𝑣) resolvente(3, 4)
6. ¬𝑃 (𝑢, 𝑤) ∨ ¬𝑃 (𝑤, 𝑔(𝑤)) 𝜃 ← {𝑤/𝑦, 𝑔(𝑤)/𝑣}, 𝐶5 𝜃
7. ¬𝑃 (𝑢, 𝑤) resolvente(2, 6)
8. ¬𝑃 (𝑤, 𝑔(𝑤)) 𝜃 ← {𝑤/𝑢, 𝑔(𝑤)/𝑤}, 𝐶7 𝜃
9. 𝑁 𝐼𝐿 resolvente(2, 8)
Como foi possível derivar a cláusula vazia NIL, temos que o argumento é válido. A figura a seguir
ilustra a árvore de refutação obtida para a prova de resolução.
Figura 14: Árvore de refutação para a prova por resolução na lógica de predicados.
• Base da programação lógica (Prolog): linguagens como Prolog são construídas sobre cláusu-
las de Horn. Fatos e regras em Prolog correspondem diretamente a cláusulas de Horn, permi-
tindo representar conhecimento e realizar inferências eficientes.
132
satisfazer simultaneamente as cláusulas de um conjunto finito.
Definição 30 (Cláusulas de Horn) Clásulas de Horn são cláusulas contendo, no máximo, um literal
positivo. Elas podem ser de 3 tipos:
o que equivale a:
(𝑝1 ∧ 𝑝2 ∧ ... ∧ 𝑝𝑛 ) → 𝑞 (295)
Resultados teóricos que não iremos demonstrar, mas são fundamentais para a lógica computacio-
nal, são apresentados a seguir.
• Decidibilidade eficiente: conjuntos de cláusulas de Horn podem ser verificados quanto à satis-
fatibilidade em tempo polinomial, ao contrário da Lógica de Predicados geral (indecidível).
133
• Aplicações em programação lógica: sistemas como Prolog baseiam-se nesse resultado para
garantir que programas lógicos (definidos por cláusulas de Horn) tenham um modelo mínimo
estável.
Outra propriedade fundamental é que a resolvente entre duas cláusulas de Horn é sempre uma
cláusula de Horn. Matematicamente, isso significa que um conjunto de cláusulas de Horn mais a
operação resolvente define um sistema fechado. Por essa razão, cláusulas de Horn são usadas para
representar regras lógicas em Prolog, o que permite o raciocínio lógico em sistemas computacionais.
Lembre-se que:
Basicamente, um programa lógico é um conjunto de cláusulas de Horne por isso elas são um
pilar da lógica de predicados aplicada, equilibrando expressividade e eficiência computacional. Sua
importância reside na capacidade de viabilizar sistemas de raciocínio automatizado, como Prolog, e
em aplicações que demandam interpretação rápida de regras complexas. Ao restringir a forma das
cláusulas, elas transformam problemas lógicos abstratos em tarefas computacionalmente tratáveis,
consolidando-se como uma ferramenta indispensável na interseção entre lógica, ciência da computa-
ção e inteligência artificial.
134
1. Conversão para Forma Normal Clausal, incluindo a Skolemização para eliminar quantificadores
existenciais.
3. Aplicação da Regra de Resolução, derivando novas cláusulas até obter a cláusula vazia (contra-
dição) ou esgotar as possibilidades.
135
15 Teorias axiomáticas e incompletude
As teorias axiomáticas são fundamentais na organização do conhecimento racional. Elas repre-
sentam a tentativa humana de estruturar ideias complexas a partir de princípios simples e indubitáveis,
chamados axiomas, dos quais todas as demais afirmações (teoremas, leis ou hipóteses) são derivadas
por meio de regras lógicas rigorosas. Desde os Elementos de Euclides, que há mais de dois milênios
estabeleceu a geometria sob bases axiomáticas, até as formulações modernas da física quântica ou da
teoria da computação, os sistemas axiomáticos têm sido essenciais para garantir coerência, clareza e
progresso tanto na matemática pura quanto nas ciências aplicadas.
Na matemática, as teorias axiomáticas garantem que o edifício intelectual seja construído sobre
alicerces sólidos. Por exemplo, os axiomas de Peano definem os números naturais a partir de conceitos
básicos como "zero"e "sucessor", permitindo derivar propriedades como a adição e a multiplicação.
