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Traducao No Vazio A Variacao Linguistica

A tese investiga a variação linguística nas traduções de 'Pygmalion' e 'My Fair Lady', analisando como os tradutores lidam com desafios de recreação de dialetos em diálogos ficcionais. Utilizando uma metodologia baseada em corpora, o estudo examina a correlação entre estratégias de tradução e fatores como meio, data de tradução e função esperada. Os resultados indicam que as escolhas dos tradutores variam entre a normalização do texto e a recriação de variedades linguísticas, influenciadas por normas culturais e contextuais.

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Adriana Conde
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Traducao No Vazio A Variacao Linguistica

A tese investiga a variação linguística nas traduções de 'Pygmalion' e 'My Fair Lady', analisando como os tradutores lidam com desafios de recreação de dialetos em diálogos ficcionais. Utilizando uma metodologia baseada em corpora, o estudo examina a correlação entre estratégias de tradução e fatores como meio, data de tradução e função esperada. Os resultados indicam que as escolhas dos tradutores variam entre a normalização do texto e a recriação de variedades linguísticas, influenciadas por normas culturais e contextuais.

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE LETRAS
CENTRO DE ESTUDOS COMPARATISTAS

TRADUÇÃO NO VAZIO
A VARIAÇÃO LINGUÍSTICA NAS TRADUÇÕES PORTUGUESAS DE
PYGMALION, DE BERNARD SHAW, E MY FAIR LADY
DE ALAN JAY LERNER

SARA RAMOS PINTO

TESE DE DOUTORAMENTO EM ESTUDOS DE CULTURA


(ESTUDOS DE TRADUÇÃO)

ORIENTADA PELO PROFESSOR DOUTOR JOÃO FERREIRA DUARTE


E PELA PROF. DOUTORA ALEXANDRA ASSIS ROSA

2009
ABSTRACT

The use of linguistic varieties in fictional dialogue helps to inform the reader about which character is
speaking and under which circumstances. It becomes a textual resource that helps the reader to define
the sociocultural outline of the character, as well as his/her position in the sociocultural fictional context.
As an element always embedded in the source text with a communicative and semiotic significance, the
presence of linguistic varieties in fictional dialogue presents the translator a particular challenge given
that the target language may not have adequate resources to provide for an equivalent target text and
formal correspondences might be impossible to pursue. Faced with the case where the source language
reflects the close relationship between the speaker/medium/context in which it is used, the translator is
thus forced to decide on the importance and meaning of the use of a specific dialect in the text. The
difficulty in translating literary dialects therefore lies not only in linguistic problems, but also in pragmatic
and semiotic difficulties, since their presence in the text adds meaning beyond the linguistic level. This is
why it is important to discuss the translator’s decision to recreate or not to recreate linguistic variation
and how he/she chooses to go about the problem, as this decision may modify, or even subvert, the
work’s internal coherence.
Within the framework of Descriptive Translation Studies, this thesis sets out to investigate the strategies
translators resort to when faced with the challenge of translating and recreating a linguistic variety in
fictional dialogue and the potential correlation between the translational patterns and (a) the medium
(page, stage and screen), (b) the date of translation and (c) the prospective function the translation was
expected to fulfill in the target context. Building on the work developed by Dimitrova (1997, 2002),
Leppihalme (2000a, 2000b) and Rosa (1999, 2001, 2004), this thesis represents an initial attempt to
define a corpus-based methodology for the semi-automatic analysis of the translation of dialects in
fictionsl dialogue. Such methodology is then applied to a parallel electronic corpus, including all the
speeches of one the characters (Eliza) of Bernard Shaw’s Pygmalion and Alan Jay Lerner’s My Fair Lady
and their corresponding 12 translated versions, published, performed and broadcasted in Portugal
between 1945 and 2001. Translation procedures are analyzed in terms of (a) the recreation or non-
recreation of linguistic variation; (b) the preservation or non-preservation of time and space coordiantes
of the ST and (c) the use of familiar or non-familiar features for the target text audience; (d) the selection
of linguistic, pragmatic and literary signs socio-semiotically more or less valued in the target culture.
The study finds that the strategies translators opt for can vary from total normalization of the text to a
recreation of a linguistic variety in the target text, either denouncing an initial norm of adequacy,
revealing a higher valuation of the source culture, text and author, or an initial norm of acceptability,
revealing a higher valuation of the intended reader, and target culture’s ideology. It also finds that the
recreation of linguistic varieties in translated text is not only mediated by the dominant norms of each
medium but also by contextual factors such as the technical aspects of each medium, the date of
translation and the prospective function. Nevertheless, given the limited size of the corpus, any
conclusions presented by this study are necessarily tentative and await verification in future, with larger
corpora.

i
ii
AGRADECIMENTOS

Diversas são as pessoas e instituições a quem não poderei deixar de agradecer, pois sem o seu apoio este
projecto não poderia ter sido realizado. As primeiras palavras de agradecimento dirigem-se, como não
poderia deixar de ser, aos meus orientadores, Professor Doutor João Ferreira Duarte e Prof. Doutora
Alexandra Assis Rosa, pelo papel de guia conselheiro que assumiram ao longo desta jornada de quatro
anos, pela disponibilidade e atenção que a este projecto sempre dispensaram, pelo profundo saber que
aceitaram partilhar comigo. Permitindo um espaço de liberdade e de responsabilização sem silenciar
importantes palavras de confiança nos momentos em que esta escasseava, possibilitaram que encontrasse
o meu caminho enquanto investigadora com a confiança necessária para enfrentar os momentos de maior
desafio.

Ao professor Yves Gambier agradeço com amizade ter-me aceite como visiting fellow na Universidade de
Turku, assim como a disponibilidade que sempre me concedeu e as desafiantes discussões que sempre
distinguirão a minha estadia na Finlândia como um dos momentos de viragem neste projecto.

Ao professor Theo Hermans agradeço igualmente ter-me recebido como visiting research student na
University College London por três anos consecutivos e pela atenção e incentivo que sempre concedeu a
este projecto, ajudando-me a ter em consideração diferentes perspectivas de modo a que a escolha do
caminho tomado fosse o resultado de uma escolha consciente.

Não poderei deixar de agradecer à Prof. Doutora Christine Zurbach pelo balancear de ideias em momentos
de dúvida e pela cedência de bibliografia aquando da definição de um modelo teórico adequado, assim
como à Prof. Doutora Maria João Brilhante pela ajuda indispensável para a consulta da tradução para
teatro de 1974. Cabe ainda agradecer o empréstimo ou envio de bibliografia aos Professores Doutores
Sirkku Aaltonen, Cecilia Alvstad, Andrew Chesterman, Henrik Gottlieb, José Lambert e Tiina Puurtinen.

Agradeço ainda a disponibilidade para responder aos questionários enviados e cedência de informação
relativamente a edições passadas ao Dr. Fernando Guedes, director da Editorial Verbo, ao serviço de
cliente da Editorial Europa-América, à Dra. Teresa Sustelo, directora dos serviços de tradução da RTP, à
Dra Maria Auta de Barros dos serviços ao cliente da SIC e à direcção do Museu do Teatro que me permitiu
aceder ao arquivo “Francisco Ribeiro”.

Não esquecendo a oportunidade de me ter dedicado a tempo inteiro a este projecto durante quatro anos,
agradeço à FCT pela Bolsa de Doutoramento que me foi concedida e ao Centro de Estudos Comparatistas
pelo financiamento de participações em diversos congressos.

Aos meus amigos agradeço as palavras de encorajamento ditas com amizade e, por vezes, com a
paciência que só nos amigos se encontra, sobretudo nos momentos de maior desafio. Deixo aqui o

iii
agradecimento de quem não esquece à Sofia, à Zeynep, à Rita, à Claire, ao Tom, à Catarina e à Lili, mas
um agradecimento especial à Ana pela leitura de partes da tese, pela discussão de ideias e pela presença
incondicional.

Aos meus pais e ao meu irmão é devido um agradecimento de toda uma vida. Pela presença e apoio
constante ao longo deste percurso de 27 anos, pelas palavras de incentivo ou de alerta em momentos de
desvio, pela confiança que sempre demonstraram ter em mim, mas sobretudo pelo exemplo de
perseverança e trabalho que moldou a minha atitude e me animou nos momentos mais adversos.

Ao André dirijo um obrigado que necessariamente transborda os limites de qualquer expressão verbal. A
confiança que sempre demonstrou ter em mim e neste projecto, a discussão animada que em torno dele
alimentou, o olhar crítico que manteve e as perguntas provocadoras que nunca procurou calar mostram
como este foi um projecto vivido a dois e construído num processo de conquistas e desânimos
acompanhado por aquele sem o qual este projecto não teria sido feito.

A todos dedico um sincero agradecimento, ficando da minha parte a promessa de que o exemplo de rigor,
disponibilidade, solidariedade e exigência recebido ficará para sempre presente no moldar da minha
atitude para com colegas e alunos no futuro.

Muito obrigado e Bem hajam!

iv
ÍNDICE

ÍNDICE DAS FIGURAS …………………….…………………………………………………….. xi

ÍNDICE DAS TABELAS ………………….……………………………………………………….. xiii

LISTA DE SIGLAS USADAS ….…….…….………….…….…………………………………….. xv

INTRODUÇÃO …………...……………………………………………………………………… 1

PARTE I. ENQUADRAMENTO TEÓRICO

CAPÍTULO 1. OS ESTUDOS DESCRITIVOS DE TRADUÇÃO ……………………………………. 9

1.1. A proposta de um estudo empírico e interdisciplinar ………………………………………… 9

1.2. A Tradução como fenómeno da cultura de chegada …………………………………………. 11

1.3. Normas de equivalência tradutória ….………………..………………………………………... 15

1.4. Estratégias e procedimentos de tradução ……………………………...…………………….. 23

1.5. Leis e universais de tradução …………………………..………………………………………. 25

CAPÍTULO 2. O ESTUDO DAS VARIÁVEIS CONTEXTUAIS ………………………………………. 31

2.1. O texto em contexto ………………………………………………...…………………………… 32

2.1.1. Contexto Situacional ……………………………………………………..……………... 34

2.1.1.1. O Campo ……………………………………………..………………………… 38

2.1.1.2. As relações interpessoais …………………………………………………….. 40

2.1.1.3. O modo ………………………………………….….…………………………... 42

2.1.2. Contexto Cultural ………………………………………………………..……………….. 46

2.1.2.1. Dimensão pragmática …………………………………………………………. 47

2.1.2.2. Dimensão semiótica ……………………………………………………………. 49

2.2. Os EDT e as propostas do New Historicism e o Cultural Materialism ……………………… 54

CAPÍTULO 3. A ANÁLISE DE CORPORA EM ESTUDOS DESCRITIVOS DE TRADUÇÃO …………. 61

3.1. A Análise de Corpora em Estudos Descritivos de Tradução ………………………………. 64

3.2. Limitações da Análise de Corpora em Estudos Descritivos de Tradução …………………. 67

v
PARTE II. MODELO DE ANÁLISE

CAPÍTULO 1. A VARIAÇÃO LINGUÍSTICA ………………………………………………………. 71

1.1. Variação linguística: terminologia ………………………………………………………………. 71

1.2. Valorização de variedades: o estabelecimento de uma hierarquia e a identificação


de estereótipos ………………………………………………………………………….……….. 72

1.3. Recriação de variedades linguísticas em texto ficcional …………………………………….. 74

1.3.1. Recriação sem aspirações de realismo ………………………………………………. 75

1.3.2. Uma recriação conseguida em diferentes níveis …………………………………….. 77

1.3.3. Uma recriação mediada por diferentes factores ……………………………………... 78

1.3.3.1. Mediação dos diferentes propósitos narrativos a cumprir ………………… 79

1.3.3.2. Mediação da tradição ………………………………………………………….. 81

1.3.3.3. Outros factores de mediação …………………………………………………. 89

CAPÍTULO 2. A VARIÁVEL MEIO: TRADUÇÕES PARA A PÁGINA, O PALCO E O ECRÃ …………... 91

2.1. Sistema dramático, sistema teatral e sistema televisivo: terminologia …………………….. 92

2.2. Meios distintos, circuitos distintos, estéticas distintas ………………………………………. 94

2.3. Meios distintos, orientações de tradução distintas …………………………………………… 102

2.3.1. Condicionantes dos meios em estudo ………………………………………………... 102

2.3.2. A tradução orientada para a representação teatral: performatividade 108


e articulação ………………………………….…………….…….…………….…….…………..

2.3.3. Tradução orientada para publicação e para legendagem: legibilidade ………….... 115

CAPÍTULO 3. A TRADUÇÃO DA VARIAÇÃO LINGUÍSTICA ………………………………………. 117

3.1 Estratégia de não-manutenção da variação linguística ………………………………………. 119

3.2. Estratégia de manutenção da variação linguística …………………………………………… 121

3.2.1. Tendência para a normalização do texto de chegada ………………………………. 122

3.2.2. Movimento de não-normalização do texto de chegada ……………………………. 128

3.3. Tipologia das estratégias de tradução da variação linguística ……………………………... 131

vi
3.4. Tipologia de classificação das variedades literárias em tradução e o estabelecimento 135
de uma escala de prestígio …………………………………………………………………….

3.5. Contínuo relativo ao grau de incorrecção reconhecido às marcas linguístico-textuais 139


por um falante médio ……………………………………………………………………………

3.6. Factores contextuais condicionantes da acção de tradução ………………………………. 141

3.6.1. Meio a que se destina a tradução ……………………………………………………... 141

3.6.2. Data de realização da tradução ……………………………………………………….. 142

3.6.3. Função prospectiva da tradução ……………………………………………………… 142

PARTE III. METODOLOGIA DE ANÁLISE

CAPÍTULO 1. SELECÇÃO E CONCEPÇÃO DO CORPUS ………………………………………… 145

1.1. Critérios de concepção e selecção de um corpus ……………………………………………. 145

1.2. O Corpus paralelo inglês/português ……………………………………………………………. 150

1.2.1. Concepção do corpus paralelo ………………………………………………………… 150

1.2.2. Motivação metodológica e prática para a constituição do TDT-Port ……………… 153

1.2.2.1. Corpus diacrónico …………………………………………...………………… 154

1.2.2.2. Uma única língua de partida - o inglês ………………………………………. 154

1.2.2.3. O suporte expressivo e o modo de tradução ………………………………. 155

1.2.2.4. Um corpus monolingue ……………………………………………………….. 155

1.2.2.5. Um único método de tradução ……………………………………….………. 156

1.2.2.6. Amostras ou textos integrais ………………………………………….……… 156

1.2.2.7. Tradução profissional e estudante …………………………………………… 156

1.2.2.8. Disponibilidade dos textos - publicados e não-publicados ……………..... 156

1.2.3. Selecção e constituição do corpus translato …………………………………………. 157

1.2.3.1. Etapas da constituição do corpus translato ………………………………… 157

1.2.3.1.1. Identificação da população-alvo ………………………………... 157

1.2.3.1.2. Selecção dos textos a incluir no TDT-Port …………………….. 157

1.2.3.1.3. Recolha de dados contextuais específicos dos textos 161


seleccionados ……………………………………………………...

vii
1.2.3.2. Textos incluídos no TDT-Port …………………………………………………. 162

1.2.4. Concepção e constituição do corpus não-translato ………………………………… 164

CAPÍTULO 2. CONCEPÇÃO DO CORPUS PARALELO ELECTRÓNICO …………………………. 167

2.1. Criação do sub-corpus não-translato ………………………………………………………….. 167

2.2. Criação do sub-corpus translato ……………………………………………………………….. 169

2.3. Dimensão do corpus paralelo …………………………………………………………………… 171

2.4. As unidades de classificação ……………………………………………………………………. 171

CAPÍTULO 3. METODOLOGIA DE ANÁLISE SEMI-AUTOMÁTICA DO CORPUS PARALELO ……… 173

3.1. Metodologia de análise …………………………………………………………………………... 173

3.2. Instrumentos de análise semi-automática ……………………………………………………... 175

3.3. Etiquetagem das unidades frásicas e criação do esquema de codificação ………………. 176

3.4. Esquema de codificação …….……………….…………….……….…………………………… 180

PARTE IV. ANÁLISE

CAPÍTULO 1. Elementos Contextuais …………………………………………………….. 183

1.1. Pygmalion e My Fair Lady no contexto de partida ……………………………………………. 183

1.2. A presença de Pygmalion e My Fair Lady no contexto de chegada ………………………... 184

1.3. O público-alvo …………………………………………………………………………………….. 186

1.3.1 Traduções para publicação ……………………………………………………………… 187

1.3.2. Traduções para teatro (palco) ……………….………………………………………….. 188

1.3.3. Traduções para TV (legendagem) ………………………………………………………. 189

1.4. Colecções e quadros de programação ………………………………………………………… 189

1.5. Os tradutores ……………………………………………………………………………………… 190

CAPÍTULO 2. Análise dos sub-corpora não-translato e translato …………………… 193

2.1. Análise dos dados quantitativos do sub-corpus não-translato ……...……………………… 193

2.1.1. Recriação de variedades linguísticas ………………………………………………….. 193

viii
2.1.2. Recriação das variedades menos prestigiadas ………………………………………. 198

2.2. Análise dos dados quantitativos do sub-corpus translato …………………………………… 200

2.2.1. Análise global do sub-corpus translato ……………………………………………….. 201

2.2.2. Ponderação de níveis inferiores de análise na análise global do sub-corpus 203


translato ……………………………………………………………………………………

2.2.2.1. Recriação das variedades linguísticas ………………………………………. 204

2.2.2.2. Recriação das variedades menos prestigiadas …………………………….. 215

2.2.3. Correlação das regularidades identificadas com variáveis contextuais: 226


meio a que se destina o TC ……………………………………………………………..

2.2.4. Correlação das regularidades identificadas com variáveis contextuais: 223


data de tradução ………………………………………………………………………….

2.2.4.1. Evolução cronológica da recriação das variedades padrão, oral 234


e subpadrão e das respectivas estratégias de tradução …………………….

2.2.4.2. Evolução cronológica do recurso a marcas linguístico-textuais de 241


variedades menos prestigiadas e das respectivas estratégias de tradução.

2.2.5. Correlação das regularidades identificadas com variáveis contextuais: 245


função prospectiva ……………………………………………………………………….

CONCLUSÃO …………………………………………………………………………………… 265

BIBLIOGRAFIA ……………………………………………………………………………..…… 287

ANEXO A: ATRIBUTOS EXTRATEXTUAIS ……………………………………………...………. 313

ANEXO B: QUESTIONÁRIO …………………………………………………………………….. 325

ANEXO C: ANÁLISE DESCRITIVA DOS RESULTADOS DO QUESTIONÁRIO ………...……………. 329

ANEXO D: SUB-CORPORA NÃO-TRANSLATO E TRANSLATO …………………………………... 338

ix
x
Índice das Figuras

Figura 1: Esquema descritivo da variação segundo o uso e o falante (tradução e

adaptação do esquema apresentado em Bell, 1991: 185) …..………………………... 36

Figura 2: Tipologia da variação segundo o meio …………………………………………………... 44

Figura 3: Tipologia de corpora analisados em EDT (baseado em Rosa, 2004: 91) ……………. 66

Figura 4: Corpora na investigação trans-linguística (tradução do modelo de

Granger, 2003: 21) ……………………………….…..……………………………………... 66

Figura 5: Terminologia relativa aos sistemas literário/dramático, teatral, televisivo ……………. 93

Figura 6: Alterações relativas ao modo aquando do processo de tradução nos

sistema literário, teatral e televisivo …...………………………………………………….. 104

Figura 7: Tipologia das estratégias identificadas na tradução da variação linguística

em texto ficcional ...………………………………………………………………………… 131

Figura 8: Tipologia da classificação das variedades literárias expressiva dos

significados comunicativos e do valor socio-semiótico das variedades ..…………… 136

Figura 9: Sistema de prestígio de variedades literárias …………………………………………… 137

Figura 10: Contínuo relativo ao grau de incorrecção reconhecidos às marcas

linguístico-textuais ………………..……….……………………………..……………….. 139

Figura 11: Funções prospectivas a assumir por textos traduzidos no contexto de chegada ... 143

Figura 12: Intervalos de desvio padrão definidos para a análise dos dados relativos à

recriação de variedades prestigiadas e não prestigiadas …………………………….. 174

Figura 13: Intervalos de desvio padrão definidos para a análise dos dados relativos

aos níveis linguísticos de que a recriação de variedades tira partido ……………….. 175

Figura 14: Esquema de codificação das unidades constitutivas dos sub-corpora

não-translato e translato ………………………………………………………………….. 181

Figura 15: Cronograma com as diversas versões e traduções de Pygmalion e My Fair

Lady nos sistemas de partida e de chegada ……………..……………………………. 186

Figura 16: Alinhamento cronológico expressivo da recriação das variedades padrão,

oral e subpadrão nas traduções para publicação presentes nos sub-corpora

não translato e translato ………………………………………………………………….. 234

xi
Figura 17: Alinhamento cronológico expressivo da recriação das variedades padrão,

oral e subpadrão nas traduções para o palco presentes nos sub-corpora

não translato e translato …………….……………………………………………………. 238

Figura 18: Alinhamento cronológico expressivo da recriação das variedades padrão,

oral e subpadrão nas traduções para legendagem presentes nos sub-corpora

não translato e translato ……….………………...……………………………………….. 239

Figura 19: Alinhamento cronológico expressivo do recurso a marcas morfossintácticas,

lexicais e gráficas nas traduções para publicação presentes nos sub-corpora

não translato e translato ……………….…………………………………………………. 241

Figura 20: Alinhamento cronológico expressivo do recurso a marcas morfossintácticas,

lexicais e gráficas nas traduções para o palco presentes nos sub-corpora

não translato e translato ………………………….………………………………………. 243

Figura 21: Alinhamento cronológico expressivo do recurso a marcas morfossintácticas,

lexicais e gráficas nas traduções para legendagem presentes nos sub-corpora

não translato e translato ………………………………….………………………………. 244

Figura 22: Movimentos de consolidação e de subversão identificados no corpus translato …. 259

xii
ÍNDICE DAS TABELAS

Tabela 1: Dimensão do sub-corpus não-translato (número de frases e palavras) ……………... 168

Tabela 2: Dimensão do sub-corpus translato (número de frases e palavras) …………………… 170

Tabela 3: Dimensão do corpus paralelo (número de frases e palavras) …………………………. 171

Tabela 4: Percentagens médias relativas à recriação de variedades ficcionais no

sub-corpus não translato …………………………………………………………………. 194

Tabela 5: Percentagens médias das variedades ficcionais no sub-corpus não translato

nas diferentes fases de evolução da personagem Elisa face ao número total

de unidades identificados em cada uma das três fases definidas ………………….. 198

Tabela 6: Percentagens médias das marcas linguístico-textuais distintivas do discurso

como oral ou subpadrão nos sub-corpora não translato …………………………….. 199

Tabela 7: Percentagens médias das marcas linguístico-textuais distintivas do discurso

como oral ou subpadrão no sub-corpus não translato nas diferentes fases de

evolução da personagem Elisa face ao total de unidades identificadas em

cada um das três fases definidas ……………………………………………………….. 200

Tabela 8: Percentagens médias das variedades ficcionais prestigiadas e menos

prestigiadas nos sub-corpora translato e não translato ………………………………. 201

Tabela 9: Percentagens médias das marcas linguístico-textuais distintivas do discurso

como oral ou subpadrão nos sub-corpora translato e não translato ……………….. 203

Tabela 10: Percentagens médias das variedades ficcionais no sub-corpus translato e

organizadas segundo o meio a que as traduções se destinam ……………………… 204

Tabela 11: Percentagens médias relativas à recriação de variedades ficcionais nas

traduções para publicação ……………………………………………………………….. 205

Tabela 12: Percentagens médias relativas à recriação de variedades ficcionais nas

traduções para legendagem ……………………………………………………………... 207

Tabela 13: Percentagens médias relativas à recriação de variedades subpadrão regional,

social e social específico no sub-corpus translato ……………………………………. 209

xiii
Tabela 14: Percentagens médias relativas ao número total de marcas linguístico-textuais

distintivas do discurso como oral ou subpadrão nos sub-corpora translato e

não translato ……………………………………………………………………………….. 216

Tabela 15: Percentagens médias relativas às marcas linguístico-textuais distintivas do

discurso como oral ou subpadrão nos dois grupos identificados nas traduções

para publicação ……………………………………………………………………………. 217

Tabela 16: Percentagens médias relativas às marcas linguístico-textuais distintivas do

discurso como oral ou subpadrão nos dois grupos identificados nas traduções

para legendagem ………………………………………………………………………….. 218

Tabela 17: Percentagens médias relativas às marcas linguístico-textuais distintivas do

discurso como oral ou subpadrão nos dois grupos identificados nas

traduções para o palco …………………………………………………………………… 219

Tabela 18: Percentagens médias relativas às marcas linguístico-textuais distintivas do

discurso como oral ou subpadrão face ao número total de desvios

identificados em cada um dos níveis estabelecidos ………………………………….. 221

Tabela 19: Percentagens médias relativas às marcas linguístico-textuais distintivas do

discurso como oral ou subpadrão face ao número total de desvios

identificados ………………………………………………………………………………... 223

Tabela 20: Percentagens médias relativas às marcas linguístico-textuais distintivas do

discurso como oral ou subpadrão face ao número total de unidades

tradutórias e unidades tradutórias não-padrão ………………………………………... 225

xiv
INTRODUÇÃO

O aproveitamento criativo de variedades linguísticas (dialectos e pronúncias) em texto ficcional

funciona como recurso mimético de que o autor tira partido tendo em vista a caracterização

indirecta das personagens, das relações interpessoais entre elas estabelecidas e das

circunstâncias de discurso. Sem preocupações de realismo e recorrendo a estereótipos

linguísticos facilmente identificados e interpretados pelo leitor/ espectador, o uso de variedades

linguísticas importa para e recria no texto ficcional juízos de valor e hierarquias sociais não só

com objectivos ao nível diegético, mas também de posicionamento face à ideologia dominante.

