Caderno de Antropologia - Luciano Nuzzo
Caderno de Antropologia - Luciano Nuzzo
Unidade I
Aula 01 (25/08) - apresentação do curso + discurso jurídico entre saber e poder
(semana 1)
Pode-se dizer que o discurso jurídico moderno, pensa e descreve o poder nos termos
negativos da lei, sendo o poder o poder do soberano de produzir a lei. A lei se manifesta
no poder de dizer não, de vetar algo.
• Entretanto, o que aparece, segundo uma linha de pensamento que atravessa Max;
Nietzsche, Weber e Foucault, é que o poder não pode se identificar apenas com o
estado e a Lei. O poder é horizontal, funciona através de redes que produzem
desejos, sujeitos e objetos; seria um poder positivo que produz normalização e
controle.
• Aqueles discursos e dispositivos que operam nos remetem a uma antropologia que
está na base do discurso e dispositivo jurídico moderno e do sujeito humano
universal, pensado como e livre e igual. Mas este homem é na verdade o indivíduo
burguês, branco, colonizador e proprietário.
Unidade II
Aula 03 (01/09) - O direito moderno e a construção da ordem social (semana 2)
Pode-se dizer que nesse modelo o horizonte é a necessidade. Se tem um problema que é
a mediação entre a transcendência e a imanência.
Esse problema acima vai ser solucionado politicamente, império sacro romano, e
a solução teológica/religiosa é através do Papa e a igreja católica.
O que quer dizer necessidade? A ordem é natural, essa afirmação é encontrada no
primeiro livro “A política” de Aristóteles e tem como consequência que cada entidade é
como é por natureza, e não pode ser diferente como é. Isto significa, que a diferença entre
os homens são naturais, assim, a ordem política deve reproduzir as diferenças naturais.
Nesse sentido, há uma diferença natural entre homem e mulher, sendo assim a ordem
política, para Aristóteles, deve reproduzir essas diferenças naturais.
Problema da Transcendência/Imanência:
§B, P. 34 “O direito é... uma lei universal de liberdade.” aqui Kant define o
direito. O direito é forma, pois as condições pelas quais a vontade de um pode coincidir
com a vontade do outro, de acordo com a lei universal da liberdade.
A definição de direito Kantiana tenta explicar um fenômeno jurídico ao reunir os
dois aspectos que o caracterizam: fato e valor. Isso no sentido, que a lei não é redutível
nem ao fato e nem ao valor, e deve, portanto se distinguir o direito tanto do fato quanto
da moral. Daqui se tira a exterioridade da definição do direito kantiano.
No §d o direito está ligado a autorização de coagir, desta forma Kant distingue o
direito da moral.
Todo o discurso Kantiano está centrado na tentativa de diferenciar o direito do
fato e a moral. Nesse sentido, o direito é ao mesmo tempo fato, mas não se identifica com
este, e valor, mas também não se identifica completamente como valor moral. Essa é a
complexidade da composição Kantiana.
Um elemento fundamental na tese Kantiana, da estrutura da norma é a coação.
A distinção entre direito e moral não se baseia no conteúdo das regras, mas sim nas
diferentes razões para a obediência. No caso do direito o motivo para obediência é
indiferente, sendo o cumprimento da ação externa importante. No caso da moral não é
necessário apenas uma obrigação externa, mas também interna.
A partir do exposto acima, o primeiro elemento que diferencia o elemento da
moral é baseada na obrigação externa e interna. A obrigação jurídica é externa, e a
moral é interna. O segundo elemento que diferencia o direito da moral, é que aquele
trata de ações externas e este diz respeito a ações internas. O terceiro elemento é que
a moral se baseia em si mesma, enquanto a obediência ao direito é baseada nas
consequências. A norma moral é um imperativo categórico. O quarto elemento que
diferencia são que as normas morais são autônomas baseiam-se num sujeito
racional, já as jurídicas são heterônomas, ou seja, são postas pelo legislador.
No §E Kant está dizendo que o direito também é fato; está ligado a questão da
coação; mas não deve-se pensar a coação como algo que contraria a liberdade. Nessa
lógica, Kant está tentando não reduzir o direito ao fato, pois o direito também é valor. O
direito estrito também tem a possibilidade de ser apresentado como uma coação geral,
mas concordante com a liberdade de qualquer um.
“O direito estrito pode ser apresentado também… mas se pode fazer o conceito de
direito consistir imediatamente na possibilidade da coação recíproca universal com a
liberdade qualquer um.” Então, Kant diz que se é verdade que o direito é fato porque a
norma jurídica se define pela coação e, portanto, se distingue da moralidade, também é
verdade que o direito é valor/coexistência livre da vontade dos sujeitos. Então, Kant está
dizendo que o direito tem fundamento na liberdade da vontade, qual justifica e
fundamenta a obrigação política e jurídica.
A moral o direito e a política indicam diferentes áreas da ação, mas ao mesmo
tempo essas áreas são conectadas. A condição se baseia em uma ideia de liberdade, que
permite ao direito e a política não sejam manifestação da vontade do soberano. desta
forma, Kant coloca dois fenômenos limites: a equidade e a necessidade.
A equidade é um fenômeno limite que define a fronteira entre o direito e a moral.
Já a necessidade (fronteira de marcação entre o direito e o fato bruto) é um fenômeno
limite que define a fronteira entre o direito e o fato. A equidade, na tradição Aristotélica,
é um instrumento moral para corrigir a rigidez formal do direito. A necessidade significa
que a liberdade de fazer ou não fazer algo é negada, porque se está em uma situação que
não pode escolher, ou seja, a liberdade não é livre.
Conclusão:
Todas essas reflexões Kantianas são articuladas em torno da questão da relação
entre direito e moral por um lado, e entre direito e fato por outro lado.
O discurso jurídico da modernidade não pode ser entendido sem a reflexão de
Kant.
A partir de Kant as duas direções de pensar a categoria jurídica, serão por um lado
uma direção que valoriza a dimensão factual da norma jurídica, outra direção valoriza a
dimensão do valor do direito. No pensamento Kantiano esses dois elementos eram
pensados como complementares.
Apenas Kelsen, retomando o pensamento Kantiano, vai tentar pensar o direito
como fato e valor.
Em 1934 Kelsen, publica “A doutrina pura do direito”. Kelsen com este título
retoma a obra da crítica Kantiana “A crítica da razão pura”. Essa ideia de pura significa
que o conhecimento deve abordar apenas o direito, para isso deve delimitar claramente o
objeto do conhecimento. Então, Kelsen para distinguir uma teoria da norma jurídica,
distingue o direito - fato da natureza, ou seja, distinguir a norma jurídica da norma moral.
O problema, mais uma vez, é entre a contingência e a necessidade. A positivação
do direito o colocou, em novos termos, o problema de legitimidade a variabilidade do
direito positivo. O direito positivo se apresenta como único direito possível,
institucionalizando as condições da própria variabilidade.
Nesse sentido,o direito positivo é resistente e variável, aberto cognitivamente, pois
pode mudar nas condições que ele mesmo estabelece. O procedimento é o lugar de
aprendizado e variação, mas ao mesmo tempo é um direito que se apresenta como
indiferente a variação.
Kelsen, retomando Kant, tenta resolver o problema da contingência do direito por
meio de uma teoria entendida como forma autônoma e independente, quanto da moral,
quanto da política.
Kelsen será capaz de resolver o problema da justificação da contingência do
direito por meio da racionalidade interna ao direito positivo. Desta forma, garantirá a
autonomia do direito, no entanto no plano político isso significa a impossibilidade de
compreender a relação entre o problema da legitimidade e o problema da legalidade, ou
seja, o problema da autonomia do direito como resultado de uma ideologia que serve para
resultar o processo real de produção da abstração jurídica. ]
No plano moral a redução do problema da justiça a uma questão puramente formal
ou uma questão que não diz nada a respeito ao direito. Nessa perspectiva, a justiça
tornasse justiça formal, pois está em conformidade às leis do estado (legalidade).
A teoria de Kelsen pode ser resumida da seguinte forma:
1. A visão do mundo de Kelsen é dualista, estando divido em ser e dever
ser (1º ponto).
2. Toda ciência visa construir a unidade do próprio objeto, assim a ciência
jurídica deve ser sistemática, isto é, a ciência jurídica deve identificar os
princípios gerais pelos quais a pluralidade descrita (?) de normas
jurídicas pode ser trazida de volta a uma unidade lógica (2º ponto).
3. A ciência jurídica descreve um objeto colocado no mundo do dever ser,
ou seja, a ciência jurídica explica apenas o direito (3º ponto).
4. O direito é unitário, pois todo ordenamento jurídico deriva de uma
única norma fundamental. Esta não é estabelecida pelo legislador, mas
apenas pensada pela ciência jurídica, que atribui unidade a toda uma
ordem jurídica (4º ponto).
5. O direito é obedecido porque é válido. E sua validade depende do fato que
sua norma fundamental transmitir o dever para todas as suas normas de
nível inferior. Nesse sentido, o sistema jurídico de Kelsen tem uma
forma piramidal e deve-se supor a norma fundamental uma condição
transcendental kantiana (condição para pensar a unidade de uma
pluralidade discreta de normas).
O que será estudado de Kelsen pelo professor é a questão da contingência e o
problema do método da ciência jurídica, a distinção entre direito e fato e a distinção entre
o direito moral e direito valor.
Unidade III
Aula 10 - Modernidade e racionalização (obs: aqui é a semana 6 na ementa, pois
o prof. alterou a ordem).
Está nos primeiros anos do século XX, e o discurso moderno torna-se o discurso
do positivismo jurídico. Este se torna o discurso oficial do estado liberal do direito, isto
é, o estado é o único detentor do poder de produzir direito, mas só nas condições
estabelecidas pelo direito.
O direito positivo moderno é racional e formal, que permite manter unida a
desigualdade econômica e a igualdade política. Esse direito permite o mercado
econômico como o lugar social de produção do valor.
O século XX é o do estado liberal, do direito positivo, da ciência jurídica, mas
também da formação da burocracia no sentido moderno da palavra, ou seja, como aparato
público administrativo impessoal que permite o funcionamento do estado e administra
efetivamente o direito.
O século XIX é o das constituições liberais, dos direitos políticos; da separação
dos poderes; mas também é o século das revoluções industriais; das transferências semi-
forçadas das massas pobres de camponeses para cidades industriais e metropolitanas; das
instituições disciplinares (hospitais psiquiátricos, prisões); da abolição da escravidão.
Este também é o século do colonialismo do estado e dos grandes grupos comerciais que
conquistam mata (?) para desenvolvimento econômico industrial.
Ainda no século XIX, os EUA se tornam potência colonizadora das américas com
a famosa doutrina Monroe. Neste século, o racismo se torna teoria biológica e social.
Neste contexto, complexo, que se tem que colocar a análise do poder de Weber e
Marx. O poder na sociedade moderna, para esses dois autores, para funcionar não precisa
apenas da violência física. Não se identifica o poder simplesmente com a lei do soberano,
ao contrário, na normalidade dos casos o poder funciona sem o uso da violência. O poder
que necessita da violência é fraco.
A análise do poder para Marx e Weber torna o poder complexo. No discurso
jurídico moderno desde Hobbes até Kelsen, a imagem dominante é a pirâmide. Ao
contrário dessa imagem recorrente o poder em Marx e Weber, e depois em Foucault, tem
uma estrutura reticular, na qual se configura uma rede complexa de dispositivos de
governo (a fábrica, escola, hospital) através dos quais o poder é maximizado. Em outras
palavras, governa ao nível dos corpos individuais e ao nível da população, do mesmo
modo as práticas sociais de governo precisam um discurso individual.
Marx chama, isso tudo acima, de ideologia. Já para Weber não se trata de
ideologia, é muito mais complexo, mas sim de uma relação de influência recíproca entre
a estrutura e a semântica; entre as práticas sociais e os discursos; entre as transformações
sociais e os discursos de saber.
Com Marx e Weber a sociedade não pode ser mais lida como um conjunto de
indivíduos livre e iguais, que decidem construir através de um contrato social em poder
comum. Além dos indivíduos na sociedade tem classes sociais, grupo de interesses,
organizações formais e informais, papéis sociais. A mesma coisa acontece com o direito,
tanto marx quanto Weber desdobram a categoria jurídica.
Agora chega-se ao tema da aula de hoje: modernidade e racionalização. Este é um
ponto importante no pensamento de Weber no sentido que todo seu pensamento gravita
ao redor da racionalização. E também importante, pois a análise Weberiana da
racionalização permite entender o direito e o funcionamento do estado moderno.
O capitalismo ocidental
desenvolveu uma estrutura
particular e específica: a
organização racional do trabalho
livre.
O ocidente, diz Weber, não é uma
civilização melhor que qualquer
outra do mundo, mas apenas mais
eficaz. Isso se dá, pois o ocidente
é materialmente mais potente,
visto que ele estende em todos os
campos da vida social a
racionalidade em relação ao
escopo.
O capitalismo tem uma estrutura totalmente diferente das outras que foram apresentadas
no mesmo período temporal em outros lugares do mundo.
(antes disso o professor leu o trecho de um texto, mas não mencionou o nome ou pag.)A
ideia da racionalização pode ser desenvolvido por um processo que acontece nos mesmos
anos e que Weber define como um processo de disciplinamento dos desejos humanos.
As ordens monásticas da
Europa medieval contribuíram
para técnicas disciplinares. Estas
que contribuíram para a repetição
rigorosa de atividades regulares, a
organização rigorosa do tempo
durante o dia e a organização das
formas de vida.
Os aspectos da vida eram
regulados pelas normas
monásticas, isso tudo garantia a
subordinar a paixão a vontade e permitia distinguir os desejos da alma dos da carne.
O disciplinamento moderno é
uma mistura de técnicas
monásticas e militares, que o
estado moderno, quando se afirma
como a estrutura política
dominante, aplica a inteira
sociedade.
:
A palavra que Weber usa que é fundamental para entender essa centralidade da
ética protestante para construção do capitalismo moderno, é Beruf.
Beruf pode ser trazido como profissão.
A palavra “profissão” pode ser identificada como trabalho, mas também como
manifestação de fé.
A ética do capitalismo se funda no vínculo profissional, que o indivíduo prova em respeito
a sua atividade profissional.
A ética do Beruf permite a interiorização do disciplinamento individual. E seu
indivíduo é o homo economicus da sociedade burguesa e capitalista, isto é, aquele
indivíduo que tem que controlar os seus desejos para construir uma ordem econômica,
política e social que permita a acumulação do valor de troca na ordem social.
Porque o capitalismo só se
deu no ocidente? segundo
Weber, é porque se teve uma
relação estrutural entre a
ética protestate, o capitalismo
e o estado moderno.O
Ocidente é tal porque
generalizou em todos os
campos sociais a
racionalização técnica e
instrumental.
O estado, o direito
positivo, o capitalismo e a
ciência experimental são as forças com as quais se manifesta essa racionalização. Todas
essas forças foram veiculadas através de uma ética.
Agora se entra no ponto mais interessante no discurso Weberiano: a explicação
da modernidade ocidental como realização de um processo de racionalização.
Agora pode-se perguntar qual é a essência de modernidade para Weber? Weber
contra Marx argumentava que uma crescente racionalização do mundo social favorecida
da ética protestante, e não o capitalismo em si, constituía a força motriz da modernidade.
O capitalismo é apenas um teatro, no qual o racionalismo sai vencedor. A racionalização,
para Weber, é organizada sob três procedimentos que a constituem:
1. Controle do mundo através do cálculo e da coleta de registro de
informações, portanto, o mundo se transforma em lugar de problemas que
podem ser resolvidos através da técnica;
2. A sistematização do significado e do valor em forma de esquema geral e
coerente;
3. Uma existência disciplinada, fundada sobre o respeito das regras.
Racionalidade significa seguir uma regra ou um princípio moral abstrato,
em vez de agir segundo os impulsos, ou o acaso, ou emotivamente.
Uma primeira consequência da
racionalização é o desencanto do
mundo, isto é, desmobilização (?)
do mágico e do místico; a perda do
sacro. Weber, como leitor de
Nietzsche, acreditava que a
modernidade como racionalização
consistia na morte de Deus, ou
seja, a perda do transcendente; dos
valores tradicionais; dos
fundamentos.
Em outras palavras, a
racionalização exigia que se eliminasse do nosso modo de agir e pensar, as formas que
não pudessem ser justificadas com suas consequências previstas. As próprias
consequências devem ser racionalmente justificadas por um fim universalmente
definidos.
A modernidade é, ao mesmo
tempo, racionalização e
desencanto. Por um lado permite a
racionalização da razão
instrumental comprometida com o
cálculo (racionalidade formal), por
outro lado esta generalização
representa um desencanto com o
mundo; a perda dos valores
tradicionais; o homem está preso
em um mundo totalmente
disciplinado.
Weber está dizendo que no interior da racionalização é presente o
desencantamento do mundo, mas esse desencantamento tem um compromisso com um
ponto de irracionalismo possível.
Por que os homens obedecem as normas? Em que justificativas internas e meios externos
se fundamenta tal denominação?
A Monitora acredita que essas perguntas não tem uma resposta correta, mas
vamos comentar e debatê-las.
O estado é uma comunidade humana que reivindica o monopólio legítimo do uso
da força física dentro de determinado território (Aqui território é umas das características
do estado, especificamente no presente). O direito de usar a força física só é atribuído a
outras instituições ou outros indivíduos, na medida que o estado permita.
O estado é tido como única fonte do direito de recorrer à violência, assim,
consequentemente, a política significa a luta de compartilhar poder entres estados ou
grupos de estado.
O estado moderno se baseia em uma forma específica de dominação. Weber diz:
A justificação interna do Estado Moderno é a crença na validade do estatuto jurídico e da
competência funcional com base em regras racionalmente criadas (Weber 1970, p.78/79).
Todavia, o Estado moderno ainda é uma associação compulsória que organiza a
dominação (Weber 1970, p. 82).
Entendendo melhor o parágrafo acima: nós somos livres, iguais e firmamos um
contrato social, no qual abrimos mão dos nossos interesses pessoais para alguém governar
em prol do coletivo.
Weber ainda criou o conceito alemão Weber criou o conceito de Herrschaft, às
vezes traduzido como “controle imperativo”, mas para o qual “dominação” talvez seja a
tradução ideal, e para ele ideia particular de Herrschaft legítima implica a legitimidade
de comando ou de autoridade. Para manter a autoridade política, o poder baseado
exclusivamente na força física é tanto instável quanto ineficaz. É importante obter a
dominação legítima.
