0% acharam este documento útil (0 voto)
16 visualizações9 páginas

Acórdão: Acordam

O Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso do Ministério Público que buscava o envio de autos do Inquérito Policial Militar à Justiça Comum, afirmando que a Justiça Militar é competente para decidir sobre a existência de crime militar doloso contra a vida de civis. A decisão reafirma a natureza militar do delito, apesar da legislação que prevê o encaminhamento dos casos à Justiça Comum em determinadas circunstâncias. O acórdão destaca a complexidade e as controvérsias em torno da aplicação da Lei nº 9.299/96 e a competência da Justiça Militar.
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
0% acharam este documento útil (0 voto)
16 visualizações9 páginas

Acórdão: Acordam

O Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo decidiu, por unanimidade, negar provimento ao recurso do Ministério Público que buscava o envio de autos do Inquérito Policial Militar à Justiça Comum, afirmando que a Justiça Militar é competente para decidir sobre a existência de crime militar doloso contra a vida de civis. A decisão reafirma a natureza militar do delito, apesar da legislação que prevê o encaminhamento dos casos à Justiça Comum em determinadas circunstâncias. O acórdão destaca a complexidade e as controvérsias em torno da aplicação da Lei nº 9.299/96 e a competência da Justiça Militar.
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
Você está na página 1/ 9

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos do Recurso em


Sentido Estrito nº 1.018/12, em que é recorrente o Ministério Público do
Estado de São Paulo, recorrida a r. decisão de fls. 112/130, tendo como
indiciado SÉRGIO DOMINGOS DIAS, Cabo PM RE 117246-8,

ACORDAM, os Juízes da Primeira Câmara do Tribunal


de Justiça Militar do Estado, à unanimidade de votos, em negar provimento
ao recurso ministerial, de conformidade com o relatório e voto do Relator, que
ficam fazendo parte do acórdão.

O julgamento teve a participação dos Juízes EVANIR


FERREIRA CASTILHO (Presidente) e PAULO ADIB CASSEB.

São Paulo, 15 de maio de 2012

FERNANDO PEREIRA
Relator

...
( RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 1.018/12 - ACÓRDÃO - CONT. - FL. 2 )
Recurso em Sentido Estrito nº 1.018/12
Recorrente: Ministério Público do Estado de São Paulo
Recorrida: r. decisão de fls. 112/130
Indiciado: SÉRGIO DOMINGOS DIAS, Cb PM 117246-8
Advogado: Dr. Edson José dos Santos - OAB/SP 94.615
(Inquérito Policial Militar nº 61.962/11 - 1ª Auditoria Militar)

POLICIAL MILITAR – Recurso em Sentido Estrito –


Apelo ministerial requerendo o envio dos autos do IPM
à Justiça Comum nos termos do § 2º do art. 82 do
CPPM – Exame efetuado pela Justiça Militar que
reconheceu inexistir crime militar doloso cometido
contra a vida de civil – Legislação que prevê o
encaminhamento dos autos apenas quando do
reconhecimento da existência de crime – Decisão
proferida pela Justiça Militar no pleno exercício da sua
competência – Controle exercido pelo Ministério
Público sobre a atividade policial que não é afetado
pela referida decisão – Recurso que não comporta
provimento.

O representante do Ministério Público do Estado


de São Paulo interpôs o presente Recurso em Sentido Estrito, nos termos do
artigo 516, alínea “a”, do Código de Processo Penal Militar (fls. 132/136), por
não se conformar com a r. decisão de fls. 112/130, proferida pelo Juiz de
Direito da 1ª Auditoria Militar, nos autos do Inquérito Policial Militar nº
61.962/11, que indeferiu sua remessa à Justiça Comum, por entender ser desta
Especializada a competência para dizer se há ou não crime militar doloso
contra a vida de civil, buscando a reforma desta decisão a fim de que, em
respeito ao Aviso nº 460/02 e ao Parecer da Assessoria da Procuradoria Geral
de Justiça, nos autos do Protocolado nº 179.515/11, sejam os mesmos
encaminhados ao Tribunal do Júri, reconhecendo-se a inexistência de crime
militar e, consequentemente, a incompetência desta Justiça Militar para
conhecimento e arquivamento de feitos deste jaez, a despeito do
reconhecimento de uma causa de exclusão de ilicitude

Sustentou, para tanto, que nos termos do


entendimento ministerial, desde o advento da Lei nº 9.299/96 os crimes
dolosos contra a vida cometidos por militares, ainda que em situação de
serviço, contra civis, tornaram-se infrações penais comuns.

Em suas contrarrazões apresentadas às fls.