Para o tradutor, este manifesta ser um verdadeiro desafio, não só por levar a que as suas opções

ganhem visibilidade textual, mas principalmente por reflectir a relação particular entre o tipo de

discurso e o indivíduo/ meio/ situação em que é utilizado. A dificuldade de tradução de variedades

linguísticas advém, neste sentido, da assimetria reconhecida entre dois sistemas linguísticos

diferentes, mas, fundamentalmente, da necessidade de tradução das relações existentes entre os

elementos formais e os parâmetros extralinguísticos, isto é, a tradução dos significados

socioculturalmente determinados e expressivos de uma estrutura ideológica, face ao qual o texto

se posiciona e que conhecerá contornos necessariamente diferentes na cultura de chegada. As

diferenças reconhecidas entre as estruturas sócio-ideológicas, a valorização atribuída a

determinadas categorias, grupos ou, inclusive, variedades linguísticas e a natureza regional e

local reconhecida a essas variedades linguísticas, forçam o tradutor a uma visibilidade acrescida

na medida em que este se vê obrigado a agir sobre o texto e, possivelmente, a trabalhar

criativamente sobre o código linguístico de chegada.

Parece, portanto, incontestável que, assim como a opção pela recriação de variedades

linguísticas em texto ficcional está saturada da presença autoral (agindo no sentido da produção

de significados específicos que assistem o receptor no posicionamento do texto e do autor no

contexto e interpretação da obra), também a recriação de variedades linguísticas em texto

traduzido estará saturada da presença do sujeito responsável pela tradução. A tensão causada

pela dificuldade de tradução procurará ser resolvida pelo agente tradutor que assume escolhas e

estratégias num processo de ganhos e perdas de significados denunciador, em última instância,

da posição do tradutor no contexto sociolinguístico e sócio-ideológico de chegada; da relação


1
entre as culturas de partida e de chegada; dos valores, normas e imagens em circulação no

contexto de chegada; da função a cumprir pelo texto na cultura de chegada e, possivelmente,

dos contornos do leitor implícito.

Diversos trabalhos em Estudos de Tradução abordaram já o tópico da tradução de variedades

ficcionais, tendo sido, inclusive, proposto o universal de “normalização dialectal” (Dimitrova,

1997) que, formulado com base em regularidades encontradas em diversos textos, procura

expressar a tendência de o texto de chegada apresentar uma taxa de discurso dialectal inferior

ao texto de partida. Contudo, os estudos existentes abordam a questão de forma muito sucinta

ou no âmbito de um estudo mais abrangente, baseando-se em corpora muito limitados e

constituídos apenas por textos literários.

O presente estudo tem por objectivo focar os diferentes aspectos da tradução de variedades

linguísticas em textos ficcionais de língua inglesa (britânica) para português europeu traduzidos

no séc. XX. Será tido em conta um corpus que permite não só o estabelecimento de um

alinhamento cronológico que nos elucide quanto à opção por diferentes estratégias tradutórias

em períodos distintos, mas também a inclusão de textos não literários e a ponderação de

diferentes meios (página, palco, ecrã) e da influência desse factor na escolha de estratégias

tradutórias. Tendo como ponto de partida todos os textos de língua inglesa traduzidos e

representados em teatros portugueses no séc. XX, foram seleccionados como pertinentes, após

um moroso processo de filtragem e selecção, doze traduções de Pygmalion de Bernard Shaw e

My Fair Lady de Alan Jay Lerner, distribuindo-se os textos por três meios distintos: traduções

para publicação, traduções para teatro (palco) e traduções para TV (legendagem).

Combinando as propostas dos Estudos Descritivos de Tradução, da Gramática Sistémico-

Funcional, da Sociologia, da Pragmática, do New Historicism e Cultural Materialism e da Análise

de Corpora em Tradução foram desenhados um modelo e uma metodologia de análise que nos

permitiram seleccionar um corpus pertinente para o estudo do tópico em questão; desenhar um

modelo de análise de variedades linguísticas ficcionais, tendo em consideração os diferentes

tipos de variação e o prestígio que lhes é reconhecido; propor uma metodologia de análise semi-

automática da qual resultarão dados quantitativos relativamente à recriação de variedades

linguísticas em texto ficcional; descrever e analisar os dados quantitativos recorrendo a técnicas

de análise estatística; identificar regularidades de comportamento tradutório e analisar a


2
correlação entre as regularidades identificadas e variáveis contextuais como o meio a que se

destina o texto de chegada, a data de tradução e a função prospectiva, ou seja, a função que se

prevê que venha a preencher no contexto de chegada.

Tendo em conta o tópico em estudo e as variáveis contextuais seleccionadas para a análise, o

presente estudo apresenta como norteadoras as seguintes hipóteses:

a) A procura de manutenção dos significados socioculturalmente determinados relativamente

às variedades linguísticas e importados para o texto pela presença de marcas não-padrão

conduz o tradutor no sentido da aceitabilidade (em cumprimento das normas e

expectativas dominantes) ao contexto de chegada. Neste sentido, é manifesta a opção por

marcas linguístico-textuais de fácil reconhecimento no contexto de chegada, afastando-se

o tradutor da preocupação em tirar partido do mesmo tipo de desvios linguísticos e nas

mesmas situações a reconhecer no texto de partida.

b) Face à necessidade de tradução de um discurso subpadrão num texto ficcional, meios

diferentes, porque com características distintas, levam ao escalonar das prioridades de

forma diversa e, consequentemente, à opção de estratégias particulares que se mostram

específicas de cada meio.

c) O alinhamento cronológico das traduções, previamente agrupadas consoante o meio a

que se destinam, torna evidente não só a opção por diferentes estratégias tradutórias em

diferentes períodos, como também a mudança gradual do sistema linguístico no sentido

de uma cada vez maior aceitação da presença de variedades subpadrão no discurso

ficcional literário.

d) Tendo em conta o período em estudo e a presença de uma censura institucional até 1974,

as traduções realizadas entre 1932 e 1974 manifestam estratégias de normalização do

discurso, isto é, o recurso a marcas gráfica e gramaticalmente menos desviantes, sendo

preferencialmente por via do nível lexical que o discurso é demarcado como subpadrão.

e) A opção tradutória seleccionada está em consonância com a função prospectiva definida

pelo agente promotor da tradução, pelo que é possível identificar relações de correlação

entre a função prospectiva e as estratégias tradutórias identificadas.

3
Tendo em conta as leis tradutórias de padronização crescente e de interferência propostas por

Toury, assim como os universais de normalização dialectal e de convergência, o presente estudo

procurará ainda testar as seguintes hipóteses:

a) Os textos de chegada apresentam uma frequência de ocorrência de marcas subpadrão

inferior à identificada no texto de partida.

b) Tendo em conta o alinhamento das variedades ficcionais num sistema organizador das

diferentes variedades entre os extremos de prestígio e menor prestígio, os textos de

chegada denunciam uma preferência pela(s) variedade(s) posicionada(s) no meio termo do

contínuo em detrimento das variedades posicionadas nos extremos do alinhamento.

c) Nas traduções mais recentes (últimas décadas do séc. XX) é possível confirmar uma

presença mais significativa de discurso subpadrão do que nas traduções das primeiras

décadas do período em estudo.

d) Nas traduções mais recentes (últimas décadas do séc. XX) é possível reconhecer uma

menor tolerância à interferência e uma maior valorização da aceitabilidade.

Como tal, o presente estudo apresenta-se como uma contribuição construtiva e original também

pela conciliação de propostas teóricas, já diversas vezes interpretadas como antagónicas e

inconciliáveis, mas que provam aqui ser não só conciliáveis, como complementares e

promotoras de uma análise mais robusta tanto pela ponderação de dados quantitativos, que

poderão no futuro fazer parte de um estudo comparativo mais abrangente, como pela

ponderação de variáveis contextuais e das relações de correlação existentes entre os dados

obtidos e o contexto sociocultural que os enquadra. Será assim igualmente objectivo do

presente estudo formular um conjunto de normas relativamente à tradução de variedades

ficcionais e à variação nas estratégias adoptadas segundo o meio a que se destina o TC e

desenhar uma tipologia de estratégias tradutórias de variedades ficcionais reunindo os dados

identificados por diversos estudos, incluindo o presente. Espera-se que este seja um contributo

construtivo para futuros projectos de investigação, assim como para tradutores no activo, que

poderão encontrar nos dados conseguidos e na tipologia desenhada um instrumento de

trabalho, na medida em que são aqui discutidas diferentes estratégias tradutórias, os resultados

da sua aplicação e os contextos que as enquadram, de entre as quais poderão optar de forma

consciente e informada.

4
A apresentação do argumento e do projecto de investigação aqui desenvolvidos encontra-se

estruturado em quatro parte essenciais:

Parte I. Enquadramento teórico

São aqui apresentadas as propostas teóricas de que o presente estudo tirou partido na

formulação do modelo de análise. No capítulo 1 são identificados e discutidos os princípios

básicos dos Estudos Descritivos de Tradução que o presente estudo reconhece como

enquadramento teórico fundamental. No capítulo 2, aceitando os limites do modelo proposto por

Toury, nomeadamente no que diz respeito ao estudo de relações de correlação entre

características linguístico-textuais e variáveis contextuais, são apresentadas as propostas da

Gramática Sistémico-Funcional, do New Historicism e Cultural Materialism que este estudo

importa e identifica como complementares dos Estudos Descritivos de Tradução. Tendo em

conta as propostas de diferentes autores, são aqui identificados os conceitos básicos da análise

das relações que o texto mantém com elementos do contexto situacional e do contexto

sociocultural mais vasto. No capítulo 3, são apresentados e discutidos os pressupostos da

Análise de Corpora em Estudos de Tradução (onde se vêem conciliadas as propostas e

instrumentos da Linguística de Corpus e dos Estudos Descritivos de Tradução) que vieram

propor novas avenidas de investigação aos EDT e dos quais o presente estudo tirou partido na

construção do modelo e metodologia de análise.

Parte II. Modelo de análise

Nesta segunda parte, são exploradas as coordenadas específicas para o estudo da recriação de

variedades ficcionais em texto ficcional, assim como da sua tradução, e dos diversos parâmetros

a ter em consideração aquando da ponderação dos diferentes meios incluídos no corpus

seleccionado. No capítulo 1, são explorados os aspectos relativos à recriação de variedades

linguísticas em texto ficcional nomeadamente as funções que cumpre na diegese e as diferentes

linhas de mediação que condicionam a recriação. No capítulo 2, são identificados os conceitos

fundamentais relativos aos diferentes meios em estudo, tornando clara a terminologia utilizada e

os elementos característicos e distintivos de cada um dos meios incluídos no corpus a ser mais
5
tarde recuperados aquando do estudo da correlação existente entre estes e as regularidades de

comportamento tradutório identificadas. No capítulo 3, são apresentados os aspectos referentes

à tradução de variedades ficcionais. Ao mesmo tempo que é feita uma revisão de estudos que

previamente abordaram este mesmo tópico, são apresentados os conceitos de que a análise

tirará partido e que serviu de base tanto à construção do modelo de classificação das unidades

tradutórias e à metodologia de análise semi-automática, como à posterior interpretação dos

dados obtidos.

Parte III. Metodologia de análise

Uma vez apresentado o modelo de análise, coube nesta terceira parte expor a metodologia de

análise especificamente desenhada para o presente estudo e na qual podem ser reconhecidas

diferentes etapas de selecção e concepção de um corpus pertinente para o estudo do tópico em

questão, de concepção de um corpus paralelo electrónico e de desenvolvimento de uma

metodologia de análise semi-automática. No capítulos 1 e 2, após a reflexão sobre algumas das

exigências formuladas na bibliografia consultada, é descrito em pormenor todo o processo de

selecção e concepção do corpus, assim como do corpus paralelo electrónico com o propósito

de tornar o presente estudo claro e replicável e os dados obtidos recuperáveis por estudos

futuros. No capítulo 3, é apresentada a metodologia de análise e as grelhas de etiquetagem que

nortearam o processo de classificação das unidades frásicas, assim como a descrição da sua

aplicação semi-automática ao corpus electrónico descrito nos capítulos anteriores.

Parte IV. Análise dos sub-corpora não-translato e translato

Nesta quarta e última parte, são apresentados os dados resultantes do estudo quantitativo e as

diferentes etapas da análise comparativa dos dados seguida por uma análise qualitativa da

relação de correlação existente entre as regularidades de comportamento tradutório que a

análise quantitativa permitiu identificar e as variáveis contextuais seleccionadas. O capítulo 1,

tendo em conta o favorecimento da consideração de factores contextuais, tem por objectivo

apresentar uma breve resenha relativamente à presença dos textos em estudo no contexto de

chegada, sendo, como tal, apresentada a listagem das obras traduzidas, dos tradutores, das

respectivas datas de tradução, do número de retraduções e em que circunstâncias foram

6
apresentadas, assim como uma análise sucinta do contexto imediato de apresentação

(colecções e quadros de programação), da formação dos tradutores e do público-alvo. No

capítulo 2, são expostos os dados quantitativos resultantes da etiquetagem das unidades

tradutórias a que se segue a análise desses mesmos dados e a identificação de regularidades de

comportamento que se faz acompanhar do estudo comparativo entre os dados relativos ao sub-

corpus não-translato e o sub-corpus translato. Numa última fase, procedeu-se ao estudo de

possíveis correlações existentes entre as regularidades identificadas e as variáveis contextuais

seleccionadas, a saber, o meio, a data de tradução e a função prospectiva.

Em conclusão, este estudo apresenta-se como um estudo das estratégias assumidas na

tradução de variedades linguísticas em textos ficcionais de língua inglesa (britânica) para

português europeu no século XX, procurando, por um lado, identificar regularidades de

comportamento tradutório, e por outro, perceber qual o grau de correlação existente entre as

estratégias assumidas e o meio a que se destina a tradução, a data de tradução e a função que

se espera que a tradução venha a preencher no contexto de chegada. O modelo e a metodologia

de análise são de aplicação alargada, na medida em que um dos objectivos do presente estudo

é que estes sejam potencialmente recuperáveis em estudos futuros tendo em consideração

outros textos, outros pares de línguas ou outros contextos socioculturais. Tal como referido

anteriormente, as conclusões da análise apresentam-se como uma primeira abordagem ao tema

da tradução de variedades linguísticas para português, como um primeiro contributo para a

compreensão das opções tradutórias assumidas, das normas tradutórias que as inspiram e do

grau de participação do contexto no momento de decisão.

7
8
Parte
I

Enquadramento Teórico

Os Estudos Descritivos de Tradução

O estudo das variáveis contextuais

A análise de corpora em Estudos Descritivos de Tradução


Parte I - Enquadramento Teórico

CAPÍTULO 1
OS ESTUDOS DESCRITIVOS DE TRADUÇÃO

1.1. A proposta de um estudo empírico e interdisciplinar

Recuperando certas linhas teóricas anteriores – nomeadamente a proposta de Mcfarlane

(1953) de um estudo descritivo sistemático da tradução, ou o modelo de Holmes (1988)

estruturador da disciplina – Toury (1995) apresenta um novo modelo, enfatizando o carácter

descritivo dos Estudos de Tradução. Holmes, reconhecendo à disciplina o objectivo duplo

de descrever o fenómeno de traduzir, para dessa descrição extrapolar princípios capazes

de explicar e prever o fenómeno descrito ou as suas características específicas, dividia a

disciplina em Estudos de Tradução Puros e Aplicados, reconhecendo nos Estudos de

Tradução Puros uma ramificação em Estudos Teóricos e Estudos Descritivos. Toury,

louvando a estrutura pioneira de Holmes (Toury, 1991: 180), designa de Estudos de

Tradução o que Holmes designa de Estudos de Tradução Puros, subdividindo-os em

Estudos Descritivos de Tradução (EDT) e Estudos Teóricos de Tradução (ETT). É nos

Estudos Descritivos de Tradução que Toury faz repousar a sua atenção, reforçando, por um

lado, a interdependência entre os três tipos de estudo descritivo já previstos no modelo de

Holmes – “function-, process- and product-oriented” (Toury, 1995: 11) – e, por outro, a inter-

relação entre os Estudos Teóricos e os Estudos Descritivos de Tradução:

[…] it is a fact that the findings of well-performed studies always bear on their
underlying theories. Whether theory-relevant implications are drawn by the
researchers themselves or by some other agent, most notably empirically minded
theorists, they contribute to the verification or refutation of general hypotheses, and
to their modification in particular. (Toury, 1995: 15)

Aos Estudos de Tradução está destinada a missão de dar conta de forma sistemática de:

a) o que a tradução pode, em princípio, implicar;

b) o que de facto implica, em determinados contextos, assim como as razões que a tal

levaram;

9
Parte I - Enquadramento Teórico

c) o que provavelmente implicará num ou noutro contexto.

A proposta de uma linha de estudo descritiva e explicativa estabeleceu, desde logo, uma

das mais marcantes dicotomias em Estudos de Tradução: a oposição entre abordagens

descritivas e prescritivas do estudo do fenómeno da tradução. Em contraposição a estudos

marcadamente prescritivos e especulativos, Toury apresenta os EDT como um ramo dos

Estudos de Tradução que desenvolve estudos empíricos, observacionais e descritivos-

explicativos. Assim sendo, e na linha do que havia sido proposto por Hempel (1952), Toury

apresenta como objectivos principais dos EDT:

a) descrever o fenómeno em análise de forma sistemática e exaustiva;

b) analisar a relação entre as regularidades encontradas e o contexto correlato do

fenómeno em estudo;

c) estabelecer princípios gerais pelos quais se poderá explicar e predizer os

fenómenos descritos.

Tratando-se de princípios probabilísticos, conseguidos pela observação de casos reais e

identificação do que tende a ocorrer em determinadas circunstâncias, torna-se possível que

a sua ocorrência seja sistematicamente prevista:

[…] there is no pretence that the nature of translation is given, or fixed in any way.
What is addressed, even in the longest run, is not even what translation is in general,
but what it proves to be in reality, and hence what it may be expected to be under
various specifiable conditions. (Toury, 1995: 32)

Toury diferencia ainda dois tipos de estudos: observacionais e empíricos (Toury, 1995:

222-223). Um estudo observacional – orientado para o produto e função – aceita como

objecto algo já existente, operando retrospectivamente no sentido de uma descrição das

características linguístico-textuais do texto traduzido, da função que assume na cultura de

chegada ou do escrutínio do processo de decisão na produção do texto. Um estudo

empírico – orientado para o processo – terá primeiro de assegurar, através de

questionários, o objecto a partir do qual obterá os dados a analisar.

Embora todos os seus esforços caminhem no sentido da definição de uma metodologia

própria dos Estudos de Tradução, Toury, confirmando a influência das propostas de Holmes

10
Parte I - Enquadramento Teórico

e Even-Zohar, reconhece a necessidade de uma abordagem interdisciplinar na prossecução

de um estudo empírico e descritivo do fenómeno da tradução, assim como a adopção e

adaptação de instrumentos desenvolvidos em disciplinas como a Linguística ou a

Sociologia.

O presente estudo pretende ser descritivo-explicativo, observacional e interdisciplinar,

tendo como objectivos orientadores: a observação dos textos que constituem o corpus; a

identificação das características linguístico-textuais dos textos traduzidos; a descrição de

regularidades de comportamento na tradução de variedades linguísticas nos textos de

chegada em português; a identificação das variáveis contextuais correlatas de

determinados comportamentos tradutórios, a verificação de (in)existência de relações de

correlação entre as regularidades encontradas e as variáveis contextuais definidas para o

estudo. Ainda que centrado nas propostas dos EDT, este estudo assume uma postura

interdisciplinar, criando intersecções com disciplinas várias, como a Linguística, a

Linguística de Corpus, a Teoria da Literatura, os Estudos Literários, os Estudos de Teatro, a

História e Cultura Contemporâneas e a Sociologia.

1.2. A Tradução como fenómeno da cultura de chegada

Um dos pontos mais marcantes na proposta de Toury (1980, 1995), a surgir quase em

simultâneo pelas mãos de Vermeer com a proposta da Skopostheorie ([1978] 1996, 1989),

viria a ser a definição de tradução como fenómeno da cultura de chegada.

O pendor descritivo e explicativo que propõe para a disciplina, desviando o foco da relação

entre TP e TC e assumindo a multiplicidade de fenómenos extratextuais implicados no

processo de tradução, leva Toury a fazer decorrer do contexto sociocultural de chegada a

definição de tradução:

Within our frame of work, the assumption is applied to assumed translations; that is,
to all utterances which are presented or regarded as such within the target culture,
on no matter what grounds. (Toury, 1995: 32)

11
Parte I - Enquadramento Teórico

Esta noção assenta em três postulados distintos: o pressuposto de existência de um texto

de partida; o pressuposto de existência de uma relação entre estes dois textos e de um

processo de transferência de certas características do TP para o TC; e, por último, o

pressuposto de que existem certas relações que unem o TC ao TP, determinados

elementos resultantes de uma transferência intercultural, intersemiótica e interlinguística

(Toury, 1995: 35).

Considerando a tradução uma forma de transferência discursiva entre sistemas e circuitos

culturais e tendo em conta que a escolha do que é traduzido, como e com que função, é

feita por aquele que incita o movimento de transferência – usualmente o contexto de

chegada (Hermans, 1996: 27) – o contexto sociocultural em que a tradução se enquadra é

o da cultura de chegada, na medida em que reflecte o estado de coisas do contexto de

que é correlata. Segundo Toury, o estudo deve partir do que é observável na CC (o texto

traduzido), sem que isso necessariamente implique a análise do texto de partida e da

relação de transferência entre o texto de partida e o texto de chegada. Não deixando de

seguir a linha de reorientação dos ET para a CC, no presente estudo será, no entanto, tido

em consideração, não só a CC, os seus agentes e relações de poder, mas também a

relação que esta mantém com a CP e as posições relativas que estes mantêm dentro de

um polissistema mais vasto. À luz do que havia sido proposto por Even-Zohar (1979) com a

Teoria dos Polissistemas posteriormente desenvolvida por Lambert e van Gorp (1985),

considera-se que a CP e a relação existente entre as culturas de partidas e de chegada

participa activamente, não só na escolha do texto a traduzir, como também na forma como

o texto é traduzido. Neste contexto, a posição de centralidade ou marginalidade que a

tradução assume dentro do sistema apresenta-se também como uma forma privilegiada de

estudo do estatuto da tradução na CC e das relações de poder existentes entre ambas as

culturas.

Do modelo de Holmes, Toury recupera ainda a divisão dos estudos descritivos em três

aspectos – função, produto e processo –, sublinhando a necessidade de estudar a

interrelação entre estes três modos:

12
Parte I - Enquadramento Teórico

[…] one cannot but proceed from the assumption that functions, processes and
products are not just ‘related’, in some obscure way, but rather, from one complex
whole whose constitutive parts are hardly separable from one another for purposes
other than methodical. […] [T]he program must aspire to lay bare the
interdependencies of all three aspects if we are ever to do so within one unified (inter)
discipline. (Toury, 1995: 11)

As interdependências entre os três aspectos surgem como foco de interesse, na medida

em que será importante identificar as regularidades que marcam a relação entre função,

produto e processo. Ainda que a totalidade dessa interdependência possa apenas ser

abarcado pelos EDT, um estudo individual da tradução que tenha em consideração apenas

um dos aspectos será sempre um estudo descritivo parcelar que nega as diferentes

dimensões da tradução (Toury, 1995: 11):

[…] there is no real point in a product-oriented study without taking into account
questions pertaining to the determining force of its intended function and to the
strategies governed by the norms of establishing a ‘proper’ product. (Toury, 1995:
13)

Toury defende, assim, que à análise do texto traduzido se deve seguir um alargamento do

âmbito do estudo por forma a abarcar certos elementos considerados pertinentes do

contexto sociocultural correlato do texto. Não deixando de reconhecer o amplo

desenvolvimento que o conceito de função conheceu por intermédio de autores como

Wright (1968) ou Vermeer ([1978] 1996), no contexto da Teoria da acção e da

Skopostheorie1 , Toury procura demarcar-se dessas mesmas posições que considera

demasiado focadas num aspecto só. Dentro de uma perspectiva semiótica, função é agora

definida “as the ‘value’ assumed to an item belonging in a certain system by the virtue of

1 Considerando que a tradução é um tipo de acção humana, Vermeer, em acordo com a Teoria da Acção
(Wright, 1968; Rehbeir, 1977; Harras, 1978 – cf. Nord, 1997: 11), define a acção tradutória como intencional e
orientada para um determinado propósito condicionado pelo contexto em que a acção toma lugar (a cultura de
chegada). Um dos factores mais relevantes nesta teoria apontado como determinador do propósito é, como tal,
o destinário, com as suas expectativas e necessidades comunicacionais específicas. Assim sendo, traduzir
significa “to produce a text in a target setting for a target purpose and target addresses in target
circumstances” (Vermeer, [1978] 1996: 29). A proposta de Vermeer foi uma válida contribuição para a
ponderação da função como factor determinante da tradução; contudo, não sendo objectivo deste estudo
centrar a sua análise na forma como determinada tradução cumpre ou não os propósitos inicialmente definidos,
a abordagem dos EDT demonstrou ser satisfatória e operativa.