Entendendo o parágrafo acima: o poder que se funda sobre a violência e coerção
é um poder fraco. É forte quando obedecemos voluntariamente, quando moldamos nossas
referências a essas normas O estado moderno é uma organização que monopoliza o uso
da violência, mas o estado precisa de dispositivos de governo; produzir comportamentos
conformes à norma disciplinar. Isso pode se dar por meio da burocracia
(institucionalização do poder do estado). Nesse estado moderno, os indivíduos
interiorizam uma regra de dever profissional e se comportam conforme as formas.
Para Weber a coerção é fundamental ao poder do estado, mas não há garantia que
o poder seja estável ou efetivo quando ele se basear exclusivamente na coerção. É
importante ter uma dominação legítima, isto é, a probabilidade de que um comando, que
tem determinado conteúdo específico, seja obedecido por um determinado grupo de
pessoas.
Weber está enfatizando o fato que a mera submissão ao comando pode ser
decorrente do hábito, ou da crença da legitimidade do comando ou pelas considerações
de conveniência. No estado moderno os comandos da elite política se baseiam não apenas
na disposição dos sujeitos em submeter-se a eles, mas no reforço de um corpo de
assistentes que assegure a conformidade com os comandos em relações aos quais esse
próprio corpo possa agir com base no hábito, ou na legitimidade ou no interesse próprio.
Herrschaft, então, é uma estrutura de subordinação de líderes e de ideários, de
governantes e governados, numa variedade de motivos e de meios de imposição. Mesmo
a dominação legítima implica em dois lados: A legitimidade - que é a autoridade - e Força
- que é a coerção.
Weber propõe 3 tipos ideais de autoridade:
1. Autoridade tradicional: tem por base uma sólida crença na santidade de
tradições imemoriais e na legitimidade do status dos que exercem
autoridade nesse contexto.
2. Autoridade carismática: tem por base a devoção, a santidade e o heroísmo,
específicos e excepcionais de um indivíduo, ou a seu caráter exemplar e
dos padrões normativos ou da ordem revelada ou estatuída por ele. Foi
muito comum na idade média quando os reis eram representantes de Deus
na terra.
3. Racional - legal (típica da idade moderna): tem por base uma afirmação
de bases racionais uma crença na legalidade dos padrões de preceitos
normativos no direito daqueles aos quais se delegou a autoridade de emitir
comandos sobre tal sistema de regras. Isto quer dizer, que quando a gente
fez o pacto racional, a gente delegou autoridade para o governante, e este
vai emitir comandos sobre um sistemas de regras que foi previamente
estabelecido e tido como obrigatório.
Por que os homens obedecem as normas? Em que justificativas internas e meios externos
se fundamenta tal denominação?
A modernidade presenciou o desenvolvimento dessa autoridade política racional.
Enquanto a maior parte da existência humana a legitimidade dos sistemas sociais se
fundaram sobre elementos tradicionais, mágicos ou religiosos, a sociedade moderna
parece fundar-se sobre uma autoridade que havia ela própria se tornado racional. Era
entendida como uma forma confiável de estruturação social, que permitia a integridade
funcional de uma sociedade ou organização social.
Weber diz que isso depende de certos fatores. Ele fala que isso depende de um
código jurídico constituído por normas jurídicas estabelecidas por consenso (todos
aceitaram) ao por imposição (por razões de conveniência, ou valores racionais, ou os
dois).
Esse código, por normas de concessão ou imposição de normas jurídicas, chama
a si o direito a obediência para a maioria dos membros da sociedade.
Outro fator que Weber acha importante nesse estado moderno é um sistema
logicamente coerente de regras abstratas que se aplicam a casos particulares.Portanto,
uma ordem social existe dentro de limites estabelecido por preceitos legais e sgue
princípios, quais sejam capazes de formulação generalizada.
Outro ponto de relevância para Weber é o protótipo do indivíduo que detém a
autoridade, que exerce uma função pública visível por todos. Esse indivíduo define suas
responsabilidades, a pessoa pode ser desde um funcionário público até o presidente. Estes
se submetem à regulação da lei.
Weber também destaca que a pessoa que obedece a autoridade só faz em virtude
de ser membro do grupo, ou seja, essa pessoa obedece porque é a lei que detém a
autoridade e não a pessoa.
A obediência não é devida aos titulares dos cargos públicos enquanto indivíduos
separados, mas sim decorrente da função atrelada ao estado que ele exerce.
O direito prevê uma estrutura formal que faz exigências bastante precisas, se
administrado racionalmente assegura que podemos ver o resultado da nossa obediência.
Dessa forma, a estrutura jurídico racional sanciona o elemento de cálculo na autoridade
jurídico racional.
Aula 12- Mudança social e crítica do direito (Obs: aqui é a aula da semana 5 na
ementa)
A primeira coisa que emerge falando da crítica do direito de Marx é a posição
liminar a respeito do discurso que ele ocupa a respeito do discurso jurídico moderno.
Apesar de Marx fazer filosofia, ele não pode ser identificado com a sociologia ou
filosofia, mas ao mesmo tempo Marx transforma, radicalmente, o modo de pensar e fazer
a filosofia e a sociologia. E também mudou a forma de pensar a categoria jurídica na sua
relação com a economia e política.
Marx é um pensador do limite, isto é, ele pensa radicalmente e leva o pensamento
ao próprio limite, ao ponto no qual o pensamento se contamina com as práticas sociais.
Nesse sentido, Marx leva as disciplinas tradicionais ao próprio limite discursivo, ou ao
ponto no qual para fazer sociologia;filosofia; economia política para além de Marx e
mesmo contra Marx tem que-se assumir a posição de Marx. Em outras palavras, pode-se
dizer que Marx representa uma passagem decisiva, que nos constrange (?) a repensar as
categorias, com as quais pensamos e agimos, com Marx e para lá de Marx.
Se a primeira questão era a posição liminar de Marx a respeito do discurso político
jurídico da modernidade, a segunda questão é a da liminar do direito ocupa na construção
teórica e prática do Marx. Ao contrário de todos os outros pensadores estudados até aqui,
Marx não construiu um corpo teórico/específico sobre o direito. Além de alguns artigos
escritos para o jornal liberal “A gazeta romana”, Marx trata diretamente do direito na sua
crítica a filosofia do direito público.
A tese do professor é que apesar da posição marginal que ocupa o direito na crítica
marxiana da sociedade moderna, o direito tem sempre uma função expressiva. Expressiva
no sentido de que o direito expressa um conjunto complexo de processos nos quais
aparecem as contradições da vida social capitalista. É um caso que Marx fala do direito
também nos escritos chamados da maturidade, no qual fala do direito quando se está
tratando de temas fundamentais, como, por exemplo, no capital fala do fetichismo (?) da
mercadoria, um dia de trabalho de 8hrs, da cumulação originária. Então, o direito também
tem um papel importante, apesar da composição marginal da sua obra complexa de Marx.
Qual é o papel importante do direito nestes textos e no pensamento de Marx
em geral? O direito ocupa um lugar bastante interessante. Por um lado é um instrumento
de repressão, de domínio de classe, e por outro lado ele expressa instrumentos das lutas
sociais. Então, pode-se dizer que o direito é um instrumento da repressão e do domínio
de classe, mas também é o instrumento das lutas, assim, pode-se dizer que apesar da sua
posição marginal; o direito assume um papel importante na análise Marxiana para
compreender o funcionamento do capitalismo e, portanto, para compreender o
funcionamento da sociedade moderna.
Ambiguidade do direito
Pode-se dizer que o direito tem uma posição ambígua, pois por um lado é
manifestação das estruturas econômicas/sociais e por outro lado o direito produz novas
formas sociais.
A partir da análise acima, pode-se dizer que Marx propõe uma teoria constitutiva
do direito na modernidade, isto na tese do professor. O direito opera em um conjunto
complexo de processos tanto como reflexo, um produto das formas sociais, quanto como
força produtiva que permite a existência destas formas.
Questões
1. Metodologia da pesquisa de Marx, ou seja, desenvolver a questão da
crítica como práxis. Essa questão terá haver com as seguintes coisas:
1. Dimensão Prático-política da teoria;
2. Dimensão Teórica da prática política;
3. Materialismo histórico como teoria e prática das lutas sociais.
Esta metodologia determina um repensamento radical da crítica e, portanto, da
filosofia.
2. Ambiguidade do direito moderno e do discurso dos direitos. Em primeiro lugar, a
respeito do direito moderno, a questão é de construir a categoria jurídica e seus
pressupostos: os indivíduos livres e iguais da tradição jusnaturalista e da tradição
jusracionalista do século XVII, XVIII e XIX. A igualdade, como variável, depende da
liberdade, e a liberdade é pensada exclusivamente como autonomia de singularidade
independentes e separadas. Desta forma, Marx nos permite entender o funcionamento do
direito moderno dentro da dialética social.
a. Dialética social: o direito opera e funciona na sua ambiguidade.
b. Os direitos têm uma função emancipatória? Se sim, de qual emancipação estamos
falando? Essas últimas questões serão analisadas na próxima aula, no texto de Marx sobre
a questão judaica.
Teoria da conjuntura
O pensamento de Marx é indisciplinado, que muda, se transforma e se renova
continuamente em relação às transformações da realidade social. A teoria em Marx nunca
é especulação, ele diz que a teoria nunca pode ser pura, mas ela opera dentro de condições
históricas sociais dadas, isto é, a teoria é sempre dada a conjuntura.
Dizer que a teoria não pode ser pura, mas que acontece dentro de condições
históricas e sociais, não significa, necessariamente, cair no positivismo determinista. Não
significa dizer que as teorias são simplesmente reflexos das condições materiais e
econômicas, mas ao contrário, em Marx as condições materiais da existência e da
experiência não são naturais e sim históricas e sociais. Essas duas últimas, significam que
são resultado das lutas, da força de uma batalha, do efeito de um embate de forças
contrapostas (diria Nietzsche), o resultado da luta de classes.
Se é verdade que os homens agem e pensam nas condições históricas e sociais
dadas, é igualmente verdade que com as lutas as transformas e as mudam. Então, a teoria
de Marx é parte da luta e não apenas seu reflexo passivo. Deste ponto de vista, pode-
se dizer que tem uma convergência bastante entre Marx e Nietzsche por um lado, e entre
Marx e Foucault por outro lado.
Esse ponto de convergência é a teoria como práxis, isto é, as teorias e os discursos
são, imediatamente, práticas sociais de transformação. Não simplesmente expressão das
lutas sociais, mas as teorias e os discursos são imediatamente lutas. O mesmo sujeito
não preexiste a história, as condições sociais/materiais. O sujeito não é um dado natural,
um dado pré-lógico e pré-social, como pensava, por exemplo, hobbes. Mas ao contrário,
o sujeito é resultado histórico das lutas, o mesmo sujeito da história, o proletariado, estão
dentro das quais se estruturam como classes sociais.
A teoria de Marx é prática de transformação do mundo, é imediatamente luta,
estas são práticas de subjetivação do sujeito que é resultado histórico das lutas. Portanto,
não pode-se entender nada da teoria de Marx sem entender que ela é práxis, isto é, prática
de transformação do mundo, e este é resultado da praxe humana e social (entre homens e
natureza). Não pode-se entender, também, nada de Marx se não se entender que as lutas
são práticas de subjetivação, ou seja, são práticas para se tornar sujeito da própria história.
Neste ponto, o professor acha que se tem uma relação entre o pensamento de Marx e o de
Foucault. É como se este retomasse essa questão do discurso como prática social não com
Nietzsche, mas também com o pensamento de Marx, ou seja, da ideia da teoria como
praxe social.
Pode-se abrir essa questão da práxis com a seguinte proposição de Marx: “os
homens fazem sua própria história, mas não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e
sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas pelo
passado…” (Dezoito de Brumário De Louis Bonaparte - 1852). Tem que se dizer que
recusar a classificação do pensamento de Marx significa colocar o foco da análise sobre
a dimensão prático e política.
O professor acha importante que uma rígida classificação disciplinar que qualifica
Marx como filósofo poderia ser feita, e foi feita, dividindo a produção Marxiana em fases
bem distintas e imaginados estas fases correspondentes a interesses disciplinares e
distintos e distintos. Portanto, teria-se a fase dos escritos juvenis (ao qual corresponde a
um Marx filósofos do direito, humanista e liberal), a fase dos escritos da maturidade (ao
qual responderia um Marx economista, sociólogo, positivista e até comunista). Agora
estas classificações determinam uma simplificação e problemática, pois reduz o
pensamento de Marx por um lado a um idealismo Hegeliano e por outro lado a um
positivismo sociológico da metade do século XIX.
Por um lado Marx não teria uma diferença da metodologia de Hegel, seus escritos
seriam a expressão de um movimento interno à filosofia de Hegel e ao idealismo da
esquerda hegeliana. Entretanto, nesses escritos não existia uma metodologia crítica e
autônoma a respeito de Hegel. Por outro lado, esta divisão comportaria a teoria econômica
de Marx, seria ciência na medida que consegue ser análise objetiva do capitalismo, ou
seja, na medida a qual consegue se libertar a própria ideologia política. Então, Marx seria
simplesmente um cientista social, um economista, um historiador que analisa
detalhadamente o funcionamento da sociedade moderna e do capitalismo.
Tanto no caso do filósofo hegeliano liberal quanto no caso do Marx cientista
positivista, a diferença de Marx (singularidade subversiva) seria normalizada e reduzida
dentro de uma imagem reconfortante. Uma filosofia crítica mais liberal e humanista, ou
o positivismo sociológico determinista mais depurável da crítica política à sociedade. O
professor acha que os dois positivismos determinar a compreensão incompleta da
dimensão prática - política do pensamento Marxiano, ou seja, da metodologia de crítica
radical do presente pensamento de Marx que não é um pensamento de um filósofo
qualquer, mas é o pensamento de um filósofo que revoluciona a modalidade de fazer
filosofia/sociologia.
Esta revolução que Marx traz dentro do discurso filosófico moderno é baseada na
sua ideia de praxe, na reconfiguração da relação entre a teoria e a praxe social. A
ideia de crítica em Marx não pretende ser uma descrição correta e verdadeira do mundo,
mas sim um instrumento da luta social e o materialismo histórico a nova praxes (este
determina uma reuptura com o pensamento hegelianos e com o positivismo sociológico
do século XIX), ou seja, imediatamente luta política.
Crítica
Em 1845 Marx encontrou o proletariado alemão e o francês. Este encontro é
importante para Marx rever suas posições teóricas através de uma perspectiva de uma
prática política. Neste mesmo ano, Marx escreve a “Ideologia Alemã”, no qual, junto com
Hegel, definem uma nova metodologia de análise crítica do presente.
Materialismo histórico: filosofia, direito, religião são interpretações do mundo
que não desenvolvem resposta a exigências de coerências internas, ou em virtude de seu
próprio desenvolvimento. Mas é ao contrário, sendo objetos determinados a partir do
desenvolvimento das forças produtivas que os homens são inseridos. Agora pode-se
entender efetivamente a tese 11ª sobre Feuerbach: os filósofos se limitaram a interpretar
o mundo, agora se trata de transformá-lo.
Em 1847 Marx e Hegel, que estão trabalhando para constituir o partido comunista
e pensando na iminência da revolução, escrevem “Manifesto do partido
comunista”. Nesse texto, Marx está construindo ao mesmo tempo o materialismo
histórico como teoria e como prática.
A primeira questão é que esse manifesto é a manifestação da ideia do materialismo
histórico como praxe e isto aparece, já na forma escolhida (?) por Marx e Hegel, como
um discurso performativo que quer transformar as relações sociais colocando o próprio
discurso dentro de um conflito político e social.
A segunda questão é que esse manifesto não é simplesmente a manifestação
prático política da teoria do materialismo histórico, mas também estão dizendo que cada
movimento da cultura é também um movimento da barbárie, isto é, a cultura pode
funcionar através daquela formação para a máquina que significa a transformação do
proletariado em máquina. Através da exploração do trabalho vivo, do domínio técnico da
natureza, do domínio da população, da produção da riqueza socialmente produzida. Por
isso, cada momento da cultura é um momento da barbárie. Segue uma passagem para
melhor entendimento:
“A cultura (Bildung) cuja perda o burguês deplora, é, para a imensa maioria dos
homens, apenas um adestramento que os transforma (Heran Bildung)..." (Manifesto
comunista, 1847).
Sociedade Moderna
1. Se baseia sobre a troca da mercadoria;
2. A mercadoria como objeto da troca no mercado é o trabalho: o trabalho é
também um elemento essencial para a produção. Então, é a mercadoria que
permite ligar a esfera da circulação com a esfera da produção.
3. A mercadoria, a coisa, objeto da troca, ou seja, o trabalho, é uma das partes
sociais entre as quais acontece a troca. Ou seja, a mercadoria, objeto da
troca, é um sujeito, o trabalhador. Ele é ao mesmo tempo sujeito e objeto da
troca: o capitalismo é uma objetificação da subjetividade humana.
4. O trabalhador no sistema capitalista é objetivado como mercadoria que pode
ser comprada no mercado.
5. A mercadoria “trabalho” é necessária para permitir a produção.
6. Os sujeitos da troca e da produção devem ser pensados como livres e iguais:
livres no sentido de vender e comprar mercadoria no mercado, e iguais como
possuidores de bens.
7. Livres de vender e comprar;
8. Iguais como possuidores de bens, o capitalista do capital, o trabalhador da
força de trabalho.
9. O contrato é a forma através da qual acontece a troca entre sujeitos jurídicos.
O direito, portanto, tem uma dupla função, pois expressa um conjunto de forças
que ao mesmo tempo reflete as relações capitalistas quanto as torna possíveis. Esta dupla
função se manifesta na capacidade de o direito destruir as formas antecedentes de
sociedade e de construir as formas nas quais se manifestam as relações sociais econômicas
na sociedade capitalista. O direito racional formal é a manifestação e a expressão perfeita
da sociedade capitalista. E não é uma expressão simplesmente passiva das relações
econômicas e sociais, mas é também ativa, pois muda; constrói; legítima.
Este direito é simplesmente a manifestação ativa e passiva das relações sociais
existentes na sociedade capitalista moderna? ou é também instrumento de luta de
transformação social? Isso será analisado na próxima aula, quando se for ler o texto de
Marx sobre a questão judaica.
-O direito tem uma função expressiva, no sentido que o direito expressa um conjunto
complexo de processos nos quais aparecem as contradições da vida social capitalista.
-O direito permite a manifestação das estruturas econômicas e sociais o direito produz
novas formas sociais e como discurso dos direitos e constitui forma de articulação e
manifestação das lutas sociais.
-Marx tem uma teoria constitutiva do direito na modernidade. Ou seja. toda aula passada
estava centrada nesse ponto. O direito opera em conjunto complexo de processos como
reflexo como força produtiva que permite a existência dessas formas.
-O direito constitui o sujeito moderno político de duas formas:
-Destrutiva = implica que o direito tem que destruir a harmonia social a concepção
orgânica da sociedade feudal. destruir o antigo espaço social., organização
humana.