143/158, o defensor nomeado requereu o acolhimento da decisão exarada pelo
Juízo a quo, sustentando que a Justiça Militar é competente para
desclassificar o crime doloso contra a vida de civil, devendo-se arquivar os
...
( RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 1.018/12 - ACÓRDÃO - CONT. - FL. 3 )
presentes autos diante da existência de excludente de ilicitude acobertando os
fatos.

O Juiz de Direito da 1ª Auditoria Militar manteve


a decisão recorrida (fls. 159/161), salientando que cabe ao Promotor de
Justiça Natural (no caso, o oficiante perante esta Justiça Castrense) decidir se
o crime de homicídio cometido por militar é doloso ou não, devendo, na
primeira hipótese, serem os autos enviados ao Tribunal do Júri e, na segunda
hipótese, serem os mesmos arquivados se o fato estiver acobertado por
excludente de ilicitude ou, proceder-se a análise dos fatos na hipótese de
ocorrência de outro delito.

Os autos foram encaminhados e recebidos nesta


Instância, sendo distribuídos ao Relator (fls. 163/164).

Nesta Instância, manifestou-se a Procuradoria de


Justiça, às fls. 166/167, pelo provimento do recurso.

É o relatório.

O exame da questão apresentada no presente


recurso recomenda que, preliminarmente, seja feita uma breve digressão
histórica sobre a modificação efetuada na legislação no que diz respeito a não
mais a Justiça Militar ter a competência para o julgamento dos crimes
militares dolosos contra a vida cometidos contra civis, passando esse
julgamento a ocorrer no âmbito da Justiça Comum, mais especificamente no
Tribunal do Júri.

Nunca é demais lembrar que essa regra foi


inserida no ordenamento jurídico nacional por meio da Lei nº 9.299/96, que
alterou o Código Penal Militar e o Código de Processo Penal Militar, assim
dispondo então:
Art. 1º O art. 9° do Decreto-lei n° 1.001, de 21 de outubro
de 1969 - Código Penal Militar, passa a vigorar com as seguintes
alterações:
“Art. 9°
(...)
II –
(...)
c) por militar em serviço ou atuando em razão da função,
em comissão de natureza militar, ou em formatura, ainda que fora do
lugar sujeito à administração militar contra militar da reserva, ou
reformado, ou civil;
(...)
f) revogada.
(...)

...
( RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 1.018/12 - ACÓRDÃO - CONT. - FL. 4 )
Parágrafo único. Os crimes de que trata este artigo,
quando dolosos contra a vida e cometidos contra civil, serão da
competência da justiça comum.”
Art. 2° O caput do art. 82 do Decreto-lei n° 1.002, de 21
de outubro de 1969 - Código de Processo Penal Militar, passa a vigorar
com a seguinte redação, acrescido, ainda, o seguinte § 2°, passando o
atual parágrafo único a § 1°:
“Art. 82. O foro militar é especial, e, exceto nos crimes
dolosos contra a vida praticados contra civil, a ele estão sujeitos, em
tempo de paz:
(...)
§ 1° (...)
§ 2° Nos crimes dolosos contra a vida, praticados contra
civil, a Justiça Militar encaminhará os autos do inquérito policial
militar à justiça comum.”
Art. 3° Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
(destaquei)

Essa lei foi editada tendo, dentre outras situações,


como principal fato gerador o episódio das cento e onze mortes na Casa de
Detenção, ocorrido no de ano 1992, em São Paulo.

Diversas autoridades e juristas diziam então que:


ou a Justiça Militar condenava os policiais militares envolvidos naquelas
mortes ou a Justiça Militar seria condenada à extinção.

Diante dessas declarações caberia aqui indagar


sobre o que seria da Justiça Militar se a decisão referente ao Coronel PM
Ubiratan Guimarães, que comandava a ação dos policiais militares no citado
caso ― e teve reconhecida sua absolvição pelo Tribunal de Justiça ―, tivesse
sido prolatada por este Tribunal de Justiça Militar, bem como se o julgamento
dos demais policiais militares ainda não tivesse sido realizado nem ao menos
na Primeira Instância, como é o que ocorre até o momento na Vara do Júri.

De qualquer forma, transcorridos mais de quinze


anos desde então, essa modificação permitiu que fosse desmentida a tese de
que o corporativismo levava à absolvição dos acusados nesses casos, uma vez
que o índice de condenações nos Tribunais do Júri vem sendo inferior ao
registrado anteriormente na Justiça Militar.