13
Parte I - Enquadramento Teórico

the network of relations it enters into” (1995: 13). A função prospectiva de uma tradução é

pelo autor proposta como um importante factor de mediação, um dos elementos

participantes no processo de decisão e escolha de estratégias tradutórias, sendo a

tradução agora considerada dentro de um contexto particular, onde vem a ocupar uma

determinada posição e satisfazer determinadas necessidades e propósitos:

[...] functions should be regarded as having at least logical priority over their surface
realizations [...] once such a perspective has been opted for, the reversal of roles is no
longer viable: since translating is a teleological activity by its very nature, its systemic
position, and that of its future products, should be taken as forming constraints of the
highest order. (Toury, 1995: 14)

Na descoberta da relação entre função, produto e processo, mostra-se fundamental o

estudo comparativo das regularidades linguísticas, na medida em que estas nos permitem

identificar procedimentos de desvio ou manutenção. Segundo Toury, apenas a partir da

análise dos desvios será possível reconstituir a função prevista para o texto na cultura de

chegada, assim como as estratégias por que o tradutor optou e as normas que estas

poderão denunciar. O conceito de desvio conhece, por via de diferentes propostas 2, a

distinção entre desvios obrigatórios, naturais do processo de tradução como consequência

de diferenças sistémicas, e desvios não obrigatórios ou opcionais, resultado de opções de

diferentes naturezas (ideológicas, estilísticas ou culturais) por parte do tradutor. Uma vez

que as escolhas não são tomadas no vazio, antes denunciando um processo de escolha

entre diversas hipóteses possíveis, o seu estudo mostra ser um aspecto valioso no estudo

do processo de decisão, das motivações e das normas de tradução que as condicionam. A

noção de desvio, já referida por Popovič (1970) e recuperada por Toury, decorre mais uma

vez da reorientação dos EDT para a cultura de chegada, na medida em que os desvios não

são agora tidos como meras discrepâncias entre TP e TC, mas sim como signos, cujo valor

decorre do contexto sociocultural que os enquadra.

2 Desvio foi assumido por vezes como fenómeno sobretudo sintáctico ou semântico num contexto de
correspondência formal (Catford, 1965); outras, em termos estilísticos (Popovič, 1970). Mais recentemente foi
igualmente recuperado para o modelo de análise de Kitty van Leuven-Zwart (1989, 1990).

14
Parte I - Enquadramento Teórico

De acordo com o enquadramento teórico assumido, o presente estudo procederá à

verificação de regularidades linguístico-textuais e à sua análise, de forma a poder

reconstituir o processo de decisão condicionado tanto pelas relações de poder existentes

entre a CP e a CC, como pelas normas da CC e pela função prevista para o texto na CC.

Espera-se com isso reconstituir certos aspectos da função e do processo da tradução,

contribuindo desta forma para a formulação de normas que os motivaram, assim como

para a descrição e explicação dos conceitos de equivalência em acção nos diferentes

meios em estudo e período em análise. A aplicação de uma metodologia da Linguística de

Corpus, o recurso a uma análise semi-automática dos TP e TC constitutivos do corpus

seleccionado e a aplicação de técnicas de análise de dados quantitativos desenvolvidos

pela estatística de Corpus, facilitarão o estudo comparativo das regularidades linguístico-

textuais que, por sua vez, permitirá identificar procedimentos de manutenção ou de desvio

tradutório. Considerando o acto de traduzir um processo dinâmico de acção em contexto,

foram ainda seleccionados certos atributos extratextuais de forma a identificar possíveis

correlações entre estes e as regularidades textuais tradutórias identificadas.

1.3 Normas de equivalência tradutória

A aproximação ao conceito de norma e do seu papel nos Estudos Descritivos de Tradução

parece passar necessariamente pelo conceito de equivalência, conceito em torno do qual

se tem desenhado uma profunda controvérsia. Tal como apontado em Baker (1998) podem

ser identificadas diferentes abordagens ao conceito: teóricos como Catford (1965), Nida e

Taber (1969), Toury (1980, 1995), Pym (1992, 1995) ou Koller (1995) definem tradução em

termos das relações de equivalência; enquanto outros rejeitam a noção teórica de

equivalência que consideram irrelevante (Snell-Hornby, 1988) ou nociva para a disciplina

(Gentzler, 1993). Posições mais moderadas como a de Baker (1992) consideram o conceito

uma categoria prática para a descrição de traduções, ainda que mais pelo facto de os

tradutores estarem acostumados ao uso do conceito do que pelo rigor do seu estatuto

teórico.

15
Parte I - Enquadramento Teórico

Enquadrando-se o presente estudo nos Estudos Descritivos de Tradução, será aqui

assumida a proposta de Toury que, aceitando a impossibilidade de uma relação de

sinonímia entre dois sistemas culturais e linguísticos naturalmente assimétricos, deixa de

fazer depender a definição de tradução do conceito de equivalência afirmando: “[…] for the

purpose of DTS, a translation will be any target language text which is presented, or

regarded as such within the target system itself, on whatever grounds” (Toury, 1985: 27). A

relação de equivalência será agora, segundo Toury, pressuposta, sendo que “equivalência”

se apresentará agora como o termo atribuído à relação de tradução que une os dois textos.

O contributo desta nova perspectiva reside principalmente no facto de a atenção do

investigador recair, agora, não no grau de equivalência existente, mas no tipo de relação

verificada e nos factores condicionantes dos contornos que essa relação assume em

determinadas circunstâncias.

Decorrendo da reorientação dos Estudos de Tradução para a cultura de chegada, este

novo enfoque no conceito de equivalência afasta o conceito de uma concepção a-histórica

e prescritiva, apresentando-o agora como relacional-funcional, histórico e ancorado na

realidade concreta:

[m]ethodologically, this means that a descriptive study would always proceed from
the assumption that equivalence does exist between an assumed translation and its
assumed source. What remains to be uncovered is only the way this postulate was
actually realized, e.g., in terms of the balance between what was kept invariant and
what was transformed. (Toury, 1995: 86)

Toury assume a tradução como produto das normas operativas no contexto de chegada,

na medida em que são elas que determinam e condicionam o tipo e o grau de equivalência

verificada em traduções reais. Assim sendo, o estudo dessas normas apresenta-se como o

passo seguinte fundamental na percepção de como foi realizado o postulado de

equivalência (Toury, 1995: 61). Mostra-se importante perceber o conceito de tradução

válido para o corpus em análise e quais os factores correlatos, na medida em que poderá

constituir-se como um primeiro passo na definição do próprio conceito de tradução que

subjaz ao corpus em análise. Neste sentido,

16
Parte I - Enquadramento Teórico

[e]quivalence, again, is of little importance in itself. There is a point in establishing it


only insofar as it can serve as a stepping stone to uncovering the overall CONCEPT
OF TRANSLATION underlying the corpus it has been found to pertain to, along with
derived notions such as DECISION-MAKING and the factors which may have
CONSTRAINED it; not an idealized process, as presented, for instance by Levý
(1967), but real-life decision-making under real-life constraints, as reconstructed,
e.g. by Even-Zohar (1975) […]. (Toury, 1995: 86)

Aceitando que qualquer acto de tradução ocorre em contexto (eventos de tradução - Toury,

1999: 18), a tradução é definida como uma actividade regulada por constrangimentos

sociais que Toury dispõe num contínuo dinâmico ocupado, num dos extremos, por regras

(gerais, objectivas e relativamente absolutas) e no extremo oposto por idiossincrasias (mais

subjectivas e menos absolutas). As normas, formando elas próprias um contínuo gradativo,

assumem o seu lugar entre estes dois extremos, vindo a ser definidas por Toury da

seguinte forma:

Norms are the translation of general values or ideas shared by a group – as to what
is conventionally right and wrong, adequate and inadequate – into performance
instructions appropriate for and applicable to particular situations, specifying what is
prescribed and forbidden, as well as what is tolerated and permitted in a certain
behavioural dimension. (Toury, 1999: 14)

O comportamento tradutório é contextualizado como comportamento social, sendo que as

normas de tradução são entendidas como constrangimentos comportamentais

interiorizados que expressam os valores partilhados pela comunidade como desejáveis,

ultrapassando as características do TP e as diferenças existentes entre os dois sistemas

envolvidos (língua, cultura, tradição literária). Falamos de um conjunto de práticas

implícitas, cujo afastamento envolve sanções e cuja existência pressupõe uma escolha

não-aleatória entre diversas hipóteses, escolha essa correlata das normas válidas na

cultura de chegada. De facto, porque fruto da cultura de chegada, as normas de tradução

conhecem uma definição histórica, variável e inconstante. A redefinição do conceito de

equivalência levou, portanto, a que o próprio conceito de acto de tradução conhecesse

17
Parte I - Enquadramento Teórico

agora uma definição variável, na medida em que pode ocupar diversas posições numa

cultura ou em diferentes momentos históricos, e se visse correlato de factores sociais que

a cultura de chegada impõe à tradução como produto, processo e função. O conceito de

equivalência viu-se pertinentemente substituído pela designação de “relação de

tradução” (Toury, 1995: 37), sendo o estudo da relação de tradução existente entre TP e TC

um dos objectivos dos Estudos de Tradução, segundo Toury. Este permite identificar

regularidades nas opções tomadas pelos tradutores de onde nos é possível abstrair o que

Toury denomina de “normas de equivalência tradutória” (Toury, 1995: 37):

We seem to have hit upon the ultimate goal of translation studies now: the
formulation of a coherent set of LAWS OF TRANSLATION BEHAVIOUR of the form
“if X, then the greater/ the smaller the likelihood of Y”. Obviously enough,
conditioned laws are inconceivable unless the conditions – the X’s in the above-
quoted formula – can be specified, and no single law of this type can be formulated
unless the conditions have been specified. (Toury, 1991: 186)

As normas podem, portanto, ser estudadas por duas vias que se complementam: por um

lado, a análise de textos traduzidos (fontes textuais), por outro, a análise de textos teóricos

e críticos sobre a tradução em geral ou sobre os textos em estudo em particular (fontes

extratextuais ou contextuais).

Toury distingue três tipos de normas: a) normas preliminares, que influenciam a estratégia

de tradução geral assim como a escolha de que textos, autores ou línguas de partida

devem ser traduzidos; b) normas iniciais, que governam a decisão do tradutor

relativamente a uma adesão às normas da cultura de partida (adequação) ou da cultura de

chegada (aceitabilidade); c) normas operacionais, que controlam as decisões tomadas

durante o processo de tradução, nomeadamente a extensão, organização e segmentação

do texto a traduzir (normas matriciais), assim como a selecção de determinadas

características linguístico-textuais (normas linguístico-textuais).

A centralidade do conceito de normas nos Estudos de Tradução, levou a uma intensa

discussão pela mão de autores como Theo Hermans ou Andrew Chesterman, cujas

18
Parte I - Enquadramento Teórico

propostas, aqui consideradas complementares à proposta de Toury e não exclusivas, serão

tidas em conta no presente estudo.

Criticando Toury por encarar as normas de tradução apenas como elementos limitadores

da acção do tradutor (opinião partilhada por Chesterman (1997) e Pym (1999)), Hermans

focará a sua atenção na tradução como produto de um contexto marcado por relações de

poder específicas:

Intercultural traffic, then, of whatever kind, always takes place in a given social
context, a context of complex power structures. It involves agents who are both
conditioned by these power structures or at least entangled in them, and who
exploit or attempt to exploit them to serve their own ends. The power structures
cover political and economic power but also, in the field of cultural production,
those forms which Pierre Bordieu call ‘symbolic power’. (Hermans, 1993: 7)

O tradutor é assim encarado como um agente, cuja acção não é inteiramente livre ou pré-

determinada, assim como inteiramente consciente ou inconsciente. Neste contexto, as

normas, se por um lado limitam a acção do tradutor tal como apontado por Toury, também

podem facilitar o processo de decisão, na medida em que apontam opções (soluções tidas

como correctas pela comunidade), cabendo ao tradutor a decisão por uma posição em

conformidade ou desvio face à norma. Implícito ao conceito de norma está, portanto, o

conceito de expectativa que Hermans procura trazer ao centro da discussão:

I prefer to think of norms not only as regularities in behaviour and a certain degree
of pressure exercised on the individual to prefer to one option rather than other,
but also as sets of expectations about preferred options, and as the anticipation of
such expectations, i.e., as the expectations of expectations. (Hermans, 1999: 3)

Desenhando um contínuo onde as normas são classificadas pela sua força normativa,

Hermans faz a distinção entre convenções, normas, regras e decretos. Entendendo o

conceito de convenções como referente a soluções arbitrárias conhecidas e aceites pela

comunidade para problemas recorrentes, o conceito de normas contempla uma força

normativa superior às convenções, acolhendo já um certo sentido prescritivo, na medida

em que indica a opção preferida pela comunidade, porque aceite como “apropriada” ou

19
Parte I - Enquadramento Teórico

“correcta” (Hermans, 1996: 30-31). O conceito de regras denunciaria uma realidade em que

as normas se tornaram obrigatórias, sendo agora formuladas explicitamente. Os decretos,

ocupando o extremo último do contínuo, surgem como regras obrigatórias e vinculativas

que contemplam duras sanções em caso de não cumprimento, não contemplando

qualquer liberdade de acção ao indivíduo.

Seguindo a proposta de Luhmann, Hermans considera as normas como elementos

mediadores entre o indivíduo e o colectivo, entre as intenções, escolhas e acções

individuais e as crenças, valores, preferências e expectativas do colectivo, contribuindo

para a estabilidade do sistema pela redução da imprevisibilidade e incerteza. Porque

manifestador de convenções sociais relativamente ao aceite como “correcto”, ao conceito

de norma está igualmente implícito o conceito de valor, e, uma vez que os valores

dominantes tendem a reflectir as hierarquias de poder da comunidade, também as normas

tenderão a reflectir essa hierarquia. Neste sentido, a tradução não está livre de asserções

de valor e não pode ser tida como ideologicamente neutra (Hermans, 1999: 8), mas sim

como produto de acção/escolhas em contexto:

Translators do not ‘just translate’. They translate in the context of certain


conceptions of and expectations about translation, however much they may take
them for granted or come to regard them as natural. Within this context translators
make choices and take up positions because they have certain goals to reach,
personal or collective interests to pursue, material and symbolic stakes to defend.
That is where the concrete interplay of the personal and the collective takes place.
As the norms concept constantly remind us, translators, like those who use or
commission translations, are social agents. (Hermans, 1999: 9)

A tradução pode agora ser entendida como um processo de manipulação do TP em

conformidade com um modelo específico da CC. O cumprimento das expectativas e do

modelo proposto pela norma, assegura a aceitação e elogio por parte do público da CC; o

afastamento face a esse modelo conduzirá a críticas e, possivelmente, marginalização3 .

Aprender a traduzir implica, neste contexto, aprender a manobrar as normas de tradução e

3Será, contudo, importante ter em consideração que o desvio ao modelo predominante na CC pode conduzir
não a marginalização, mas a aceitação por parte de grupos que pretendam desafiar esse modelo.

20
Parte I - Enquadramento Teórico

a operar dentro delas, antecipando e negociando as expectativas que o público da CC

detém relativamente à tradução. Entre tradutor e receptor existem relações de expectativa

previamente determinadas e mais ou menos compartidas por ambos os lados, fazendo

com que a questão de quem detém o controle da situação esteja dependente do poder e

posição reconhecida a cada um dos elementos participantes no processo.

Importa, agora, não só identificar as normas em acção, mas também quando estas são ou

não quebradas, por quem e quais os elementos contextuais que poderão estar na base

dessa tomada de posição, seja esta de conformidade ou de desvio. A força ilocutória do

texto não se resume ao nível semântico, passando agora também pela posição que este

ocupa no sistema relativamente à norma.

Andrew Chesterman, seguindo o argumento de Hermans de que as normas funcionam pela

gestão de expectativas, propõe, com base na proposta de Bartsch (1987), a distinção entre

normas técnicas, éticas e sociais (1993: 5). Dentro das normas técnicas, podemos

reconhecer ainda as normas de expectativa e as normas profissionais, orientadas, em

grande medida, pelas primeiras. As normas de expectativa dizem respeito ao que a

comunidade da CC espera de uma tradução em termos de gramaticalidade, aceitabilidade,

estilo, textualidade, convenções formais ou discursivas (1993: 9). Tais expectativas são em

parte governadas pelo conceito de tradução prevalecente na CC, assim como pelos textos

traduzidos já existentes na LC, levando, frequentemente, a juízos de valor relativamente à

qualidade e correcção da tradução face ao modelo aceite como correcto na CC. As

normas profissionais governam os métodos e estratégias de tradução aceitáveis, podendo

ser subdivididas em três grandes grupos 4: normas de responsabilidade (o tradutor deve

agir com lealdade relativamente ao autor do TP, ao mecenas e ao leitor da CC, aceitando a

responsabilidade pela tradução); normas de comunicação (o tradutor deve agir de forma a

melhorar a comunicação entre o autor do TP, o mecenas e o leitor da CC) e normas de

relação (o tradutor deve agir de forma a que uma relação apropriada seja estabelecida e

4 Os três grupos a compreender as normas profissionais conheceram as designações de “accountability


norms”, “communication norms” e “relation norms” (Chesterman, 1993: 8-9), sendo, no presente estudo e
seguindo a proposta de Rosa (2004), traduzidos como: normas de responsabilidade, normas de comunicação e
normas de relação.

21
Parte I - Enquadramento Teórico

mantida entre TP e TC, relação essa definida pelo tradutor com base no seu entendimento

das intenções do autor do TP, da função do texto e do público-alvo).

Todos os autores referidos reconhecem a variabilidade inerente às normas, fazendo-as

depender directamente do contexto que as enquadra e condiciona (estado das culturas de

partida e de chegada e o seu posicionamento relativo no polissistema, momento histórico,

agentes envolvidos, tipo de texto, função da tradução na CC, conceito de tradução no

contexto de chegada, etc.). Reconhecendo as normas como guias de orientação

normativas (chegando a estabelecer um contínuo gradativo de classificação de normas

relativamente à sua força normativa e subjectividade), a que subjaz a noção de sanção por

parte da sociedade (seja ela positiva ou negativa), reconhecem, finalmente, o tradutor

como agente último que escolhe de entre as diversas soluções possíveis e cuja acção deve

ser interpretada dentro do seu contexto específico, na medida em que, dentro de um jogo

de expectativas, o tradutor acaba por assumir uma posição dentro desse mesmo contexto.

O presente estudo, à semelhança do que foi feito em diversos outros estudos como

Munday (1998), Øverås (1998), Kenny (1999a) ou Rosa (2004), desenhou como primeira

etapa a recuperação de leis operacionais – sobretudo linguístico-textuais – analisáveis

posteriormente em termos de normas iniciais de adequação ou aceitabilidade. Seguindo a

proposta de Hermans (1999) estes dois conceitos serão tidos como dois extremos de um

contínuo onde será possível reconhecer diferentes níveis de adequação ou aceitabilidade,

isto é, de maior ou menor aproximação de cada um destes extremos. Coordenando a

análise dos textos com variáveis extratextuais, espera-se que venha a ser possível

identificar algumas das normas preliminares válidas para os meios, o espaço e o tempo em

análise, ainda que as conclusões daqui retiradas sejam apenas válidas relativamente ao

corpus em estudo. Será ainda tida em conta a distinção feita por Toury (1995: 67-68) entre

normas primárias (mais ou menos obrigatórias para todas as instâncias de um determinado

comportamento), normas secundárias (determinam o comportamento preferido) e

comportamento tradutório tolerado (de menor intensidade).

22
Parte I - Enquadramento Teórico

1.4. Estratégias e procedimentos de tradução

Afastar o conceito de norma da noção de determinismo e aceitar o processo de tradução

como acção em contexto, uma tomada de posição mediada por expectativas e linhas de

acção passadas num sistema em que diferentes opções assumem posições várias, conduz

à consideração do conceito de processo de decisão. Diversos autores defendem este

conceito como central no processo de análise e identificação do tipo de relação entre os

textos de partida e de chegada e de como funcionam os elementos da tradução

relativamente à unidade correspondente no texto de partida (Molina e Albir, 2002).

Contudo, este conceito nem sempre tem conhecido uma definição consensual entre

investigadores, sendo possível identificar desacordo tanto ao nível terminológico como

conceptual. A falta de consenso resulta na existência de diferentes denominações

(procedimentos, técnicas, estratégias, método, processos, princípios, etc) em grande

medida motivada pela natureza diversa das áreas que as adoptaram, assim como na

sobreposição de conceitos entre as diversas propostas conhecidas5.

No presente estudo será considerada a proposta de Kwiecinski (2001) onde é apresentada

a seguinte definição do conceito de estratégia:

[…] a translation strategy […] may be defined […] as a textually manifest, norm-
governed, intersubjectively verifiable global choice of the degree in which to
subscribe to source-culture or target-culture concepts norms and conventions.
(Kwiecinski, 2001: 120)

É aqui sublinhada a análise tanto dos processos de tradução, como da tradução como

produto. Não deixando de ter em conta a posição de autores como Lörscher (1991) ou

Leppihalme (1997, 2001) que assumem o conceito de estratégia como abarcando apenas

os problemas identificados conscientemente, neste estudo, na linha da proposta de

Jääskelainen (1993: 107-111), o conceito de estratégia denunciará uma escolha global

resultante de um acto consciente ou inconsciente, potencialmente determinado por normas

5 Diferentes modelos têm sido propostas por diversos investigadores, entre os quais podemos identificar as
tipologias de Vinay e Darbelnet (1958), Nida (1964), Newmark (1988), Toury (1980, 1985, 1995), Ivir (1987), Nord
(1992), Delisle (1993), Gottlieb (1992), Venutti (1995), Kwiewciski (2001), Leppihalme (2001), Molina e Albir (2002),
Chesterman (1997, 2005).

23
Parte I - Enquadramento Teórico

tradutórias. O critério de “consciência” não só se mostra bastante problemático num

estudo como o presente, em que as estratégias de tradução são reconstituídas a partir da

sua manifestação textual, como obriga à não ponderação de todo o comportamento

inconsciente, isto é, comportamento automatizado guiado por normas implícitas não

verbalizadas. O presente estudo rejeita igualmente a assumpção de Lörscher (1991) do

processamento não-problemático de uma tarefa como comportamento não-estratégico,

assumindo em contrário que a acção estratégica ocorre em qualquer momento de decisão.

As estratégias serão, desta forma, encaradas como um plano de resolução de problemas

implementado num determinado contexto. A implementação é processual ainda que o

plano em si não o seja, pelo que as estratégias são cognitivas e não linguísticas

(Chesterman, 2005: 24). O tradutor é assim identificado como um agente solucionador de

problemas, que, em determinados momentos cruciais do acto de tradução, toma decisões

conscientes (que motivam procedimentos) ou decisões inconscientes acatando certas

normas tradutórias. As estratégias apenas poderão ser identificadas através de um modelo

descritivo e de uma análise retrospectiva dos elementos textuais da tradução como

produto. Mostra-se agora importante inquirir não só sobre o que fez o tradutor, mas

também porque fez de determinada forma (Leppihalme, 1997: 259).

No seguimento das propostas de Séguinot (1989), Jääskelainen (1993, 2002) e Chesterman

(1997, 2005) 6 onde são definidos dois tipos de estratégias com escopos de acção

diferentes, será, neste estudo, feita a distinção entre estratégias, tal como definido

anteriormente, e procedimentos que, seguindo uma vez mais a proposta de Kwiecinski

serão definidos como:

[…] a resultant, textually-manifest, norm-governed and intersubjectively verifiable


translational action applied to individual linguistic manifestations at a specific
linguistic or textual level, e. g. the lexical level, the syntactic level, or the level of the
generic structure (format). (2001: 120)

6 Séguinot (1989) e Jääskelainen (1993, 2002) propõem a distinção entre “estratégias globais” e “estratégias
locais” ou procedimentos, procurando assim fazer a distinção entre a estratégia global inicialmente estabelecida
pelo tradutor e que irá afectar, numa fase posterior, o processo de decisão em diferentes momentos do textos.
Chesterman, na mesma linha de pensamento, propõe a distinção entre “comprehension strategies” e
“production strategies” (1997) e “strategy” e “technique” (2005).

24
Parte I - Enquadramento Teórico

Aos procedimentos correspondem, assim, decisões que actuam a um nível micro-textual

(grafológico, morfossintáctico ou lexical) ou macro-textual (funções desempenhadas pelos

elementos linguístico-textuais) e dos quais resultam características textuais. São estas

características textuais o objecto de um estudo descritivo e retrospectivo, como o

presente, que procurará reconstituir procedimentos, resultantes de estratégias, mais ou

menos conscientes e, possivelmente, as normas que as terão motivado.

No contexto definido pelas propostas de Toury e Hermans anteriormente expostas, a

escolha das estratégias ganha um significado sócio-semiótico, sendo alvo de um juízo de

valor que as hierarquiza e posiciona num sistema que, segundo autores como Rosa (2004),

pode ser organizado de forma a reconhecer um centro de prestígio e uma periferia de

desprestígio. Dependendo do estado do sistema da cultura de chegada e da posição

assumida pela tradução em determinado momento histórico, a estratégia orientada para o

contexto de chegada, por exemplo, pode ser tida tanto como centralizadora relativamente

às normas da cultura de chegada (e socio-semioticamente valorizada como estratégia de

prestígio) ou como marginalizadora, pela adopção de signos socio-semioticamente

desvalorizados.