-Construtiva = a decomposição dessa estruturas tradicionais se criou o indivíduo
isolado e ao mesmo tempo trabalhador e consumador. Isolado de sua autonomia
racional. o ser humano pensado na modernidade como pessoa jurídica, a condição
necessária que o próprio ato de troca possa acontecer
Contexto histórico social que começa se delinear o problema de emancipação dos judeus
-desenvolvimento da economia capitalista
-afirmação do estado representativo moderno
-a consequente crise feudal
Para Bauer a emancipação política só poderia ser parcial até que houvesse uma
renúncia as crenças religiosas portanto os judeus não deveriam ter direito civis e políticos
até que renunciasse a ser judeus. Os judeus portanto tiveram que emancipar deles
mesmos, da sua natureza particular e lutar primeiro q=contra a própria religião para
depois conquistar os direitos políticos
Marx presumindo a posição de Bauer escreve que temos que emancipar nós
mesmo antes de emancipar os outros. A forma mais cristalizada de antagonismo entre o
jedueu e o cristao é o religioso e como se supera o antagonismo? tornando-o impossível,
superando a religião.
Então o problema para marx não é de natureza teleológica como pensa Bauer, mas sim
de natureza econômica e política, na sociedade moderna o dualismo entre o mundo
terreno e mundo celestial tem sua base material nos diz marx na cisão entre homem
político e homem privado e entre o estado político e sociedade civil. POrtanto, escreve
marx, que a emancipação política em relação a religiosa permite que a religião subsiste
ainda que não se trata de uma religião privilegiada. A contradição que se encontra o
adepto de uma religião em particular com sua cidadania em que apenas uma parte da
contradição secular universal entre o Estado político e a sociedade burguês
consequentemente o homem não foi liberado da religião mas ganhou essa liberdade da
religião. Ele não foi liberado da propriedade, mas ganhou essa liberdade da propriedade.
Para Marx não é suficiente a emancipação política ele quer uma emancipação
que não seja só política, mas também uma emancipação social que não seja irreal. A
emancipação política é irreal pq produz continuamente o dualismo entre burguês e
citoyen
a questão concerne portanto a forma religiosa de um dualismo que por um lado se
configura em um universalismo irreal do estado com o poder oposto ao indivíduo e
como dominação do ordinário como forma de vínculo social oposto aos indivíduos.
Os droits de l’homme, os direitos humanos, são diferenciados como tais dos droits du
citoyen, dos direitos dos cidadãos.
Quem é esse homme que é diferenciado do citoyen? Ninguém mais ninguém menos que
o membro da sociedade burguesa. Por que o membro da sociedade da sociedade
burguesa é chamado de “homem”, pura e simplesmente, e por que os seus direitos são
chamados de direitos humanos? A partir de que explicaremos esse fato? A partir da
relação entre o Estado político e a sociedade burguesa, a partir da essência da
emancipação política.
Antes de tudo constatemos o fato de que os assim chamado direitos humanos, os droits
de l’homme, diferentemente dos droits du citoyen, nada mais são dos que os direitos do
membro da sociedade burguesa, isto é, do homem egoísta, do homem separado do
homem e da comunidade
A egalité, aqui em seu significado não político, nada mais é que igualdade da
liberté acima descrita, a saber: que cada homem é visto uniformemente como mônada
que repousa em si mesma.
Até aqui, Marx conduziu uma crítica radical aos discurso dos direitos e do
projeto jurídico moderno. Ele desconstrói pedaço por pedaço do discurso político
jurídico da modernidade.Muitos intérpretes marxistas leem esse texto da questão judaica
como uma crítica destrutiva ao discurso dos direitos. Eles falaram que mArx considera
o discurso dos direitos como um discurso ideológico que simplesmente do discurso do
domínio de classe. Os direitos tem só uma função, ideológica que consiste em esconder
o domínio de classe. São instrumentos da dominação de uma classe sobre outra, sem
poder emancipatório.
Para o professor, se é verdade que Marx critica a teoria dos direitos ele
reconhece ao discurso dos direitos a capacidade de agir praticamente, politicamente ou
universal que os pertence. Tem que lembrar também do local de fala do Marx é uma
crítica que quer ser universal, contesta a emancipação política pq é irreal e não consegue
alcançar o que se promete.
Para Marx não se trata de desmascarar o conteúdo que se esconde na forma de
enunciação dos direitos, mas verificar a capacidade de uma emancipação universal isto
é articular relações socioeconômicas reais por meio de sua progressiva politização
os direitos não são apenas a manifestação passiva, mas há uma função ativa é
ligada a dimensão de luta, política e liberação que pertence aos discursos do direito.
. Rousseau: -> “o contrato social” - neste texto ele ressignifica o conceito de povo e a
relação entre direitos e estado.
No contrato social Rousseau diz que devemos nos perguntar: como um povo pode
ser povo? E não apenas como um povo pode ser soberano.
O problema para Rousseau não é apenas a justificativa do poder supremo.
O povo em Rousseau é uma multidão insurgente. Nesta perspectiva varia algumas
reflexões:
- Ideia de nação que é a ideia de cidadania dos revolucionários franceses Jacobinos,
não tem nada a ver com o conceito de pertencimento; mas sim com o ato de liberação
que a multidão realiza em conjunto.
Até aqui, a gente tentou evidenciar as linhas ao longo das quais o discurso jurídico-
político moderno se desenvolveu. Em segundo lugar, a gente quis analisar os conceitos
ao redor dos quais este discurso construiu a própria semântica. Enfim, a gente quis
compreender como a semântica está implicada com o poder e como poder é tal porque
tem uma semântica. Exatamente este último ponto é o tema sobre o qual trabalha
Foucault, e, portanto, para entender isso precisamos da ajuda do filósofo francês.
Então até agora a gente não quis descrever mais ou menos, analiticamente,
pensadores, conceitos, teorias; mas a gente quis mostrar como o discurso – no nosso caso
um discurso jurídico, político moderno – é um complexo de práticas discursivas, e não
práticas que constituem sujeitos e objeto de conhecimento; mas que constituem sujeitos
e objetos de poder.
O discurso jurídico, portanto, opera, ao mesmo tempo, no nível do poder e, ao
mesmo tempo, no nível do saber. No nível do poder, o discurso funciona e opera sempre
produzindo efeitos de poder. No nível do saber, o discurso legitima os efeitos do poder
que produz através da referência a verdade. Tem uma coisa interessante, que é que esse
discurso jurídico e político moderno do saber se estrutura com relação ao poder; e o poder
se estrutura com relação ao saber. Em outras palavras, podemos dizer que o poder para
funcionar precisa de uma semântica, de um saber, de um apelo a verdade, e vice versa.
Parece evidente como o discurso de verdade, como o discurso do saber, na sua auto
apresentação, na verdade, produz efeitos de poder significantes.
Chegamos à pergunta: por que Foucault? O pensamento de Foucault nos permite
entender exatamente esta coimplicação entre saber e poder na constituição da sociedade
moderna e no funcionamento do direito. Temos aqui 2 consequências relevantes para nós.
A primeira diz respeito à crítica: como a crítica pode ser crítica? A segunda diz respeito
ao poder: como funciona o poder?
A crítica é um esforço cujas condições de fala são contingentes e históricas e,
portanto, infundadas. um discurso situado, sempre capturado tem outro das relações de
poder. Agora, se o discurso crítico não é um discurso de fora, mas é parte do mundo que
quer descrever e criticar, como a crítica pode ser crítica? Se a verdade é sempre parcial –
perspectiva, como diria Nietzsche –, contingente, resultado de uma batalha, qual é o
fundamento da crítica? Qual a sua relação com a verdade? Qual é o fundamento da crítica,
qual a sua relação com a verdade, se a verdade é sempre parcial?
Outra consequência, como estávamos dizendo antes, nos diz respeito ao poder:
como funciona o poder? Então, agora, através de Foucault, a gente conseguiu entender
como o poder precisa de uma semântica. O que significa que o poder precisa de uma
semântica? Significa que o poder escreve algo, qualquer coisa em um horizonte de
sentido. O sentido é um fenômeno relacional, da relação e do relacionar-se. Só há sentido
em uma relação.
O poder, portanto, é inscrito em um horizonte de significado para poder orientar
de modo efetivo o processo de compreensão e ação. Aqui, também Weber concorda. Para
Weber, o poder é inscrito em um horizonte de significado; ele precisa formar um
horizonte de significado para poder orientar de modo efetivo o processo de compreensão
e ação. Então o poder obtém estabilidade só quando aparece sob a iluminação do sentido
e do razoável. Até aqui, chega também Weber, quando fala do processo de racionalização
de um poder formal. Mas, para Foucault, esta racionalidade, este significante que pertence
ao poder, não é atribuído pelo indivíduo. Não é o indivíduo quem atribui significado ao
poder e, portanto, o poder tem um significado. Mas é o contrário: o poder constrói
indivíduos e sujeitos como indivíduos normais, plasmados, conformes a exigências do
poder.
Se tudo isto é verdade: “o poder precisa de uma semântica”; “o poder precisa de
um horizonte de sentido”; “o sentido é algo relacional”; “o poder tem que ser racional”;
“essa racionalidade permite a produção de subjetividades, sujeitos conformes, normais,
disciplinados”; então o poder não pode mais ser descrito como unitário, como vertical,
como centralizado, como macrofísico. Tem de ser descrito como poder difuso, horizontal,
periférico. A imagem do Leviatã não funciona mais para descrever o poder no mundo
moderno. Então a hipótese de Foucault – a que ele trabalha na sua segunda fase de
produção – é repensar completamente o poder, fora da imagem do poder como poder do
soberano, do Leviatã. A gente falou bastante da imagem do Leviatã, que foi a imagem do
poder por muito tempo. Essa imagem não corresponde ao poder na idade moderna. Temos
que superar essa representação do poder como poder do Leviatã, como poder do
soberano.
Há mais dois pontos que quero desenvolver. O primeiro é uma crítica e o segundo
é sobre o poder. Como podemos fazer a crítica quando o discurso da crítica está fora do
mundo? Como podemos fazer uma crítica a um mundo existente, se não temos um lugar
fora desse mundo, que nos permite um distanciamento para observar e criticar? Portanto,
como pode acontecer a crítica, como a crítica pode ser críticaa?
A segunda questão, é sobre como o poder funciona. Esse poder macrofísico que
se identifica com o Leviatã, esse poder que se expressa num comando da lei do soberano
é um poder que funciona através do sentido, inscrevendo algo num horizonte de sentido.
Como podemos descrever esse poder que claramente vai além da imagem do poder
unitário, centralizado, do comando, da lei, do poder como repressão e interdição?
O ponto de partida para entender as duas questões que coloquei agora, é a hipótese
fundamental de Foucault: o racionalismo é expressão de uma vontade de dominação
através da técnica. As ciências humanas e sociais que nascem e se desenvolvem a partir
do século XIX, como a antropologia, a sociologia, a criminologia e a psicologia são
centrais para desenvolver este projeto de assujeitamento. O saber não é independente do
poder, mas saber e poder são aliados. O poder precisa de um discurso de verdade; e os
saberes, os discursos de verdade, produzem efeitos de poder.
O ponto fundamental para entender a ideia de crítica de Foucault diz respeito a
tradição que pensava a crítica de uma forma, podemos dizer, kantiana. (??? min 15.14)
A metodologia que permite pesquisar a relação entre o saber e o poder, e a
genealogia do poder, é interna. E como a gente vai ver mais para frente, como Foucault
retoma esta ideia de Nietzsche, que é bastante simples: o ambiente institucional, no qual
os discursos são produzidos, são fatos linguísticos de práticas sociais, fáceis de conduzir
a vida real e sujeitos específicos de poder.
Portanto, saber e poder não são duas coisas diferentes, opostas, como filosofia, à
metafísica desde Platão. Nesta concepção de metafísica, o saber se opõe ao poder,
constitui um limite aos abusos de poder. A figura de Sócrates é representativa de um saber
sem poder, contra um poder sem saber. Por isso, Sócrates foi assumido como um herói
do discurso filosófico. Como todos os heróis, a filosofia rapidamente esqueceu a sua
mensagem efetivamente revolucionária. E, paralelamente, em Foucault, em seu último
curso no Collége de France, sente a vontade de voltar a figura de Sócrates. Ele disse uma
coisa bastante interessante; ele não era um filósofo, mas, na última fase de sua vida, sentia
a necessidade de falar sobre Sócrates. Dessa forma, ele disse às pessoas que era um
filósofo, porque cada filósofo, pelo menos uma vez na vida tem que fazer um curso sobre
Sócrates. Foucault, em um curso maravilhoso sobre a coragem e a verdade, volta a figura
de Sócrates e o pensa diferentemente, não mais a figura do saber contra o poder, mas
como a figura da paroisias – coragem da verdade. Não se trata da verdade lógica da
filosofia, a verdade como correspondência entre o pensamento e as coisas, a verdade da
metafísica. Não, a verdade de Sócrates, a verdade de Foucault, a verdade sobre a qual
Foucault, que está doente, está morrendo de aids, era a verdade como escolha ética, de
luta contra um poder mentiroso. Então pairosias é a pessoa que tem a coragem para dizer
a verdade, estando a própria vida contra o poder que é um poder mentiroso. É uma verdade
que não tem nada a ver com a verdade do poder no sentido nobre da palavra. A verdade
de um poder que afirma a própria verdade científica, por exemplo. Mas a verdade como
escolha ética, como luta; que é muito diferente.
Voltemos ao assunto principal desta aula. Saber e poder são aliados, se
coimplicam. Esta ideia tem algumas consequências que são relevantes para nós. Primeira,
o discurso não é neutro, mas constituem relações de poder. O discurso é um conjunto de
fatos linguísticos em um determinado nível, e polêmicos e estratégicos em outro. O
discurso não é simplesmente aquilo que traduz ou reflete as lutas e os sistemas de
dominação. O discurso é aquilo para o quê e através do quê se luta, o discurso é o poder
que se quer conquistar. Esta última observação é bastante significativa para entender
como os discursos têm uma relevância porque tem efeitos no poder e são utilizados
também como instrumentos de resistência.
Outra consequência relevante para nós é que o sujeito da tradição filosófica e
jurídica moderna se descobre ser periférico, plural. Não há condição, mas condicionado.
Foucault quer questionar o ponto central do pensamento moderno, cuja centralidade está
no sujeito. De Descartes até Husserl, o sujeito é a condição de possibilidade do
conhecimento e da verdade. Kant nos diz que o sujeito é a condição transcendental.
Condição transcendental significa que temos que pressupor a existência do sujeito para
poder pensar o conhecimento e a verdade. Segundo Kant, o mundo não se oferece ao
sujeito como entidade ordenada e objetiva. Mas é o sujeito que contribuía para ordenar o
mundo com a própria razão. A experiência de mundo, segundo Kant, estava organizada
segundo mecanismos que estruturam o funcionamento da razão. Kant fala de condição a
priori. Para Kant, a razão moderna funciona para todos do mesmo modo, universal.
Agora, Foucault, por meio de Nietzsche, pensou a linguística de Saussure, bem
como a antropologia, visando descontruir radicalmente esse sujeito universal e abstrato.
A questão é como pesquisar como se constitui através da história esse sujeito. Como esse
sujeito está implicado nas relações de poder. Não é um sujeito abstrato, condicionado.
Marx fala, no capital, do sujeito jurídico, aquele que permite a troca no mercado, mas que
esconde atrás desse sujeito abstrato todas as diferenças. Esse sujeito que se constitui por
meio da tradição filosófica moderna e do discurso jurídico e político, na verdade, é um
sujeito que se constitui na história. Marx, no capital, fala como esse sujeito do
capitalismo, esse sujeito jurídico, é construído através da exploração, através do
desmatamento, através da colonização das américas. Assim, Foucault visa descontruir
radicalmente esse sujeito universal e abstrato da tradição metafísica moderna. A questão
é pesquisar como se constitui através da história este sujeito.
Vamos ao ponto: como pode ser a crítica? A crítica, para Foucault, deve ser
arqueo-genealógica. O que é isso? O termo arqueologia é retomado de Kant. Kant usa o
termo arqueologia para indicar a história do que torna necessário uma forma de saber. Ao
contrário disso, a crítica arqueológica de Foucault quer mostrar o caráter contingente do
que é representado como homogêneo, necessário, universal. Esta é a grande descoberta
nietzscheana: não temos nenhuma relação de necessidade, tudo é contingente. A
arqueologia, portanto, deve fazer emergir as condições de possibilidade daquilo que é
pensado e dito.
O termo genealogia é retomado de Nietzsche, e tem como tarefa uma wirliche
Historie, uma história real. A ideia é fazer emergir as condições materiais, as batalhas, os
conflitos de onde nascem os discursos, os conceitos, as ideias. Ou seja, os discursos
passam a ser resultado de um jogo de poder.
Este é um trecho que Foucault escreve em um artigo chamado “o que é
iluminismo?” – mesmo título de um outro texto publicado por Kant (1784) –, em que faz
uma reinterpretação do texto de Kant, para pensar de uma forma diferente o conceito de
crítica. Vocês sabem que o conceito de crítica é uma completa repetição no começo da
modernidade da noção de Kant, que era estabelecer os limites da razão. Para Kant, para
poder separar, distinguir a filosofia como ciência, e a filosofia como pensamento
metafísico, teológico, temos que estabelecer os limites da razão. Então, a filosofia
enquanto ciência não pode se perguntar sobre a ideia de Deus, porque esta pergunta não
pode ter uma resposta, pois vai além da possibilidade do conhecimento humano. A gente
pode conhecer só através do sentido. E o intelecto tem a tarefa de ordenar os dados que
percebemos através dos sentidos. Mas há ideias puras que não podemos conhecer através
da razão, mas temos que pressupor como condições transcendentais para podermos pensar
e conhecer. Então, para Kant, a crítica é estabelecer os limites da razão. Mas, para
Foucault, não é suficiente, naturalmente. Então temos de ir além de Kant, além da ideia
kantiana e moderna de crítica, pois, neste caso, é sempre uma ideia transcendental, que
pressupõe a existência de um fundamento, de algo universal a partir do qual podemos
pensar, descrever e criticar o mundo.
Para Foucault, tudo é contingente. A própria noção é crítica é contingente e,
portanto, sem fundamento. Então não podemos pressupor um lugar fora do mundo,
porque o próprio mundo é contingente. Ou a gente pensa a existência de um lugar fora do
mundo a partir do qual podemos fazer a crítica, ou temos que pensar que a crítica é
infundada.