Da mesma maneira, desmistificou a absurda ideia


em relação a qual uma pessoa ao se determinar a praticar um crime, tem o seu
pensamento condicionado a praticá-lo ou não de acordo com o órgão que irá
julgá-lo.

Por outro lado, cabe ainda mencionar que a Lei nº


9.299/96 gerou inúmeras dúvidas e discussões a respeito da sua

...
( RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 1.018/12 - ACÓRDÃO - CONT. - FL. 5 )
constitucionalidade, do âmbito da sua aplicação e, em especial, sobre a
natureza do crime ali tratado ter deixado ou não de ser militar, o que leva até
hoje alguns a defenderem equivocadamente o entendimento de que o crime
doloso contra a vida cometido por militar contra civil, em situação de serviço,
tornou-se uma infração penal comum.

Como registro da perplexidade causada pela


redação da Lei nº 9.299/96, José Carlos Couto de Carvalho, Subprocurador-
Geral da Justiça Militar, em artigo intitulado “Homicídio e lesões corporais
decorrentes de disparos de arma de fogo: dolo eventual e culpa consciente”,
publicado na Revista “Direito Militar” nº 85, set/out 2010, editada pela
Associação dos Magistrados das Justiças Militares Estaduais, observou que
diante das críticas direcionadas ao referido texto legal, apenas treze dias após
a sanção o Presidente da República encaminhou mensagem ao Congresso
Nacional contendo o Projeto de Lei nº 2.314/96, que buscava alterar a Lei nº
9.299/96.

José Carlos Couto de Carvalho esclareceu ainda


no artigo mencionado que:
Na Exposição de Motivos do Projeto, o então Ministro da
Justiça Nélson Jobim, entre outras razões, observou, referindo-se à
citada Lei n° 9.299/96:
“5. Convém esclarecer que, muito embora o projeto de
lei acima referido estivesse eivado de imperfeições redacionais que, por
si só, ensejariam seu desacolhimento, o fim por ela visado não permitiu
que o Poder Executivo postergasse a solução desse problema, com o veto
ao Projeto de Lei n° 2.801, de 1992, para o subsequente
encaminhamento de outra propositura legislativa. 6. Por esse motivo,
optou por apresentar projeto de lei corrigindo as inadequações tão logo
entrassem em vigor as novas regras do Código Penal e de Processo
Penal Militar.”
A referida Exposição de Motivos, em outros itens, após questionar
a constitucionalidade da Lei n° 9.299/96, concluiu com referência à
controvérsia que poderia surgir em decorrência da menção ao elemento
subjetivo:
“12. Além do mais, não foi prudente a lei, ao fixar a competência
do Juízo em razão do elemento subjetivo da conduta, até mesmo
porque, não se define de modo claro qual o momento processual em
que isso ocorrerá e a quem caberá decidir sobre essa questão. Pela
redação do § 2° do art. 82 do Código de Processo Penal Militar,
pressupõe, inclusive, um pré-julgamento na fase do inquérito, o que
poderá acarretar insegurança jurídica. 13. Acrescente-se, ainda, as
consequências negativas que advirão da sentença que declarar ter o
agente praticado o crime com culpa e, em decorrência disso, demonstrar
a incompetência do Juízo.”
Verifica-se, portanto, que o próprio governo que sancionou a
norma reconheceu as dificuldades da sua aplicação em face da análise
do elemento subjetivo. (destaquei)

...
( RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 1.018/12 - ACÓRDÃO - CONT. - FL. 6 )
O Projeto de Lei nº 2.314/96 não prosperou, tendo
por sua vez a Emenda Constitucional nº 45, de 2004, tratado também da
questão ao modificar a redação do § 4º do artigo 125 da Constituição Federal,
que passou a viger da seguinte forma:
§ 4º Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os
militares dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações
judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvada a competência
do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal competente
decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e da graduação
das praças. (destaquei)

Verifica-se, agora, ser a própria Constituição que


ressalva que o crime militar doloso contra a vida de civil militar deve ser da
competência do júri, não tendo, no entanto, essa ressalva o condão de tornar o
referido crime de natureza comum. Ao contrário, reafirmou a natureza militar
do delito.

Tratando-se de crime militar e a Constituição


Federal prevendo que cabe às polícias civis a apuração de infrações penais,
exceto as militares, é o inquérito policial militar o instrumento adequado para
apuração dessa infração penal militar, devendo o mesmo ser encaminhado
para a Justiça Militar e, quando verificada a existência de crime militar doloso
contra a vida, enviado na sequência à Justiça Comum.

Diante disso, interessante observar, inclusive, que


no caso de homicídio doloso, o policial militar deveria ser denunciado e
pronunciado pela prática do crime previsto no artigo 205 do Código Penal
Militar e não no artigo 121 do Código Penal.

