PLANO DE AULA – PRINCÍPIOS PROCESSUAIS (2 encontros)
Direito Processual Civil I
Prof. Guilherme Vianna
Introdução aos Princípios Processuais
Princípios Informativos Gerais e Parte dos Princípios Específicos
I. Introdução: Princípios Processuais
Conceito: São valores e diretrizes que informam, orientam e limitam a atuação
do legislador, do juiz e das partes no processo.
Função: a de garantir a legitimidade e racionalidade do processo.
Os princípios processuais constituem as diretrizes fundamentais que infor-
mam a estrutura e o funcionamento do processo. São eles que garantem que
o processo seja instrumento ético de atuação da função jurisdicional e de efe-
tivação dos direitos fundamentais.
Destaque-se que o CPC, dos arts. 1º a 12, denomina o capítulo inaugural como
“das normas fundamentais do processo civil”.
Como bem assinalou Sálvio de Figueiredo Teixeira (foi Ministro do STJ):
“São os princípios que distinguem e revelam os sistemas processuais,
concluindo-se ainda que, por trás dos princípios que informam as nor-
mas processuais, sempre está um comando constitucional”
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II. Princípios Informativos Gerais do Processo
Princípio da Legalidade
O processo é regido pela lei: limites e possibilidades são estabelecidos norma-
tivamente.
Art. 5º, II, CF: “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma
coisa senão em virtude de lei”.
Processo como atividade vinculada, não discricionária. A ideia de que o pro-
cesso é atividade vinculada à lei — jamais arbitrária.
Humberto Theodoro Júnior (Professor de MG)
“Nenhum aplicador do direito conseguirá êxito se se limitar à pura e sim-
ples aplicação dos textos legais. A infinita variação dos fatos humanos
só encontrará a justa solução se o aplicador souber encontrar no espírito
do ordenamento jurídico a norma individualizada que cada caso con-
creto reclama”
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Princípio Lógico
Exigência de coerência interna e sistematicidade das normas processuais.
Impede contradições e garante previsibilidade.
Deve-se buscar os meios mais adequados à elucidação da verdade e à segu-
rança jurídica. Como relembrado por Alcides de Mendonça Lima (Professor
no RS)
“Princípio lógico, que consiste na escolha dos atos e formas mais aptos
para descobrir a verdade e evitar o erro”
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Princípio Político
Processo como instrumento de realização de direitos fundamentais.
Função de pacificação social e garantia da segurança jurídica.
Princípio político, que consiste em prover os direitos privados de máxima ga-
rantia social com mínimo sacrifício da liberdade individual
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Princípio Econômico
Busca evitar que o processo seja custoso a ponto de inviabilizar o acesso à
justiça, como ensina o clássico pensamento de Paula Baptista:
“Brevidade, economia, remoção de todos os meios maliciosos e supér-
fluos, tais são as condições que devem acompanhar o processo em toda
a sua marcha”
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Leonardo Greco (Professor no RJ) destaca como o debate contemporâneo
sobre publicismo e privatismo alterou a compreensão do processo, antes visto
como instrumento dos direitos subjetivos e agora também como meio de reali-
zação de valores coletivos:
“A oralidade, a concentração, o impulso processual oficial, o ativismo judicial
especialmente em matéria probatória [...] são características do processo civil
como instrumento da concretização de escopos sociais ou publicísticos”
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III. Princípios Específicos (Parte 1)
Devido Processo Legal
Previsão constitucional: art. 5º, LIV, CF.
“Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido pro-
cesso legal”.
Garantia de um processo justo, com respeito aos direitos fundamentais.
Dimensão formal: observância dos ritos legais.
Dimensão substancial: justiça do procedimento.
Segundo Celso Agrícola Barbi (Professor de MG)
“No ensino de Ada Pellegrini Grinover, por esse princípio, naquele país
[EUA], evoluiu ampliativamente: do conteúdo clássico [...] passa-se à proteção
mais ampla, sem distinção entre substance e procedure. A cláusula trans-
forma-se na garantia geral da ordem jurídica”
Princípio síntese de todos os demais princípios processuais. Concentra em si
a cláusula de fechamento e congruência de todos os demais princípios.
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Acesso à Justiça
Garantia de fruição dos direitos subjetivos por meio do Judiciário.
Abuso do direito de demandar e litigância predatória: limites éticos e proces-
suais ao acesso à Justiça.
O acesso à justiça não é apenas o direito de ingressar em juízo, mas de obter
a prestação jurisdicional efetiva e adequada.
O acesso à justiça é a garantia da possibilidade de submeter ao Poder Judici-
ário a apreciação de lesão ou ameaça a direito, conforme art. 5º, XXXV, da
Constituição Federal.
Evolução do conceito: de acesso ao Judiciário para acesso à ordem jurídica
justa (Cappelletti e Garth).
Em sua concepção moderna, sobretudo após a obra clássica de Cappelletti e
Garth, na coletânea “Acesso à Justiça” (1978), transcende o mero acesso for-
mal ao Judiciário, passando a compreender:
Possibilidade efetiva de obtenção de uma tutela adequada e tempestiva;
Remoção de barreiras econômicas, técnicas e culturais;
Efetividade na proteção de direitos individuais e coletivos.
Consequências dessa mudança de perspectiva:
a) Lei dos Juizados Especiais (Lei n.º 9.099/1995 e Lei n.º 12.153/2009)
Instrumento legislativo que visa simplificar, desburocratizar e democratizar o
acesso à Justiça:
Redução das formalidades processuais.
Eliminação de custas em determinados casos.