Então este é um trecho que eu acho muito interessante, muito potente e que
expressa perfeitamente a ideia de crítica de Foucault. Vamos discutir juntos:
“[...] tal crítica não é transcendental e não se propõe a tornar
possível uma metafísica: é genealógica na sua finalidade e
arqueológica na sua metodologia. Arqueológica – e não
transcendental – no sentido que não tentará aprender as estruturas
universais de cada conhecimento e de casa ação moral possível;
mas tentará tratar os discursos que articulam o que pensamos,
dizemos e fazemos como tantos outros eventos históricos. E tal
crítica será genealógica no sentido que não deduzirá que nos
impossível fazer ou conhecer algo a partir daquilo que somos; mas
colherá, na contingência daquilo que nos fez o que somos, a
possibilidade de não ser mais, de não fazer ou não pensar mais
naquilo que somos, fazemos ou pensamos.
Ela não busca tornar possível a metafísica transformada finalmente
em ciência; mas tenta relançar para o mais longe possível e mais
difusamente possível o trabalho indefinido da liberdade.”
Então, eu acho esse trecho muito lindo e nos remete a uma tarefa de conhecimento
e ética e política: o trabalho definido da liberdade. Essa crítica não tem como finalidade
separar a ciência da metafísica, a ciência da teologia, mas quer mostrar como o nosso
presente é aberto a possibilidades de transformações radicais. A crítica arqueológica e
genealógica produz uma transformação do presente em um evento, em um composto de
uma série de eventos contingentes que poderiam ser diferentes do que são. O objetivo é
pensar o presente como uma materialização de possibilidades entre tantas possibilidades.
As outras possibilidades que não se transformaram realidade permanecem como
possibilidades, sempre presentes e possíveis. Portanto, o que se mostra como homogênea
e universal, por meio da análise arqueo-genealógica, revela-se contingente. Esta crítica
não para de colocar a questão do impossível, ou seja, a possibilidade do excesso, a
possibilidade da diferença. A crítica não para de questionar o presente.
É justamente aqui que Foucault questiona o nosso presente, que se apresenta
continuamente nas formas autoritárias de um processo de construção e noção da
diferença. A diferença é continuamente construída por discursos. A diferença é, ao
contrário, para Foucault, uma excedência, um imã do impossível, nunca completamente
assimilado nas lógicas do poder e nas lógicas do saber identificável com a ordem do
discurso e com as instituições que assumem a tarefa de identificar a diferença.
Então, o ponto central do pensamento foucaultiano é exatamente isto: como pensar
diferentemente. Analisando o funcionamento dos dispositivos de saber/poder que
constroem sujeitos e objetos, a crítica arqueo-genealógica não para de colocar a questão
do impossível, ou seja, a possiblidade do excesso, a possibilidade da diferença. Isso
significa que a crítica não cessa de questionar o presente, fazendo a pergunta: “como não
ser governado?
Então, a segunda questão que eu quero considerar, nesta aula, é sobre como
funciona o poder. A tese de Foucault é que é necessário dessubjetivar o sujeito político e
jurídico da tradição. Ou seja, cortar a cabeça do soberano. Se a gente não corta a cabeça
do soberano, realmente não podemos entender como funciona o poder na sociedade
moderna. Temos que nos libertar da Soberania, da Lei e do Estado se queremos
compreender realmente como funciona o poder moderno.
Chegamos aos textos que eu passei para vocês lerem: em defesa da sexualidade,
em defesa da sociedade.
Foucault diz o seguinte na obra “em defesa da sociedade”:
“[...] em vez de orientar a pesquisa sobre poder para o âmbito do
edifício jurídico da soberania, para o âmbito das ideologias que o
acompanham, creio que se deve orientar a análise do poder, para o
âmbito da dominação (e não da soberania), para o âmbito dos
operadores materiais, para o âmbito das formas de sujeição, para o
âmbito das conexões e utilizações dos sistemas locais dessa
sujeição e para o âmbito, enfim, dos dispositivos de saber
Em suma, é preciso desvencilhar-se do modelo do Leviatã, desse
modelo de um homem artificial, a um só tempo autômato, fabricado
e unitário igualmente, que envolveria todos os indivíduos reais, e
cujo corpo seriam os cidadãos, mas cuja alma seria a soberania.
É preciso estudar o poder fora do modelo do Leviatã, fora do campo
delimitado pela soberania jurídica e pela instituição do Estado;
trata-se de analisá-lo a partir das técnicas e táticas de dominação.
Eis a linha metódica que, acho eu, se deve seguir, e que tentei seguir
nessas diferentes pesquisas que [realizamos] nos anos anteriores a
propósito do poder psiquiátrico, da sexualidade das crianças, do
sistema punitivo etc.”
Foucault, nesta aula, está resumindo o percurso de análise que ele começou a partir
de 1930, quando começa a ensinar no Collége de France. A partir de, mais ou menos,
1980, Foucault começa a se interessar sobre o funcionamento do poder e sua relação entre
saber e poder: como os discursos reproduzem efeitos do poder e como o poder amplifica
o efeito de verdade dos discursos. Nesse sentido, é necessário que o poder seja analisado
microfisicamente, perifericamente, nos lugares onde o poder é exercido, se manifesta.
Essa ideia anima as análises de Foucault.
Temos que nos libertar do modelo do Leviatã. Para entender o funcionamento real
dos mecanismos, dispositivos do poder.
Quais são, então, os elementos do poder soberano? Foucault diz que a concepção
do poder como poder soberano se baseias sobre três elementos. O primeiro é a concepção
econômica do poder: o poder é um bem que os indivíduos transferem ao soberano; o poder
é algo que pode ser objeto de um contrato, de uma transferência dos indivíduos ao
soberano. Lembre-se, o direito para Hobbes é o direito a liberdade de fazer aquilo que
fosse necessário para sobreviver. Quando o indivíduo livre renuncia ao seu direito natural,
funda-se a sociedade, o estado. Ou seja, funda-se a lei. A lei, diferentemente do direito, é
uma limitação da liberdade natural do que é necessário para a sobrevivência. Então o
poder é algo que pode ser transferido. Essa liberdade que se transfere ao soberano, ele
reverte em proteção contra a violência. A crítica de Marx ao Estado é baseada neste
ponto.
O segundo elemento é a concepção unitária do poder: o soberano é sempre
pensado como sujeito unitário que exercita o poder do centro até a periferia, de cima para
baixo. A imagem é do Leviatã, da capa da primeira edição do livro de Hobbes. O poder
se manifesta no Estado, na unidade que o soberano representa.
O terceiro elemento é a concepção jurídica do poder: o poder é pensado na forma
da lei. A lei como comando repressor, garantido pela sanção. A lei como manifestação da
vontade, torna-se norma. Algo de racional e, ao mesmo tempo, carrega a vontade do
soberano. Mas permanece essa ideia de que o poder se manifesta através da lei. O direito
na modernidade é a forma através da qual é manifesta o poder político.
A crítica de Foucault, portanto, tem como objetivo o discurso político e jurídico
moderno. Esse discurso identifica a política com o Estado, e o direito com a lei. O
resultado é a representação do poder como o poder soberano. Tanto as teorias absolutistas
que queriam justificar o poder absoluto do Estado, quanto as teorias liberais que queriam
limitar o poder absoluto do Estado, compartilham a representação do poder como
soberania. Tanto Hobbes, quanto Locke e Rousseau descrevem o poder nos termos da
soberania jurídica – uma soberania absoluta, no caso de Hobbes; uma soberania liberal,
no caso de Locke; uma soberania democrática, no caso de Rousseau. Em todas essas
teorias temos a identificação do poder com o Estado e com o direito.
A teoria política-jurídica moderna de Hobbes até Kelsen, passando por Kant, vai
promover uma racionalização do poder soberano. Essa racionalização se realizou através
de um processo de constitucionalização do poder, ou seja, uma juridificação do poder e
do estado, uma consequente formalização do direito. Dessa forma, o soberano absoluto
de Hobbes transforma-se na norma fundamental de Kelsen. De Hobbes até Kelsen, o
poder é completamente neutralizado no direito. Torna-se norma jurídica, hipótese lógica,
condição transcendental para pensar a unidade do ordenamento jurídico. E o Estado torna-
se simplesmente ordenamento jurídico: uma pluralidade de normas cuja unidade não é
substancial, mas apenas formal, lógica, transcendental. O discurso jurídico moderno
pensa resolver o poder no direito em uma tecnologia formal de construção normativa da
realidade. O conceito de soberania se refere ao processo de formação do Estado moderno.
Mas, segundo Foucault, é um conceito teológico-político – não é mais útil para entender
o funcionamento do poder. O poder não deve pressupor, como elementos iniciais, a
soberania do estado e as formas da lei. O poder moderno não se identifica mais com a
soberania!
Esse é um ponto importantíssimo. As instituições jurídicas não seriam as únicas
em que o poder opera. O poder moderno funciona em um complexo de tecnologia política
capazes de intervir capilarmente sobre os corpos dos indivíduos e da população a fim de
plasmar novos tipos antropológicos, novos comportamentos, novas subjetividades, novos
desejos. Dessa forma, o poder moderno não é um poder negativo, que se expressa através
da forma da lei; mas é positivo, capaz de penetrar a vida biológica – biopoder.
Biopoder é um poder preocupado com o governo dos corpos dos indivíduos e da
população. As relações de poder não são mais uma relação de exterioridade, não se
limitam a sancionar juridicamente relações de classe, raça, gênero, mas contribui para
constituí-los. O poder constrói subjetividades.
Nesse sentido, o pensamento de Foucault está aberto também para o pensamento
pós-colonial. Temos de partir da periferia da sociedade; por analisar as margens, podemos
entender o centro. Essa é, de certa forma, a ideia de Marx também. Para entendermos a
acumulação originária, temos de entender o que está acontecendo com a colonização das
américas.
Outro ponto, é que o poder é onipresente. Não está apenas no centro, em cima da
pirâmide. O poder é um poder horizontal, que está em qualquer lugar. No texto “a vontade
e o saber”, Foucault escreve que o poder está em toda a parte. O poder não é uma
instituição e nem uma estrutura; não é uma certa potência de que alguns sejam adotados.
O poder é um nome dado a uma situação estratégica complexa numa sociedade
determinante.
Aula 17 - Semana 8
Na aula passada a gente viu o como Foucault entende o poder. E vimos também
que, para entendê-lo, precisamos deixar a ideia de soberania de lado. A primeira questão
é abandonar esse modelo do Leviatã.
Em suma, é preciso desvencilhar-se do modelo do Leviatã, desse modelo de um homem
artificial, a um só tempo autômato, fabricado e unitário igualmente, que envolveria todos
os indivíduos reais, e cujo corpo seriam os cidadãos, mas cuja alma seria a soberania.
É preciso estudar o poder fora do modelo do Leviatã, fora do campo delimitado pela
soberania jurídica e pela instituição do Estado; trata-se de analisá-lo a partir das técnicas
e táticas de dominação.
Hobbes tenta racionalizar poder. A ideia da capa do Leviatã é mostrar esse poder unitário,
central do soberano, composto por indivíduos singulares, livres e iguais, que fundam um
poder comum, que é esse poder unitário sobre o consenso. É um poder que se legitima
sobre a vontade dos indivíduos livres e iguais. A gente falou bastante dessa ideia da
racionalização através do direito. Na modernidade política e jurídica, a ideia de autoridade
muda radicalmente. Agora, autoridade significa ser autorizado a exercer um poder.
Portanto, na medida em que aquele poder é autorizado pelos indivíduos, essa imagem
fictícia de um contrato social legitima o poder. Autoridade significa que é um poder
autorizado, portanto legítimo.
A questão para Foucault é que esse poder funciona como representação política e jurídica
do poder, mas não é representativo do funcionamento real do poder moderno. Para
entender como funciona realmente o poder na nossa sociedade, não podemos fazer
especificamente referência ao modelo do Leviatã. Temos que ir além desse modelo. A
questão é como esses indivíduos que compõem o corpo de Leviatã podem ficar juntos. A
questão é como esse composto que são os indivíduos livres e iguais para a teoria jurídica
ficam neste lugar ficam juntos. Como é possível? Quais são os mecanismos que
possibilitam a construção desses indivíduos como corpos doces, como corpos
controlados, como corpos normais, como corpos conformes? Como é possível que esses
indivíduos obedeçam por meio de uma sanção abstrata?
Ninguém obedece por meio de sanção. O mecanismo no cotidiano da obrigação não pode
funcionar se o poder quer ser um poder real. Poder que usa exclusivamente a violência
ameaça é um poder fraco. É um poder que não funciona como poder. Poder, para ser
poder, para poder funcionar como poder tem de ser um poder que funciona sem violência;
e constrói os comportamentos dos indivíduos de um jeito capilar sutil analítico. Em outras
palavras, como esse poder pode construir uma população de corpos dóceis?
“o poder não é algo que se adquira, arrebate ou compartilhe, algo que se guarde ou deixe
escapar; o poder se exerce a partir de inúmeros pontos e em meio a relações desiguais e
móveis”
O poder funciona dentro de uma relação, que pode ser uma relação afetiva, uma relação
familiar, uma relação na universidade, uma relação na escola. Poder é uma relação e
funciona das relações que são desiguais
O segundo ponto diz que o poder não é externo, transcendente; mas imanente nas relações
econômicas, sexuais e de conhecimento.
“as relações de poder não se encontram em posição de exterioridade com respeito a outros
tipos de relação (processos econômicos, relações de conhecimento, relações sexuais), mas
lhe são imanentes; são os efeitos imediatos das partilhas, desigualdade e desequilíbrios
que se produzem nas mesmas e, reciprocamente, são as condições internas destas
diferenciações; as relações de poder não estão em posição de superestrutura, com um
simples papel de proibição ou de recondução possuem; lá onde atuam, um papel
diretamente produtor”
A ideia de poder que Foucault está apresentando é um poder produtivo. Não é um modelo
centrado na repressão, como no modelo do é Leviatã. Claro, pode ser também repressão,
mas não é só repressão. Para ser poder tem que ser produtivo, tem que permitir que coisas
possam ser feitas. Um poder funciona quando consegue ser produtivo, não só quando está
dizendo não. Funciona quando diz você tem que fazer isso e você está fazendo isso,
interiorizando a disposição do poder. Você está fazendo isso antes que a vontade do
soberano se manifeste como comando.
Vamos para o terceiro elemento do poder na concepção foucaultiana. O poder não implica
uma relação vertical, mas horizontal:
“O poder vem de baixo; isto é, não há, no princípio das relações de poder, e como matriz
geral, uma oposição binária e global entre os dominadores e os dominados, dualidade que
repercuta de alto a baixo sobre grupos cada vez mais restritos até as profundezas do corpo
social. Deve-se, ao contrário, supor que as correlações de forças múltiplas, que se formam
e atuam nos aparelhos de produção, nas famílias, nos grupos restritos e instituições,
servem de suporte a amplos efeitos de clivagem que atravessam o conjunto do corpo
social. Estes formam, então, uma linha de força geral que atravessa os afrontamentos
locais [...]. As grandes dominações são efeitos hegemônicos continuamente sustentados
pela intensidade de todos os esses afrontamentos.”
Foucault não está dizendo que não tem distinções entre dominadores e dominados, que
não há desigualdade entre classes sociais. Ele está dizendo que essas distinções
macrofísicas entre as classes, grupos podem funcionar através das microfísicas do poder,
através das relações de poder que funciona microfisicamente nos lugares mais periféricos.
Sim, para entender como o poder funciona realmente temos de olhar os lugares
periféricos; não podemos olhar apenas a marcafísica do poder, o centro.
Vou, agora, ao quarto ponto, que diz que o poder não implica em um sujeito:
“não há poder que se exerça sem uma série de miras e objetivos. Mas isso não quer dizer
que resulte da escolha ou da decisão de um sujeito, individualmente; não busquemos a
equipe que preside sua racionalidade; nem a casta que governa, nem os grupos que
controlam os aparelhos do Estado, nem aqueles que tomam as decisões econômicas mais
importantes, gerem o conjunto da rede de poderes que funciona em uma sociedade (e a
faz funcionar); a racionalidade do poder é a das táticas muitas vezes bem explícitas no
nível limitado em que se inscrevem — cinismo local do poder — que, encadeando-se
entre si, invocando-se e se propagando, encontrando em outra parte apoio e condição,
esboçam finalmente dispositivos de conjunto: lá, a lógica ainda é perfeitamente clara, as
miras decifráveis e, contudo, acontece não haver mais ninguém para tê-las concebido e
poucos para formulá-las: caráter implícito das grandes estratégias anônimas, quase
mudas, que coordenam táticas loquazes, cujos "inventores" ou responsáveis quase nunca
são hipócritas”
As relações de poder são sempre atravessadas por um cálculo, mas esse cálculo é o
resultado de uma escolha racional de um sujeito. A ideia fundamental de Foucault é
produzir um processo de subjetivação, ou seja, dessubjetivar o sujeito de conhecimento.
Todo o pensamento moderno foi construído ao redor desse sujeito racional, a partir da
própria existência, da própria contingência se pensa como necessário, como racional.
Nesse sentido, o sujeito cartesiano é o sujeito que está pensando na contingência e, a partir
daí, uma vez que está certo construir um mundo racional, ordenar o mundo. É um sujeito
racional, é um sujeito que pensa é um sujeito que tenha certeza. Então o seu pensamento
pode ser utilizado para ordenar e construir o mundo a imagem da própria racionalidade
subjetiva.
Como esse sujeito de conhecimento é produzido nas práticas sociais, o estado soberano é
produzido por meio de mecanismos disciplinares que a manutenção da ordem social. No
final do texto do panoptismo, Foucault diz uma coisa muito linda: a modalidade panóptica
do poder não está na dependência imediata, nem no prolongamento das grandes estruturas
políticas e jurídicas de uma sociedade; é, entretanto, completamente independente.
Historicamente, o processo pelo qual a burguesia se tornou, no decorrer do século XVIII,
a classe politicamente dominante, abrigou-se atrás da instalação de um quadro jurídico
explícito, unificado formalmente, igualitário, atrás da organização de um regime do tipo
parlamentar representativo. Mas com o desenvolvimento e a generalização dos
dispositivos disciplinares, como o instituto – a outra vertente obscura desse processo –, a
forma jurídica geral que garantia o sistema de direito era sustentada por esses mecanismos
cotidianos e físicos.
Ou seja, tem um discurso político-jurídico que funciona como mantenedor do poder, por
meio, por exemplo, da constitucionalização do poder na forma da lei. Ao mesmo tempo,
esse processo de democratização, de constitucionalização do poder, do conhecimento dos
direitos pode funcionar, porque tem mecanismos que estão construindo os corpos, que
estão disciplinando e construindo os indivíduos como indivíduos.
Então, vocês não podem entender todo esse processo da racionalização sem pensar como
funciona uma fábrica, sem pensar como funciona uma vou prisão, sem pensar como
funciona uma escola, sem pensar como funciona um asilo psiquiátrico – que são as
instituições do século XIX.