Quem argumenta a impossibilidade da aplicação


do Código Penal Militar pela Justiça Comum, certamente não atentou para o
fato de que nos Estados onde não foram criados os Tribunais Militares quem
julga em grau de recurso os crimes militares é o Tribunal de Justiça.

Por outro lado, caso o legislador ordinário tivesse


então pretendido transformar em crime comum o crime militar doloso contra
a vida de civil teria simplesmente inserido no parágrafo único do artigo 9º do
Código Penal Militar dispositivo expresso estabelecendo essa situação e não
como fez, prevendo que os crimes tratados naquele artigo, quando dolosos
contra a vida e cometidos contra civil, seriam da competência da Justiça
Comum.

Além disso, no mesmo sentido, caso o legislador


tivesse pretendido transformar em crime comum o crime militar doloso contra
a vida de civil não teria determinado que o inquérito policial militar
continuasse a ser o procedimento apto a apurar o fato.
...
( RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 1.018/12 - ACÓRDÃO - CONT. - FL. 7 )
Posto isso, adentrando-se agora ao mérito
propriamente dito do recurso ora em exame há de se ressaltar inicialmente que
a questão em debate tem um contorno muito mais doutrinário do que prático e
que comporta perfeitamente interpretações divergentes.

Independentemente dessa constatação, há de se


reconhecer, segundo o meu convencimento, o acerto do entendimento
expressado a respeito, com a contumaz maestria, pelo Ministro Carlos
Velloso, quando do julgamento da ADI nº 1.494-3, realizado pelo Excelso
Supremo Tribunal Federal em 09.04.1997, cujo voto vencedor tem o seguinte
trecho a seguir reproduzido e que sintetiza o assunto em discussão:
“(...) à Justiça Militar estadual compete julgar os policiais
militares nos crimes militares praticados pelos mesmos. Os crimes
militares são definidos em lei (C.F., art. 125, § 4º).
Esta é a regra.
A lei ordinária, a qual compete definir os crimes militares,
excepciona: os crimes dolosos contra a vida, praticados pelos policiais
militares, contra civis, serão da competência da Justiça comum: Lei
9.299/96, de 7.08.96. Excepcionou-se, portanto, a regra. Esses crimes,
contidos na exceção, serão da competência da Justiça comum.
Mas a própria lei, que assim procedeu, estabeleceu que, ‘nos
crimes dolosos contra a vida, praticados contra civil, a Justiça Militar
encaminhará os autos do inquérito policial militar à Justiça comum.’
É dizer, a Lei 9.299, de 1996, estabeleceu que à Justiça Militar
compete exercer o primeiro exame da questão. Noutras palavras, a
Justiça Militar dirá, por primeiro, se o crime é doloso ou não; se
doloso, encaminhará os autos do inquérito policial militar à Justiça
comum. Registre-se: encaminhará os autos do inquérito policial
militar. É a lei, então, que deseja que as investigações sejam
conduzidas, por primeiro, pela Polícia Judiciária Militar.
É claro que o primeiro exame da questão – se doloso ou não o
crime praticado contra civil – não é um exame discricionário, isento de
controle judicial. Não. Esse exame está sujeito ao controle judicial,
mediante os recursos próprios, e inclusive, pelo habeas corpus.
Mas o que deve ser reconhecido é que o primeiro exame é da
Justiça Militar, que, verificando se o crime é doloso, encaminhará os
autos do IPM à Justiça comum. É o que está na lei.
Posta a questão em tais termos, força é concluir que a Polícia Civil
não pode instaurar, no caso, inquérito. O inquérito correrá por conta da
Polícia Judiciária Militar, mediante o inquérito policial militar.
Concluído o IPM a Justiça Militar decidirá, remetendo os autos à
Justiça comum, se reconhecer que se trata de crime doloso praticado
contra civil.
Registro novamente: este julgamento não se constitui num
julgamento imodificável. Estará ele sujeito a um controle judicial,
através dos meios próprios, inclusive por meio de habeas corpus.”
(destaquei)

Se a Justiça Militar não tivesse a competência


para realizar o exame atinente ao reconhecimento ou não da existência de
...
( RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 1.018/12 - ACÓRDÃO - CONT. - FL. 8 )
crime militar doloso contra a vida de civil e, na verificação da sua existência,
para encaminhar os autos à Justiça Comum, não haveria qualquer sentido na
lei determinar que os fatos fossem apurados por meio de um inquérito policial
militar e que este fosse direcionado por primeiro à Justiça Militar.