1.5. Leis e universais de tradução

Toury apresenta como objectivo dos Estudos de Tradução a formulação de leis de tradução

resultantes da acumulação de dados relativos a regularidades conseguidas por um número

nunca finito de estudos descritivos. A título ilustrativo apresenta duas leis: a lei da

padronização crescente e a lei da interferência (Toury, 1995: 259). A lei de padronização

crescente, embora tenha conhecido recentes acertos na sua definição (Toury, 1999), é em

Toury (1995) definida como:

[…] in translation, source-text textemes tend to be converted into target-language (or


target-culture) repertoremes, [i.e.], in translation, textual relations obtaining in the
original are often modified, sometimes to the point of being totally ignored, in favour
of (more) habitual options offered by target repertoire. (Toury, 1995: 268)

25
Parte I - Enquadramento Teórico

Neste contexto, um textema é um signo subordinado a relações textuais, suportando,

assim, uma função textual, enquanto um repertorema é um signo que faz parte de um

repertório institucionalizado. Esta lei procura expressar a tendência para os textos de

chegada exibirem escolhas e estruturas próximas da língua e cultura de chegada,

estruturas menos ambíguas e mais simples que as do texto de partida. Como

consequência, os textos de chegada tendem a ser mais padronizados do que os textos de

partida. Esta realidade advém em grande parte da posição periférica, já referida por Even-

Zohar (1979), normalmente ocupada pela tradução, isto é, quanto mais periférica for a

posição ocupada pela tradução num determinado sistema, mais o texto de chegada

expressará uma atitude de acomodação aos modelos e ao repertório já estabelecidos

(Toury, 1995, 1999). Estes dados, e tendo em conta que a tradução assume normalmente

uma posição periférica na cultura de chegada, levam-nos a concluir que a tradução

funciona frequentemente como factor de conservadorismo.

A lei de interferência, complementar da primeira, é definida por Toury da seguinte maneira:

“In translation, phenomena pertaining to the make-up of the source text tend to be

transferred to the target text” (Toury, 1995: 275). Embora o grau de transferência esteja

dependente dos processos mentais envolvidos na actividade de tradução, Toury não deixa

de notar que a interferência discursiva é variável na medida em que depende dos agentes

envolvidos e do contexto sociocultural correlato do texto de chegada. A tolerância à

interferência parece estar directamente relacionada com as relações de poder entre as

culturas de chegada e de partida, tendendo a aumentar quando a cultura de chegada tem

a cultura de partida como mais prestigiada. Tentativas de tradução “o mais próximo

possível do original” encontram-se regularmente em grande tensão com as tentativas de

produção de textos e discurso “nativos” e próprios da cultura de chegada, nomeadamente

se estes são introduzidos na cultura de chegada com a função de cumprirem um papel

semelhante ao que cumpriram na cultura de partida.

Autores como Venutti (1998), Tymoczko (1998) ou Hermans (1999) criticam a proposta de

Toury do estabelecimento de leis de comportamento tradutório, evocando ser positivista e

limitadora da disciplina de Estudos de Tradução, que passaria agora apenas a dar conta

26
Parte I - Enquadramento Teórico

das semelhanças entre as traduções e não do que as distingue e posiciona como únicas. É

ainda apontado o facto de nunca se conseguir atingir uma universalidade ou objectividade

absolutas, na medida em que a investigação seria sempre determinada pelas coordenadas

temporais e espaciais em que é desenvolvida, assim como pelo sujeito que a realiza.

Autores como Baker (1993) ou Chesterman (2004a, 2004b) vêem na procura de

generalizações o movimento natural de uma qualquer ciência que, com base em casos

particulares, procura identificar regularidades e propor hipóteses descritivas gerais que

cubram mais do que um caso singular. Em resposta às criticas referidas, apontam dois

aspectos: por um lado, o facto de a impossibilidade de universalidade e objectividade

absolutas ser inerente a qualquer tipo de análise e apenas poder ser ultrapassada através

de uma exposição clara do corpus em análise e da metodologia utilizada (tanto na reunião

do corpus, como na análise dos dados); por outro, o facto de apenas através de leis

explanatórias gerais ser possível estabelecer ligações com resultados provenientes de

outras disciplinas. Toury (2004) relembra ainda o facto de se tratarem de leis descritivas

probabilísticas e não de leis normativas com pretensões de universalidade.

À semelhança da proposta de Toury, outros estudos, usufruindo agora de corpora

electrónicos, têm contribuído para a formulação de leis expressivas de características

textuais próprias dos textos traduzidos – os universais de tradução. Este conceito,

cunhado por Blum Kulka (1986) e desenvolvido por Baker (1993) em substituição do

conceito de leis de comportamento tradutório, abarcaria as características que ocorreriam

tipicamente em textos traduzidos e não nos textos de partida ou textos originais da cultura

de chegada e que não são fruto de interferência de um sistema linguístico específico7

(Baker, 1993: 243). No mesmo artigo, Baker, com base em diferentes estudos

desenvolvidos, propõe como universais de tradução:

a) Explicitação: o texto de chegada tende a ser consideravelmente mais explícito do

que o texto de partida ou do que textos originais na mesma língua (Blum-Kulka,

1986)

7 A definição de universias de tradução é apresentada da seguinte forma: “features which typically occur in
translated texts than in original utterances and which are not the result of interference from specific linguistic
systems” (Baker, 1993: 243)

27
Parte I - Enquadramento Teórico

b) Simplificação lexical, sintáctica e estilística: o texto de chegada tende a ser mais

simples e menos ambíguo que o texto de partida ou os textos originais na mesma

língua (Vanderauwera, 1985; Schlesinger, 1991);

c) Normalização: o texto traduzido tende para a convencionalidade textual ou

adequação a padrões típicos na cultura de chegada (Schlesinger, 1991; Toury, 1995);

d) Eliminação de itens repetidos: o texto traduzido tende a eliminar ou a diminuir a

frequência de certos itens lexicais frequentemente repetidos no texto de partida

(Vanderauwera, 1985);

e) Diferente distribuição de certos itens lexicais: o texto de partida tende a apresentar

uma taxa de frequência superior de certos itens relativamente ao texto de partida e a

textos originais na língua de chegada (Vanderauwera, 1985; Laviosa, 1998).

Estudos desenvolvidos posteriormente permitiram testar alguns destes universais em

contextos e pares de línguas diferentes8, assim como propor outras hipóteses de universal:

a) Normalização dialectal: o texto de chegada tende a apresentar uma taxa de discurso

dialectal inferior ao texto de partida (Dimitrova, 1997)9;

b) Sanitização: o texto traduzido tende a conhecer uma adaptação do seu contexto

narrativo, por forma a que este se torne mais próximo da cultura de chegada (Kenny,

1998);

c) Retraduções orientadas para o contexto de partida: as retraduções tendem a estar

mais próximas do texto de partida que a primeira tradução realizada (Palimpsestes 4,

1990 in Chesterman, 2004a);

d) Padrões lexicais atípicos: o texto traduzido tende a apresentar combinações de

palavras atípicas relativamente a textos originais na língua de chegada (Mauranen,

2001);

e) Convergência: tendência do texto de chegada a preferir o centro de um contínuo e a

evitar os extremos, nomeadamente, entre variedades orais e escritas (Shlesinger,

1989, Laviosa-Braithwaite, 1996 e Laviosa 1998a, 1998b)

8O universal de explicitação veio a ser testado e confirmado pelos estudos de Klaudy (1996) e Øveras (1998),
assim como o universal de simplificação pelo estudo de Laviosa-Braithwaite (1997).
9 Esta hipótese vem a ser testada e confirmada pelos estudos de Leppihalme (2001) e Rosa (2004).

28
Parte I - Enquadramento Teórico

O conceito de “universal de tradução” tem conhecido grande atenção por parte de

diferentes investigadores, conhecendo propostas de subcategorização (Chesterman,

2004a)10 e outros desenvolvimentos e críticas pela mão de autores como Toury (2004a,

2004b) ou Klaudy (2001), que se questionam relativamente ao nível de abrangência

necessário para que se assuma determinada tendência como universal e à formulação das

hipóteses de universal11. É agora necessário continuar a testar as hipóteses com diferentes

coordenadas de tempo e de espaço, assim como diferentes pares de línguas, não

perdendo de vista o facto de que, como hipóteses que são, os universais poderão ser

constantemente questionados quanto ao seu estatuto de universais, na medida em que

certas características ou regularidades textuais por eles abarcadas pareçam estar

relacionadas com determinados aspectos específicos do contexto sociocultural que as

condiciona (Olohan, 2004).

O presente estudo encontra parte do seu interesse no facto de efectuar uma análise mais

alargada de questões levantadas em estudos de caso descritivos12 com base na análise de

corpora de extensão muito limitada, tendo como principais objectivos: a) testar as

hipóteses formuladas nesses estudos e b) participar no processo de agregação de dados

originais que servirão ao teste das leis de comportamento tradutório, tendo presente que

serão alvo de especial atenção as duas leis propostas por Toury e os universais de

normalização e convergência. A análise da correlação existente entre dados linguísticos

textuais e factores contextuais poderá contribuir ainda para uma especificação das

hipóteses formuladas por outros estudos, nomeadamente das leis que Toury identifica. A

10 Chesterman propõe uma subcategorização do conceito em S-Universals e T-Universals pretendendo assim


dar conta da diferença entre as regularidades encontradas, por um lado, entre textos traduzidos e os seus
textos de partida (S-Universals); por outro, entre textos traduzidos e textos não traduzidos presentes no
contexto de chegada (T-Universals) (Chesterman, 2004a: 7).
11 Toury chama ainda a atenção para o facto de se assumirem como universais, características detectadas e
enunciadas a um nível de generalização demasiado alto ou a um nível demasiado específico (2004a: 17-20).
Ainda que não seja novidade a sua posição face ao termo “universal”, Toury, tem renovado em artigos recentes
(2004a, 2004b) as suas reservas relativamente a um termo que considera falacioso e limitador da natureza
hipotética e da formulação probabilística do que por ele foi formulado sob o conceito de “leis”. Segundo Toury
a relevância da identificação de regularidades e do processo de generalização está, não na formulação de leis
per si, mas sim no poder explicativo que lhes reconhece (2004b: 29).
12Ben-Shahar (1994), Berezoveski (1997), Brodovich (1997a; 1997b), Dimitroca (1997), Irmeli (2002), Leppihalme
(2000a; 2000b), Määtä (2004), Nevalainen (2004), Rosa (1998, 1999, 2001).

29
Parte I - Enquadramento Teórico

hipótese norteadora do estudo relaciona-se com a lei de interferência no sentido em que

prevê que nas traduções mais recentes (últimas décadas do séculos XX) se reconheça uma

menor tolerância à interferência e uma maior valorização da aceitabilidade. Relaciona-se

com a lei da padronização crescente, na medida em que se espera que nessas mesma

traduções se confirme uma presença mais significativa de discurso subpadrão, isto é, que

na tradução do discurso subpadrão presente nos TP se recorra a características

identificadoras do discurso como subpadrão, procurando manter, assim, as relações de

poder e de solidariedade presentes no TP.

Verificando-se a correlação entre as regularidades identificadas e os factores contextuais

determinados, enquadrar-se-ão essas mesmas regularidades no conceito de norma e não

no universal de tradução. Relacionando regularidades textuais com factores contextuais,

procurar-se-á formular normas de comportamento tradutório e descobrir o conceito de

equivalência tradutória e as suas possíveis reformulações ao longo do período em análise.

O conceito de equivalência será especificado em termos de adequação ou aceitabilidade e

em termos de centralização ou marginalização nos moldes anteriormente enunciados.

30
Parte I - Enquadramento Teórico

CAPÍTULO 2
O ESTUDO DAS VARIÁVEIS CONTEXTUAIS

Assumindo a tradução como um processo de transferência entre sistemas, o modelo

proposto por Toury afasta-se naturalmente de perspectivas tradicionais que consideram a

língua de forma abstracta e independente do contexto, aproximando-se de abordagens

funcionais da língua que procuram dar conta do valor comunicativo dos enunciados em

contexto. Todavia, o incentivo ao estudo de correlações existentes entre características

linguístico-textuais e variáveis contextuais 1 não é feito acompanhar de um modelo onde

nos sejam disponibilizados instrumentos metodológicos específicos que tornem possível

esse estudo.

No contexto de todo um movimento interdisciplinar estimulado dentro dos próprios Estudos

de Tradução, é objectivo deste capítulo apresentar os pressupostos teóricos basilares do

modelo de análise adoptado que permitiu correlacionar os factores socioculturais com as

regularidades linguístico-textuais identificadas no corpus definido. Este modelo,

desenvolvido no enquadramento de uma abordagem funcionalista em geral e da Gramática

Sistémico-Funcional (GSF) de Halliday (1971, 1985, [1985] 1994, Halliday et al., 1964 e

Halliday e Hasan, 1991), em particular, tem ainda em consideração a proposta de Hatim e

Mason (1990), expressiva do reconhecimento da importância de uma abordagem funcional

da tradução e da partilha de conceitos e métodos entre a GSF e os ET, e as propostas do

New Historicism de Greenblatt (1982, 1988) e do Cultural Materialism de Sinfield (1983,

[1985] 1994, 1992), a quem são reconhecidas afinidades frutuosas com os ET e, em

particular, com a proposta de Lefevere (1985, 1990, 1992).

1 Seguindo a proposta de Brown e Yule será adoptado o conceito de variável contextual (1983: 36) que,
abandonando uma perspectiva determinista de causa-efeito entre elementos linguísticos e elementos
contextuais, define esta relação em termos de co-ocorrência dos elementos. Esta perspectiva mostra estar
bastante próxima da de Toury, na medida em que salvaguarda uma certa liberdade de acção por parte do
locutor que, para efeitos deste estudo, podemos identificar com o tradutor.

31
Parte I - Enquadramento Teórico

2.1. O texto em contexto

Halliday defende uma abordagem funcional da linguagem, enfatizando as funções sociais

do uso linguístico, isto é, a sua função é produzir significados, significados esses

influenciados pelo contexto que o enquadram (contexto imediato e cultural) e resultantes de

um processo de escolha. Como gramática funcional, considera que a linguagem assume

diversas funções, produto de escolhas feitas em diferentes níveis funcionais. Como

gramática sistémica, é uma teoria do significado como escolha, através da qual a

linguagem é interpretada como rede de opções.

A aproximação dos EDT à gramática sistémico funcional, nos anos 90, parece acontecer de

forma natural e sem grandes surpresas, na medida em que parece responder à

necessidade sentida nos Estudos de Tradução de ir além da análise de texto. Se a análise

de texto se concentra no estudo da organização interna dos textos, a GSF faz recair a sua

atenção na dimensão comunicativa da linguagem e na forma como esta deixa transparecer

as relações sociais e de poder que a enquadram. Depois de estudos como os de Hatim e

Mason (1990, 1997), Baker (1992) ou House (1997), estudos que procuram aplicar os

princípios da GSF em diferentes campos dos Estudos de Tradução, os pontos de contacto

entre os EDT e a GSF parecem por demais evidentes. Ambas assumem o uso linguístico

como funcional, isto é, um processo semiótico que produz significados, estando esses

significados e essas escolhas sempre enquadradas num determinado contexto

sociocultural. Admitindo, no entanto, que o contexto sociocultural não é o único factor

determinante, ambas reconhecem ao produtor do texto a categoria de agente locutor com

liberdade de escolha entre as diversas hipóteses que o sistema lhe permite. Por último,

ambas identificam um nível de análise idêntico, relativamente ao grau de abstracção e

generalização da descrição que efectuam.

À luz das propostas de Malinovsky (1923, 1935) e Firth ([1935], 1951) (vide Hatim e Mason,

1990: 36), Halliday propõe a distinção entre contexto situacional e contexto cultural;

contudo, além de não explorar o contexto cultural em pormenor, na medida em que a sua

atenção recai sobretudo nos parâmetros do contexto situacional, Halliday assume a

32
Parte I - Enquadramento Teórico

relação entre texto e contexto dentro da dicotomia texto e contexto, que este estudo

considera não abarcar ou dar conta de todos os matizes desta relação:

[t]here is text and there is other text that accompanies it: text that is ‘with’, namely
the con-text. This notion of what is ‘with the text’, however, goes beyond what is
said and written: it includes other non-verbal goings-on – the total environment in
which a text unfolds. So it serves to make a bridge between the text and the
situation in which texts actually occur. (Halliday, [1985] 1991: 10)

É assim aqui proposta a consideração de uma relação mais dialéctica de texto em

contexto, que reconhece o texto simultaneamente como produto e actor do e no contexto

que o enquadra. Procurar explicar o texto literário à luz do contexto histórico em que se

insere seria reduzir o texto literário à condição de espelho desse contexto; porém, não

podemos negar a ancoragem histórica de cada texto e a relação intrínseca entre texto e

contexto. Recuperando as propostas do New Historicism e do Cultural Materialism, será

aqui reconhecida a posição de poder do texto literário na formação do contexto de que é

produto:

Rather than passively reflecting an external reality, literature is an agent in


constructing a culture’s sense of reality. It is part of a much larger symbolic order
through which the world at a particular historical moment is conceptualized and
through which a culture imagines its relationship to the actual conditions of its
existence. In short, instead of a hierarchical relationship in which literature figures
as the parasitic reflector of historical fact, one imagines a complex textualized
universe in which literature participates in historical processes and in the political
management of reality. (Wilson e Dutton, 1992: 28)

Contudo, encarar o texto em contexto implicará, igualmente, assumi-lo não só como

produto e agente, mas também como processo. Seguindo a proposta de Hatim e Mason,

desenvolvida no contexto da Pragmática, o texto escrito e a sua tradução serão encarados

como um acto de comunicação, uma interacção discursiva entre locutor e alocutário, que,

condicionando as decisões tradutórias, será perceptível através das marcas textuais que

promulgou. Será assim importante reconhecer diferente níveis de interacção verbal, assim

33
Parte I - Enquadramento Teórico

como os diferentes pares de participantes ou interlocutores envolvidos (Rosa, 2004: 253),

na medida em que analisar o grau de influência do contexto no processo de tradução

através de normas de equivalência implicará, não só a identificação dos participantes

envolvidos, mas também do seu posicionamento em termos históricos, geográficos,

socioculturais e linguísticos. No presente estudo, serão tidas igualmente em consideração

as motivações ideológicas, cujo impacto, segundo a proposta de Lefevere (1984: 97), não

poderá ser olvidado pelo investigador, tanto pela sua inevitável presença na produção de

traduções, como por se constituírem no meio primordial de investigação das motivações

subjacentes a determinadas escolhas e estratégias assumidas pelo tradutor (Pym,1998: ix)2.

Num estudo dedicado à análise das estratégias de tradução de variedades linguísticas que,

assumindo um valor sócio-semiótico, fazem depender a sua interpretação e recriação de

conhecimentos extralinguísticos vários, a consideração das variáveis contextuais que

rodeiam o texto torna-se particularmente relevante, não só pelo significado comunicativo

assumido pelas variedades linguísticas e a necessária consideração de elementos

extralinguísticos que lhes conferem esse significado, mas também pelo significado que

assumem as escolhas assumidas pelo tradutor e que, segundo Lane-Mercier (1997: 47),

denunciarão a posição deste no sistema de chegada assim como os princípios ideológicos

motivadores da tradução.

2.1.1. Contexto Situacional

O modelo linguístico de Halliday (1971, 1985) tem por base dois pressupostos

fundamentais: por um lado, que a gramática da língua é um sistema de opções disponíveis

para a expressão de significado; por outro, que a linguagem tem como propósito a criação

de textos comunicativos que deixem transparecer três tipos de significado de forma a

responderem satisfatoriamente a três questões fundamentais: o quê? Porquê? Como?

2 Procurando dar conta de agentes condicionadores como os mecenas ou as editoras, Nord (1991: 42-47)
estabelece a distinção entre o emissor e o produtor textual da tradução, entre quem promulga a tradução e,
provavelmente, define a orientação desta e aquele que produz a tradução. Embora esta seja uma linha de
investigação importante e merecedora de desenvolvimento, a impossibilidade de reunir a informação necessária
relativamente às orientações dadas ao tradutor pelo agente promotor da tradução não permite que neste estudo
esta distinção seja tida em conta.

34
Parte I - Enquadramento Teórico

Assume o texto como o produto de três tipos de escolhas que expressam diferentes tipos

de significado, reflectido no conteúdo, no objectivo/propósito e na organização do texto3.

O modelo de Halliday, assumindo o texto como uma unidade semântica funcional que se

apresenta simultaneamente como objecto, instância e produto do contexto que o rodeia,

parte assim do pressuposto de que o texto encerra em si o contexto situacional em que é

produzido ([1985] 1991: 11). O contexto de situação é, então, definido por Halliday como

“the immediate environment in which a text is actually functioning” ([1985] 1991: 46), sendo

possível, num movimento retrospectivo, inferir as variáveis contextuais pertinentes, na

medida em que certas marcas linguísticas denunciam:

a) quem produz o texto e as relações interpessoais estabelecidas entre os

participantes do discurso (tenor, relações interpessoais, associadas ao significado

interpessoal);

b) o evento que enquadra o discurso (field, campo, associado ao significado

ideacional);

c) qual o papel que a linguagem desempenha na troca discursiva e o canal de que se

tira partido (mode, modo, associado ao significado textual).

Considerando os textos em termos da sua comunicabilidade, somos levados a indagar

quanto à função assumida por esses textos, as correlações possivelmente existentes entre

características linguístico-textuais (selecções do código), factores contextuais (tempo,

espaço, relações interpessoais, etc) e características do discurso que manifestam essas

correlações. Para uma melhor descrição dessas relações e da variação linguística inerente,

Halliday propõe um modelo em que duas dimensões são reconhecidas: marcas que

denunciam o falante (dialectos) e marcas que denunciam o uso (registos). O texto revela

marcas do relacionamento entre locutor e alocutário(s), do canal ou canais escolhidos para

3 Neste sentido, são identificadas três metafunções da linguagem:


a) Metafunção ideacional: realizada por padrões de transitividade, expressa o significado cognitivo,
ocupando-se da organização do conteúdo das proposições e não com a forma como são apresentadas.
b) Metafunção interpessoal: realizada através de padrões de modalidade, expressa o significado funcional,
criando frases que expressam o conteúdo cognitivo e lógico das proposições e mostram o
relacionamento que o falante mantém com os outros para quem a mensagem se dirige.
c) Metafunção textual: realizada através de estruturas temáticas e de informação, expressa o significado
discursivo, criando e realizando enunciados (ou textos) em eventos comunicativos reais. Organiza estes
enunciados de forma a que estes expressem o conteúdo proposicional de forma coesiva e coerente.

35
Parte I - Enquadramento Teórico

transportar o signo, assim como da função a desempenhar pelo texto como exemplo de

comunicação humana. A figura 1 esquematiza os diferentes tipos e níveis de variação:

Figura 1: Esquema descritivo da variação segundo o uso e o falante (tradução e adaptação do esquema
apresentado em Bell, 1991: 185)

Num estudo que tem como objectivo a análise da tradução de variedades linguísticas e a

influência do meio para o qual a tradução se destina, mostra-se particularmente importante,

por um lado, a distinção feita entre variação diacrónica e sincrónica, assim como dos

diferentes tipos de variantes sincrónicas – dialecto (variação no espaço), sociolecto

(variação social) e idiolecto (variação individual) –; por outro, as diferentes categorias

reconhecidas como condicionadoras de um registo. Segundo Halliday, o conceito de

registo pretende dar conta do uso linguístico e das variações identificadas consoante os

diferentes contextos que enquadram esse uso linguístico:

The category of register is postulated to account for what people do with their
language. When we observe language activity in the various contexts in which it
takes place, we find differences in the type of language selected as appropriate to
different types of situation. (Halliday, McIntosh e Stevens, 1964: 87)

36
Parte I - Enquadramento Teórico

Neste sentido, a noção de registo - definido como “a configuration of meanings that are

typically associated with a particular situational configuration of field, mode and

tenor” ([1985] 1991: 38-39) - demonstra ser a via pela qual se correlacionam as

características linguístico-textuais e os factores contextuais: as três variáveis do registo

determinam as escolhas do sistema linguístico nas áreas de significado identificadas por

Halliday (ideacional, interpessoal e textual). Enquanto realização das possibilidades

semânticas da língua, o registo mostra ser culturalmente determinado e dependente do

contexto que o enquadra, sendo neste sentido que Halliday chama à discussão a noção de

“convenção” que, segundo o autor, permite o acordo geral relativamente à (in)adequação

de um enunciado a uma determinada circunstância.

Procurando tornar mais operativa a proposta de Halliday no que diz respeito à correlação

entre texto e contexto, Hasan propõe ainda o conceito de configuração contextual de um

texto (ConfigC)4 que define como um “specific set of values that realises field, tenor and

mode” (Halliday e Hasan, 1991: 55). Segundo Hasan, apenas através da noção de ConfigC

nos será possível efectuar afirmações relativamente a estruturas do texto, na medida em

que conceitos gerais como campo, modo e relações interpessoais não nos permitem

estabelecer relações específicas entre elementos linguísticos e elementos contextuais.

Cada um destes conceitos conhece, assim, diferentes aspectos que deverão ser

considerados enquanto variáveis do contexto. Como aspectos da ConfigC de um texto,

Hasan propõe relativamente ao campo, a natureza da actividade social, os tipos de actos e

os objectivos destes; relativamente ao modo, o papel da linguagem (constitutivo ou

ancilar), o tipo de partilha do processo de criação textual com o alocutário, o canal (gráfico

ou fónico) e o meio (escrita ou fala); relativamente às relações interpessoais, os papéis de

agente, díades de poder, hierárquicas/não hierárquicas e díades de proximidade/distância

social. Contudo, o facto de ser possível identificar o registo de uma situação particular ou,

inclusive, de uma cultura, comprova que se, de um ponto de vista teórico, a ConfigC pode

representar um conjunto quase infinito de possibilidades, na prática (e tendo em conta que

4 Embora Hasan tenha adoptado a abreviatura CC para configuração contextual, neste estudo, seguindo a
proposta de Rosa (2004), será adoptado a abreviação ConfigC, uma vez que CC é tradicionalmente
reconhecido, em português, como abreviatura de Cultura de Chegada.

37
Parte I - Enquadramento Teórico

o uso linguístico, enquanto prática social, se mostra convencional) o número de

possibilidades numa qualquer cultura torna-se bastante limitado. Configurações

semelhantes de elementos contextuais conduzem, portanto, a textos com configurações

linguísticas semelhantes. Poder-se-á, inclusive, ter em ponderação que uma certa

configuração de variáveis contextuais na categoria campo terá uma grande influência na

configuração de certas variáveis das categorias relações interpessoais e modo (Halliday e

Hasan, 1991).