O século XIX é muito interessante porque temos muitas coisas acontecendo ao mesmo
tempo. Temos uma dinâmica de constitucionalização do poder sobre a qual, como
juristas, a gente fala muito: os direitos das constituições, os conhecimentos
constitucionais, os direitos civis e políticos. Mas, ao mesmo tempo, o século XIX é o
século das instituições: das fábricas, dos hospitais, das escolas; há generalização da
disciplina para toda a sociedade. Tudo isso é representado maravilhosamente na literatura,
por exemplo.
Vamos no outro ponto, um ponto essencial. Foucault diz também que onde há poder há
resistência. A ideia é, Foucault escreve:
Eu acho esse ponto essencial, porque essa ideia do poder como algo horizontal, como
algo que funciona na relação não significa que esse poder é um poder invencível, um
poder que não pode ser contestado. Ao contrário, o poder funciona porque tem a
resistência. O poder é uma resposta à resistência. Deleuze tem um texto interessante que
diz que a resistência vem antes do poder. Paradoxalmente, o poder é sempre uma resposta
a uma resistência efetiva, a uma força maior. O poder quer subjugar. Então a resistência
é constitutiva do poder, não é algo externo ao poder; mas está no núcleo central deste
poder. Isso significa que esse poder é sempre contestado, é sempre colocada em xeque, é
sempre colocado em discussão. O poder não é uma identidade absoluta, unitária, vertical;
mas o poder funciona microfísicamente , e microfisicamente tem muitas resistências ao
poder. Isso significa que em um determinado momento essas resistências podem assumir
uma dimensão macrofísica.
Biopoder
Então chegamos a essa definição sobre a qual fala Foucault: o biopoder. Para Foucault,
esse poder da modernidade é um poder que tem alvo, como objeto a vida biológica. Com
vida biológica entendemos os corpos – o poder tem como objeto os corpos, controlar os
corpos, produzir corpos normais, produtivos, produzir tempo e trabalho dos corpos
através da exploração no trabalho, extrair conhecimento no capitalismo cognitivo.
O poder é onipresente está em qualquer lugar. Mas também temos que saber que a
resistência é onipresente.
Problemas abertos
Como pode conviver, no mesmo período histórico, a nova mecânica do poder e o discurso
político e jurídico focado sobre a soberania, a lei, o modelo do Leviatã? Outra questão
que temos que entender é como funciona a nova mecânica do poder? Como se realiza o
disciplinamento dos corpos e a normalização social?
“temos, pois, nas sociedades modernas a partir do século XIX até nossos dias, de um lado
na legislação, um discurso, uma organização do direito público articulados em torno do
princípio da soberania, do corpo social e da delega, por cada qual, de sua soberania ao
Estado. E depois temos, ao mesmo tempo, uma trama cerrada de coerções disciplinares
que garante, de fato, a coesão desse mesmo corpo social. Ora, essa trama não pode mandar
algum ser transcrita nesse direito que é, porém, seu acompanhamento necessário. Um
direito da soberania em uma mecânica da disciplina: e entre esses dois limites, creio eu,
que se pratica o exercício do poder. Mas esses dois limites são de tal forma, e são tão
heterogêneos, que nunca se pode fazer que um coincida com o outro. O poder se exerce,
nas sociedades modernas, através, a partir do e no próprio jogo dessa heterogeneidade
entra um direito público da soberania e urna mecânica polimorfa da disciplina.”
Foucault fala em Vigiar e punir que os princípios do poder moderno são dois. O primeiro
é o princípio de exclusão: excluir alguém. Estou excluindo alguém colocando-o na prisão;
estou excluindo um doente colocando-o no hospital; estou excluindo um louco
colocando-o no manicômio. Mas também funciona através do princípio da vigilância, do
controle e da individualização em que a função desses dois paradigmas, dois modelos
servem para entender o poder moderno. O poder funciona como estigmatização de alguém
como normal, como louco, como mendigo como sujeito perigoso, como sujeito que tem
que ser excluído. O sonho desse modelo é criar uma comunidade pura, normal, sem
doença, sem mal moral. O funcionamento destes dois princípios permite a gente entender
o funcionamento destas instituições disciplinares. Por exemplo, a prisão, por um lado,
opera pelo princípio da exclusão; na prisão são colocadas as pessoas perigosas. Dentro da
prisão opera um princípio uma mecânica do poder disciplinar, que é a temporalização, a
individualização, a vigilância – que são o controle cotidiano controle capilar do
comportamento dos presos.
Todas as disciplinas que nascem no século XIX, nascem como saberes disciplinares, ou
seja, esses mecanismos disciplinares não são apenas mecanismos que acumulam e
difundem o poder de uma forma capilar sobre os corpos; mas são instrumentos para a
acumulação de saber. Então, através da organização escolar na qual a gente se formou,
escolas mais clássicas reproduzem modelo pedagógico jesuítico que é um modelo
extremamente disciplinar, e todo uma pedagogia do século XIX foi uma pedagogia que
se constrói ao redor deixo mecanismos disciplinares. Pensamos na psicologia a
psicologia. Como disciplina, estrutura-se ao redor de um saber médico e de um
mecanismo disciplinar ao redor da família, ao redor da sexualidade infantil, por exemplo.
Pensamos na criminologia. Toda a criminologia do século XIX é um campo do saber ao
redor de mecanismos disciplinares da prisão, da casa de correção, do asilo.
Então a ideia de Foucault é que tem mecanismos de práticas de poder sociais que
permitem a formação de saberes, que permitem a formação de subjetividades, que
permitem a formação de um jeito de pesquisa. Um jeito de pesquisa criminoso, por
exemplo, é um mecanismo que surge no século XIX como consequência da difusão dos
mecanismos disciplinares da prisão. Não é algo de que precisa o criminoso, mas é produto
de uma prática social de internação. A grande internação que acontece na Europa, mais
ou menos entre os séculos XVII e o século XIX, e que permite o desenvolvimento do
capitalismo fundamentalmente - porque o capitalismo nasceu através de uma disciplina
de uma população de campesinos que foram transformados em trabalhador. Portanto, essa
internação de mendigos, de marginais entre os séculos XVII ao século XIX permitem
também a construção de novas formas de saber novas subjetividades. Essa é a ideia, o
sujeito não precisa do conhecimento, mas o sujeito é resultado de práticas sociais que
permitem a constituição de novas subjetividades que são funcionais; práticas que
funcionam em um período histórico determinado. Por exemplo, um criminoso, um
menino masturbador, um menino incorrigível que resiste ao processo disciplinar na
escola.
A ideia é que o direito racional, formal que a gente está estudando na sociedade moderna
é contaminado, colonizado com práticas e saberes que são disciplinares. Um exemplo é a
perícia psiquiátrica no processo penal. Como opera? Qual é a função da perícia
psiquiátrica no processo penal? Vocês sabem que um sujeito não pode ser imputado por
tal crime se tiver problemas psicológicos problemas mentais. A perícia psiquiátrica opera
para legitimar através de um saber, um poder que é o poder de julgamento, um poder
penal de julgar. Então tem uma função circular entre o poder de decidir ser culpado ou
não, e o saber médico, que aparentemente é médico.
Uma coisa interessante é que Bentham pensou o Panóptico como uma sociedade
completamente transparente. Esse é o sonho também do racionalismo do século XVIII,
que tem com a ideia da prisão, transformar os corpos dos detentos. O espaço da prisão é
um lugar de visibilidade, de normalidade, que pensa sobre como podemos produzir a
anormalidade desses sujeitos.
A questão central é como funciona o poder na sociedade disciplinar? Foucault diz que há
um modelo alternativo ao do leviatã, isso que é o modelo do panoptismo. O princípio do
panoptismo é visibilidade, transformar um grupo de pessoas. Ter um grupo
individualizado de forma que podemos observar cada um dos indivíduos que compõem
esse grupo. O panoptismo é um instrumento de acumulação de conhecimento e de saber.
Podemos pensar a prisão como um zoológico em que o psiquiatra forense pode estudar
para acumulação de saber, para controle para vigilância.
O paradigma da lepra se funda sobre a exclusão dos leprosos e sobre um sonho que é a
comunidade de pura, liberada da contaminação. Como podemos nos libertar do contágio.
Como podemos nos libertar das pessoas que são portadoras das doenças. Então colocamos
os leprosos em um lugar fechado fora da cidade, nas fronteiras da cidade – um lugar onde
não podem sair. Colocamos um controle para verificar se as pessoas não saem da cidade
e, dessa forma, nós podemos libertar da doença. A lepra, então, é um paradigma da
expulsão sobre como funciona o poder. É uma distinção binária entre o doente e o não
doente, entre o normal e o anormal, entre o conforme e o inconforme, entre o perigoso e
o não perigoso, entre o louco e o racional.
O poder funciona através de uma lógica de negação da negação. Temos que negar o que
nega a identidade para afirmar a identidade. É uma lógica de negação da diferença. A
diferença tem que ser pensada sempre como negação. a diferença é negação, negação da
identidade. Precisamos de diferença. E precisamos de diferença para afirmar a identidade.
Então precisamos do louco; o louco é fundamental para Descartes. Ele não pode pensar o
sujeito racional sem ter a loucura, senão através da expulsão da loucura. toda a metafísica
do pensamento antigo aristotélico tem que pensar um animal para pensar o homem. O
animal pode ser um bárbaro, pode ser uma mulher, pode ser um escravo, pode ser um
estrangeiro. Essas são figuras da diferença é que temos que afirmar ou excluir para afirmar
a identidade. Então paradigma da lepra funciona com o paradigma da expulsão.
Depois temos o paradigma da peste. O paradigma da peste é um paradigma da disciplina
e da vigilância. Depois do início da epidemia, não é mais possível excluir para pestilentos
da cidade. A cidade está dividida em zonas. Cada área é diferente devido a intensidade da
epidemia desinfecções e quarentenas. É necessário estabelecer um controle, um
monitoramento capilar generalizado. A população é cadastrada, cada bairro fica sob a
supervisão de um curador. Soldados, médicos, coveiros, únicas pessoas que podem
circular livremente pela cidade, devem exercer controle sobre a população, verificar as
condições de saúde de cada família, distribuir remédios e alimentos. A peste se refere a
um modelo de poder disciplinar. A peste também é um sonho de poder disciplinar.
Até este é um grande problema na Europa desde o século XVI. Foucault escreve: os
juristas do século XVII pensam o estado de natureza para imaginar a construção jurídica
do poder na forma da lei; os políticos do século XVII sonham a peste para imaginar a
sociedade perfeitamente disciplinada e organizada. Então a especificidade da pandemia
determina uma forma de controle, determina uma forma de vigilância. No caso de uma
peste, a forma de monitoramento não é exclusão, mas é a disciplina.
Veja, a pandemia foi utilizada como emergência que permite a derrogação das leis
constitucionais para aplicar misturas emergenciais fora da lei; misturas efetivamente
disciplinares e depois como forma de controle e vigilância interna. A questão é que o
Covid é diferente da peste, então qual é a especificidade? Como está operando essa
específica doença na reconfiguração dos mecanismos de controle? Os mecanismos de
controle são velhos, a quarentena é uma coisa antiga, a repartição da cidade é uma coisa
antiga também, os instrumentos emergenciais excepcionais também são antigos. Agora,
tem coisas diferentes. Todo esse discurso sobre o risco, sobre o cálculo de risco que cada
pessoa associada a cada pessoa tem uma lógica de capitalismo liberal que está
funcionando dentro do paradigma disciplinar. Temos mecanismos de avaliação de risco
de cada um, com frequências econômicas que são próprias do capitalismo liberal.
Deveríamos refletir sobre isso bastante. Como funciona conjuntamente os mecanismos
que são próprios da nossa contemporaneidade.
Sociedade disciplinar
“Você é próprio do século XIX ter aplicado ao espaço da 10 cruzam de que o leproso era
o habitante simbólico (e os mendigos, os vagabundos, os loucos, os violentos formavam
a população real) a técnica do poder própria do “quadriculamento” disciplinar. Tratar os
leprosos como pestilentos, projetar recortes finos da disciplina sobre o espaço confuso do
internamento, trabalhá-lo com os métodos da repartição analítica do poder, individualizar
os excluídos, mas utilizar processos te individualização para marcar exclusões”
Agora temos que nos atentar para a transformação da sociedade disciplinar para a
sociedade de controle, que tem um outro elemento a mais. Não temos só a sociedade
disciplinar, que funciona também no nosso presente através das prisões, dos asilos
psiquiátricos, das escolas, dos hospitais que tentam formar sujeitos normais. Mas temos
uma sociedade de controle, uma sociedade com uma vigilância contínua que controla
todos os indivíduos.
Aula 18 - Semana 9
As aulas dessa semana serão dedicadas a discutir sobre a sociedade do controle e sobre o
biopoder, mas antes de falar mais especificamente sobre a sociedade do controle e sobre
o fim ... (?), eu queria retomar alguns conceitos sobre os quais a gente já debateu nas aulas
passadas, mas que precisam de uma análise mais profunda.
Então a gente falou na outra aula, na aula passada, do panoptismo. Então o panoptismo.
Aqui nesta nesse slide vocês podem ver, é uma imagem do Panóptico usado para construir
as prisões e é uma imagem que está reproduzindo uma prisão nos Estados Unidos, no
século XIX.
Então a coisa interessante que Foucault nos diz é que o panoptismo comunga, junta 2
modalidades do poder: a modalidade da exclusão e a modalidade da inclusão e da
disciplina. Então, por um lado, para explicar como o poder funciona, Foucault se refere a
2 paradigmas: o paradigma da lepra e o paradigma da peste. Então, 2 epidemias que em
momentos diferentes afetaram a vida das populações, principalmente as populações
urbanas.
Então o paradigma da lepra é um
paradigma porque o governo tem
que excluir os leprosos para um
espaço externo fora da cidade, para
construir uma comunidade pura,
liberada da possibilidade de fusão
com o mal.
O paradigma da peste é um
paradigma completamente diferente
porque, ao contrário da lepra, os
pestilentos não podem ser isolados
com facilidade, mas todo o espaço da cidade tem que ser organizado de uma forma capilar
através da quarentena e vigilância.
Então é um poder que separa de uma forma binária os leprosos e os não leprosos, quem é
doente e quem não é doente, quem é incluído e quem é não incluído e não pode ser
incluído para o bem da comunidade na sua totalidade.
Então a ideia da prisão como instrumento disciplinar é algo que vai se desenvolvendo a
partir do século XVIII. Antes as prisões eram lugares não da individualização, da
disciplina, mas onde ficavam amassados os corpos de excluídos sobre os quais o poder
operava só através da lógica da separação e da expulsão em um lugar separado. Depois
não era importante para o poder o que acontecia dentro desses espaços de separação, eram
espaços obscuros, eram espaços onde poderia acontecer qualquer coisa, onde não era mais
tarefa do poder se preocupar com o que acontecia dentro do espaço. Esse espaço de
exclusão agora tem uma aplicação de técnicas disciplinares, esses espaços de exclusão. E
por que acontece isso? Tem um texto muito interessante de 2 sociólogos italianos que
publicaram em 1977 e que Foucault cita em “Vigiar e punir” que se chama “Prisão e
fábrica”.
Então no século XIX se cria uma relação muito estrita entre a prisão e a fábrica, a fábrica
precisa de força de trabalho. Essa força de trabalho pode ser também procurada em
lugares de exclusão. Então essas pessoas, os mendigos, vagabundos, os loucos, violentos
devem ser considerados força de trabalho útil para o mercado capitalista, para a produção
capitalista. Então devem ser transformados em trabalhadores disciplinados. Então começa
a se aplicar a disciplina das técnicas disciplinares religiosas, militares também para essa
população de excluídos que vivem e que é relegada em lugares de exclusão, como as
prisões, os hospícios, os manicômios etc.
Isso é interessante. As técnicas disciplinares são utilizadas para marcar exclusões, ou seja,
a técnica disciplinar de vigilância, de controle do corpo é usada para estabelecer quem é
normal e quem não é normal, quem é conforme a uma norma, uma regra de
comportamento e quem não é conforme, quem não se adapta a norma e, portanto, o sujeito
que pode ser excluído. E, uma vez que excluído, pode ser objeto de técnicas disciplinares
para corrigir os seus comportamentos anormais. Então podemos ver que, nas sociedades,
temos uma sobreposição de técnicas de expulsão e de técnicas disciplinares que a
sociedade disciplinar do século XIX é o resultado... dessas 2 são proposições, dessa
junção entre técnicas de exclusões e técnicas disciplinares, entre os modelos paradigma
da lepra e o paradigma da peste.
Então essas instituições constituem ainda as formas atuais das instituições disciplinares.
Disse mais Foucault:
Então essa é estrutura do panóptico: a torre central, os braços em forma hexagonal e essa
outra estrutura que se reparte do hexágono central... temos outras possibilidades de
controle.
Esta é uma imagem bastante interessante da prisão modelo, na Ilha da Juventude, com
referência ao modelo do prisão dos Estados Unidos. A Ilha da Juventude tem esse nome
que derivou de Fidel Castro e o seu irmão, Raul, que foram detidos, em 1952, depois da
tentativa de fazer a Revolução em Cuba, que falhou.
Então a coisa pra nós interessante é essa estrutura, não do panóptico como organizado.
Escreveu Foucault:
Fazer com que a vigilância seja permanente em seus efeitos. Por que permanente? Porque
a vigilância é interiorizada. Então é a coisa mais perversa, podemos dizer, do mecanismo
panóptico: é que os detentos encontram-se presos numa situação de poder de que eles
mesmos são os portadores, interiorizam a dimensão do poder e sabem que são visíveis
permanentemente. Portanto, interiorizam a norma, o critério de comportamento, o
interioriza, se comporta voluntariamente como o poder quer que eles se comportem.
Então, o poder disciplinar, portanto, o poder que Foucault visa evidenciar é um poder
visível e verificável.
A gente, introduzindo a aula na semana passada, falou que o poder é onipresente. Então
a onipresença do poder é permitida através dessa interiorização do critério do poder, da
norma que o poder quer apoiar e sustentar.
É visível: sem cessar, o detento terá diante dos olhos a alta silhueta da torre central de
onde é espionado.
Inverificável: o detento nunca deve saber se está sendo observado, mas deve ter a certeza
de que sempre pode sê-lo.
Então Michel Foucault publicou “Vigiar e punir” em 1975. Vigiar e punir é o texto no
qual Foucault analisa de uma forma muito detalhada o funcionamento da sociedade
disciplinar. E então Foucault começa sua pesquisa, arqueogenealogia do poder ao redor
dos anos 70, quando começa a ensinar no Collège de France.