Sem essa estrutura, a matemática seria um conjunto desconexo de observações, vulnerável a con-
tradições. Nas ciências, embora os axiomas muitas vezes tenham caráter empírico (como as leis de
Newton), eles funcionam como pontos de partida teóricos para modelar fenômenos naturais, prever
resultados e validar experimentos.
Um sistema axiomático não apenas organiza o conhecimento, mas também revela conexões pro-
fundas entre áreas aparentemente distintas. A teoria dos conjuntos de Zermelo-Fraenkel (ZF), por
exemplo, unifica conceitos matemáticos sob uma linguagem comum, enquanto a axiomatização da
termodinâmica permite aplicar princípios universais (como a conservação da energia) a sistemas tão
diversos quanto motores e estrelas. Essa capacidade de generalização é crucial para avanços interdis-
ciplinares, como a fusão entre matemática e biologia na modelagem de ecossistemas ou entre lógica
e ciência da computação no design de algoritmos.
Ao definir axiomas de forma explícita, as teorias axiomáticas eliminam ambiguidades linguísticas
e conceituais. Na matemática, isso evita paradoxos (como o famoso paradoxo de Russell na teoria
ingênua dos conjuntos) e assegura que provas sejam verificáveis passo a passo. Nas ciências, a pre-
cisão axiomática permite que modelos teóricos sejam testados e refinados. Por exemplo, a teoria da
relatividade geral de Einstein é formulada axiomaticamente, o que possibilita previsões precisas sobre
fenômenos como a curvatura da luz em campos gravitacionais.
As teorias axiomáticas também impulsionam a inovação ao desafiar pressupostos. A substituição
do axioma das paralelas de Euclides por alternativas não euclidianas, por exemplo, revolucionou a
geometria e abriu caminho para a relatividade geral. No entanto, os próprios limites dos sistemas
axiomáticos, revelados por resultados como os teoremas da incompletude de Gödel, lembram-nos de
que nenhum sistema formal é autossuficiente. Esses limites não são fracassos, mas incentivos para a
criatividade, mostrando que a busca pelo conhecimento é um processo dinâmico e infinito.
Na ciência da computação, axiomas sustentam a verificação formal de softwares críticos (como
sistemas de aviação). Na economia, teorias como a dos jogos usam axiomas para modelar compor-
tamentos racionais. Até mesmo nas humanidades, a lógica modal (baseada em axiomas) auxilia na
análise de argumentos filosóficos e éticos.
136
As teorias axiomáticas são muito mais que abstrações intelectuais: elas são ferramentas práticas
para explorar a realidade, resolver problemas e expandir as fronteiras do saber. Seja na pureza da
matemática ou no empirismo das ciências naturais, elas asseguram que o conhecimento não seja um
amontoado de opiniões, mas uma rede coerente e verificável de ideias. Neste capítulo, exploraremos
como esses sistemas não apenas moldaram a história do pensamento, mas continuam a ser indispen-
sáveis para enfrentar os desafios do futuro.
Definição 31 Uma teoria é completa se qualquer proposição atômica 𝑝 ou sua negação ¬𝑝 que
compõe suas proposições 𝑃1 , 𝑃2 , ..., 𝑃𝑛 (axiomas + teoremas) pode ser provada. Em outras palavras,
uma teoria é completa se existe uma demonstração para todo 𝑝 ou ¬𝑝 (componentes das proposições).
Definição 32 Uma teoria é consistente se não há proposição 𝑝 tal que 𝑝 e ¬𝑝 são ambas prováveis
(𝑇 ). Em outras palavras, é uma teoria livre de contradições.
Com base nas definições acima, iremos enunciar um outro resultado muito importante na lógica
matemática: o teorema da incompletude de Gödel.
Teorema 10 (Teorema da incompletude de Gödel (1931)) Toda teoria axiomatizável e completa rica
o suficiente é inconsistente.
Precisamos entender o que significa uma teoria ser "rica o suficiente". De forma simplista, diremos
que uma teoria rica o suficiente é aquela suficientemente poderosa para expressar a aritmética básica.
A implicação do primeiro teorema de Gödel pe que existem sentenças verdadeiras na teoria que
não podem ser provadas, ou seja, há verdades matemáticas inacessíveis à propria teoria. O segundo
teorema de Gödel é enunciado a seguir.