O Código Penal Militar, da mesma forma que o


Código Penal, prevê no seu artigo 42 o seguinte:
Art. 42. Não há crime quando o agente pratica o fato:
I - em estado de necessidade;
II - em legítima defesa;
III - em estrito cumprimento do dever legal;
IV - em exercício regular de direito. (destaquei)

No tocante a este tema, merece registro a


insuspeita lição de Jorge César de Assis, Promotor de Justiça Militar da União
e renomado autor de várias obras sobre Direito Militar, ao sustentar que:
“pode ser também que fique demonstrada – extreme de dúvidas – a
ocorrência de uma excludente de ilicitude, legítima defesa ou estrito
cumprimento do dever legal, e aí, mesmo que a vítima seja civil, não
haverá crime doloso, autorizando o arquivamento do inquérito, ou a
permanência do julgamento na Justiça Especializada.” (“Direito Militar
– Aspectos Penais, Processuais penais e Administrativos”, 2ª ed., Juruá,
Curitiba, 2008).

Verifica-se, assim, que na eventualidade do Juiz


de Direito, exercendo sua atividade jurisdicional na Justiça Militar,
reconhecer a inexistência de crime, não há razão para determinar o envio dos
autos à Justiça Comum ― uma vez que esse encaminhamento é obrigatório
apenas quando do reconhecimento da existência de crime militar doloso
contra a vida civil ―, até mesmo porque, se dessa forma não estivesse
simplesmente se atendo à estrita observância da lei, essa medida também
estaria em perfeita consonância com os princípios da economia processual e
da celeridade, este último inserido dentre os direitos e garantias fundamentais
por meio da Emenda Constitucional nº 45/04.

Se a análise técnica e jurídica da questão


referenda esse posicionamento vislumbra-se em sentido contrário apenas o
equivocado pressuposto que conduziu à edição da Lei nº 9.299/96 ― já
abordado ―, qual seja, o aventado corporativismo da Justiça Militar, que se
comprovou inexistente, reitere-se aqui.

De qualquer forma, procurando afastar qualquer


infundado receio a respeito, oportuna a reprodução mais uma vez do trecho do
voto do Ministro Carlos Velloso, no qual ele reafirma que o exame efetuado
pela Justiça Militar sobre a existência ou não de crime militar doloso contra
vida de civil “...não se constitui num julgamento imodificável. Estará ele

...
( RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 1.018/12 - ACÓRDÃO - CONT. - FL. 9 )
sujeito a um controle judicial, através dos meios próprios, inclusive por meio
de habeas corpus.”

Além disso, afora a possibilidade dos Promotores


de Justiça que atuam na Justiça Militar entenderem necessário, conforme o
caso, o envio de cópia dos inquéritos policiais militares à Justiça Comum, o
controle em relação à atuação dos policiais militares não deixa de ser exercido
pelo Ministério Público oficiante perante o Tribunal do Júri, uma vez que,
paralelamente, nesses casos o crime de resistência previsto no artigo 329 do
Código Penal é registrado pela Polícia Civil, conforme pode ser verificado a
título de exemplo às fls. 13/17 destes autos, e o Aviso nº 460, de 6 de julho de
2002, da Procuradoria Geral de Justiça, é muito claro ao estabelecer o
seguinte:
“RECOMENDA aos membros do Ministério Público, com atuação
na área criminal, que ao se manifestarem em inquéritos policiais e
termos circunstanciados, versando sobre o crime de resistência
praticado contra policiais civis ou militares, e que resulte na morte do
agente pela ação destes últimos, encaminhem os autos à Promotoria de
Justiça com atribuições perante o Tribunal do Júri, para que possa ser
analisada, em conjunto, a ocorrência, em tese, de crime doloso contra a
vida. Na hipótese de arquivamento desta última imputação, havendo
delito remanescente a ser apreciado que não seja da competência do
Tribunal do Júri, o feito deverá ser restituído ao juízo competente.”
(destaquei)

Nada impede, portanto, que os Promotores de


Justiça atuantes no Tribunal de Júri, quando do recebimento dos mencionados
inquéritos policiais e termos circunstanciados que tenham apurado o crime de
resistência previsto no Código Penal, ao vislumbrarem a existência de crime
militar doloso contra a vida de civil requeiram, caso julguem necessário, o
encaminhamento por parte da Justiça Militar de cópia do respectivo inquérito
policial militar.

Nessa conformidade, diante de todo o exposto, há


de se negar provimento ao presente recurso em sentido estrito.

FERNANDO PEREIRA
Relator

...

Você também pode gostar