A primeira aula, o primeiro discurso é uma introdução, podemos dizer, a essa nova fase
da pesquisa foucaultiana que visa se ocupar não só das formas do saber na sua autonomia,
mas da relação entre saber e poder. Então é sobretudo a relação entre saber e poder na
sociedade disciplinar, na sociedade moderna que é a sociedade disciplinar. Então
Foucault escreve nesse momento de importante produção intelectual e reflexão sobre o
poder moderno, um poder que não é um poder soberano, que não é só um poder soberano,
que funda a sua exclusão, proibição, instituições jurídicas, mas um poder diferente. Um
poder horizontal no sentido que funciona, não é nessas instituições, não só instituição
estatal e central, é o poder periférico, poder que passa através dos corpos individuais.
Então, ele escreve 2 textos fundamentais que são “Vigiar e punir”, em 1975, e “A vontade
de saber”, de 1976, que é o outro texto, no qual retoma alguns conceitos já elaborados em
“Vigiar e punir”, mas ele desenvolve a questão, essa nova ideia do poder, como um poder
que funciona diferentemente do poder da soberania, do poder jurídico, mas um poder que
funciona sobre os corpos, o que é um poder produtivo, não negativo. Ele desenvolve essa
ideia nesse livro “A vontade de saber”, de 1976, que é o primeiro livro de uma trilogia
que visa analisar a história da sexualidade.
Então no “Vontade de saber” Foucault crítica a ideia do poder como repressão, a ideia
que, para ele, é presente sobretudo na tradição marxista acadêmica, podemos dizer, de um
certo marxismo, uma certa psicoanálise que pensa a sexualidade como reprimida pelo
poder. Para Foucault, evidentemente, tem também essa dimensão da repressão, mas, no
século XIX, ele fala que a sexualidade não é reprimida, mas é promovida através de
saberes e discursos. Então ele quer desenvolver essa ideia.
Agora, nos cursos que acontecem naqueles mesmos anos, ele vai especificando, podemos
dizer, nos cursos ao Collège de France, ele vai se organizando de uma forma melhor a
pesquisa foucaultiana. Então os cursos são fundamentais para entender o laboratório do
pensamento foucaultiano, além do que é conteúdo nos seus livros. Então o curso sobre
“Os anormais” de 1974 - 1975 é importante para entender como funciona a normalização
em uma sociedade disciplinar, mas, sobretudo, são importantes “Em defesa da
sociedade”, o curso que ele deu no Collège de France, em 1975-1976 e o curso que ele
deu “Segurança, território população”, de 1977-1978.
Então sobre o curso “Em defesa da sociedade” a gente já falou várias vezes. Agora queria
falar um pouco com vocês sobre a primeira aula desse curso que é intitulado “Segurança,
território, população”. E por que eu queria falar sobre esse curso, sobre essa aula que
constitui uma leitura obrigatória no nosso curso? Porque nesse curso Foucault vai mudar
um pouco o seu interesse de pesquisa. Até agora ele, mais ou menos, se ocupa da
sociedade disciplinar, dos mecanismos que permitem a normalização dos corpos na
sociedade disciplinar.
Agora, nesse curso “Segurança, território, população” ele se ocupa de tecnologias, das
tecnologias da segurança e ele afirma que, além da sociedade disciplinar do final do
século XIX e, principalmente, depois do século XX, vai se desenvolvendo uma sociedade
da segurança.
Então o poder, que não é mais o poder disciplinar, é mais um poder que funciona
diferentemente tanto do poder do mecanismo jurídico, do poder soberano, quanto do
mecanismo disciplinar, do poder de normalização da sociedade disciplinar.
Então vamos ver qual é a nova idéia de Foucault que ele vai desenvolvendo neste curso.
Em relação ao poder da sociedade moderna ele escreve:
Então como se transforma o poder? Através das novas tecnologias. E quais são as
características dessas tecnologias de segurança? Foucault escreve:
Então de um lado temos o dispositivo a conduta proibida “matar alguém”; de outro lado,
a punição “reclusão de 6 até 20 anos”. Coisa simples. Conduta proibida, a proibição
“matar” e a punição.
O que significa tudo isso? De um lado tecnologias de vigilâncias e controles que permitem
suportar a proibição, prever e antecipar a conduta criminosa. De outro lado, técnicas de
correção que permitem transformar a punição em uma punição corretiva. Então quando a
norma de lei é inserida em um contexto, em um dispositivo de vigilância e correção, temos
algo que vem antes da norma... então um dispositivo que permite controlar as pessoas
antes que essas pessoas possam realizar condutas proibidas e, depois, temos um
dispositivo que funciona depois que foi realizada a conduta proibida. E por que? Para
transformar a punição em uma punição corretiva, para transformar o indivíduo que
cometeu a infração. Então no dispositivo disciplinar temos a distinção binária entre
“permitido” e “proibido”, temos um acoplamento entre “ação proibida” e a “punição”.
Então temos, nos 2 primeiros pontos, a mesma lei penal, mas dessa vez a lei penal está
inserida dentro do dispositivo disciplinar, portanto, aparece uma terceira figura que é o
culpado e aparece que o culpado não é exatamente a pessoa que realizou o crime, o
culpado não se identifica imediatamente com o crime realizado e temos técnicas de
vigilância, de diagnósticos, transformações além do ato legislativo que cria a lei e do ato
judicial que pune a conduta criminosa.
Então, portanto:
Se agora a gente substituir a palavra “crime” pela palavra “doença” no Código XIX,
podemos entender como a gestão, a organização de uma epidemia na sociedade do
controle acontece através de mecanismos que não são tanto mecanismos disciplinares
quanto são mecanismos de segurança, então a questão: Qual a probabilidade de se fundir
a epidemia, a doença? Qual a probabilidade de os indivíduos de um grupo social tem de
pegar Covid? Qual é a taxa de probabilidade?
Outro ponto sobre o qual a gente insistiu bastante na aula passada. Você não tem que
imaginar uma sucessão temporal entre dispositivos jurídicos e depois dispositivos
disciplinares e depois mecanismos de segurança, como passado, passado remoto, passado
próximo... como passado, presente... mas os mecanismos jurídicos, os mecanismo
disciplinares e os mecanismo de segurança convivem, se potencializam um com outro,
claro podemos dizer, como diz Foucault que na sociedade contemporânea prevalece o
mecanismo da segurança, mas isso não significa que outros mecanismos jurídicos e
disciplinares não funcionem, ao contrário, significa que os mecanismos de segurança
colonizam os mecanismos jurídicos e disciplinares e transformam essa relação, as
exigências próprias da segurança. E vocês que são juristas sabem perfeitamente o quanto
a dimensão da segurança é presente na atuação legislativa em um país como o Brasil, mas
também em outros países, como os EUA e a legislação sobre terrorismos e imigração na
Europa, no continente europeu, olha o que o Foucault diz:
Enfim, a gente começou falando da lepra, da peste... da lepra da peste. Agora, na primeira
aula desse curso, em 77-78, o
Foucault coloca uma outra doença
que é varíola. Então ele fala: temos o
paradigma da lepra (a exclusão dos
leprosos segundo o critério
dentro/fora). Temos o paradigma da
peste (o critério da quarentena
através da organização disciplinar do
espaço e dos corpos dentro do
espaço). E depois, no século XIX,
principalmente, temos outras
epidemias e políticas públicas de inoculação para proteger a população, que muda as
técnicas de poder e de gestão dos riscos ligados a epidemia. A varíola indica instrumentos
e técnicas para lidar com os fenômenos epidêmicos e endêmicos. A questão não é só a
epidemia, a lepra, a peste, que são exceções, mas doenças que se tornam epidêmicas e, ao
mesmo tempo, endêmicas, que funcionam normalmente. A questão agora é gerenciar,
administrar esses fenômenos que são naturais e sociais ao mesmo tempo de uma forma
que permite reduzir os riscos e incrementar os benefícios das políticas públicas. Escreve
Foucault:
Então podemos usar esse trecho para ler a epidemia que estamos vivendo, agora
o problema não mais a exclusão dos leprosos, dos doentes, não é só a quarentena, é o
gerenciamento dos riscos ligados a doenças que são epidêmicas e endêmicas ao mesmo
tempo... sua taxa de mortalidade, o risco da inoculação, qual o custo beneficio da gestão,
do gerenciamento da epidemia, quais são os benefícios sempre em termos econômicos.
Esse é um trecho para entender o que está acontecendo na atualidade que me parece
impressionante.
Então quais são as características? Tudo isso nos permite entender as características dos
dispositivos de segurança, lembrando que os dispositivos de segurança que são usados
prevalentemente na nossa sociedade, a sociedade de controle, sociedade pós disciplinar,
então são:
Assume como próprio objeto um novo corpo: o objeto dos dispositivos de segurança é
um corpo social que é diferente do corpo do indivíduo. Vamos ver qual é o corpo.
Vejamos:
Nós falamos que os dispositivos de segurança funcionam sobre um espaço, também sobre
uma ideia de normalização. Espaço, gerenciamento do espaço.. (ler os conceitos abaixo)
Sobre primeiro ponto: isso capitaliza um espaço, um território, então temos antes de tudo
colocar uma capital, a capital é o lugar do poder, a partir da capital o poder pode ser
exercido nas periferias.
Sobre o segundo ponto: a disciplina pensa o espaço de forma diferente. Vocês podem
pensar em uma prisão que é uma espaço disciplinar por essência.... o problema é organizar
de forma hierárquica os elementos presentes desse espaço (os detentos, os educadores, os
gerentes)
Pressuposto: o ponto de partida é a norma que funciona como modelo; o ponto de chegada
é a definição, a distinção entre quem é normal e quem é anormal, uma vez que temos esse
modelo de ótimo, podemos estabelecer o que é normal e o que é anormal.
Então que quero dizer aqui de forma simples? Quero dizer que a normalização da
segurança funciona de uma forma completamente diferente, não se estabelece antes a
norma, o modelo ótimo que quer ser alcançado, mas se estabelece uma média entre
normalidades diferentes, não temos a distinção binária entre normais e anormais,
determinada a partir de uma referência a uma norma assumida como critério e modelo
ótimo, mas temos normalidades diferentes, então para estabelecer a norma temos que
fazer operar essas diferentes normalidades. Exemplo: a epidemia de COVID. Não temos
uma única mortalidade, temos a taxa de mortalidade na Itália, Brasil, Espanha, EUA..
agora temos uma média que pode ser criada, essa é a média, essa é a norma, que é a norma
da mortalidade em relação a epidemia de COVID, o mesmo pode ser feito com as medidas
de contenção da epidemia, não temos uma única avaliação do que é normal e anormal,
mas temos médias estatísticas que podem ser usadas para definir intervenções em
instrumentos de segurança.
Último ponto. O dispositivo de segurança não opera mais sobre o corpo individual, mas
sobre o corpo da população.
A população é considerada um grupo na sua naturalidade, ou seja, a população existe e
vive dentro de um ambiente. O conceito de ambiente sobre o qual a gente estava falando
antes. Ou seja, é dependente de uma série de variáveis, como clima, riqueza, doenças, ou
seja, os dispositivos de segurança tem como objetivo governar o povo da população, a
sua naturalidade, a vida da população em um ambiente operando com referência a uma
pluralidade de variáveis que tem que ser consideradas cada vez que queremos governar
através dessas técnicas de segurança.. Terminamos. Agora, na segunda aula, vamos falar
sobre a sociedade do controle.
Aula 19 - Semana 9
Bom dia a todos! Começamos essa segunda parte da nossa aula de hoje, que será dedicada
à discussão do filme (? – 0:15), à discussão da sociedade do controle, da sociedade da
vigilância, através da leitura e discussão de alguns textos, os quais vocês conhecem muito
bem. Ou seja, o texto de Foucault, aquela aula de 1º/01/1978, do curso “Segurança,
território e população”, e através de um outro texto, que é sobre a sociedade do controle,
escrito por um filósofo francês chamado (? – 1:05), mas também através de outras
referências.
Eu queria começar esta aula de discussão dos textos através do texto de um autor que não
analisamos detalhadamente, mas que várias vezes, durante este curso, nós citamos. É o
texto do (? – 1:40), chamado “Crítica da violência”, publicado em 1921, na revista
“Arquivo de ciência social e de ciência política”, dirigida por Max Weber, (? – 2:25).
Quando o texto foi publicado, Max Weber já havia falecido, mas a revista era bastante
ligada à sua família.
O texto é bastante interessante e complexo. Não podemos demorar muito nesta aula
falando deste texto, mas podemos refletir sobre algumas questões que são colocadas no
texto. Eu acho que este texto nos apresenta duas questões importantes para entender a
crise que o autor estava vivenciando nos anos 1920, mas que também são importantes
para entender a crise social, política e de saúde que estamos vivenciando agora no Brasil
e no mundo.
Vocês sabem que a palavra “crítica” deriva da palavra “crisis”, palavra grega que indica
a fase aguda de uma doença, o momento entre a vida e a morte, quando a decisão sobre a
vida e a morte se torna uma decisão ética. Então, “crítica”, no verbo grego (? – 4:30),
significa separar, distinguir, e, consequentemente, significa decidir, julgar o valor de algo.
Então, “crisis” refere-se a (? – 4:50), ou seja, à possibilidade de julgar, decidir sobre o
que fazer em um momento de crise, o que abre para nós a possibilidade ética e política da
crítica.
Agora, a “Crítica da violência” do autor nos diz pelo menos duas coisas, em resposta à
crise dos anos 1920 e àquela que estamos vivenciando atualmente. A primeira diz respeito
à relação geral entre a violência e a lei. O autor tem uma posição bastante radical, mas
interessante. Ele acredita que toda a criação política e jurídica moderna ocultou a relação
estrutural entre violência e direito. Tanto a linha da antropologia política moderna, que
pensa a violência como o dado natural presente antologicamente no ser humano, que deve
ser domesticado e civilizado para construir o (? – 6:10) da violência, ou seja, o Estado e
a sociedade civil, a liberdade e os direitos. Quanto à linha do realismo sociológico e
jurídico, que vem de Weber a Carl Schmitt, segundo a qual a violência é o que deve ser
neutralizado, através da sua inclusão na ordem do direito, como violência legítima do
Estado.
Uma e outra linha, para o autor, não conseguem compreender a relação intrínseca que
subsiste entre direito e violência. A violência é o que define o direito, a sua origem e, ao
mesmo tempo, é o que permite que o direito se conserve como direito. A história do
direito não seria, então, a história maravilhosa que os juristas contam, a história da
realização dos direitos na evolução histórica, mas a história da ocultação dessa origem
incômoda, dessa origem que liga estruturalmente o direito à violência.
Em outras palavras, o autor nos força a abandonar as narrativas tranquilizadoras e
normativistas que vinham na violação dos direitos e no uso da violência apenas uma
exceção às regras do Estado constitucional. O Estado constitucional seria a regra, a
normalidade, enquanto as violações dos direitos seriam excepcionalidade.
O texto nos convida a considerar a relação estrutural que o direito tem com a violência.
A exceção às regras do Estado constitucional não representaria, portanto, um acidente,
mas a ameaça sempre presente que pertence ao direito, à sua origem e à sua conservação.
A segunda questão que o autor coloca é que o lugar em que se manifesta o compromisso
do direito com a violência, onde a relação estrutural entre violência e direito se manifesta
de forma escandalosa e radical, é a polícia. A polícia é uma instituição ignominiosa, nos
diz o autor, porque nela não existe diferença entre a violência que funda o direito e a
violência que o conserva. Se a primeira deve demonstrar que é vencedora, a outra deve
mostrar que não está perseguindo finalidades externas ao direito. A polícia, assim, é
emancipada de ambas as condições.
De acordo com o autor, a polícia intervém em todos os casos em que não há uma situação
legal clara, como na vigilância da vida do cidadão. A violência policial contínua é pior na
democracia do que em um Estado absolutista. No Estado absolutista, no qual não há a
separação entre os Poderes, a violência da autoridade se conforma à essência da
autoridade, à sua natureza, sendo o Estado absolutista fundado sobre o arbítrio da vontade,
o arbítrio da violência.
Nas democracias, a polícia, em tese, teria apenas a tarefa de preservar o direito. Mas, pelo
contrário, a polícia, sub-repticiamente, legisla na clandestinidade. A polícia, nos diz o
autor, é espectral, aparece desaparecendo, fazendo desaparecer o que, na verdade,
representa. A polícia representa a ausência de limites.
Então, eu acho que, à luz dessas observações do autor sobre a ligação estrutural entre a
violência e o direito, sobre a origem de ambos, sobre como a violência funciona como
origem, mas também como instrumento para conservar e manter o direito, a história do
direito é a história da ocultação dessa origem violenta do direito. Essa é a primeira
questão.
Segunda questão: o compromisso entre violência e direito se manifesta de forma
escandalosa na polícia, porque ela é, por essência, a ausência dos limites. É uma
instituição espectral, porque esconde o que, na verdade, representa.
Acredito que essas duas observações do autor nos permitem refletir sobre o presente, em
que pessoas querem discutir a sociedade do controle a partir do (? – 12:50). O presente
que estamos vivenciando no Brasil é um presente que podemos descrever como um
presente no qual a crise se torna normal. Um presente de normalização da crise.
Nessa perspectiva, o elemento comum entre o (? – 13:20) e a situação brasileira é
justamente a normalização da crise. O estado de emergência não é mais algo excepcional,
mas se torna permanente e normal.
A minha tese, que quero lhes apresentar agora, é a seguinte: o estado de emergência,
mesmo que latente (não declarado), se apresenta como um dispositivo governamental,
normalizado, de gerenciamento de crises, não só econômica, mas também institucional e
política. Um dispositivo necessário para interromper os processos de democratização e
inclusão social, e impor uma nova Constituição material, autoritária na gestão política do
conflito social e neoliberal na definição da agenda econômica.
(? – 14:40), como critica a crítica do autor, nos obriga a entrar neste lugar obscuro, no
qual funcionam as tecnologias governamentais, naquele espaço liminar que separa e une,
ao mesmo tempo, direito e violência. Direito é emergência, direito é exceção. Aqui
também aparece a centralidade fantasmagórica da polícia. Uma polícia que não é mais
apenas um aparato repressivo, mas é um instrumento eficaz de governo, aquém e além do
direito. A polícia se torna, não só aparato repressivo do Estado — como sempre foi
pensada na tradição política —, mas também instrumento de governo, aquém e além do
direito.
(? – 16:00), portanto, no filme, como um novo sacerdote, nos inicia nos mistérios da
sociedade do controle. Nos dias em que a história se passa, juntamente com jornalistas,
nós, espectadores, somos apresentados aos novos mistérios. No mundo antigo, os
mistérios do governo e de seu império eram definidos pela expressão latina “arcana
imperii et dominationes”. “Arcana” são os segredos do governo e da dominação, são os
instrumentos que devem ser mantidos em segredo para que se exerça efetivamente o
governo, a dominação. O (? – 17:20) nos fala de “arcana imperii et dominationes”, ou
seja, as técnicas de vigilância digitais, mas também, de uma maneira mais desencantada,
os paradoxos da sociedade moderna, a relação entre o projeto de racionalização e o furor
do poder.