Considerando a necessidade de um modelo mais sofisticado, que melhor permita explorar

as diferentes dimensões do contexto situacional, foram tidas em conta, além da proposta

de Halliday e Hasan, as propostas de Lyons (1977) e Leckie-Terry (1991). A recuperação de

diferentes propostas, conciliáveis entre si porque complementares, permitiu identificar

elementos concretos de análise da correlação entre elementos contextuais e

características discursivas particulares presentes nos textos em análise.

2.1.1.1. O Campo

A categoria campo diz respeito ao evento em que o texto opera, à natureza da actividade

social em curso, aos tipos de actos e os seus objectivos, estando, por isso, intimamente

ligada à função. Haliday apresenta a seguinte definição:

The field of discourse refers to what is happening, to the nature of the social action
that is taking place: what is it that the participants are engaged in, in which the
language figures as essential component? ([1985] 1991: 12)

Tal como referido anteriormente, Hasan (1991) propõe como aspectos da categoria campo

o tipo de actos em curso e os seus objectivos, sendo a esta proposta que Leckie-Terry

(1991) adiciona outros aspectos: a arena (referente ao locus da acção, que posiciona num

contínuo entre mais e menos institucionalizado); os participantes (relativo às características

inerentes aos participantes) e o domínio semântico (referente ao conteúdo disposto num

contínuo entre mais ou menos especializado).

38
Parte I - Enquadramento Teórico

Em determinadas situações, a actividade em curso deriva directamente da especificidade

reconhecida à arena, assumindo por isso um papel fundamental na estrutura do texto.

Sendo uma selecção culturalmente determinada que obedece a convenções e regras

próprias da acção numa comunidade, não será difícil aceitar a não aleatoriedade na

selecção da arena e a influência da instituição na escolha do conteúdo. Este conceito foi

desenvolvido por Fairclough (1988), que, na esteira de Bordieu, reconhece o significado

comunicativo do texto resultante não apenas do conteúdo, mas em grande medida do

sistema de relações estabelecidas entre interlocutores e valor atribuído à instituição. A

instituição social, segundo o autor, faz a mediação entre o contexto cultural (estruturas

sociais) e as práticas sociais (discurso):

The institution defines its own significant forces, and their rights and obligations in
each situation-type, including their rights of access or constraints on access on
situation-type. (Fairclough, 1988: 113)

Para Fairclough o conceito de discurso passa pelo conceito de “ordens de discurso” que,

constituídas socialmente, determinam o discurso e se assumem como convenções

associadas a instituições sociais, isto é, “ideologically shaped by power relations in social

institucions and in society as a whole” (1989: 17). Mostra-se assim particularmente

importante para o presente estudo reter a noção de que a arena identificada e o grau de

institucionalidade que lhe é reconhecido terão a sua influência na selecção de certos

aspectos das variáveis relacionamento interpessoal e modo e, como tal, na estrutura do

texto. Em interacção com outros elementos contextuais, estes contribuirão ainda para a

definição da natureza e função do texto. O conceito de instituição assistir-nos-á igualmente

na identificação da relação entre contexto de situação e contexto cultural, na medida em

que não só se apresenta como conceito mediador entre determinado contexto situacional

e o conhecimento interiorizado dos participantes, como participa na definição da natureza

e função do texto.

Para efeitos de produção de cómico, nomeadamente em texto ficcional, os conceitos de

arena, instituição e convenção linguística a ela associada provam ser centrais. O desafiar

39
Parte I - Enquadramento Teórico

das expectativas do leitor pela desadequação de certo uso linguístico a determinada

situação e o locus da acção mostra ser um dispositivo de cómico de que recorrentemente

se tira partido em texto ficcional, relembrando-nos, não só que o uso linguístico é feito de

convenções, mas também que o texto ficcional delas tira partido no cumprimento de

determinados objectivos retóricos e narrativos (cf. II-1).

2.1.1.2. As relações interpessoais

Esta categoria pretende dar conta das relações existentes entre os participantes envolvidos

no evento comunicativo, sendo definida por Halliday da seguinte forma:

The TENOR OF DISCOURSE refers to who is taking part, to the nature of the
participants, their statuses and roles; what kinds of role relationship obtain among the
participants, including permanent and temporary relationships of one kind or another,
both the types of speech role that they are taking on in the dialogue and the whole
cluster of socially significant relationships in which they are involved. (Halliday e
Hasan, 1991: 12)

Qualquer texto reflectirá, portanto, a relação estabelecida entre locutor e alocutário, relação

essa que denunciará relações de poder ou solidariedade, podendo conhecer diferentes

níveis em termos de formalidade, delicadeza, impessoalidade e acessibilidade.

Hasan identifica como variáveis específicas para esta categoria dois aspectos: o papel do

agente, relativo ao grau de contacto ou poder que o agente detém, e a distância social,

identificada num contínuo entre dois pólos de maior ou menor familiaridade.

Leckie-Terry (1991), tal como Hasan, considera o papel assumido pelos participantes

igualmente determinado pela distribuição de poder na situação comunicativa, mas acresce

a estes aspectos o grau de formalidade e o foco que reconhece poder estar direccionado

para o envolvimento interpessoal dos participantes ou para o conteúdo informativo da

mensagem (1991: 40). Lyons (1977), por sua vez, identifica como elementos contextuais

condicionantes de escolhas na situação comunicativa os seguintes: o papel assumido pelo

participante que pode ser deítico (em consequência da presença do alocutário na situação

comunicativa) ou social (funções específicas da cultura institucionalizada na sociedade e

40
Parte I - Enquadramento Teórico

reconhecida pelos seus membros); o estatuto social; as coordenadas de espaço e tempo; o

grau de formalidade; adequação do meio à situação e adequação ao conteúdo e ao campo

(1977: 574-585).

A complementaridade das propostas apresentadas parece manifesta, sendo inclusive

possível reconhecer pontos de sobreposição. De entre os factores contextuais expostos,

alguns parecem assumir uma maior relevância na definição da ConfigC do texto no âmbito

do presente estudo: o papel social assumido pelo participante, o grau de formalidade

reconhecido à situação comunicativa e as coordenadas espácio-temporais. Como função

instituicionalizadora na sociedade, o papel social, que normalmente implica estatuto social,

determina certos aspectos do comportamento linguístico, nomeadamente o fenómeno que

Lyons denomina de “code-switching” (1977: 580), isto é, “the ability of members of such

language-comunities to pass from one dialect or variety of the language to another

according to the situation-of-utterance” (1977: 580). O grau de formalidade e as

coordenadas espácio-temporais estão intimamente ligadas, não só por ambas contribuírem

também para o fenómeno de “code-switching”, mas também por o grau de formalidade

estar directamente associado às coordenadas de espaço (arena) e de tempo. O grau de

formalidade reconhecido a determinada situação comunicativa, porque institucionalizado

na sociedade, é variável e histórico tal como a sociedade que o define, e, em grande parte,

definido pelo grau institucional da situação. A relevância destes dois aspectos no presente

estudo justifica-se, na medida em que, contribuindo para a determinação das relações de

poder entre os participantes, a definição do papel social e do grau de formalidade

implicam, porque assim convencionalmente estabelecido, que certas opções linguísticas

sejam tomadas em detrimento de outras. Em texto ficcional, tendo em conta que o leitor/

espectador, inserido no mesmo contexto cultural, desenha um quadro de expectativas

específicas com base em comportamentos convencionais que também ele partilha e aceita,

estes podem igualmente ser elementos importantes na definição de momentos cómicos,

pelo desafiar da convenção social e das expectativas do leitor/espectador. Ao tradutor cabe

a delicada tarefa de garantir a descodificação do subcódigo extratextual a um receptor,

cujo horizonte cultural pode não coincidir com o do receptor implícito no TP.

41
Parte I - Enquadramento Teórico

O uso de variedades linguísticas num texto ficcional assume um significado semiótico e

comunicativo, onde se estabelece uma relação entre as variedades e a sua posição numa

escala de valores pré-estabelecida pela comunidade linguística. Assim sendo, mostra servir

o propósito de caracterização das personagens e do posicionamento destas na hierarquia

social, isto é, os elementos linguístico-textuais são analisados como um código que,

associado a um subcódigo de factores extratextuais, revela a função de caracterização das

personagens. Mostra-se, assim, necessário que a partir do nível morfossintáctico, lexical e

fonético (através dos quais são codificados os dialectos), e relacionando-os com factores

extralinguísticos, seja possível recriar o papel social, bem como as díades de poder ou

solidariedade que ligam as personagens. Como tal, são objectivos do presente estudo

apurar:

a) que relações de poder ou solidariedade são instituídas pelo recurso a variedades

linguísticas ficcionais no TP;

b) se as variedades linguísticas ficcionais são recriadas ou não no TC;

c) se as relações de poder ou solidariedade se mantêm no TC; e,

d) no caso de se manterem, se estas conhecem os mesmos contornos que no TP.

2.1.1.3. O modo

Como terceiro parâmetro discursivo, Halliday propõe a variável modo (“mode”) que define

da seguinte forma:

The MODE OF DISCOURSE refers to what part the language is playing. What it is
that the participants are expecting the language to do for them in that situation: the
symbolic organisation of the text, the status that it has, and its function in the
context, including the channel […] and also the rhetorical mode, what is being
achieved by the text in terms of such categories as persuasive, expository, didactic,
and the like. (Halliday e Hasan, 1991: 12)

O texto reflectirá, portanto, o papel que a linguagem assume (constitutivo ou ancilar), o

processo de partilha (activo ou passivo), o canal (fónico, gráfico ou uma combinação dos

dois) e o meio (escrita ou fala) (Halliday e Hasan, 1991: 57-58). Procurando complementar a

42
Parte I - Enquadramento Teórico

proposta de Hasan, e tendo igualmente em conta as variáveis papel da linguagem (que a

autora apresenta como contextualização) e meio, Leckie-Tarry (1991) reconhece que o

texto reflectirá ainda o grau de planeamento (que considera em estreita ligação com os

aspectos arena e grau de formalidade) e a possibilidade de feedback5 .

Para o presente estudo, desenha-se como particularmente relevante a consideração do

papel que a linguagem assume, da (im)possibilidade de feedback, do canal e do meio, na

medida em que, tratando-se de texto ficcional, o tipo de partilha com o alocutário

conhecerá um grau de planeamento bastante elevado. O mesmo argumento seria

igualmente válido para a não consideração das variáveis (im)possibilidade de feedback e

canal; contudo, a consideração da (im)possibilidade de feedback no presente estudo

conhece justificação, por um lado, por no caso da tradução para o palco a natureza

imediata do feedback a ocorrer durante e depois do espectáculo teatral poder ter um

impacto directo na tradução; por outro, pela ponderação por parte do locutor (neste caso o

tradutor) das necessidades, expectativas, preferências e conhecimento do alocutário

aquando da formulação textual, podendo isso vir a influenciar as suas escolhas e decisões

relativamente à reconfiguração das marcas textuais. Bell (1991) reflecte sobre esta questão

em termos de “audience design”, reconhecendo que a acomodação do texto ao auditório,

esteja ele presente ou ausente, é um importante factor na definição do registo (1984: 159)6.

A ponderação da variável meio encontra a sua pertinência no facto de terem sido incluídos

no corpus seleccionado para este estudo traduções de textos dramáticos e fílmicos que,

tendo como objectivo último a representação em palco e a legendagem respectivamente,

conhecerão, necessariamente, uma alteração do meio. Ainda que neste estudo apenas

sejam considerados os textos produzidos pela mão do tradutor e não o produto final (o

texto em interacção com os restantes elementos em palco/ecrã, levando a que, no caso

das traduções para o palco, a alteração do canal e meio não venha a ocorrer pelas mãos

5 A consideração de uma eventual reacção por parte do alocutário e conhecimento dessa reacção por parte do
locutor, mostra ser um importante complemento à proposta de Hasan que reconhece a variável processo de
partilha.
6 No enquadramento da Análise de Discurso, este conceito é formulado no contexto de um modelo
comunicativo onde é feita a distinção, por um lado, entre autor real e autor implícito e, por outro, entre leitor real,
leitor ideal e leitor implícito. Esta questão será recuperada em I-2.2.2.1.

43
Parte I - Enquadramento Teórico

do tradutor, a variável canal foi identificada como relevante por se considerar que a

perspectiva de uma alteração de canal numa etapa posterior, poderá igualmente influenciar

as escolhas e decisões na reconfiguração das marcas textuais 7 . As diferenças

reconhecidas aos diversos canais possíveis (neste caso, gráfico, fónico e auditivo), não só

implicam estruturas e formas de organização textual distintas, como seguem linhas de

tradição e convenção diferentes, criando diferentes expectativas no leitor e espectador. Ao

tradutor cabe o papel de mediador entre o texto escrito e o texto proferido, pelo que o

produto da sua acção situar-se-á necessariamente entre círculos semióticos diferentes que

assumem tradições e modos distintos. Neste sentido, mostrou-se relevante ter em

consideração as diferentes possibilidades e combinações existentes entre os dois extremos

“escrita” e “fala”, procurando dar conta dos diferentes matizes a reconhecer nos diversos

textos incluídos no corpus. Tendo em conta a proposta de Gregory e Carrol (1978), foi

desenhada a seguinte tipologia da variação segundo o meio:

Figura 2: Tipologia da variação segundo o meio.

7 Tal como apontado por autores como Bassnett (1991), Mateo (1995) ou Aaltonen (2000), o processo de
tradução depende em grande medida do tradutor escolhido, da sua posição no sistema teatral e da visão que o
próprio detém da sua actividade de tradutor. Por vezes é o tradutor que prepara o texto a estar presente em
palco, traduzindo já com a dramaturgia em mente; outras, o processo de tradução é partilhado entre um
tradutor que transfere o significado verbal do texto e um outro que adapta a sua versão às exigências e
necessidades do palco e do encenador.

44
Parte I - Enquadramento Teórico

Ao modelo de Gregory e Carrol (1978), foram adicionadas três categorias (assinaladas em

caixas sombreadas) de forma a que a tipologia desse conta, não só dos diferentes textos

constituintes do corpus em estudo, mas também de outras variantes dos meios fala e

escrita que actualmente não poderemos deixar de ter em conta no contexto dos Estudos

de Tradução. As categorias são: fala não espontânea com o objectivo de descrever a acção

em filme ou palco em substituição desta (dará conta dos casos de descrição áudio para

pessoas invisuais); escrita para ser lida enquanto ouvida (legendagem em recitais com

repertório cantado), enquanto ouvida e acompanhada de imagem (legendagem de um filme

para cinema, televisão, VHS ou DVD) ou enquanto ouvida e acompanhada pela

representação (legendagem em teatro) e, finalmente, escrita para ser lida em substituição

do que é ouvido (legendagem para surdos ou deficientes auditivos). Foi assim objectivo

deste estudo desenhar uma tipologia mais exaustiva, que possa ser recuperada em

projectos futuros, contribuindo assim para o estabelecimento de uma nomenclatura geral

que possa ser partilhadas por diferentes estudos dentro dos Estudos de Tradução.

A natureza diversa que nos permite identificar os diferentes meios, parece indicar

igualmente que cada meio preenche funções distintas, isto é, na medida em que diferentes

configurações de variáveis contextuais criam diferentes funções a ser satisfeitas, motivam

também a selecção de um meio específico que possibilite o cumprimento dessa função.

Segundo Stubbs:

[m]any of the differences in form, particularly in grammar, between spoken and


written language are due to the different purpose they serve, and are especially due
to the rather restricted and specialized functions of most written language. […] The
choice of a particular medium is likely to have particular implications […] [and] is
normally determined by the social function of the communication. (1980: 100)

Parece ser assim possível reconhecer uma relação de correlação entre meio e função, tal

como entre meio e estruturas linguísticas, que nos permite pensar na função como posição

mediadora entre factores contextuais e formas linguísticas e no registo como elemento

operante entre função e formas linguísticas.

45
Parte I - Enquadramento Teórico

Também Halliday reserva à função um importante papel na definição do meio8 que

apresenta como a “enabling function”, isto é, a categoria em que a realização linguística se

inicia (Halliday, 1971: 44); contudo, não a explora em detalhe, tratando esta questão

apenas dentro do contexto da variável modo. A ponderação da dimensão comunicativa

(que grosso modo corresponderá aos parâmetros reconhecidos ao contexto situacional)

implicará a consideração do registo, que definirá a posição do locutor no contexto

situacional, e dos dialectos e pronúncias que situarão o locutor no contexto sociocultural

mais vasto. É sobre este contexto sociocultural mais vasto, a influência que detém no

condicionar do contexto situacional e a forma como determina a interpretação do texto,

que o presente estudo fará recair agora a sua atenção.

2.1.2. Contexto Cultural

O presente estudo tem como objectivo a análise de características linguístico-textuais, mas

também a identificação de correlações sistemáticas entre os elementos linguístico-textuais

identificados e os factores contextuais que enquadram o falante, o uso da língua, os

objectivos que guiaram esse uso e a avaliação que faz e atribui aos elementos contextuais,

correlatos das suas escolhas linguísticas. Ainda que de uma importância hoje evidente, a

análise do registo mostra-se insuficiente para a compreensão do uso da língua em contexto

por focar a sua análise nas condicionantes do contexto imediato de situação em detrimento

do contexto sociocultural mais vasto. Tal como Hatim e Mason (1990) relembram, as

categorias contextuais campo, relações interpessoais ou modo, ainda que universais, no

sentido em que todas as línguas as identificam, conhecem uma ConfigC específica

determinada pelo contexto que a enquadra, tanto situacional como cultural, sendo que é do

contexto cultural mais vasto que os diferentes elementos do contexto situacional recebem

o seu valor e significado.

É assim defendido por este estudo que o enunciado conhece um significado que decorre

de um contexto imediato, das relações sociais entre locutor e alocutário, mas também de

8Segundo Halliday: “Speech and writting are used in different contexts, for different purposes” (Halliday e
Hasan, 1991: 93).

46
Parte I - Enquadramento Teórico

um contexto sociocultural mais vasto, de onde os elementos da situação comunicativa

recebem o seu valor e significado.

Tendo em conta que Halliday e Hasan (1991), apesar de reconhecerem o contexto cultural

como um dos factores determinadores na interpretação do texto9 , optam por focar a sua

atenção nos parâmetros da situação comunicativa imediata, mostrou-se necessário ter em

consideração outros modelos que, não se circunscrevendo ao contexto situacional,

permitissem sublinhar a importância do contexto sociocultural mais abrangente na selecção

e interpretação dos elementos textuais.

A consideração de alguns dos parâmetros dos modelos de Lyons (1977) e Leckie-Terry

(1991) permitiu-nos já o alargamento da definição da variável relações interpessoais e

campo de forma a ser igualmente tido em conta o contexto macro-social; todavia, outros

aspectos deste sistema de redes de signos revelam a sua importância para o presente

estudo, pelo que serão tidas em consideração a proposta de Hatim e Mason (1990), onde,

além da dimensão comunicativa, é reconhecida a existência de duas outras dimensões –

pragmática e semiótica –, assim como as propostas do New Historicism de Greenblatt

(1982, 1988) e do Cultural Materialism de Sinfield (1983, 1985, 1992).

2.1.2.1. Dimensão pragmática

Assumindo os princípios da gramática funcional de Halliday e o uso linguístico como

produto de um processo de selecção e escolhas, será importante reconhecer que as

escolhas feitas ao nível das três componentes já amplamente discutidas – campo, relações

interpessoais e modo – são, em grande medida determinadas por factores pragmáticos

directamente relacionados com o propósito do texto (Hatim e Mason, 1991: 75).

Reconhecendo a capacidade de um locutor agir com as palavras, mostra-se importante

9 O contexto cultural é definido por Halliday como “[…] a broader background against which the text has to be
interpreted: its context of culture. Any actual context of situation, the particular configuration of field, tenor and
mode that has brought text into being, is not just a random jumble of features but a totality – a package, so to
speak, of things that typically go together in the culture. People do things on these occasions and attach these
meanings and values to them: this is what a culture is” (Halliday e Hasan, 1991: 46). O reconhecimento da
importância do contexto cultural é reforçado quando na página seguinte é reconhecida a sua influência na
interpretação do texto: “The context of situation and the wider context of culture make up the non-verbal
environment of a text. We have spoken of these as “determining” the text, stressing the predicability of the text
from the context” (Halliday e Hasan, 1991: 47)

47
Parte I - Enquadramento Teórico

reconhecer a dimensão pragmática de um texto, isto é, assumir o texto como acção.

Stalnaker define pragmática como “[the study] of the purposes for which sentences are

used, of the real world conditions under which a sentence may be appropriately used as an

utterance” (1972: 380). Baker, confirmando a relevância do estudo das motivações

promotoras do acto tradutório, avança com a noção de manipulação empreendida pelos

participantes na situação comunicativa, definindo pragmática como “the study of meaning,

not as generated by the linguistics system, but as conveyed and manipulated by

participants in a comunicative situation” (1992: 217). Para os Estudos de Tradução, esta

assumpção conhece três consequências imediatas: a consideração dos propósitos

motivadores da tradução e não apenas dos efeitos e função a ocupar pelo texto traduzido

na CC; o assumir de uma nova perspectiva sobre o conceito de equivalência que deverá

agora ser definido não só ao nível do conteúdo do texto, mas também da sua força

ilocutória e perlocutória10; e finalmente, o reconhecimento do tradutor como agente locutor

com liberdade de escolha entre as diferentes hipóteses que o sistema lhe disponibiliza.

Caberá ao tradutor, além da análise do TP e da sua posição na CP, realizar juízos

relativamente ao efeito da tradução nos leitores da CC (Hatim e Mason, 1990: 65).

Assumir o texto literário como palco de interacção comunicativa entre locutor e alocutário e

ter em consideração os propósitos e os efeitos dessa interacção tornam relevante a

recuperação dos conceitos de leitor real e leitor implícito desenvolvidos pela Pragmática e a

Análise de Discurso. Por leitor real entenda-se o receptor do texto posicionado “no mesmo

plano ontológico que o autor empírico” (Reis, 1998: 220); por leitor implícito entenda-se a

entidade intratextual que corresponde às expectativas do autor relativamente ao seu leitor,

“um sujeito virtual em função do qual o texto é constituído como estrutura a

descodificar” (Reis, 1998: 220). A materialização no texto das expectativas e assumpções

do locutor face ao alocutário faz do conceito de leitor implícito uma construção teórica

bastante relevante para o estudo da tradução, na medida em que as expectativas do

tradutor face à comunidade receptora do texto traduzido parecem assumir um papel

10 Reconhecendo o texto como acção e a capacidade de o locutor agir com palavras, J. Austin (1962) distingue
três tipos de acção: acto locutório, a acção levada a cabo pelo enunciado de uma frase bem formada e dotada
de significado; acto ilocutório, a força comunicativa que acompanha o enunciado; acto perlocutório, o efeito
que o enunciado tem no alocutário.

48
Parte I - Enquadramento Teórico

fundamental na motivação e determinação das estratégias tradutórias. Ambos o TP e o TC

são produzidos para um leitor, cujas necessidades e expectativas se apresentam numa

maior ou menor tensão relativamente aos propósitos comunicativos do locutor do TP. A

reposição de um texto numa outra cultura, coloca o tradutor numa posição em que o leitor

implícito reconhecido no texto, com as suas necessidades e expectativas, pode não

coincidir com o leitor da CC, tanto em termos de afastamento temporal como cultural,

podendo ser esse o elemento promotor, por exemplo, de uma estratégia de aceitabilidade.

2.1.2.2. Dimensão semiótica

Reconhecer a influência de elementos contextuais na selecção e interpretação de

elementos textuais levar-nos-á a reconhecer o texto como uma rede de signos num sistema

de signos, querendo isto dizer que o texto produz valor semiótico afluente dos valores e

significados reconhecidos na comunidade linguística que o enquadra. Cada elemento

textual assume o seu significado pragmático, não deixando de interagir com outros

elementos (textuais e não textuais) que o acompanham como signos com significados

semióticos mais gerais. Esta dimensão interactiva do texto é semiótica, levando a leitura

pragmática um pouco mais além, enquanto assiste o leitor no posicionamento do texto

num determinado sistema de valores próprios de uma dada cultura. Os elementos

contextuais participam na situação comunicativa enquanto signos, cujo significado é

definido social e institucionalmente e aceite pelos participantes na situação comunicativa,

isto é, o que age sobre o texto não será tanto os elementos específicos reconhecidos ao

contexto, mas sim as expectativas e assumpções dos participantes relativamente a esses

elementos. Entram assim em jogo sistemas complexos de inferência e pressuposição,

assim como todo um conjunto de assumpções e convenções, na medida em que os

diferentes enunciados se tornam signos em constante interacção com outros signos e os

seus usuários. É neste sentido que Basil Hatim afirma:

Pragmatic purposes and the communicative potential of utterances, then, cannot be


appreciated in isolated textual occurrences. For utterances to mean what they say
and say what they mean, they must interact with other utterances present in the

49
Parte I - Enquadramento Teórico

surrounding textual environment or retrievable from the wider universe of discourse.


(1990-91: 83)

O significado comunicativo de um texto será interpretado e descodificado com base em

inter-relações possíveis pelo conhecimento prévio de outras situações por parte dos

participantes. Será assim relevante recuperar o “princípio de analogia” proposto por Brown

e Yule pelo qual assumem que o discurso “is interpreted in the light of past experience of

similar discourses, by analogy with the previous similar texts” (1983: 65)11 . O processo de

interpretação não é apenas um acto de descodificação através da correspondência de

elementos linguísticos a representações guardadas na memória do locutor. Estas

representações são protótipos de um conjunto de diversos elementos - forma da palavra,

formas gramaticais, estruturas narrativas, sequência de acções esperada para uma

determinada situação (Fairclough, 1989:10).