Desnecessidade de advogado até o limite de 20 salários-mínimos (art. 9º, Lei
n.º 9.099/1995).
Valorização da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e
celeridade.
Impacto: amplia o acesso especialmente para populações economicamente
vulneráveis, facilitando a solução de pequenos conflitos.
b) Custos do Serviço Forense
O custo do processo é uma das principais barreiras ao acesso à justiça.
Gratuidade da Justiça (art. 98 e seguintes, CPC/2015) como instrumento es-
sencial de remoção desse obstáculo.
Atuação da Defensoria Pública como expressão da garantia constitucional de
assistência jurídica integral e gratuita aos necessitados (art. 134, CF).
Reflexão: a exigência de custas, taxas ou honorários pode ser inibidora ou até
impeditiva do exercício do direito de ação.
c) Exigência de Patrocínio por Advogado
A regra geral do processo é a necessidade de representação das partes por
advogado (art. 103, CPC).
Exceções importantes que ampliam o acesso:
Juizados Especiais: até 20 salários-mínimos, não há necessidade de
advogado.
Habeas Corpus: não se exige advogado (art. 654, § 1º, CPP).
Procedimentos administrativos e autodefensivos.
Discussão contemporânea: necessidade de equilíbrio entre tecnicidade da atu-
ação profissional e o livre exercício do direito de ação.
d) Processo Coletivo
O processo coletivo representa um dos mais importantes avanços na concre-
tização do acesso à justiça.
Amplia o espectro de proteção jurisdicional, permitindo que grupos, categorias
ou classes de pessoas tenham seus direitos tutelados.
Instrumentos:
Ação Civil Pública (Lei n.º 7.347/1985).
Mandado de Segurança Coletivo (art. 5º, LXX, CF).
Ação Popular (Lei n.º 4.717/1965).
Defesa de interesses e direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos
(art. 81, CDC).
Relevância: supera limites da proteção apenas individual, fortalecendo o mo-
delo democrático e ampliando a efetividade da jurisdição.
e) Técnicas Processuais Facilitadoras
O desenvolvimento de mecanismos processuais que visam assegurar a tutela
efetiva dos direitos também integra a noção de acesso à justiça:
Tutela provisória (urgente e da evidência) – CPC, arts. 294 e seguintes.
Julgamento antecipado do mérito (art. 355, CPC).
Procedimento monitório (art. 700, CPC): permite a formação célere de título
executivo judicial.
Exigência de fundamentação das decisões (art. 489, CPC): reforça o controle
e a previsibilidade.
Essas técnicas buscam superar a morosidade e reduzir custos, elementos tra-
dicionalmente apontados como obstáculos ao acesso efetivo.
f) Negócio Processual
O negócio jurídico processual (art. 190, CPC) permite que as partes, dentro de
certos limites, ajustem regras do procedimento:
Flexibilização de prazos.
Definição de ônus processuais.
Pactuação sobre produção probatória.
Relevância: potencializa a autonomia das partes e torna o processo mais ade-
quado às especificidades da relação jurídica.
Limite: não pode resultar em restrição ou supressão do acesso à justiça, de-
vendo respeitar a função pública do processo e os direitos indisponíveis.
g) Instrumentos de controle da qualidade e efetividade do processo
O controle administrativo e jurisdicional busca assegurar que o direito de
acesso à justiça não seja frustrado por falhas institucionais:
Corregedorias e Conselhos: CNJ, Corregedorias locais.
Reclamação constitucional: para preservação de competência e autoridade
das decisões (art. 988, CPC).
Representação administrativa: contra excesso de prazo e morosidade.
Conclusão – Acesso à Justiça
Não se resume à possibilidade de ingressar em juízo;
Exige condições materiais e processuais adequadas;
Envolve a redução de custos, flexibilização de procedimentos, possibilidade de
tutela coletiva e adaptação do processo às necessidades das partes.
Como assevera Humberto Theodoro Júnior:
“A função do processo é servir à efetividade do direito, eliminando os
entraves materiais, culturais e institucionais que obstaculizam o acesso
ao Judiciário”
O acesso à justiça é cláusula essencial do Estado Democrático de Direito.
Sua realização depende de um conjunto de mecanismos legislativos, instituci-
onais e processuais, que devem ser constantemente aprimorados para garan-
tir que a jurisdição seja efetiva, célere e justa.
Conforme Sálvio de Figueiredo Teixeira:
“O processo deve proporcionar a quem tem um direito tudo aquilo e pre-
cisamente aquilo que ele tem o direito de obter”
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Direito de Defesa
Manifestação do contraditório; articulação defensiva plena.
Dimensões:
Defesa processual.
Defesa substancial.
Defesa probatória.
Fundamento do contraditório e da paridade de armas, deve ser amplo e efetivo,
garantindo que nenhuma decisão seja tomada sem que se oportunize à parte
a possibilidade de influenciar no convencimento do juiz.
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Contraditório e Paridade de Armas
Audiatur et altera pars: “ouça-se também a outra parte”.
Fundamento histórico no direito romano: "inaudita causa quemquam damnari
aequitatis ratio non patitur" (“a razão da justiça não tolera que se condene al-
guém sem ouvir sua causa”).
Conceito moderno: garantia de participação efetiva das partes no processo.
Relação com o princípio da igualdade processual.
Segundo Candido Rangel Dinamarco (Professor de SP)
“O contraditório é axioma fundamental do processo, garantindo o acesso
das partes ao processo em plano de igualdade e o exercício da facul-
dade de formular alegações e contra-alegações em defesa de seus di-
reitos e interesses legítimos”
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