Vocês lembram: começamos todo este curso tentando refletir sobre a relação entre o
projeto de modernização e de racionalização e o poder. Então, qual é a relação entre
racionalização e poder? A racionalização que se realiza com a sociedade moderna produz
para nós uma amplificação dos instrumentos e das técnicas de vigilância e controle, em
outras palavras, as técnicas de poder. A racionalização torna o poder mais eficaz.
Quando falamos sobre (? – 18:50), colocamos como questão central o problema do
disciplinamento. O (? – 19:10) é um modelo arquitetônico disciplinar arquétipo da
sociedade moderna. Agora, na sociedade que estamos vivenciando, que (? – 19:25)
descreve para nós desde uma perspectiva interna, uma perspectiva das técnicas de
vigilência, o (? – 19:40), nesta sociedade, torna-se líquido, fluido. O (? – 19:45) não é
mais somente aquela arquitetura que permite o controle dos preços dos (? – 19:55) dos
soldados na (? – 20:00), mas torna-se a forma geral de uma sociedade. Torna-se líquido.
Em qualquer lugar, somos observados.
E, com as novas tecnologias digitais através da rede, o (? – 20:20) se intensifica e se
estende para ocupar todos os espaços sociais. É como ser o sonho de (? – 20:30) de uma
sociedade transparente, ao mesmo tempo visível e legível em cada de suas partes. Agora,
na sociedade do controle, se torna realmente possível. A distopia da sociedade (? – 20:55)
era, ao final, a utopia do racionalismo moderno. Ou seja, qual era a utopia do racionalismo
moderno que podia se manifestar na sociedade (? – 21:10)? A construção de uma ordem
perfeitamente coerente, internalizada de comportamentos e ações.
A autonomia do sujeito kantiano, sobre a qual falamos bastante neste curso, mostrou seu
lado sombrio e complementar em tecnologias disciplinares de normalização. Para se
tornar sujeito, esse sujeito tinha que ser sujeitado. Em outras palavras, as tecnologias do
corpo assumiram a tarefa de construir o sujeito como condição transcendental de
conhecimento e liberdade. Ou seja, para ter um sujeito como sujeito kantiano, autônomo,
livre, condição do conhecimento, era necessária uma tecnologia disciplinar que sujeitasse
o corpo do indivíduo, através de técnicas disciplinares de assujeitamento e de
individualização.
Então, o discurso que Foucault desenvolveu nos cursos e no texto “Vigiar e punir”. Todos
os discursos dos direitos, da liberdade e da autonomia do iluminismo se fundam ao mesmo
tempo sobre um dispositivo disciplinar que permite, que garante o funcionamento, a
coesão do corpo social.
O (? – 23:05) moderno é moderno porque o poder a que se refere funciona em termos de
um relacionamento. A vigilância é capilar porque é uma tarefa a ser atribuída a quem é
vigiado. Ou seja, é o poder que só pode funcionar à condição de estar escrito em cada um
de nós.
O paradoxo constitutivo da modernidade é o seguinte: autonomia, por um lado, e
heteronomia, por outro. Liberdade, por um lado, e vigilância, por outro. Quanto mais
manifestamos nossa liberdade de comunicação e o uso das tecnologias que permitem a
comunicação, mais participamos ativamente da vigilância. Vocês entendem? Quanto
mais manifestamos nossa própria liberdade, mais os instrumentos de vigilância se ativam,
exatamente permitidos e produzidos através da liberdade de comunicação. Como
escreveu um sociólogo alemão chamado Niklas Luhmann, (? – 24:30).
Mas não há apenas isso. (? – 24:40) é a história do poder antigo e novo, e de seus (? –
24:50) do estado de emergência, dos limites do direito, em relação às tecnologias de
vigilâncias eletrônicas, ao uso dos dados e das informações. Ao mesmo tempo, é também
a história do tomar a palavra, de um processo complicado e sofrido de subjetivização. No
espaço heterotópico de um hotel e de uma cidade como o Congo, espremida entre dois
sonhos, simultaneamente utópicos e distópicos, testemunhamos uma metamorfose.
(? – 25:30), o codinome que assina mensagens criptografadas, se torna (? – 25:45). Ou
seja, torna-se um sujeito que reivindica uma postura e um lugar de fala, um lugar a partir
do qual ele começa a falar e dizer a verdade.
O documentário é também a história de um contradiscurso, que é imediatamente
contraconduta, uma prática ética e política de resistência e remoção dos mecanismos de
subjugação.
O discurso do poder é aquele de (? – 26:25), de resistência e subjetivização. Conduto, não
se opõem, mas constituem duas performances dos dispositivos (? – 26:35) e do poder,
que é desvelado. O discurso do poder e o discurso do sujeito são reflexos invertidos um
do outro. Cada um constitui a condição de possibilidade do outro. Mas talvez estejamos
diante de paradoxos da sociedade moderna.
Então, vamos lá, entender esses paradoxos da sociedade moderna. Vamos a um texto de
um filósofo francês chamado Gilles Deleuze, um filósofo bastante importante, que foi
amigo de Michel Foucault e que retoma muitos de seus argumentos. Antes de morrer, ele
escreve, em 1995, um texto profético chamado “Post-scriptum sobre as sociedades de
controle”, em que ele retoma algumas reflexões de Michel Foucault sobre a sociedade
disciplinar e a sociedade de segurança, desenvolvidas e analisadas nos cursos de 1977 e
1978.
Gilles Deleuze nos diz, nesse texto, que o poder não é mais o sólido, o poder das
sociedades disciplinares, mas é um poder reticular, é um poder ilimitado e generalizado.
A sociedade disciplinar é uma sociedade de internação, uma sociedade de instituições —
família, escola, fábrica, prisão etc. — e uma sociedade de assinatura, que indica o
indivíduo. É a matrícula que indica a posição do indivíduo em uma massa.
Individualização é massificação. São processos complementares que, juntos, garantem a
manutenção da ordem social.
A sociedade do controle, por outro lado, é uma sociedade de dígitos, seu idioma é um
idioma numérico, composto por dígitos que marcam o acesso ou a negação de
informações. Os indivíduos são (? – 29:20), nos diz Deleuze. Isto é, dados, amostras,
bancos, categorias de risco... não são indivíduos, mas são agregados de dados diferentes,
analisados em situações e contextos diferentes.
Deleuze intuiu uma tendência em (? – 29:45). Ele percebe que um regime de dominação
está definitivamente mudando o regime disciplinar. Obviamente ele está ciente de que a
sociedade do controle não elimina os velhos meios e tecnologias próprios da sociedade
disciplinar. Ao contrário, os indivíduos, os corpos, desmaterializados dos bancos de
dados, as categorias de risco do controle atuarial, sempre podem, de acordo com a
necessidade de governança, se materializar novamente em corpos. Corpos de terroristas,
corpos de migrantes, corpos de pobres, são os novos escravos da economia global. Corpos
a serem excluídos, expropriados, disciplinados, aprisionados ou, simplesmente,
sufocados.
Então, ora as ideias de Deleuze necessariamente nos levam de volta a Foucault, à sua
pesquisa do final dos anos 1970 sobre o biopoder, sobre aquelas tecnologias da segurança
que ele desenvolve a partir do curso de 1977 e 1978. Foucault, antes de Deleuze,
provavelmente já havia diagnosticado a mudança, reconhecendo a centralidade das
tecnologias de segurança no governo biopolítico da população.
No curso que introduzimos, segurança, território e população são precisamente as
tecnologias de segurança que complicam e movem o eixo da intervenção do biopoder. No
mais, as tecnologias disciplinares do corpo mais gestão e governo da população em seus
fluxos e movimentos no espaço.
A segurança opera com base em dados, sua administração se concentra na avaliação de
probabilidade e fatores de risco. Ao contrário da disciplina, que é centrípeta, que delimita
e fecha um espaço, a segurança é centrífuga, é reticular, tende a expandir o seu alcance,
adapta-se plasticamente às irritações do ambiente, expandindo ou contraindo.
Diversamente, a disciplina intervém em cada movimento, para corrigi-lo ou direcioná-lo.
A segurança, ao contrário, deixa para lá, promove a mobilidade, intervém nos processos,
mas sem bloqueá-los.
Talvez, enfim, o elemento que mais nos interessa neste contexto: os dispositivos legais
disciplinares operam com base na distinção entre legal e ilegal, obrigatório e proibido.
Respectivamente, os dispositivos jurídicos operam com a distinção entre legal e ilegal, e
o dispositivo disciplinar opera com a distinção obrigatório e proibido. O direito estabelece
o que é proibido e permite todo o resto.
A disciplina estabelece o que é obrigatório, a norma, e proíbe todo o resto. A segurança,
por outro lado, é independente do proibido e do obrigatório. Ao contrário, a segurança
preocupa-se com o controle da complexidade. Em outras palavras, as tecnologias da
segurança e controle têm a função de responder a uma realidade, com o fim de limitá-la,
controlá-la ou regulá-la.
O que está acontecendo com a pandemia, em contextos diferentes do Brasil à Europa, é
exatamente um mecanismo, uma técnica de segurança. A imunidade de rebanho também
pode ser entendida como uma técnica neoliberal de segurança. Desse ponto de vista, as
tecnologias de segurança, destaca Foucault várias vezes, não substituem os dispositivos
legais disciplinares, mas os integram, modificam, transformam. O que acontece é, antes,
um processo de contaminação, depredação e, também, de colonização do Estado por
técnicas de governo.
Chegamos aqui a um ponto decisivo: a relação entre soberania, Estado e governança. A
análise de Foucault nos leva, me parece, a um plano bastante diferente, por exemplo,
daquele discutido por um filósofo italiano chamado Giorgio Agamben, em alguns textos
que foram publicados há alguns anos, mas também textos muito presentes sobre o estado
de exceção. Segundo esses textos, a governamentalidade opera dentro de um dispositivo
soberano que se funda sobre a exceção.
Para Foucault, eu acho, ao contrário do que pensa Agamben, são a soberania e o Estado
que se tornam policêntricos. Não existe apenas um único centro de comando, mas uma
pluralidade de agências semipúblicas e semiprivadas, que, de fato, garantem o governo
da população em um determinado espaço. Mas radicalmente, porém, são as mesmas
tecnologias estáticas de governos que definem ou que compete ao Estado, o que é público
e o que privado, o que é estatal e o que não é.
Agora talvez seja possível voltar ao nosso documentário para entender melhor uma
pergunta que me parece, apesar de Deleuze e de Foucault, ainda é aberta e problemática.
Ou seja, a relação entre a emergência que estamos vivenciando e as tecnologias de
segurança, entre o estado de exceção, mais ou menos declarado, mais ou menos operante
na realidade da vida cotidiana da população — e de grupos específicos da população —
e o exercício efetivo do governo.
(? – 37:20), vocês provavelmente já sabem, é o terceiro documentário de (? – 37:25), que
constitui uma trilogia sobre as consequências do 11 de Setembro. Hoje todos sabemos o
que esse evento significou, um evento total e, acima de tudo, podemos dizer, um evento
global em suas consequências. Como o documentário mostra muito bem, em nome da
segurança nacional e da luta contra o terrorismo, se legitimam leis especiais que
comprimem os direitos individuais, mas, acima de tudo, se configuram novos dispositivos
de controle.
O exemplo mais importante, no caso do 11 de Setembro, é a construção do campo de
Guantánamo, onde, sem julgamento, supostos combatentes inimigos, acusados de
terrorismos, foram subtraídos das regras do direito nacional norte-americano e
internacional, detidos em condições extremas e por tempo indeterminado.
Então, (? – 38:45) nos leva a descobrir os mecanismos de funcionamento da sociedade de
controle, como descrita por Foucault e Deleuze, nos mostra como o poder é reticular,
difuso, policêntrico e invisível. Ao mesmo tempo, no entanto, nos lembra de que as
ferramentas de emergência e exceção típicas da soberania não desaparecem, mas
mudaram, se transformaram, foram readaptadas às novas necessidades da governança
neoliberal.
(? – 39:20), em outras palavras, nos empurra, mais uma vez, para o coração das trevas do
direito moderno, no ponto em que direito e violência se juntam, e o Estado se apresenta
sob a forma da polícia. O Estado se torna o Estado policial, uma polícia espectral, que
age globalmente, dentro e fora das fronteiras nacionais.
Isso não significa, no entanto, repropor, como sempre (? – 39:55) faz, a centralidade
política da soberania como decisão sobre o estado de exceção, que é a definição clássica
de soberania usada por Carl Schmitt. Ao contrário, parece que o estado de exceção se
transforma também, perdeu seu caráter central, não faz mais referência a um soberano
onipotente, mas é constantemente produzido e atuado pela agência da governança
neoliberal.
Ou seja, esse estado de exceção — que, na tradição jurídica, era suspender a Constituição,
a ideia de que tem alguém que pode suspender o direito (“Quem tem o poder de suspender
a Constituição ou os direitos constitucionais? O presidente, o exército, um grupo
parlamentar...”) — não funciona mais dessa forma. Agora temos uma pluralidade de
estados de exceções microfísicos, que são declarados microfisicamente, ou melhor, que
operam sem ser declarados formalmente, mas que operam como práxis normal de
governo, de população e de grupos que são considerados grupos de risco, porque vivem
num espaço específico, porque apresentam um risco de criminalidade específica, porque
apresentam um risco de pegar uma doença etc. O estado de exceção funciona
microfisicamente como forma efetiva de governo e de gestão de uma situação percebida
como risco social.
(? – 42:25), no ensaio de 1921, escreve: (? – 42:30). Ou seja, “há algo de podre no direito”.
O cheiro podre que emana do direito emerge ao analisar as autoridades técnicas semi-
soberanas e (? – 43:00) que operam na normalidade de estados mínimos de exceção. Aqui
a exceção não é aquela do soberano que decide suspender o direito para fundar uma nova
ordem ou para conservar a ordem existente, mas é a exceção do poder discricionário da
polícia. A violência policial não tem forma, sua presença é fantasmagórica, ilusória,
generalizada em todos os lugares. A espectralidade consiste no fato de que um corpo
nunca está presente para si mesmo como ele é, sempre diferente de como ele se apresenta.
Aparece desaparecendo, fazendo desaparecer o que representa.
Se o poder cresce à margem da indeterminação e se prolifera na crise da Constituição,
como estrutura organizada da separação de Poderes. Na crise da Constituição como
instrumento de separação dos Poderes, na crise do constitucionalismo liberal, a polícia se
apresenta como forma de governo da crise. Com a palavra “polícia”, no entanto, devemos
nos referir às forças de segurança pública, mas, como Foucault nos ensina, a todo o
conjunto de dispositivos e tecnologias de segurança e agências através das quais o
governo real da população e do território é exercido.
Um importante sociólogo, David Lyon, nos lembra, em um texto (? – 45:00), como
governos nacionais e grandes empresas trabalham juntas a tal ponto que as empresas
podem operar como uma espécie de polícia, tanto por conta própria quanto pela
autoridade. As empresas começam, Lyon nos diz, a atender a solicitações de dados
pessoais, informações, agregações de dados, antes mesmo de o pedido ser notificado. Isso
sugere que um estado de emergência latente foi aceito.
É evidente que o problema jurídico colocado pela expansão da vigilância não é
compreensível dentro do esquema do liberalismo clássico “indivíduo vs. Estado” ou
“direito à privacidade vs. poder”. A lógica da vigilância e o funcionamento do poder
fogem ao liberalismo clássico. A extensão da vigilância por agências neoliberais do
governo produz, não apenas uma violação da privacidade, mas, sobretudo, redefine as
condições políticas, sociais e econômicas da cidadania. Esse é o ponto importante! As
técnicas de segurança redefinem a cidadania.
Lyon nos fala de (? – 46:45), uma economia política de informações pessoais através da
qual é possível criar novas hierarquias econômicas, jurídicas e sociais, com base nos
perfis de risco permitidos pela agregação de dados pessoais. Assim, são produzidas e
multiplicadas formas de inclusão diferenciadas, que rompem e redesenham radicalmente
as fronteiras da cidadania de uma forma antidemocrática.
Mas não há apenas isso. Existe toda uma dimensão também em relação ao funcionamento
concreto do direito na contemporaneidade da sociedade do controle. As formas do direito
contemporâneo não estão mais dependentes de uma soberania legislativa, mas cada vez
mais são orientadas para uma racionalidade técnica especializada, que pode prescindir
das mediações políticas elaboradas pela tradição jurídica moderna.
Daí, duas consequências relevantes. A primeira diz respeito ao direito, ao fato de ele não
estabilizar mais expectativas, mas se orientar os efeitos, tornando-se uma técnica de
gerenciamento do risco. A outra diz respeito à política, à forma de legitimar a decisão
política. Se, no contexto do constitucionalismo, a decisão é considerada legítima com
base nos procedimentos segundo os quais foi formada — a discussão que já analisamos
com Weber —, a decisão dessas autoridades semi-soberanas técnicas de segurança é
imposta na contingência de uma situação de crise. A legitimação não ocorre ex ante, mas
acontece ex post, depois que os efeitos da decisão foram realizados. A legitimidade
depende do sucesso ou não da intervenção que produz.
Então, concluindo, (? – 49:20) é a história do poder, dos seus segredos, das tecnologias
que o compõem. Mas, como dissemos, é também a história de um processo de
subjetivização e resistência. O poder da sociedade do controle, paradoxalmente, quanto
mais difundido e onipresente, mais é frágil. A resistência passa constantemente pelo
poder. Esse é o ensino de Michel Foucault também. A resistência passa constantemente
pelo poder. Se o biopoder da sociedade do controle toma a vida como objeto de
intervenção política, ao mesmo tempo, a vida constitui um elemento de resistência
ontológico.
Então, não sabemos o que acontecerá, mas sabemos que o jogo está aberto, o jogo está
sempre aberto. O que podemos fazer, no entanto, é decidir, aqui e agora, na imanência da
nossa resistência, como o (? – 50:40), se queremos ser realmente homens e mulheres
livres ou não.
Aula 20 - Semana 10
O tema desta semana é o racismo de estado e a necropolítica. A aula de hoje tem como
objeto a discussão desse texto de Michel Foucault das aulas que ele deu no colégio de
França em 17/03/1976. nesta aula, Foucault problematiza uma questão bastante atual: a
relação entre soberania e o biopoder. Então se a soberania pode ser descrita como o poder,
o direito do soberano de matar, de exercer a violência. se a soberania assim se caracteriza,
então como esse direito de matar pode funcionar dentro da economia política do poder,
dentro da economia política de uma sociedade da normalização?