Embora tenhamos aqui em conta textos de natureza diferente, será importante reconhecer

a existência de linhas de tradição que, aceites e reconhecidas pelo leitor/espectador, o

assistem na descodificação e interpretação de determinado uso linguístico. Segundo

Goodman (1973), ler é um processo de reconstrução apenas possível pela activação de

conhecimento adquirido em experiências/leituras passadas:

The reader does not merely pass his eyes over written language and receive and
record a stream of visual perceptual images. He must actively bring to bear his
knowledge of language, his past experience, his conceptual attainments on the
processing of language information encoded in the form of graphic symbols in order
to decode the written language. Reading must therefore be regarded as an
interaction between the reader and written language, through which the reader
attempts to reconstruct a message from the writer. (1973: 15)

11 Diversos são os autores que assumem esta mesma posição, sendo notória a coincidência deste princípio
com o conceito de “pressuposição assumida” proposto por Stalnaker e que pretende dar conta da situação de
que “pressupositions is what is taken by the speaker to be the common ground of the participants in the
conversation” (1978: 321), os conceitos de implicatura e inferência propostos pela gramática sistémico-
funcional de Halliday, ou mesmo o conceito de “competência comunicativa” com que Hymes (1971) pretendia
abarcar o conhecimento e a capacidade por parte do falante em fazer uso de todos os sistemas semióticos que
lhe estão disponíveis como membro de uma comunidade. Stubbs, por sua vez, refere-se ao processo de leitura
como um “psycholinguistic guessing game” (1983: 212), denunciando a natureza inacabada de um produto
sempre tido como acabado.

50
Parte I - Enquadramento Teórico

Embora a tradução para o palco venha a conhecer uma concretização em palco, o mesmo

poderá ser aplicado ao sistema teatral. O espectador recupera conhecimentos e

experiências passadas que o assistem na interpretação e reconstrução da mensagem do

texto oral. O papel de mediador a cumprir pelo tradutor obriga-o, portanto, a ter em

consideração as diferentes tradições em que se insere o texto de partida e que lhe

permitirão interpretar o texto, assim como as diversas tradições do contexto de chegada

que facilitarão a percepção de quais os elementos e parâmetros de transferência familiares

ao leitor da CC. Relembrando o conceito de “norma de expectativa” proposto por

Chesterman (1997), exposto em I-1.3 do presente estudo, percebemos a centralidade que

a gestão das expectativas conhece para o tradutor que assumirá determinadas escolhas

em conformidade ou desvio face ao que, prospectivamente, detém como a expectativa do

leitor.

Assumindo que os textos remetem para outros textos e que partilham características que

nos permitem reconhecer, inferir e interpretar elementos textuais, somos levados a

ponderar os conceitos de género e intertextualidade.

Agindo a um nível superior ao de registo12 (Martin, 1985), o conceito de género permite-nos

ultrapassar os limites do contexto restrito do texto e, estabelecendo a ponte com o

contexto cultural, perceber as relações estabelecidas entre textos e entre textos e

elementos contextuais. Tradicionalmente, o conceito de género conheceu definições como

a de Hymes para quem a noção de género implica “the possibility of identifying formal

characteristics, traditionally recognized” (1975: 61). Autores como Kress ou Threadgold

rejeitam esta limitação do conceito a categorias meramente formais assumindo que:

[g]enres are not simply schemas or frames for action. They involve, always,
characteristic ways of “text-making” (what in systemic-functional terms we could
call mode), and characteristic sets of interpersonal relationships and meanings”.
(Kress e Threadgold, 1988: 216)

12Para Halliday o conceito de “registo” abarca a relação entre textos e processos sociais, reconhecendo ao
conceito de “género” uma aplicação mais limitada e confinada ao conceito de registo, isto é, a definição do
género de um texto contribui para a compreensão do seu registo (Halliday, 1978: 145). Martin, partindo da
proposta de Halliday, faz a distinção entre género e registo e reconhece ao conceito de registo uma posição
mediadora entre o género e o discurso (Martin, 1984).

51
Parte I - Enquadramento Teórico

Mais do que apenas legitimar combinações convencionais de diferentes variáveis ou

determinadas selecções formais, o conceito de género representa um nível abstracto de

estratégias verbais usadas para atingir propósitos de diversas naturezas, sendo, nesse

sentido, definido por Kress como uma forma convencionalizada com “specific forms and

meanings, deriving from and encoding the functions, purposes and meanings of the social

occasion” (1985: 19). O significado de um texto não decorre apenas do discurso, mas

também do género que lhe é reconhecido. Segundo Kress:

[…] both discourse and genre carry specific and socially determined meanings.
Discourse carries meanings about the nature of the institution from which it derives;
genre carries meanings about the conventional social occasions on which texts
arise. (Kress: 1985: 20)

No presente estudo, será importante ter em consideração as características formais, a

história nos sistemas literário, teatral e fílmico e as funções sociais assumidas pelo género

em estudo, comédia, no sentido em que a atitude de manutenção ou desvio assumida

pelas escolhas do tradutor face às expectativas suscitadas pelo género será mais um

aspecto na reconstituição do contexto e na compreensão do fenómeno de tradução. A

identificação do género em que se inclui o texto, seja ela indirectamente reconhecida pelo

leitor ou explicitamente anunciada na capa, folheto, cartaz ou elementos paratextuais, cria

no leitor/espectador determinadas expectativas, levando à activação de conhecimentos

prévios e ao estabelecimento de relações aquando da interpretação do texto.

O conceito de intertextualidade, reconhecido por Hatim e Mason como um sistema

semiótico de significação, afasta a noção de características estáticas de um texto

resultante de um processo mecânico (1990: 123). O significado do texto não é apenas

tributário das relações estabelecidas com os elementos do contexto imediato, mas

também das relações criadas com outros textos que definem uma linha literária em que

este se insere. Na linha de Beaugrande e Dressler (1981) que definem intertextualidade

como “ways in which the perception and reception of a given text depends upon the

52
Parte I - Enquadramento Teórico

participants’ knowledge of other texts”, podemos, inclusive, considerar a intertextualidade

como condição essencial de todos os textos. Segundo Benson (1985):

[…] the meanings we make through texts, and the ways we make them, always
depend on the currency in our communities of other texts we recognize as having
certain definite kinds of relationships with them […]. Every text, the discourse of
every occasion, makes sense in part through implicit and explicit relationships of
particular kinds to other texts, to the discourse of other occasions. (1985: 275)

De entre diferentes modelos que ponderam o conceito de intertextualidade, o de

Beaugrande e Dressler (1981) mostrou servir os propósitos do presente estudo,

mostrando-se, em grande medida, complementar da proposta de Halliday 13. Os autores

consideram a questão da interferência intertextual em termos de uma maior ou menor

mediação:

[…] the extent to which one feeds one’s current beliefs and goals into the model of
the communicative situation: the greater the expanse of time and of processing
activities between the use of the current text and the use of previously encountered
texts, the greater the mediation (1981: 182).

A recriação literária de variedades linguísticas segue uma linha de tradição definida e

perpetuada por outros textos literários relativamente aos quais o autor se irá posicionar,

sendo possível reconhecer diferentes fontes de mediação (cf. Cap. 1, Parte II).

Concluímos assim que o nível contextual semiótico, em conexão com os níveis pragmático

e comunicativo, regula a expressão, transferência e compreensão dos significados sócio-

culturais presentes no texto. No presente estudo, tendo em conta a hipótese e objectivos

propostos, pretende-se: identificar o significado comunicativo das formas em análise

(dialectos) mediante a definição e reconhecimento da ConfigC do TP, identificar o valor

sócio-semiótico que assumem por ocuparem um determinado lugar numa escala de valores

13 Considerando os contextos de situação e cultural a face não verbal de um texto, Halliday encara a
intertextualidade como a relação dialéctica que necessariamente existe entre contexto e texto: “ […] the
relationship between text and context is a dialectical one: the text creates the context as much as the context
creates the text. ‘Meaning’ arises from the friction between the two. This means that part of the environment for
any text is a set of previous texts, texts that are taken for granted as shared among taking part.” ([1985], 1991:
47).

53
Parte I - Enquadramento Teórico

previamente determinada pela comunidade linguística de partida e perceber que contornos

assumem ambas as dimensões nos textos traduzidos. Assumindo a tradução como um

processo de transferência em contexto e o tradutor como um agente locutor que age

mediante escolhas, será igualmente objectivo deste estudo identificar o grau de correlação

entre as opções e estratégias assumidas e a função a cumprir pela tradução no contexto de

chegada.

2.2. Os EDT e as propostas do New Historicism e o Cultural Materialism

Os anos 80, marcados por um abandono de posições formalistas, assistem ao emergir de

movimentos como o New Historicism (promovido nos EUA por Stephen Greenblatt) ou o

Cultural Materialism (desenvolvido no Reino Unido por Alan Sinfield e Jonathan Dollimore)

promotores de uma visão contextualizadora do texto, cuja leitura é agora entendida como

histórica, variável e participante na comunidade que a enquadra. Se o esmorecer do debate

nos poderia, a um primeiro olhar, levar a concluir quanto ao declínio ou abandono desta

perspectiva, um segundo olhar, permite-nos concluir que tal se deve antes a um amplo

consenso quanto à sua pertinência e a uma adopção generalizada dos seus princípios

pelos movimentos críticos actuais. Os ET não foram, e não são, alheios a esta nova

perspectiva. Na linha de Even-Zohar com a Teoria dos Polissistemas (1979), autores como

Susan Bassnett e André Lefevere, desenvolvem com a publicação de Translation, History

and Culture em 1990 o que veio a ser denominado de “Cultural Turn” nos ET. Abandonando

a reverência a um conceito de original subjugador do texto traduzido, defendem uma nova

perspectiva dentro dos ET que assume não só a historicidade e subjectividade da leitura,

do acto de tradução e do estudos do acto de tradução, como também a existência de

sistemas avaliativos e estéticos socialmente constituídos.

Sem intenções de promulgar um criticismo radical ou uma visão do texto subjugado às

teias do seu contexto (críticas por vezes apontadas aos diferentes movimentos

historicistas), considerou-se importante recuperar alguns aspectos das propostas do New

Historicism e Cultural Materialism, agora no contexto dos ET. Embora estas tenham sido

propostas formuladas dentro dos Estudos Literários, os parâmetros agora recuperados

54
Parte I - Enquadramento Teórico

demonstram ser igualmente relevantes para qualquer tipo de texto, confirmando a

pertinência da sua ponderação no contexto do presente estudo.

Confirmando a dimensão semiótica de um texto, o New Historicism e o Cultural Materialism,

mais do que descrever aspectos e padrões estilísticos ou linguísticos do texto, procuram

perceber a motivação desses padrões e a relação que manifestam com outros elementos

dentro e fora do texto, textuais e não textuais. Afastando-se de abordagens formalistas que

reconhecem ao texto um significado universal e ahistórico, defendem a percepção do texto

como um signo num sistema de signos, valorizando a participação do contexto histórico

que enquadra o texto, assim como as necessidades sociais e comunicativas que esse texto

procura satisfazer.

[…] the text’s formal boundaries have to be opened up, in order to enable the
search of the diverse ways in which they represent, transform and negotiate social
materials which they share with other cultural objects. As such, literary texts are
not seen as ‘containers’ of meaning, but as elements of a general system of
signification. (Pieters, 2001: 34)

O texto, literário ou não literário, é agora entendido, não apenas como meio de expressão

de conhecimento histórico ou espelho da sociedade, mas sim como elemento activo num

determinado momento histórico do qual é simultaneamente produto e actor. É, assim,

reconhecida uma relação dialógica entre texto e contexto que tanto rejeita a concepção de

um texto fora do seu contexto, como da história como um conjunto de factos fora do texto

escrito. A assumpção de historicidade de qualquer texto leva a que seja igualmente

assumida a historicidade e necessidade de contextualização do seu próprio discurso

enquanto disciplina.

Reconhecendo a literatura como parte constitutiva da forma como as sociedades se

organizam e governam a si mesmas, autores como Stephen Greenblatt ou Alan Sinfield, na

esteira de Foucault, encaram os textos literários como espaços onde as relações de poder

ganham visibilidade, apresentando-se, assim, como importantes veículos de poder. O

acesso e a regulação do acesso ao discurso, assim como o controlo sobre este, são agora

questões relevantes alvo de um novo enfoque promotor de uma maior visibilidade do

55
Parte I - Enquadramento Teórico

estudo da acção e efeitos do mecenato, da publicidade, dos prémios literários, do ensino,

e, naturalmente da censura (tanto institucional como não institucional). Como disciplina o

New Historicism e o Cultural Materialism mostram-se especialmente interessados nas

relações de poder que operam na comunidade, a forma como são representadas e

perpetuadas no texto, e como o texto participa activamente na confirmação, perpetuação

ou oposição a essas relações de poder. O texto literário é agora entendido num contexto de

relações de poder denunciadoras de movimentos de consolidação (meios pelos quais a

ordem dominante procura perpetuar-se a si mesma), subversão (elementos que procuram

subverter a ordem dominante) ou contenção (meios pelos quais a ordem dominante procura

conter as pressões subversivas):

[...] the work of art is one of the places in which [a culture] gets shaped and
transmitted and empowered and questioned as well as represented and
expressed. (Greenblatt, 1988: viii)

A função do texto terá de ser definida como a aplicação ou uso do texto num contexto

particular de forma a cumprir determinados objectivos e/ou interesses. Assumir o papel do

texto literário na representação que uma cultura faz de si mesma leva-nos, por um lado, a

ponderar a forma como este confirma ou desafia outras representações dessa mesma

realidade e que posição assume no jogo de relações de poder; por outro, a aceitar que a

ideologia está presente e age sobre o texto literário, tal como sobre qualquer outro texto.

Neste sentido, o conceito de literatura vigente, o prestígio que lhe é conferido, a selecção

dos textos a compreender o cânone e instituições como a escola, o teatro ou a biblioteca

são entendidos como a face material dessa ideologia.

Neste contexto, e ainda na esteira de Foucault, considerou-se importante recuperar

algumas das propostas desenvolvidas em “O que é um autor?” ([1983] 1989) e “A ordem do

discurso” ([1970]1996) relativamente à autoria do texto. Segundo Foucault, a reflexão sobre

a autoria textual deverá ter em conta a posição socialmente determinada assumida pelo

autor, tanto dentro do texto como fora dele, por forma a que se tenham em conta, não só

os factores sociais e históricos determinadores da posição autoral, mas também das regras

56
Parte I - Enquadramento Teórico

e regulamentações que definem o campo discursivo em que o autor opera. O texto é neste

sentido entendido como um contexto de negociação entre criador (provido de um

complexo repertório de convenções partilhadas com outros criadores e a comunidade em

geral) e as instituições e práticas da sociedade.

À parte de outros factores que distinguem o New Historicism do Cultural Materialism, no

contexto do presente estudo surgem como especialmente relevantes dois aspectos: a

assumpção, por parte do Cultural Materialism, de que qualquer modo de comunicação, e a

literatura em particular, conhece uma existência e função material dentro das estruturas

sociais de poder, na medida em que é regulada, governada e reproduzida por instituições 14;

o focar da sua atenção não apenas no contexto de produção do texto (tal como promove o

New Historicism de Greenblatt), mas também no(s) contexto(s) de recepção. Para o Cultural

Materialism o texto é produto e actor tanto do e no contexto de produção como do(s) e no

(s) contexto(s) de recepção:

A play by Shakespeare is related to the contexts of its production. […] Moreover,


the relevant history is not just that of four hundred years ago, for culture is made
continuously and Shakespeare’s text is reconstructed, reappraised, reassigned all
the time through diverse institutions in specific contexts. What the plays signify,
how they signify depends on the cultural field in which they are situated. (Sinfield e
Dollimore, [1985] 1994: viii)

Considerar o texto na sua relação com os elementos e forças de poder presentes no

contexto circundante e a forma como este, através de convenções, normas e acção de

diversos agentes, terá influenciado a produção de determinadas regularidades

identificadas nos textos, assemelha-se, portanto, ao objectivo mais vasto dos Estudos de

Tradução. O estudo das normas, que Toury apresenta como um dos objectivos dos EDT,

terá, seguindo as propostas de Hermans e Chesterman expostas no capítulo anterior,

necessariamente de ter em conta o contexto de relações de poder e expectativas em que a

negociação das escolhas do tradutor toma lugar.

14A designação Cultural Materialism foi justificada pelos autores como uma tomada de posição face à Cultural
Poetics que não assumia esta face material do texto literário.

57
Parte I - Enquadramento Teórico

Mais do que procurar identificar o contexto das traduções em estudo, importa agora

perceber o texto traduzido em contexto, aceitando a sua condição de produto e actor

desse e nesse contexto. Tal como reconhecido por Bassnett e Lefevere (1990):

Translation is, of course, a rewriting of an original text. All rewritings, whatever their
intention, reflect a certain ideology and a poetics and as such manipulate literature
to function in a given society in a given way. Rewriting is manipulation, undertaken
in the service of power, and in its positive aspect can help in the evolution of a
literature and a society. (1990: ix)

Importa agora identificar a posição que o texto traduzido assume no jogo de relações de

poder e ideológicas da CC e face à poética dominante, a função que cumpre em ambos os

domínios, assim como a posição da CC face à CP. Mais do que assumir que o processo de

tradução é iniciado pela CC, importa agora identificar por que via foi patrocinada a

tradução e que função se esperava que viesse a preencher.

Alguns destes aspectos receberam a atenção de André Lefevere (1990), cujas propostas se

mostra pertinente aqui recuperar. Concentrando-se na análise de factores concretos que

sistematicamente governam a recepção, aceitação ou rejeição da literatura, Lefereve

identifica os que governam o sistema como “reescritores”, sendo que as motivações da

reescrita podem ser de natureza ideológica (em conformidade ou desacordo com a

ideologia dominante) ou poética (em conformidade ou desacordo com a poética

dominante). Lefevere descreve o sistema literário, dentro do qual a tradução ocupa o seu

lugar, como sendo norteado por um triplo factor de controlo:

a) Profissionais dentro do sistema literário: críticos, professores, tradutores;

b) Mecenas fora do sistema literário: os poderes capazes de promover ou dificultar a

leitura, escrita e reescrita da literatura (Lefevere, 1992: 15). Ao mecenato são

identificados três componentes: ideológica (que condiciona a escolha e

desenvolvimento tanto da forma como do conteúdo); económica (que garante a

subsistência dos escritores e reescritores); e de estatuto (a aceitação do patrocínio

assinala a adesão a uma elite e aceitação do estilo de vida associada a essa elite). É

feita ainda a distinção entre mecenato indiferenciado e diferenciado, na medida em

58
Parte I - Enquadramento Teórico

que as três componentes são providenciadas pela mesma ou por diversas

entidades respectivamente;

c) A poética dominante, a que reconhece duas componentes: uma formal, um

inventário de instrumentos literários, géneros, motivos, personagens, situações e

símbolos protótipos; e uma funcional, uma noção de qual, ou qual deveria ser, o

papel da literatura no sistema social.

A tradução, que Lefevere encara como o exemplo de reescrita mais evidente, possibilita o

conhecimento de determinada obra fora das fronteiras do sistema em que foi produzido,

pelo que a análise da tradução deverá basear-se no estudo dos constrangimentos e/ou

motivações do tradutor e da poética dominante, ambos regulados por mecenas. A

ideologia e a poética influenciam a adopção de determinadas estratégias por parte do

tradutor na resolução de problemas específicos resultantes das diferenças culturais (neste

contexto introduz o conceito de “universo do discurso” – objectos, costumes do mundo

familiar ao autor ou ao tradutor) ou das diferenças linguísticas naturais entre as línguas

envolvidas. Na escolha de estratégias participam ainda a relação de poder/prestígio entre

as culturas de partida e chegada, o público-alvo e a posição do tradutor relativamente à

poética de tradução da cultura de chegada. A sobrepor ao exposto, o tradutor sofre

igualmente a influência de um terceiro elemento – o texto de partida – “the locus where

ideology, poetics, universe of discourse and language come together, mingle and

clash” (Lefevere, 1985: 133).

A proposta de Lefevere, integrando as propostas de Toury e denunciando afinidades

evidentes com as propostas de Greenblatt e Sinfield, mostra-se complementar da proposta

de Toury na medida em que apresenta parâmetros de análise mais abrangentes e

concretos, justificando assim a sua aplicação no presente estudo.

Neste sentido, no contexto do presente estudo prova-se relevante identificar:

a) os diferentes contextos de recepção dos textos em análise,

b) o posicionamento da CC face à CP,

c) quem traduziu e qual a fonte de patrocínio, assim como o seu posicionamento dentro

da CC (em termos ideológicos e de prestígio),

59
Parte I - Enquadramento Teórico

d) (in)existência de dispositivos de controle de acesso ao discurso,

e) o público a que se destinam as traduções,

f) o posicionamento do TP e do seu autor na CC,

g) o posicionamento assumido pelos textos em análise face tanto à ideologia como à

poética dominantes no momento de produção, no sentido do reconhecimento de

movimentos de consolidação, subversão ou contenção,

h) as regularidades existentes entre os padrões linguísticos reconhecidos e os

elementos contextuais seleccionados como pertinentes.

60
Parte I - Enquadramento Teórico

CAPÍTULO 3
A ANÁLISE DE CORPORA EM ESTUDOS DESCRITIVOS DE TRADUÇÃO

A recente aproximação dos Estudos de Tradução e da Linguística de Corpus e o emergir de

uma linha de investigação baseada na análise de corpora em EDT pode ser encarada como

resultado directo da reorientação dos Estudos de Tradução para o contexto de chegada.

Esta mudança de perspectiva é descrita por Venuti:

The literature on equivalence formulates linguistic and textual models and often
prescribes a specific translation practice [...]. The target orientation, in contrast,
focuses on actual translations and submits them to detailed description and
orientation. It inspires research projects that involve substantial corpora of translated
texts. (Venuti, 2000: 123)

A linguística de corpus assume assim uma abordagem empírica relativamente ao estudo da

língua igualmente reconhecida pelos Estudos Descritivos de Tradução. Autores como Toury

(1980) ou Holmes (1988) insistem no estudo de dados observáveis e na edificação de uma

metodologia que torne possível, não só o estudos de corpora mais vastos, mas também a

replicação de estudos individuais. Para uma disciplina desenhada por Toury como empírica

e indutiva, baseada na descrição sistemática do objecto em corpora cada vez mais vastos

de forma a que se possam abstrair leis gerais a partir das regularidades identificadas, a

Linguística de Corpus apresenta instrumentos de análise e todo um aparato metodológico

relevante para os Estudos de Tradução. Num artigo inaugural, Mona Baker (1993),

assumindo uma perspectiva descritiva, avançava com a proposta do recurso ao aparato

analítico da linguística de corpus no estudo do produto e processo da tradução. Segundo a

autora, a disponibilidade de corpora mais vastos, tanto de textos originais como de textos

traduzidos, aliada a uma metodologia baseada em dados observáveis e na construção de

corpora, possibilitaria aos investigadores em Estudos de Tradução o desvelar da natureza

dos textos traduzidos “as a mediated communicative event, shaped by its goals, pressures

61
Parte I - Enquadramento Teórico

and context of production” (1993: 243), sendo nesse sentido que sublinha ainda a

importância desta abordagem para o estudo de normas de equivalência tradutória:

Like universal features of translation, textual exponents of translational norms can be


efficiently and reliably investigated if access to computerised corpora is made
available to scholars in the field. (Baker, 1993: 246)

Segundo Baker (1993, 1996), a análise de corpora em EDT torna possível uma análise

automática ou semi-automática de corpora mais vastos com resultados mais fiáveis,

possibilitando a generalização dos resultados de análise de corpora representativos. Será

possível identificar padrões conhecidos em corpora mais vastos, confirmando resultados

ou testando hipóteses e teorias pré-existentes de outros estudos, mas também identificar

padrões desconhecidos até então (porque apenas verificáveis em corpora de maiores

dimensões ou porque difíceis de identificar com uma análise manual) e formular novas

questões a investigar (Halverson, 1998).

As afinidades partilhadas entre a Linguística de Corpus e os EDT, tanto ao nível teórico

como metodológico, assim como a posição já conquistada pela análise de corpora em

Estudos de Tradução, permite-nos falar em Análise de Corpora em EDT. Autores como

Leech (1991), Stubbs (1996), Laviosa (2002) ou Rosa (2004) destacam como afinidades

mais relevantes:

a) A valorização de uma abordagem empírica e indutiva. Ambas as disciplinas

defendem estudos baseados na análise de dados empíricos para que daí sejam

abstraídas características do fenómeno analisado com base nas regularidades de

comportamento identificadas.

b) Análise do uso real para a descrição sistemática do objecto. Tanto a Linguística de

Corpus como os EDT têm por objectivo estudar o fenómeno em causa tal como ele

é e existe. Segundo Toury “what is addressed, even in the longest run, is not what

translation is in general, but what it proves to be in reality […] real life situations that

we set out to account for” (Toury, 1995: 32-33).