Teorema 11 (Segundo teorema de Gödel) Nenhuma teoria rica o suficiente, axiomatizável e con-
sistente pode provar sua própria consistência.
A implicação do segundo teorema de Gödel é que se um sistema pudesse provar "Eu não sou
contraditório", isso seria uma contradição! Logo, a consistência depende de um sistema externo mais
forte (que, por sua vez, também não pode provar sua própria consistência).
Juntos, os dois teoremas de Gödel causaram um profundo impacto na matemática e na ciência
da computação, acarretando na descoberta de problemas indecidíveis, como o famoso problema da
parada (halting problem) proposto por Alan Turing.
137
15.2 A máquina de Gödel
Iremos apresentar uma alegoria que nos permite construir um esboço simplista e intuitivo da prova
do teorema da incompletude de Gödel. Trata-se da máquina de Gödel, um mecanismo abstrato que
imprime expressões compostas por apenas 5 símbolos: ¬, 𝑃 , 𝑁 , ( e ). A seguir apresentamos algumas
definições importantes:
• Uma expressão é imprimível se a máquina pode imprimí-la (quando uma expressão é imprimida
pela máquina, equivale a ela ser provada).
• Toda a expressão que a máquina pode imprimir será impressa em algum momento.
• Uma sentença é uma expressão com uma das quatro formas a seguir (sintaxe):
1. 𝑃 (𝑋)
2. ¬𝑃 (𝑋)
3. 𝑃 𝑁 (𝑋)
4. ¬𝑃 𝑁 (𝑋)
Todas as sentenças imprimidas pela máquina são verdadeiras! Se a máquina imprime 𝑃 (𝑋),
como 𝑋 é imprimível, a máquina também irá imprimir 𝑋 em algum momento. Note ainda que se
𝑋 é imprimível, então 𝑃 (𝑋) é verdade, mas isso não implica que 𝑃 (𝑋) deva ser imrpimível. Em
resumo:
• Toda sentença imprimível é verdadeira, mas nem toda sentença verdadeira é imprimível (pode
ser provada).
A pergunta que surge agora é: existe uma sentença verdadeira que não é imrpimível (pode ser
provada)? Vamos tentar buscar por essa sentença 𝑍. Lembre-se que desejamos ter:
138
• ¬𝑃 𝑁 (𝑍) é verdade ⇐⇒ a norma de 𝑍 não é imprimível
Vamos substituir 𝑍 por ¬𝑃 𝑁 , gerando ¬𝑃 𝑁 (¬𝑃 𝑁 ). Porém, essa expressão se traduz para:
Assim, temos:
o que gera a conclusão de que ¬𝑃 𝑁 (¬𝑃 𝑁 ) é verdade se e somente se ¬𝑃 𝑁 (¬𝑃 𝑁 ) não é imprimível.
Construímos portanto um exemplo de sentença verdadeira que não pode ser provada!
139
permanecerão sempre além do alcance da resolução algorítmica, desafiando-nos a buscar soluções
criativas e a aceitar os limites do conhecimento humano. Neste seção, discutiremos um pouco mais
sobre esse fascinante problema.
Dado um programa 𝑃 e uma entrada 𝐼 (input), deseja-se decidir, por meio de um algoritmo, se
𝑃 terminará sua execução com essa entrada ou permanecerá executando para sempre (loop infinito).
Turing demonstrou que não pode existir um algoritmo que resolva esse problema de decisão, pois isso
iria ferir a lógica. A seguir, apresentamos um esboço da prova usando redução ao absurdo.
1. Suponha que exista uma função computável ℎ𝑎𝑙𝑡𝑠(𝑓 ), que retorna True se afunção 𝑓 termina e
False, caso contrário (nunca termina). Essa é exatamente a negação da conclusão.
3. Note que se ℎ𝑎𝑙𝑡𝑠(𝑔) retorna 𝑇 𝑟𝑢𝑒, significa a função 𝑔 termina, mas então ela entra em um
loop infinito.
4. Por outro lado, note que se ℎ𝑎𝑙𝑡𝑠(𝑔) retorna 𝐹 𝑎𝑙𝑠𝑒, significa que a função 𝑔 não deve terminar,
mas ela termina (não entra no if).