é aqui que Foucault introduz um conceito muito importante, o racismo. As questões que
nos coloca Foucault nesta aula são: como pode se legitimar o direito do estado de matar
ou expor a morte a própria população quando o poder se torna biopoder? se o biopoder é
um poder preocupado com a vida como pode aceitar legitimar promover a morte? outra
questão é: qual é a economia política da morte e como funciona em um sistema político
centrado na vida?
como pode esse poder governar a vida de uma população? através de uma intervenção de
processos biológico-políticos: mortalidade de doenças, natalidade... todos esses
fenômenos que pertencem a esse grupo só tem um objeto, está internação do poder bio-
político moderno. O poder bio-político está preocupado com a vida, com os corpos
individuais, para torná-los úteis, dóceis. Para torná-los capazes de funcionar bem nos
mecanismos do capitalismo – que precisa de força de trabalho que seja disciplinar.
Disciplinar é transformar os corpos em corpos dóceis.
A questão conclusiva do curso é como esse modelo de poder neste sistema político
organizado ao redor de uma tecnologia de poder que podemos descrever como biopoder
- o poder preocupado com a vida do corpo individual da população - como neste sistema
político funciona a morte, a política da morte? ou seja como funciona o velho direito
soberano de usar a violência até o limite de matar os próprios súditos?
“O que quer dizer de fato direito de vida é de morte ? não é claro que o soberano
pode fazer viver como pode fazer morrer. o direito de vida é de morte só se exerce de
uma forma desequilibrada e sempre do lado da morte o efeito do poder soberano sobre a
vida suas exerce a partir do momento em que o soberano pode matar em última análise o
direito de matar é que detêm efetivamente em si a própria essência desse direito de vida
é de morte é porque eu soberano pode matar que ele exerce seu direito sobre a vida é
essencialmente um direito de espada não há pois simetria real nesse direito de vida é de
morte não é o direito de fazer morreu de fazer me ver não é tão pouco o direito de deixar
viver e deixar morrer é o direito de fazer morrer ou de deixar viver.
Então ter o direito de vida é de morte não significa que há um desequilíbrio entre
a vida é a morte. o poder soberano enquanto poder da negação pode ser manifestado a
partir do exercício da morte.
Foucault fala em uma de suas aulas sobre um indivíduo que tentou matar o
soberano quem foi exposto foi supliciado foi condenado ao suplício público. Perceba que
o suplício acontece publicamente, acontece na praça principal. está todo mundo pode
assistir ao suplício, todo mundo deve assistir o suplício. todos querem assistir o suplício
por prazer e por medo. prazer em medo sobrepõem se um ao outro. O suplício deve ser
uma tortura tremenda, terrível. o corpo do sentenciado deve ser esquartejado. ele está
deitado numa mesa e os cavalos tiram os membros do indivíduo. foucault descreve isso
de forma muito detalhada nas páginas iniciais de vigiar é punir. qual é o significado do
suplício nesta economia do poder soberano? vou vamos ler um trecho de vigiar é punir
sobre o significado político e jurídico do suplício:
“vou suplício tem então uma função jurídico política é um cerimonial para
reconstruir a soberania lesada por um instante. ele a restaura manifestando em todo o seu
brilho. vou à execução pública pô rápida e cotidiana que seja sincera em toda a série dos
grandes rituais do poder eclipsado restaurado coroação entrada do rei numa cidade
conquistada sobre missão dos sítios revoltados: I'm por cima do crime que desprezou
soberano é lesiva aos olhos de todos uma força invencível. sua finalidade é menos de
estabelecer um equilíbrio que de fazer funcionar até um extremo a de simetria entre o
susto que usou violar a lei e os soberano todo-poderoso que faz valer a sua força se a
reparação do dano privado ocasionado pelo delito deve ser bem proporcionada se a
sentença deve ser justa a execução da pena é feita para dar dar um espetáculo da medida
mas do desequilíbrio do excesso deve haver nessa liturgia da pena uma afirmação enfática
do poder e de sua superioridade intrínseca e essa superioridade não é simplesmente é do
direito mas você está força física do soberano que se abate sobre o corpo de seu adversário
domina atacando a lei infrator lesa a própria pessoa de príncipe ela ou pelo menos aqueles
a quem ele delegou sua força se apodera do corpo do condenado para mostrá-lo marcado
vencido quebrado.
Os únicos suplícios públicos dessa magnitude foram até a decaptação de Luís XVI
durante a revolução francesa. quem tão soberano que será decapitado pelo povo. Esse ato
de cortar a cabeça do rei foi também a forma de transferir o poder soberano de um sujeito
ao outro sem mudar a estrutura, o direito do soberano. O povo soberano manifesta a
própria soberania através da cortação da cabeça do rei. É interessante como esta ideia da
soberania como o poder de matar se mantém tambem em um quadro de democratização
do poder soberano.
A função assassina do Estado só pode ser assegurada, desde que o Estado funcione
no modo do biopoder, pelo racismo...
A questão que se nos apresenta agora é: como é possível que um poder preocupado
com a dominação da vida? Vida enquanto corpo biológico passível de dominação pelas
normas. A norma pode ser uma norma de produtividade, pode ser uma norma
heterossexual, pode ser uma norma de uma sociedade patriarcal, pode ser uma norma que
permite diferenciar os anormais dos normais. Os corpos, portanto, são conformes as
normas sociais disciplinares.
Por outro lado, temos uma preocupação de vida no sentido da população, ou seja,
de governar o corpo da população em um ambiente. Controlar as trocas nas cidades,
controlar os funcionamentos urbanísticos da cidade, controlar onde é possível governar
através de dispositivos de segurança. Todas essas tecnologias que configuram o horizonte
biopolítico no qual a vida do organismo-indivíduo, assumem o corpo como dimensão
central nas técncas de governo do biopoder.
Dizer que se vive em uma sociedade de normalização não quer dizer que o
biopoder soberano é usado para o funcionamento do Estado. Ao contrário, as técnicas
disciplinares e o poder soberano se confundem até criar uma forma de poder na qual temos
a normalização e o velho direito soberano de matar. Quando o poder soberano quer
funcionar com os mecanismos disciplinares têm que necessariamente fazer referência ao
racismo. Se quiser utilizar o direito de matar, tem que fazer referência ao racismo.
Tirar a vida não deve ser entendido simplesmente como assassinato direto:
Então vocês entendem agora porque a ideia que Foucault tem modernidade é uma
idéia de que o processo de racionalização é uma ideia bastante complexa, por exemplo,
ele nos disse que tem um vínculo muito forte entre a teoria biológica do século XIX e o
discurso do poder.
Tudo isso é pensado no século XIX através dos termos, das lentes, podemos dizer,
do discurso evolucionista, de um discurso evolucionista biologista fortemente racista.
Então o que funda e justifica o racismo que vai se desenvolvendo teoricamente no século
XIX, um racismo bem diferente dos séculos antecedentes, é um racismo biológico que se
baseia sobre a idéia biológica, a intenção biológica das raças.
Mas a coisa mais importante, mais relevante para o nosso discurso e para um
entendimento crítico da modernidade é que o racismo não é algo, uma técnica, que é uma
entre outras técnicas, mas é a tecnologia que permite no estado moderno o funcionamento
do direito superado (?) de matar que justifique, legitime o assassino, no sentido de expor
também à morte, não só assassino em direito (?), mas, sobretudo, que através da teoria
biológica evolucionista racista é possível, no século XIX, pensar fenômenos sociais muito
diferentes entre si, a loucura, por exemplo, os problemas das classes pobres, a pobreza
das classes, as classes pobres são pensadas mas como classes fracas, como classes
geneticamente desvantajadas, como classes que têm um problema biológico, que as afeta.
Outra questão bem importante para o discurso de hoje é que o racismo de estado
irrompe com a colonização, ou seja, a colonização é o lugar que ocupa uma posição
especial na modernidade. Já Marx em “O Capital”, no capítulo 24, sobre acumulação
originária nos diz que a modernidade, os direitos humanos, Bentham, a liberdade, ou seja,
o sistema do capitalismo se funda sobre a violência, sobre a expropriação do trabalho vivo
e, sobretudo, sobre a rapina colonial, sobre a expropriação das terras coloniais e sobre a
exploração do trabalho das populações indígenas e sobre a escravidão.
Então o Foucault está falando do passado, está falando, na verdade, do presente.. como o
racismo me permite explicar o funcionamento prático das guerras contemporâneas, das
operações de polícia, dos tratamentos dos inimigos, dos tratamentos dos criminosos.
Mas é interessante e útil nesta aula e neste curso porque retoma alguns conceitos de
Michel Foucault, o conceito de racismo, o conceito de biopolítica, o conceito de soberania
ou conceito de direito... retomando esses conceitos você interpreta através da questão da
colonização.
Então a colonização assume na análise de Mbembe a posição central para entender a
modernidade e o processo de racionalização moderna. Para entender o processo de
modernização moderna nós temos que nos confrontar com a questão da colonização, com
o significado da colonização assume no plano jurídico, no plano político e até um plano
diretamente filosófico.
Então podemos dizer que está algo de podre na biopolítica e este algo de podre na
biopolítica é a possibilidade sempre presente da biopolítica de se tornar necropolítica.
Como pode se tornar necropolítica? Por um lado, através de uma política de intervenção
na direita sobre a vida, então, uma intervenção que é permitida pela técnica. A biopolítica
pode ser transformado em necropolítica quando a técnica, a tecnologia médica científica
permite uma intervenção sobre a vida que pode até destruir a vida, que pode chegar a
destruição da vida. Vocês podem pensar sobre este assunto, a questão das bombas
atômicas, dessas novas tecnologias de destruição em massa das pessoas... como a
tecnologia permite a intervenção sobre a vida, mas a tecnologia pode ser usada para
destruir completamente a vida sobre o planeta.
Então, agora, Mbembe nos disse uma coisa importante, disse que a necropolítica
funciona coligando, juntando a biopolítica, ou seja, a proteção da vida com a soberania,
ou seja, o direito de exercer a violência e que este conjunto de biopolítica e de poder
soberano funciona dentro do estado de exceção, no estado de sítio que se normaliza, que
se torna regra.
Ele escreve:
Os textos principais que animam este debate são: o texto de Giorgio Agamben,
um filósofo italiano que provavelmente vocês já ouviram, o texto “Homo Sacer”, que foi
publicado, em 1995, na Itália e foi publicado em português no Brasil e em vários outros
lugares e traduzido para várias línguas; “Estado de exceção”, de 2001. Um outro texto
muito importante é do outro filósofo italiano que se chama Roberto Esposito, também
traduzido que se chama “Immunitas”, publicado em 2002.
Nós temos um outro texto que é um curso de Jacques Derrida, filósofo francês que
vocês que seguramente conhecem. Deu o último curso entre 2001 e 2003. Depois teremos
esse texto Mbembe, “Necropolítica”, de 2013. Um texto que também é interessante, da
Judith Butler, sobre a relação entre a morte e a biopolítica que se intitula “Vida precária:
os poderes do luto e da violência”, publicado em 2004. Eu estou falando isso só para
dizer, só para colocar o livro do Mbembe em um contexto um pouco mais amplo onde há
exposições que podem aquecer um sentido mais profundo e, ao mesmo tempo, estou
dizendo isso para quem quer se aprofundar nestes temas... já é uma pequena bibliografia
sobre o tema do racismo, do biopoder e do estado de exceção.
A teoria mais conhecida sobre o estado de exceção foi a desenvolvida por Carl
Schimitt, um católico de direita que se torna nazista, em Teologia Política. Ele diz que o
soberano é quem decide sobre o estado de exceção. O estado de exceção é aquele
momento no qual é necessário que o soberano suspenda as garantias constitucionais para
defender a ordem política. Essa ideia pode ser conservada, tutelada através de uma
suspensão do direito. É um instituto paradoxal: é necessário suspender os direitos e o
sistema para restaurar os direitos, para tutelar o ordenamento direito. é um instrumento,
pensado pelos juristas do século XIX e XX, necessário para defender a sociedade em uma
situação de urgência e necessidade. O soberano pode usar da violência aquém e além da
lei e das garantias constitucionais. Há uma suspensão da constituição, da separação dos
poderes em nome de alguma ameaça. A soberania aparece exatamente no estado de
exceção, pois não mais limitações constitucionais.
Até agora, Mbember está repetindo Foucault, mas aqui está a sua especificidade:
a colônia é um arquétipo do Estado de exceção. Isso é muito interessante porque mostra
que a primeira vez que aparece a relação entre soberania, biopoder e racismo não é no
Estado nazista. A colônia representa o lugar de exceção em que a soberania consiste
fundamentalmente no exercício de um poder à margem da lei (legibus solutus). As
colônias são esse lugar interessantíssimo no qual se manifesta pela primeira vez o poder
soberano, biopolítico através do mecanismo do racismo, ou seja, através da separação
entre raças, através de uma hierarquia das raças, entre forças e fortes, normais e anormais.
No espaço colonial, essa geometria se confunde, não é mais legível através das
categorias políticas do direito moderno. O exército torna-se polícia, a polícia torna-se
exército. O criminoso torna-se inimigo e o inimigo é criminalizado. O soberano se
confunde se sobrepõe às milícias privadas, grupos criminosos, latifundiários, empresas
multinacionais. No espaço colonial, o soberano é mais o agente que imagina o soberano,
ou seja, o supremo titular do poder, o vértice do poder político, mas se torna soberano
também grupos privados, milícias privadas, latifundiários, ou seja, todas as organizações
que conseguem organizar o território.
Através de uma análise histórica, vemos que o Estado de exceção que nós vivemos
é a regra, é a normalidade. O Estado de exceção é a normalidade, é a dimensão que
começando na colônia persiste nas metrópoles como regra na qual todos vivem, por meio
de critérios de raça.
Chegamos a alguns problemas aqui:
Nosso curso tem a pretensão de pensar a nossa atualidade! A semântica chega
sempre depois das produções culturais, portanto, estamos sempre em dificuldade, pois as
nossas categorias intelectuais são mais limitadas que as mutações culturais que acontecem
na nossa experiência de vida. A questão de problematizar todo o discurso político da
modernidade não pode não chegar a tentar repensar o presente a partir de alguns conceitos
que desenvolvemos neste curso: biopolítica, biopoder, racionalização, necropolítica,
estado de exceção.
Então chegamos neste ponto: como funciona o estado de exceção na nossa
atualidade? Muitas vezes o estado de exceção não é declarado. Funciona, mas funciona
indiretamente. Então como funciona o estado de exceção no horizonte político que é
caracterizado pelo neoliberalismo, pelo necroliberalismo? Agora, como funciona essa
relação a um direito que sempre mais é um direito desvinculado da Constituição, um
direito reticular e pluricêntrico da Constituição, do constitucionalismo clássico, liberal,
liberal democrático, que é colocado em xeque na crise econômica, dos processos das
crises institucionais, políticas e até das crises de saúde como, por exemplo, a pandemia.
O direito é colonizado sempre mais através das práticas disciplinares, das práticas de
segurança. Então como funciona esse estado de exceção nesse novo horizonte neoliberal
de gestão da crise? Então aqui algumas sugestões que eu deixo para vocês refletirem antes
da gente concluir o nosso curso.
Sobre a Constituição ser fraturada: fraturada por quem? Assistimos uma crise
institucional no Brasil fortíssima e onde a separação dos poderes são continuamente as
ameaçadas, são continuamente questionadas. Na Europa tenho uma centralidade do
executivo, quando em muitos países europeus têm uma Constituição no qual Congresso
é o órgão principal e não é o executivo, não é o presidente. Então.. um quadro de regulação
unitária garantida pelo direito público da Constituição fraturadas... “assistimos uma
pluralidade de autoridades semi-soberanas, semi- constituintes que operam nos confins
da lei no seu espaço intersticial, dentro e fora dos limites da soberania”
Consequências da normalização do
estado de exceção. (Ele leu os
tópicos e foi comentando)
Sobre o primeiro tópico: ou seja, a
polícia no sentido não só de exercer
de instituição que exerce a
violência, mas uma instituição que
governa a contingência, que
governa o que acontece, que governa o imprevisível e que está diretamente ligada a
contingência do momento.
Sobre o segundo tópico: então a política opera através da censura racista que separa quem
deve viver e quem deixar morrer, expor a morte simbólica e real. A política se torna
racista na medida no qual se torna necropolítica.
Sobre o terceiro tópico: a cidadania é fragmentada porque esta separação produz
categorias diferentes de população. Depois, a separação pode acontecer através dos
critérios de raça, de gênero, mas, também, segundo os novos critérios biomédicos, idade,
doença, perspectiva de vida que são capitalizadas para construir perfis, categorias de
risco. Então quem pertence a uma categoria tem um risco x, quem pertence a categoria x
pode ser preso, pode ser alvo de uma operação da polícia, de exclusão, de marginalização,
estigmatização etc
Sobre o quarto tópico: a sobreposição dos critérios sociais com os biológicos permite criar
perfis de risco, categorias de risco e, para cada perfil, a categoria específica, status
político, jurídicos, segundo uma lógica de segurança financeira. Tem uma lógica nesta
lógica dos perfis de risco, tem uma lógica na financeirização, no capitalismo financeiro.
Tudo é considerado através da lógica econômica do risco. Então as pessoas são
consideradas como possíveis sujeitos que tem em si um valor associados a um valor e um
risco.
Então se trata de capitalizar, assegurar este risco, capitalizar o valor e assegurar o risco
segundo uma lógica que é tipicamente do capitalismo financeiro e que é aplicada nas
políticas de gestão da população. O direito aqui se transforma em direito liberal. o direito
condicional é irritado continuamente pela política e colonizado cada vez mais pelas
práticas governamentais de gestão e controle dos riscos reconfigurando-se
completamente. Esta reconfiguração determina várias coisas.
Minha tese que estou propondo para vocês neste final do curso é a seguinte:
Então a minha tese que estou falando aqui é que o estado de exceção se torna
regra, mas no sentido que se torna microfísico, é o mecanismo normalizado de
gerenciamento das crises econômicas, sociais, políticas, de polícia; é necessária para
interromper os processos democratização, inclusão e impor nova Constituição material
autoritária na gestão política do conflito social e neoliberal na definição da agenda
econômica. Eu acho que, em muitos países, na Europa, no Brasil, nos Estados Unidos, a
gente está vivenciando este cenário triste.
Então o direito se transforma, o direito se torna uma técnica de gerenciamento de
risco e também a política. A política muda a forma de legitimação da decisão. A forma
que pensava Marx Webber. Se, no contexto do constitucionalismo, a decisão é
considerada legítima com base nos procedimentos racionais segundo os quais foi formada
os procedimentos, a decisão agora depende das autoridades soberanas, privadas, uma
autoridade que é imposta na contingência da situação de crise.
Portanto, é legítimo em relação a tradição ao resultado que produz, que consegue
produzir. Se o resultado produzido é o esperado, então o resultado é legítimo; mas se não
conseguir o resultado esperado, então é ilegítima e tem que ser superada.