62
Parte I - Enquadramento Teórico

c) O estudo de corpora cada vez mais vastos, variados e bem definidos.

d) A tentativa de distinguir o comportamento linguístico típico implica não excluir a

priori, com base em critérios quantitativos, alguns tipos de texto autêntico. Assim

como Sinclair não rejeita qualquer uso linguístico, também Toury não rejeita

qualquer texto que seja considerado como tradução pela cultura de chegada. É

pelas regularidades de comportamento identificadas que se poderá avaliar a

criatividade de certas opções, assim como é pela identificação de certas normas de

equivalência tradutória que os desvios assumem significado. Neste sentido, a noção

de uso típico da Linguística de Corpus assemelha-se à noção de norma dos EDT.

e) A assumpção de uma abordagem baseada na interrelação entre as diferentes fases

do processo: criação do corpus, análise dos dados, formulação e testar das

hipóteses, avaliação e reformulação das hipóteses.

f) A procura de regularidades de onde se abstrairão leis gerais. Ambas as disciplinas

procuram formular generalizações a partir de dados organizados que denunciam

regularidades de comportamentos, regras que assumem a forma de leis

probabilísticas e não de regras prescritivas. Stubbs afirma: “Corpus linguistics […]

investigates relations between frequency and typicality, and instance and norm. It

aims at a theory of the typical, on the grounds that this has to be the basis of

interpreting what is attested but unusual” (Stubbs, 2001: 151).

g) Ambas as disciplinas recorrem a corpora para a prossecução do seu estudo, sem

que por isso se definam como estudos de corpora. Tal como afirma Laviosa, “it is

more fruitful to focus on corpus work as a research methodology, […] as the

application of corpus analysis techniques, both quantitative and qualitative, to the

study of aspects of the product and process of translation” (Laviosa, 2002: 9).

h) Reconhecimento da língua e do uso da língua em tradução como fenómeno social

condicionado pela cultura que o produz.

63
Parte I - Enquadramento Teórico

3.1. A Análise de Corpora em Estudos Descritivos de Tradução

A parceria entre a Linguística de Corpus e os EDT, possibilitando o desenvolvimento e

aplicação de novas metodologias para o estudo da tradução como produto, tem ajudado a

ultrapassar algumas desconfianças relativamente à aplicação da linguística ao estudo da

tradução. Tais desconfianças foram suscitadas por abordagens centradas em estudos que

raramente atingiam níveis hierárquicos superiores à palavra ou ao sintagma, não tendo em

consideração factores contextuais ou o texto como um todo dotado de sentido interno. A

análise de corpora em EDT propicia estudos que têm em conta, não só a análise de

características linguístico-textuais, como também o seu relacionamento com factores do

contexto sociocultural que as enquadra e condiciona. Tal como afirma Tymoczko (1998),

este novo paradigma preconiza estudos qualitativa e quantitativamente diferentes,

colocando os EDT a par dos mais recentes desenvolvimentos da era da informação.

Tendo objectos e metodologias específicos, os EDT têm desenvolvido diferentes tipos de

corpora que não coincidem necessariamente com os que a Linguística de Corpus define

para corpus monolingues, gerando alguma confusão terminológica. O termo “corpus

comparável” tem sido utilizado “to refer to a bi/multilingual corpus made up of two or more

sets of texts from the same subject of domain(s) (Sinclair, 1991, vide Laviosa, 2002: 36),

enquanto “corpus paralelo” se refere a um “corpus of original texts in language A and their

translations in language B”. Também dentro dos EDT a terminologia não é consistente, na

medida em que certos autores usam “corpus paralelo” para se referirem aos dois tipos de

corpus bilingues (Johansson and Hofland, 1994; Hartman, 1994; Gellerstam, 1996; vide

Laviosa 2000, 2002: 37), enquanto outros seguem a terminologia tradicional da análise

contrastiva fazendo a distinção entre “corpus de tradução” (textos original numa língua A e

respectivas traduções numa língua B) e “corpus paralelo” (textos originalmente escritos nas

línguas A e B) (Aijmer et al., 1996; , 1996; cf. Laviosa, 2002: 37).

Baker (1995: 231) define três tipos de corpora:

• Corpora paralelos (“Parallel Corpora”): este tipo de corpus consiste em textos

originalmente escritos numa língua A e nas respectivas traduções numa língua B.

64
Parte I - Enquadramento Teórico

Tradicionalmente é a corpora paralelos que os estudos feitos em EDT recorrem, na

medida em que só um estudo comparativo entre TP e TC pode ser descritivo e

explicativo das relações de tradução que unem estes textos. Segundo Baker:

Their most important contribution to the discipline in general is that they support a
shift of emphasis, from prescription to description. They allow us to establish,
objectively, how translators overcome difficulties of translation in practice, and to
use this evidence to provide realistic models for trainee translators. They also
have an important role to play in exploring norms of translating, in specific socio-
cultural and historical contexts. (Baker, 1995: 231)

Apenas o recurso a corpora paralelos possibilitará ao investigador chegar à

formulação de normas de equivalência tradutória em contextos socioculturais

particulares, procedimento que Toury identifica, juntamente com a formulação de leis

de tradução, como o objectivo último dos EDT.

• Corpora multilingues (“Multilingual Corpora”): Os corpora multilingues consistem na

reunião de dois ou mais corpora monolingues, construídos na mesma instituição ou em

instituições diferentes, tendo por base a partilha de critérios semelhantes.

• Corpora comparáveis (“Comparable Corpora”). Os corpora comparáveis são

constituídos por dois corpora simples: um translato e outro não-translato. Têm por

objectivo, não a tradicional comparação entre TP e respectivo TC, mas sim a

comparação de textos traduzidos para uma determinada língua e de textos

originalmente escritos nessa mesma língua, com o propósito último de estudar as

regularidades e características do texto traduzido1.

Laviosa desenvolve uma tipologia em quatro níveis procurando dar conta dos diferentes

tipos de corpora possíveis em Estudos de Tradução (cf. III-1.2.1). Kenny (1999a), com base

nos estudos de Baker e Laviosa, propõe uma outra organização das categorias propostas

que assenta no cruzamento de duas distinções distintas: um primeiro grupo que faz a

1 Este tipo de corpora tem proporcionado contribuições importantes para a primeira fase de análise proposta
por Toury (Laviosa, 2002: 13), em que se estuda o TC em termos da sua aceitabilidade na cultura de chegada
sem que o TP seja tido em consideração.

65
Parte I - Enquadramento Teórico

distinção entre corpora monolingues, bilingues e multilingues, e um segundo grupo que faz

a distinção entre corpora simples, paralelos e comparáveis. Será assim possível

reconhecer: corpora simples monolingues2; corpora comparáveis monolingues, bilingues ou

multilingues; corpora paralelos bilingues ou multilingues:

Corpus Monolingue Bilingue Multilingue

Corpus simples
Simples ***** *****
monolingue

Corpus comparável Corpus comparável Corpus comparável


Comparável
monolingue bilingue multilingue

Corpus paralelo Corpus paralelo


Paralelo *****
bilingue multilingue

Figura 3: Tipologia de corpora analisados em EDT (baseado em Rosa, 2004: 91)

Granger (2003), assumindo uma posição diferente da assumida em 1996 e denunciando a

discrepância entre os Estudos de Tradução e a Linguística Contrastiva, defende a

necessidade de um modelo que dê conta dos diferentes tipos de corpora que,

possibilitando aos investigadores operar com os mesmos conceitos, promova a

cooperação entre as duas perspectivas.

Figura 4: Corpora na investigação trans-linguística (tradução do modelo de Granger, 2003: 21)

2 O corpus simples monolingue consiste num conjunto de textos numa mesma língua, seja essa a língua em que
foram escritos originalmente ou a língua para a qual foram traduzidos (Laviosa, 1997, 2002). Os resultados
obtidos com este tipo de corpora permitem reforçar o conhecimento de regularidades comuns na língua de
chegada (Kenny 1999a).

66
Parte I - Enquadramento Teórico

3.2. Limitações da Análise de Corpora em Estudos Descritivos de Tradução

Apesar de a Linguística de Corpus se apresentar como um poderoso aliado dos EDT, a

aplicação de uma metodologia de análise de corpora em EDT não deixa de levantar

algumas reservas a autores como Malmkjaer (1998), Tymoczko (1998), Hermans (1999),

Mason (2001), Laviosa (2002) ou Olohan (2004) que, não deixando de reconhecer os pontos

positivos desta parceria, alertam para alguns cuidados que não devem ser esquecidos. Um

dos problemas mais evidentes será o de esta abordagem proporcionar informações

relativamente às características linguísticas do texto, mas pouco relativamente ao seu

estatuto na cultura de chegada, isto é, relativamente ao contexto sociocultural que o

enquadra (Hermans, 1999: 93-94). Por outro lado, os instrumentos informáticos

normalmente utilizados apresentam sérias limitações, não só por muitas vezes ser atribuído

especial relevo a determinados fenómenos, ficando outros fora da análise, mas também por

tornarem bastante difícil a análise de características textuais, isto é, será difícil proceder-se

a uma análise automática que vá além do nível frásico (Malmkjaer, 1998; Laviosa, 2002). É

ainda frequentemente criticado o facto de certos corpora incluírem apenas um texto

traduzido para cada texto original, fazendo com que os resultados obtidos, além de

enviesados, não sejam generalizáveis por denunciarem apenas as idiossincrasias de um só

tradutor (Malmkjaer, 1998). Uma última advertência é feita relativamente ao perigo de os

investigadores, aturdidos pelo peso dos dados quantitativos, não alargarem o âmbito da

sua pesquisa. A fiabilidade conseguida pela aplicação de uma análise automática ou semi-

automática não poderá ser o objectivo último do estudo, pelo que os resultados

quantitativos deverão ser complementados por um estudo mais abrangente que, tendo em

conta factores contextuais, procure apurar as motivações de certas regularidades

linguístico-textuais identificadas. O tipo de análise realizada em Estudos de Tradução e a

promoção da identificação de universais de tradução recebe ainda a crítica de o estudo se

concentrar apenas no que os textos têm em comum, e não tanto naquilo que os distingue

(Hermans, 1999; Tymozco, 1998).

67
Parte I - Enquadramento Teórico

A aplicação de uma metodologia deste tipo parece, neste sentido, exigir do investigador a

criação de perguntas muito específicas a fazer ao corpus, de forma a que os conceitos se

tornem operativos. Baker parece concordar quando afirma que:

[…] corpus linguistics does not lend itself to abstraction: we cannot search for
something like simplification in a corpus. We have to ask ourselves first what kind of
concrete manifestations each feature might have in a text, and then we have to
consider how we might locate these concrete manifestations, by no means an easy
matter. (Baker, 1997: 179)

Tendo em consideração os problemas apontados ao uso de uma análise de corpora em

Estudos de Tradução, Mona Baker alerta, num artigo de 1999, para a necessidade de se ter

em consideração o contexto mediador das regularidades identificadas e propõe a

ponderação de três elementos contextuais que considera fundamentais: “the expectations

of the public, the assumption or claims of the theorists, and the actual practice of

professional translators” (1999: 8). A autora parece assim querer demonstrar a

possibilidade de conciliação das perspectivas linguística e cultural dos Estudos de

Tradução.

Na linha da proposta de Toury, mostra-se assim fundamental trabalhar num movimento

bidireccional entre as propostas do enquadramento teórico e as descobertas conseguidas

a partir dos dados. Baker parece concordar que esta será a abordagem mais proveitosa:

My own feeling is that the process of refining the definition will go hand in hand with
that of verifying the feature: definition and verification are interdependent in the
sense that it is only by investigating the various concrete manifestations of these
abstract notions that we will be able to refine the concepts themselves. (Baker, 1997:
180)

A aplicação de uma metodologia desta natureza em EDT prevê a elaboração de grandes

projectos interdisciplinares (Baker, 1993); contudo, estudos individuais como o presente

terão necessariamente de limitar a sua abrangência, tanto em termos da constituição de

um corpus ab initio (corpus esse necessariamente de uma dimensão bastante inferior),

68
Parte I - Enquadramento Teórico

como em termos de elaboração de instrumentos informáticos específicos para o estudo a

desenvolver. Apesar de todas as limitações, a aplicação da metodologia de análise de

corpora não deixa de se apresentar como uma mais valia para o estudo individual, que não

vê a sua validade posta em causa por todas as condicionantes apresentadas. O recurso a

um corpus electrónico possibilita não só a consideração de um corpus mais vasto do que

seria possível com uma metodologia de análise manual, mas também o valer-se de

instrumentos informáticos que permitem resultados mais fiáveis ao mesmo tempo que

potenciam a identificação de regularidades não verificáveis através de uma análise manual.

O presente estudo recorre a um corpus paralelo electrónico não alinhado, esperando com

isso identificar regularidades de comportamento relativamente à tradução de variedades

linguísticas em texto dramático para diferentes meios: publicação em livro, representação

teatral e legendagem. Tendo em conta os perigos anteriormente expostos, o corpus incluirá

mais do que um TC para cada um dos TP e contempla o estudo de unidades frásicas

expressivas de unidades discursivas. Relativamente aos instrumentos técnicos, uma vez

que os programas utilizados em análise de corpora em EDT concentram a sua análise ao

nível da palavra, mostrou-se necessário recorrer a um outro programa – Systemic Coder3 –

desenvolvido por Mick O’Donnell. Proceder-se-á, então a uma análise semi-automática de

onde resultarão dados quantitativos reveladores de regularidades de comportamento

tradutório. Estas serão posteriormente interpretados à luz dos condicionamentos e

motivações do contexto sociocultural como reveladores da interrelação entre o produto de

tradução, o processo e a função prevista para o TC.

3No presente estudo foi utilizado a versão 4.68 for Windows do programa informático Systemic Coder (Maio de
2005), desenvolvido por Michael O’Donnell da WagSoft Linguistics software. O programa está disponível em:
http://www.wagsoft.com/coder/.

69
Parte I - Enquadramento Teórico

70
Parte
II

Modelo de Análise

A Variação Linguística

Traduções orientadas para a página, palco e ecrã

A tradução da variação linguística


Parte II - Modelo de Análise

CAPÍTULO 1
A VARIAÇÃO LINGUÍSTICA

O aproveitamento criativo de variedades linguísticas em texto ficcional funciona como

recurso mimético de que o autor tira partido tendo em vista a caracterização indirecta das

personagens, das relações interpessoais entre elas estabelecidas e das circunstâncias de

discurso. O presente capítulo tem por objectivo explorar os significados comunicativos e

semióticos do uso de variedades linguísticas em texto ficcional (literário, teatral e televisivo),

procurando dar conta dos elementos extralinguisticos em jogo, do valor sociocultural que

lhes é atribuído e dos diferentes níveis de mediação que condicionam a recriação.

1.1. Variação linguística: terminologia

No enquadramento da GSF houve anteriormente oportunidade de se reconhecer a língua

como um conjunto de sistemas linguísticos marcado pela multiplicidade (diassistema),

sendo possível fazer a distinção entre variedades relativas ao uso (registo) e ao usuário

(dialectos) e entre variedades diacrónicas e sincrónicas. Como variedades sincrónicas são

reconhecidas: variedades diatópicas ou dialectais, relacionadas com factores geográficos;

variedades diastráticas ou sociais, relacionadas com factores sociais (podemos distinguir

sociolectos, gírias, tecnolectos); variedades diafásicas, relacionadas com factores

pragmáticos e discursivos (podemos identificar diferentes registos linguísticos) e,

finalmente, sob o conceito de idiolecto, a variação individual de cada indivíduo (Mateus et

al., [1983] 1999; Cunha, 1984; Halliday e Hasan [1985]1991; Bell, 1991; Ferreira et al., 1996).

Entre as diversas variedades identificadas num território, uma delas, geralmente

seleccionada por influência de factores extra-linguísticos (políticos, económicos, comerciais

ou pedagógicos), adquire maior prestígio, passando a ser identificada pelos falantes como

o uso correcto da língua, a norma ou o padrão. Parece ser, portanto, uma consequência

natural que, na maioria das vezes, seja seleccionada como variedade padrão, aquela

reconhecida à área geográfica tida como mais importante, política e economicamente, e

71
Parte II - Modelo de Análise

utilizada por falantes pertencentes aos estratos socioculturais mais altos. O estatuto e o

prestígio reconhecidos à variedade padrão são mantidos e perpetuados pelo sistema

educacional e o consentimento geral dessa variedade como língua da cultura e do ensino.

Autores como Trudgill e Hughes fazem antes a distinção entre dialecto, referente a

variedades diferenciadas por marcas de natureza gramatical e lexical, e pronúncia, referente

à diferenciação de natureza fonética (1979: 2). Embora esta não seja a terminologia ou a

categorização adoptada neste estudo, não deixou, no entanto, de ser tida em

consideração, na medida em que esta distinção poderá dar conta de situações em que a

variedade padrão conhece diferentes pronúncias, sem que tal funcione como marcador de

estrato social. No contexto inglês, esta distinção mostra-se particularmente importante, na

medida em que a variedade padrão (“Standard British English”) conhece diferentes

pronúncias localizáveis geograficamente, sendo apenas utilizada em conjunto com a

pronúncia padrão (“Received Pronunciation”) por um número muito reduzido de falantes

(1979: 8) 1.

1.2. Valorização de variedades: o estabelecimento de uma hierarquia e a identificação

de estereótipos

O estabelecimento de uma variedade linguística como norma ou padrão e o validamento

social desta variedade como a língua oficial, da cultura e do ensino precipita a identificação

das restantes variedades como subpadrão, uma identificação motivada por um juízo de

valor estabelecido com base na noção de desvio face à norma (Traugott, 1980: 323). Tendo

em conta que a variedade padrão corresponde normalmente à variedade empregue pelos

falantes de estatuto social mais elevado e que o grau de desvio face a essa norma será

mais acentuado no seio dos falantes de estatuto mais baixo, rapidamente concluímos

quanto à estreita ligação entre a língua e a estrutura social, que, com base nos seus

sistemas de valor, conduz ao estabelecimento de uma hierarquia de valor das variedades

linguísticas. Os falantes tendem a reconhecer maior prestígio à variedade identificada como

1 Segundo Trughill e Hughes “‘received’ here is to be understood in its nineteenth-century sense of ‘accepted in
the best society’” (1979: 2). Assim sendo, o dialecto mais prestigiado na sociedade britânica é o “standard
English” e a pronúncia mais prestigiada é a “Received Pronunciation” (RP).

72
Parte II - Modelo de Análise

o uso correcto da língua, e a desvalorizar as restantes variedades identificadas com

estratos socioculturais mais baixos e relacionadas com espaços geográficos que não o

centro económico e de poder. A noção de desvio face à norma é frequentemente feita

acompanhar da noção de “mau”, “incorrecto” ou “feio”, promovendo a variedade padrão

como preferível e superior em diversos níveis, incluindo o estético:

Standard dialects and prestige accents acquire their high status directly from the
high status social groups that happen to speak them, and it is because of their
high status that they are perceived as “good” and therefore “pleasant. (Trudgill e
Giles, 1978: 178)

Será importante reconhecer que esta hierarquização dos falantes é feita com base no

senso comum destes, levando à criação de estereótipos a que se pode reconhecer uma

forte componente linguística. Há marcas dialectais e de pronúncia com uma função

indexical (Hickey, 2000: 65), isto é, particularmente reveladoras de características do

falante relativamente ao seu posicionamento no espaço, tempo e hierarquia social,

conduzindo ao estabelecimento de juízos. Na linha de Rodrigues (2002), poderemos definir

estereótipo como “os traços mais facilmente referidos pelos falantes da língua como

típicos de uma variedade linguística que não seja muito promovida” (Rodrigues, 2002: 2).

Tais traços são frequentemente estigmatizados e manobrados pelos falantes com fins

jocosos ou depreciativos e, porque de conhecimento generalizado, tornam-se propícios à

manipulação em texto ficcional. Será, no entanto, importante ter em consideração que os

elementos caracterizadores do discurso, assim como a noção de autenticidade, dependem

de normas literárias, teatrais, fílmicas, etc., assim como de normas linguísticas específicas

de um tempo e de um espaço, exigindo, como tal, uma interpretação contextualizada (Ben-

Shahar, 1994: 200).

A variação linguística é portanto reveladora do espaço e das relações de poder entre os

participantes na situação comunicativa, assim como da hierarquia que marca o estatuto de

cada participante no diálogo. Importa agora perceber como é feita a recriação destas

variedades e do seu significado comunicativo e semiótico em texto ficcional, que formas

assume e que propósitos cumpre.

73
Parte II - Modelo de Análise

1.3. Recriação de variedades linguísticas em texto ficcional

O uso de variedades linguísticas como recurso mimético pode ser reconhecido em textos

desde a Antiguidade Clássica. Autores como Aristófanes, Terêncio ou Plauto recorriam já a

marcas de discurso subpadrão ou coloquial, contribuíndo para a verosimilhança dos

diálogos e produção de cómico. No sistema inglês, reconhecemos o uso de dispositivos

semelhantes em autores como Chaucer, na sua poesia satírica; no drama dos séculos XVI e

XVII, em autores como Shakespeare ou Ben Jonson, com objectivos de “expose affectation

or hypocrasy, to effect a disguise, or to indulge in clowning” (Blake, 1981: 9); no género

romance, com autores como Scott, Wilde, Dickens, Brönte ou Hardy (Chapman, 1994). O

sistema português reconhece a presença de variedades linguísticas no drama de Gil

Vicente, na historiografia de Fernão Lopes, em romances de autores como Almeida Garrett,

ou Eça de Queirós e posteriormente em obras de Vitorino Nemésio, Maria Velho da Costa,

José Régio ou Lídia Jorge entre outros2.

Será agora importante definir o que neste estudo se assumirá como dialecto ficcional. Para

tal foi recuperada a definição de Lane-Mercier de dialecto literário que consideramos ser

aplicável, não só ao texto literário, mas também ao texto teatral, televisivo e ficcional em

geral:

[…] the textual representation of non-standard speech patterns that manifests


both the socio-cultural forces which have shaped the speaker’s linguistic
competence and the various socio-cultural groups to which the speaker belongs
or has belonged. (Lane-Mercier, 1997: 45)

A recriação de variedades linguísticas em texto ficcional, não só conhece já uma tradição

estabelecida no tempo, como parece obedecer a determinados propósitos dentro da

economia do texto. Não procurando ser uma fiel representação do discurso real, estará, no

entanto, sempre sujeita a diferentes tipos de restrições: artísticas, relativamente ao

conteúdo e modo da representação; linguísticas, relativamente à forma que assume e de

2 A falta de estudos sobre a recriação de variedades linguísticas em texto literário no sistema português e a
impossibilidade de persecução dessa análise no presente estudo, levou a que as considerações feitas
relativamente a autores portugueses, cujas obras pode ser reconhecida a recriação de variedades linguísticas,
se tenha baseado quase exclusivamente na experiência da autora do presente estudo enquanto leitora.

74
Parte II - Modelo de Análise

que meios linguísticos tira partido, e pragmáticas, relativamente aos propósitos que procura

cumprir. É em todas estas formas de mediação da recriação que este estudo focará a sua

atenção neste momento.

1.3.1. Recriação sem aspirações de realismo

Segundo Trudgill e Hughes (1979) os falantes identificam três tipos de desvios que levam o

falante a reconhecer um texto como incorrecto: elementos novos ou desconhecidos na

língua, marcas de oralidade e marcas dialectais, afirmando Trudgill que “since this dialect

[standard variety] is to a considerable extent codified, it requires only one deviation from this

norm for a stretch of speech or writing to be perceived as non-standard” (1979: 10). O grau

de frequência de marcas linguísticas desviantes face à norma será variável de texto para

texto, sendo possível reconhecer diversos factores determinantes nessa decisão: a pressão

do próprio sistema ortográfico, associado à noção de correcção, no caso dos textos

escritos; a consciência que o autor detém de si próprio enquanto artista; o grau de

legibilidade e de inteligibilidade (Ives, 1950: 148). Tal como Chapman afirma “the variety of

visual devices is interesting for what it reveals about the background of the novelist, but it is

secondary to the reader’s response to the dialogue in its context” (1994: 245).

Ambos os autores procuram alertar para o facto de, embora em texto ficcional se criar a

ilusão de discurso autêntico, o realismo formal não ser desejado ou esperado3 . De facto, as

marcas de que os autores tiram partido são o resultado de uma selecção pertencente a um

repertório de textos ficcionais estabelecido pela tradição do sistema a que pertencem e que

o leitor/espectador aprendeu a descodificar. Brodovich (1997a, 1997b) traz-nos o conceito

de “scenic dialect” que define como um conjunto de formas estereotipadas, definidas a um

nível sociocultural e não linguístico, de que os escritores tiram partido como forma de

caracterização das personagens. Factores de legibilidade e inteligibilidade são certamente

determinantes na selecção das marcas linguísticas, assim como na sua frequência, sob

pena de se criar um texto ininteligível de tão resistente à leitura e descodificação. A função

3 Tendo em conta a natureza ficcional da variedade linguística em texto literário, foi anteriormente proposto o
conceito de pseudo-dialecto (Rosa, 2004), assim como a distinção entre standard literary dialect e non-standard
literary dialet (Määtä, 2004).

75
Parte II - Modelo de Análise

mimética do diálogo é, assim, relegada a uma posição secundária face ao seu poder

caracterizador da personagem e das relações interpessoais. De facto, qualquer variação

dialectal é tacticamente ignorada até que o texto exija que esta se torne específica e

assuma relevância na economia da narrativa. O próprio Bernard Shaw, depois de criticar a

ficcionalidade e inexistência do “cockney” de Dickens, é forçado a admitir numa nota aos

leitores em Pygmalion que “[…] with apologies, this desesperate attempt to represent her

[Eliza] dialect without a phonetic alphabet must be abandoned as unintelligible outside

London” (1957: 9). Tal como refere Chapman (1994),

[f]or the reader, all that matters is that Mrs Bolton is a ‘low’ character, who helps to
further the plot and gives some comic relief by contrast with the standard
speakers. […] Why does head keeps its aspirate, while hospital loses it? Again, the
question is not relevant to the general effect which the novelist succeeds in
creating. (1994: 22)

É assim compreensível que a gama de variedades seja reduzida, acabando por se centrar

na dicotomia padrão vs subpadrão (Blake, 1981: 14). De todas a marcas dialectais

identificadas, são apenas seleccionadas as mais expressivas da categoria que se pretende

representar, estereótipos conhecidos do autor (e do tradutor) e facilmente reconhecíveis

pelo leitor/espectador. Esta circunstância será igualmente motivada pelo facto de na

maioria dos casos o autor, assim como o tradutor, não deter um conhecimento linguístico

aprofundado capaz de uma descrição detalhada da sua própria língua, recorrendo, como

tal, a marcas linguísticas utilizadas e organizadas pelos estereótipos, e respectivas

associações, reconhecidos na sua comunidade e que pressupõe de fácil identificação e

descodificação pelo leitor/espectador. Tal como referido anteriormente, as expectativas do

leitor/espectador e do conhecimento que este detém assumem um importante papel nas

escolhas tanto do autor, como do tradutor.