5. Portanto, como chegamos em uma contradição, a hipótese inicial de que existe uma função
computável ℎ𝑎𝑙𝑡𝑠(𝑓 ) é falsa. Logo, sua negação deve ser verdadeira, ou seja, não existe função
ℎ𝑎𝑙𝑡𝑠(𝑓 ) que decida se 𝑓 termina ou não!
140
O Primeiro Teorema da Incompletude mostrou que qualquer teoria formal consistente e sufici-
entemente poderosa contém proposições verdadeiras que não podem ser provadas dentro da própria
teoria. Já o Segundo Teorema da Incompletude revelou que tais teorias não podem demonstrar sua
própria consistência, reforçando a necessidade de abordagens metamatemáticas para a fundamentação
da matemática.
Esses resultados tiveram um impacto profundo na filosofia da matemática e na computação, desa-
fiando a visão formalista de um sistema matemático completo e confiável. Além disso, influenciaram
áreas como a teoria da computabilidade e a inteligência artificial, ao estabelecer limites rigorosos para
o que pode ser computado e formalmente provado.
Assim, o estudo das teorias axiomáticas e da incompletude não apenas aprofunda nossa com-
preensão da lógica matemática, mas também destaca as fronteiras do conhecimento formal, abrindo
caminho para novas investigações na estrutura do raciocínio matemático e na natureza da prova.
141
Informações sobre o autor
Alexandre L. M. Levada concluiu o curso de graduação em Bacharelado em Ciência da Computa-
ção no Departamento de Estatística, Matemática e Computação (DEMAC) da Universidade Estadual
Paulista "Júlio de Mesquita Filho"(UNESP), em Rio Claro, no ano de 2002. Concluiu o mestrado
em Ciência da Computação, na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), em fevereiro de 2006.
Concluiu o doutorado em Física Computacional no Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP
em 2010 sob a orientação do Prof. Dr. Nelson Delfino d’Ávila Mascarenhas e co-orientação do Prof.
Dr. Alberto Tannús. Atualmente é Professor do Departamento de Computação na Universidade Fede-
ral de São Carlos. Atua nas áreas de processamento de imagens e sinais e reconhecimento de padrões.
Possui experiência em ministrar diversas disciplinas para cursos de Ciência e Engenharia de Compu-
tação, como Lógica Matemática, Teoria dos Grafos, Matemática Discreta, Algoritmos e Estruturas
de Dados 1 e 2, Projeto e Análise de Algoritmos, Otimização Matemática, Processamento Digital de
Imagens, Reconhecimento de Padrões e Programação Científica.
“Se você tiver um pão e eu tiver um euro, e eu uso o meu euro para comprar o seu pão, no final
da troca eu terei o pão e você o euro. Parece um equilíbrio perfeito, não? A tem um euro, B
tem um pão; depois, A tem o pão e B o euro. É uma transação justa, mas meramente material.
Agora, imagine que você tem um soneto de Verlaine ou conhece o teorema de Pitágoras, e eu
não tenho nada. Se me ensinar, no final dessa troca, eu terei aprendido o soneto e o teorema,
mas você ainda os terá também. Nesse caso, não há apenas equilíbrio, mas crescimento. No
primeiro, trocamos mercadorias. No segundo, compartilhamos conhecimento. E enquanto a
mercadoria se consome, a cultura se expande infinitamente.”
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Referências
[1] M. C. Nicoletti, A cartilha da lógica. Editora UFSCar (EDUFSCar), 2009.
[2] A. L. M. Levada, Fundamentos de lógica matemática. Editora UFSCar (EDUFSCar), 2012. Dis-
ponível em: http://livresaber.sead.ufscar.br:8080/jspui/bitstream/
123456789/2781/1/SI_Alexandre_FundamentosLogicaMat.pdf.
[4] F. S. C. Silva, M. Finger, and A. C. V. Melo, Lógica para computação. Thomson, 2010.
[5] J. Nolt, D. Rohatyn, and A. Varzi, Schaum’s outline of theory and problems of logic. Thomson,
2 ed., 1998.
[9] J. Heil, First-order logic: a concise introduction. Hackett Publishing Company, Inc, 2 ed., 2021.
[15] A. Figur, “O teorema da incompletude de Gödel,” Acta Legalicus, vol. 3, setembro 2017.
[16] E. Nagel and J. R. Newman, Gödel’s proof. New York University Press, 2001.
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