76
Parte II - Modelo de Análise

1.3.2. Uma recriação conseguida em diferentes níveis

Assim como os dialectos podem diferir da variedade padrão em diversos níveis, também a

recriação literária destes pode recorrer a marcas de diferentes níveis linguísticos:

ortográfico, fonológico, morfossintáctico e lexical.

O facto de, na maioria dos casos, os dialectos não conhecerem um sistema ortográfico

oficial, faz com que o escritor, assim como o tradutor, possa tirar partido de marcas

ortográficas, na medida em que, dada a rígida normalização do sistema ortográfico de uma

língua, qualquer desvio face a essa norma ortográfica seja facilmente detectável e promotor

de uma imediata identificação do discurso como subpadrão. Marcas de natureza

ortográfica/fonológica assumiriam, assim, a forma de uma ortografia alternativa distinta da

ortografia padrão a que foi atribuída a designação de “eye-dialect”. Este tipo de desvio,

consistindo geralmente na elisão de certas vogais ou consoantes e uso de apóstrofes, será

certamente o que mais comprometerá a leitura, mas, possivelmente, o que menos

comprometerá a gramaticalidade do texto. Autores como Walpole (1974), sem qualquer

intenção de crítica ou julgamento, apontam o “eye-dialect” como inconsistente e paradoxal,

na medida em que as marcas linguísticas que salienta, além de não serem utilizadas de

forma regular e coerente, mais não fazem que aproximar o discurso escrito do discurso

oral, isto é, não podem ser identificadas como marcas linguísticas subpadrão, mas sim

como marcas desviantes do sistema ortográfico tido como norma.

As the author attempts to transmute vocalized sounds into ink, he finds several
available to the task [...]. He can tailor the diction to reflect large or limited
vocabulary, informal colloquialisms, and regional idioms. And he can use “eye
dialect”. That is, usually by adding an apostrophe to the twenty-six letters of the
alphabet, he can twist standard orthography to suggest nonstandard
pronunciations. [...] [E]ye dialect is intrinsically neither consistent nor fair-handed.
It is not consistent because it is impossible to show all speech variations by using
the standard alphabet. Hence only a few words are misspelled - just enough to
indicate ignorance and locality [...]. (Walpole, 1974: 192 e 193)

Embora este seja um tipo de marca bastante recorrente, não deixa de ser interessante

verificar que tanto Page ([1973] 1988: 57, 69) como Dimitrova (1997: 52) concluem que os

77
Parte II - Modelo de Análise

dialectos literários são sobretudo marcados em termos lexicais, desvios mais claros e,

como tal, mais facilmente identificáveis como dialectais, e consideravelmente menos em

termos morfossintácticos, desvios em certos casos difíceis de distinguir de marcas de

coloquialidade, noutros, comprometedores da leitura. Embora as conclusões de Hickey

(2000), de que os falantes detêm uma maior consciência de classes aberta (lexicais) do que

de classes fechadas (fonéticas e morfossintácticas), pareçam confirmar esta afirmação,

outros estudos parecem ir na direcção oposta. O estudo de Brodovich (1997), onde se

conclui que, no corpus então em estudo4 , apenas 2% das marcas denunciadoras de

discurso subpadrão são de natureza grafo-fonética face a 50% de marcas de natureza

gramatical e 24% de natureza lexical, parece apontar para a hipótese de a taxa de

frequência e a natureza das marcas subpadrão conhecerem variação consoante o contexto

cultural e o sistema em que operam. Neste sentido, espera-se que a análise semi-

automática efectuada no contexto do presente estudo possa identificar quais os níveis

linguísticos de que mais se tira partido nas traduções portuguesas dos textos de Bernard

Shaw e Alan Jay Lerner, e qual o grau de mediação da variável meio na frequência e

natureza das marcas linguístico-textuais identificadas.

1.3.3. Uma recriação mediada por diferentes factores

Recuperando a distinção desenvolvida por Lyons (1977, vol. I: 32-33) entre uma

transmissão de sinais informativos (com significado para o alocutário não intencionados

pelo locutor) e sinais comunicativos (com significado para o alocutário e transmitidos

intencionalmente pelo locutor), compreendemos que o recurso e a recriação de variedades

linguísticas em texto ficcional pertencerão a esta segunda categoria. Assumindo a

subordinação da recriação ficcional de variedades face aos propósitos narrativos do autor,

Page encara o dialecto ficcional como uma variável “dependent on the demand of the

fictional situation rather than on the probable behaviour of an actual speaker” ([1973] 1988:

59). Lane Mercier, definindo a representação de sociolectos como uma ‘violência’ da

4 O corpus seleccionado por Brodovich consistia num corpus comparável monolingue onde foram reunidas, no

corpus translato, as traduções russas de Pygmalion de G. B. Shaw e de Of Mice and Men de J. Steinbeck e, no
corpus não-translato, as obras de quatro autores russos, A. Ostrovsky, F. Abramov, V. Astafiev e V. Belov.

78
Parte II - Modelo de Análise

‘ordem de comportamento’, vai mais longe, afirmando que “simultaneously attests to the

author’s own sociolinguistic positioning and foregrounds his or her ideological and political

agenda” (1997: 47). Para a autora, mais do que participante na produção de significados ao

nível da diegese, a recriação de variedades linguísticas assume um significado extra-

diegético de posicionamento do autor e da sua ideologia face à tradição e normas

presentes no contexto circundante.

O texto ficcional, e, consequentemente, a recriação ficcional de variedades linguísticas,

sofre assim mediações de diferentes naturezas, entre as quais, no contexto do presente

estudo, podemos identificar como mais relevantes: os propósitos a cumprir pela recriação,

a tradição em que se insere o texto e factores vários como a legibilidade ou o meio. Tendo

em conta o período em estudo, deverá ainda ser ponderado, no caso dos textos

traduzidos, a existência de organismos de censura reguladores da acção do tradutor.

1.3.3.1. Mediação dos diferentes propósitos narrativos a cumprir

Na linha da gramática sistémico-funcional, houve já oportunidade de concluir não só

quanto à influência dos contextos situacional e cultural no moldar do discurso, mas

também quanto à possibilidade de se inferir características do falante e do contexto a partir

do discurso. Em texto ficcional, o aproveitamento criativo de variedades linguísticas

funciona, assim, como recurso narrativo que contribui para informar o leitor sobre quem fala

e sobre as circunstâncias em que fala, sustentando uma forma de caracterização indirecta

da personagem.

O discurso das personagens pode ser considerado marcado ou neutro, isto é, o texto pode

ou não marcar de forma implícita características linguísticas do falante denunciadoras de

quem fala, do seu estatuto social, da circunstância em que fala ou da relação interpessoal

existente entre o locutor e o alocutário. No caso de textos escritos, tendo em conta a

associação feita pelo falante comum entre o meio escrita e a variedade padrão, podemos

entender que a variedade padrão seja interpretada como discurso neutro, levando a

introdução de qualquer marca de oralidade ou variedade subpadrão venham a ser ambas

indicativas de discurso subpadrão. O discurso marcado ou caracterizador permite, assim,

79
Parte II - Modelo de Análise

caracterizar indirectamente as personagens, sendo-lhe reconhecido por autores como Page

([1973] 1988: 55 e 76) ou Dimitrova (1997: 58) uma função de integração e identificação de

uma personagem com um grupo regional ou social ou uma função de contraste ou

individualização, levando a que uma personagem se distinga de todas as outras:

At different times, therefore, dialect can serve opposite purposes – to bring


characters closer together by signalling an increase in emotional pressure […]; or
to draw them apart, by emphasizing a social gulf or acting as an unpleasant
reminder of humble origins. (Page, [1973] 1988: 76)

Para além desta, podem, no entanto, ser identificadas outras funções ou propósitos

diegéticos da recriação de variedades linguísticas, nomeadamente a localização espacial e

temporal da personagem e da acção, a focalização narrativa, a verosimilhança da recriação

e a produção de cómico. Se em obras como A Time on Earth de Vilhelm Moberg a recriação

de variedades parece servir o propósito central de localização no espaço e no tempo tanto

da acção como das personagens (Dimitrova, 1997), em obras como The Sound and the

Fury de Faulkner parece antes cumprir o objectivo de focalização narrativa, isto é, participa

na definição do ponto de vista narrativo, indicando sob que perspectiva são descritos os

eventos (Määtä, 2004). Certos autores apontam ainda a procura de autenticidade do

discurso como uma possível função da recriação de variedade em texto ficcional. Este

factor será particularmente relevante em textos com um número elevado de personagens,

na medida em que o recurso a variedades, não só contribui para uma recriação mais

verosímil ou autêntica (por vezes referida como mais “realista”), como ainda assiste o leitor/

espectador na distinção das personagens.

Por outro lado, o uso de uma variedade ficcional pode ainda cumprir o propósito de

produção de cómico. Tendo em consideração a definição que Aristóteles nos dá de

comédia – “[a] comédia é, como dissemos, imitação de homens inferiores; não todavia,

quanto a toda a espécie de vícios mas só quanto àquela parte do torpe que é o

ridículo” (2000: 109) – e a associação feita entre discurso dialectal e o baixo carácter da

personagem, não será difícil compreender a presença recorrente de discurso subpadrão em

80
Parte II - Modelo de Análise

textos ou momentos cómicos. A isso se deverá, tal como aponta Page ([1973] 1988: 57),

que o recurso a variedades ficcionais tenha estado praticamente confinado à comédia até

meados do século XIX.

Será importante aqui recuperar os conceitos de dinamismo e estatismo desenvolvidos por

Basil Hatim e Ian Mason (1997: 27-28) relativamente ao uso linguístico, através dos quais os

autores procuram dar conta de instâncias de discurso mais ou menos desafiadoras das

expectativas do leitor. Esta avaliação seria feita com base num contínuo onde num dos

extremos reconheceríamos ocorrências textuais em que a coesão e coerência serão

problemáticas e a intencionalidade e localização não tão evidentes; e, no outro extremo,

ocorrências textuais caracterizadas por uma máxima coesão e coerência, intencionalidade

e localização facilmente identificáveis. No primeiro caso, havendo um desvio frequente das

normas, as expectativas do leitor seriam constantemente desafiadas; no segundo,

denunciando um seguir estrito das normas, as expectativas do leitor seriam invariavelmente

cumpridas. Esta questão desenha-se como particularmente importante em termos de

produção de cómico por via da utilização de variedades literárias, na medida em que o

cómico apenas tomará lugar se houver uma desadequação entre discurso e circunstância,

isto é, o romper das expectativas do leitor, nomeadamente pela selecção de um registo tido

como inadequado numa determinada situação (seja pelo assunto tratado, os interlocutores

ou o espaço), provoca o choque e o riso. Foi a esta estranheza capaz de espoletar um

momento cómico que Aristóteles reconheceu como elemento promotor dos momentos de

reconhecimento e catarse no texto cómico.

1.3.3.2. Mediação da tradição

Tanto a forma assumida pela recriação literária, como as funções que hoje lhe

reconhecemos, foram em grande medida definidas pela tradição literária e por um evocar

constante deste tipo de recurso por diversos escritores. Page ([1973] 1988) refere-se a uma

tradição própria mediadora do uso de estereótipos e de determinadas marcas distintivas do

discurso, que por vezes muito se afasta da realidade:

81
Parte II - Modelo de Análise

The […] reader might be better equipped to recognise a conventionalised literary


dialect, such as Cockney became, since he might already have encountered it in
his reading. Such literary dialect would tend to develop a tradition of its own, and
in the course of time would bear less and less resemblance to the living dialect
with which it was associated. (Page, [1973] 1988: 56)

Embora Page tenha fundamentado a sua afirmação em textos literários, é possível

reconhecer sem dificuldade a mesma circunstância tanto no sistema teatral como

televisivo. É agora objectivo deste estudo procurar delinear melhor a que tradições nos

referimos e recorremos aquando da recepção, interpretação e análise de um texto literário,

teatral ou televisivo.

Relativamente ao sistema literário inglês, autores como Mills (1972), Blake (1981, 1995),

Page ([1973] 1988) ou Chapman (1994) apontam a Reeve’s Tale de Chaucer como o

primeiro caso onde é possível identificar a recriação literária de um dialecto regional, pelo

cuidado em dar conta do discurso particular dos estudantes de Cambridge. Ainda que seja

possível identificar o uso de variedades literárias em autores como Wordsworth, o recurso a

este dispositivo não começou por florescer no sistema literário ou, em particular, no género

poético – os poemas com um número de personagens que justificasse o recurso a

variedades linguísticas, pertencendo ao género poesia épica, seguiam uma norma literária

que os vinculava ao uso da norma padrão.

Foi assim no sistema teatral que o recurso a variedades mais se desenvolveu numa primeira

fase. Um primeiro exemplo remonta ao século XV com a peça The Second Shepherd’s Play,

uma das Mystery Plays do Wakefield Circle, onde Mak, um ladrão de ovelhas, assume o

discurso particular da sua profissão com propósitos cómicos. Os resultados do uso de

variedades linguísticas para fins cómicos eram evidentes desde os textos clássicos de

Plauto ou Terêncio agora do conhecimento de alguns através de traduções que

começavam a surgir. É, de facto, uma técnica dramatúrgica que conhece um grande

desenvolvimento no teatro isabelino, onde se destacam as figuras de Shakespeare e

Jonson, que fazem já da recriação teatral de variedades linguísticas um recurso primário na

82
Parte II - Modelo de Análise

produção de cómico. Se nas “restoration plays” do século XVII e no melodrama que

floresce no século XIX, a recriação literária de variedades linguísticas é relegada para

segundo plano, com a comédia de costumes esta retoma a sua centralidade, mostrando-se

incontornável em certos enredos, nomeadamente de Oscar Wilde e de Bernard Shaw.

Será relevante ter em consideração que o modo dramático veio apenas a conhecer um

maior desenvolvimento nos séculos XVIII e XIX, pelo florescer de um público leitor e

diversas editoras que promoveram a publicação de textos teatrais e a sua circulação como

textos dramáticos. Autores como Bernard Shaw ou Oscar Wilde, reivindicando a

completude do texto dramático e a dequação deste à publicação em livro e leitura

individual, defendem igualmente o desenvolvimento de dispositivos diversos que

assistissem o leitor na interpretação do texto, entre eles, o recurso a marcas gráficas numa

tentativa de aproximação do modo escrito ao modo oral presente em palco. Reconhecendo

a tensão existente entre discurso oral e discurso escrito, vêm a recorrer a dispositivos já

desenvolvidos no sistema literário no seio do modo narrativo onde é possível reconhecer o

uso, ainda que tímido, de certas marcas gráficas em autores como Smolett ou Fielding, que

vêm tirar partido do estabelecimento de uma norma ortográfica face à qual qualquer desvio

visual teria um grande impacto. A recriação literária de dialectos continuava, no entanto, a

cumprir apenas a função de produção de cómico, sendo apenas com Walter Scott que,

atribuindo-lhe uma especial relevância, a faz sobressair agora não com uma função cómica,

mas num uso heróico ou trágico. Recorrendo a marcas visuais, que sabia inteligíveis para o

leitor de então, não só contribuiu para a credibilidade do dialecto regional ficcional, como

introduziu algo que viria a ser amplamente explorado pelos autores vitorianos – a distinção

entre os níveis social e educacional dentro de uma mesma região. Ficava assim provada a

possibilidade de recriação de variedades ficcionais expressar tanto uma localização

regional como o registo e o tipo de relação interpessoal existente entre as personagens

(Chapman, 1994: 19), conhecendo agora outras funções que não apenas a produção de

cómico. Para tal, terá certamente contribuído o desenvolvimento da dialectologia que

procurava esclarecer a não inferioridade dos dialectos regionais, enquanto dava conta das

múltiplas variedades do inglês. A presença de variedades literárias pode ser agora

83
Parte II - Modelo de Análise

identificada em autores como Maria Edgeworth, Elizabeth Gaskell (Mrs Gaskell), Emily

Brontë ou George Eliot. A representação torna-se mais sofisticada, participando na

localização física e temporal, assim como na identificação do grau de escolaridade, do

grupo social e do estrato social. Dickens é apontado por diversos autores como o

romancista que mais terá desenvolvido a representação de discurso de classe social baixa,

mais especificamente o “cockney”, assumindo as particularidades do seu discurso como

uma fonte de vivacidade e caracterização e não apenas de produção de cómico. Hardy, um

romancista contemporâneo de Bernard Shaw, dedica igualmente bastante atenção à

recriação de dialectos regionais e citadinos nas suas obras, sendo, no entanto, alvo de

críticas relativamente ao discurso de certas personagens que muitos tomavam como

obscuro e de difícil compreensão.

Embora seja possível constatar que, tanto em texto literário como em texto teatral, as

variedades linguísticas são interpretadas face a um binómio padrão vs subpadrão, será

igualmente importante perceber que, à medida que a recriação de variedades se foi

tornando mais sofisticada e central na caracterização das personagens, diferentes dialectos

com diferentes significados sociais foram recebendo maior ou menor atenção. O primeiro

dialecto a trilhar o caminho no discurso ficcional terá sido o dialecto rústico do Sul, sendo

apenas no século XVII que o dialecto do Norte terá conhecido alguma atenção por parte de

certos escritores. Contudo, ainda que diferentes autores tirem partido de diferentes

dialectos, estes são sempre de natureza regional. Será por via do movimento Romântico,

que, celebrando a autenticidade dos dialectos regionais, altera a visão e atitude

relativamente a estes, que os dialectos citadinos denunciadores de classes sociais

começam a receber maior atenção (Blake, 1981: 18). Nesta alteração de atitude não terão

sido certamente alheias as mudanças económicas e sociais suscitadas pelo processo de

industrialização do séc. XIX que não só levou ao surgir de novas classes sociais e à

alteração da geografia da cidade como também ao suscitar de curiosidade por certas áreas

geográficas que assumiam agora uma importância cada vez maior. Havia agora a

necessidade de uma variedade capaz de representar uma classe social baixa própria da

cidade que os escritores vitorianos queriam ver retratada, necessidade essa que veio a ser

84
Parte II - Modelo de Análise

preenchida pelo sociolecto “cockney”, natural da cidade de Londres e sempre associado às

classes sociais mais baixas e de baixo nível de escolaridade. Seria agora também a

variedade privilegiada na produção de cómico, vindo a sua utilização a não se cingir apenas

a enredos decorridos em Londres.

Almost over night Cockney became the principal vulgar language [...]. In many
ways this is not surprising since it contrasts readily with the standard and since it
was probably better known to the average author and reader than any regional
dialect […]. In the second half of the eighteenth century, comments on vulgar
London pronunciations begin to appear with increasing frequency in grammars
and other works on language. The effect of these grammatical works was to make
Cockney better known and hence to be accepted as the epitome of bad usage.
(Blake, 1981: 118)

Embora o “cockney” tenha sido primordialmente utilizado com fins cómicos, no período

vitoriano, e principalmente sob a pena de Dickens, começa a ser utilizado como marcador

de classe e não tanto como dispositivo cómico. Essa linha vem a ser retomada por Bernard

Shaw que faz uso do “cockney” na maioria das suas peças, nomeadamente Man and

Superman (1903), Major Barbara (1905), Passion, Poison, and Petrification (1905), Getting

Married (1908) e Pygmalion (1914), levando Mills (1972) a apontar Pygmalion como o

refinamento último das técnicas de recriação literária que vinham a ser testadas nas peças

antecedentes (1972: 56). Contudo, o destaque conquistado por Bernard Shaw na história

da recriação do “cockney” não passa apenas pela recorrente presença deste nas suas

peças, mas antes por uma atenção cuidada que lhe dedica e que o leva a desenhar uma

nova convenção ortográfica que considerava mais próxima da realidade. Se autores como

Hardy, Lawrence ou Bennett, seus contemporâneos, preferem seguir a convenção

ortográfica estabelecida pela tradição literária, autores como Bernard Shaw ou H. G. Wells

mostram-se mais experimentais e introduzem novas formas de representação que

consideram, não só mais próximas da realidade, como mais próximas do leitor e da sua

realidade circundante. A recriação de variedades literárias, por via do estabelecimento de

uma tradição, tornou-se “fossilizada” (Blake, 1995: 14) e, segundo Bernard Shaw,

85
Parte II - Modelo de Análise

demasiadamente longe da variedade linguística do país, perdendo assim a sua capacidade

catártica, isto é, o leitor ou espectador, embora reconhecesse o discurso como subpadrão

por via da sua experiência enquanto leitor e espectador, não reconhecia as marcas

especificas do dialecto, facto que comprometia a sua identificação com a personagem e o

efeito catártico pretendido por Bernard Shaw.

É possível concluir, assim, que o recurso e desenvolvimento da recriação de variedades

linguísticas ocorreu de forma paralela nos sistemas literário e teatral, funcionando o

segundo como promotor de um desafio da norma escrita literária e uma cada vez mais

frequente introdução de marcas de discurso oral e subpadrão no discurso escrito em texto

dramático. A natureza oral dos textos teatral e fílmico televisivo constituiu-se sempre como

elemento promotor do recurso a marcas distintivas do discurso, por forma a que uma maior

verosimilhança, base dos objectivos de mimese e reconhecimento, fosse mais plenamente

conseguida5.

A falta de estudos com uma análise geral da recriação de variedades linguísticas nos

sistemas literário, teatral e fílmico português, e não cabendo tal análise no contexto do

presente estudo, não nos permite oferecer aqui uma resenha dos diferentes contornos que

essa recriação terá recebido no sistema português. Contudo, estudos pontuais dedicados à

obra de diferentes autores e textos dos sistemas literário, teatral e fílmico portugueses

permitem-nos confirmar o recurso regular a variedades ficcionais, seja para a

caracterização da personagem, para um maior efeito de realismo ou introdução de

momentos cómicos. No sistema literário somos de imediato remetidos para as obras de

Almeida Garrett, Eça de Queirós, Vitorino Nemésio, Maria Velho da Costa ou Lídia Jorge

entre outros. No sistema teatral não será certamente esquecida a longa tradição iniciada

por Gil Vicente do uso de variedades ficcionais para a introdução de momentos cómicos e

que tamanha presença teve ao longo do teatro português, nomeadamente no teatro de

5 O discurso em palco, assim como no ecrã de televisão, embora francamente mais próximos do discurso oral
real, não deixam de ser mediados pelas normas e tradições dos sistemas em que operam. O choque e a
surpresa motivados pela utilização da expressão “Not bloody likely” em Pygmalion (acto III) e My Fair Lady (Acto
I, cena 6) parecem confirmar essa realidade. De entre os diversos jornais que dedicaram espaço a uma revisão
crítica da peça, podemos destacar as palavras do Daily Sketch que sob o título de “The Pygmalion Sensation!
Mrs Campbell swears on stage and cultured London roars with laughter” continuava no corpo do texto com a
seguinte afirmação: “Mrs P C uttered the Unprintable Swearword at His Majesty’s Theatre on Saturday night and
the play stopped for a full minute till the audience had done laughing” (1914: 15).

86
Parte II - Modelo de Análise

revista popular. Também no sistema fílmico é possível encontrar exemplos tanto nos filmes

clássicos das décadas de 40 e 50, como em filmes mais recentes onde diferentes

variedades linguísticas são usadas como elemento caracterizador das personagens

participando num maior realismo.

Também no sistema de textos traduzidos para português vemos confirmada a recriação de

variedades ficcionais. Embora seja predominante uma estratégia de padronização do

discurso, foi já por vários estudos (Rosa, 1997, 1999, 2001, 2004; Ramos Pinto 2006)

identificada uma estratégia recriação de variedades ficcionais progressivamente mais

acentuada.

Ponderada a tradição de recriação de variedades ficcionais nos sistemas literário, teatral e

televisivo nos dois sistemas culturais pertinentes para o presente estudo, cabe-nos agora

tentar perceber de que forma têm os diferentes sistemas em estudo trabalhado a realidade

linguístico-pragmático-semiótica que as variedades linguísticas acarretam.

Neste sentido, e seguindo os estudos de Page ([1973] 1988: 47-48) e Chapman (1994: 226),

é importante dar conta da estreita ligação que parece haver ao longo de quase todas estas

obras, por um lado, entre discurso do narrador/didascálias e a variedade padrão e, por

outro, entre o discurso das personagens e a variedade subpadrão. Se esta correlação

poderá não assumir grande significado no texto teatral, na medida em que o público não

teria acesso às didascálias, o mesmo já não se verifica quando a publicação de textos

dramáticos se torna uma prática corrente. A oposição padrão vs subpadrão é, assim, não

só introduzida entre personagens de estatuto social e grau de escolaridade altos e

personagens de estatuto social e grau de escolaridade baixos, mas também entre

didascálias (ou discurso do narrador no caso do filme) e o discurso das personagens. São

reconhecidas excepções nas peças de J. M. Synge que faz uso da variedade irlandesa do

inglês em toda a sua obra; contudo, será importante notar que só um leitor fora do espaço

irlandês identificaria ainda esse discurso como dialectal, na medida em que este traduzia o

discurso já reconhecido por todos como a norma presente na Irlanda.

87
Parte II - Modelo de Análise

Outro aspecto a destacar e em estreita ligação com o anteriormente referido é o facto,

igualmente reconhecido por diversos autores - Page ([1973] 1988: 47-48), Blake (1981: 13) e

Chapman (1994: 221) -, de a variedade padrão estar reservada, não só ao discurso do

narrador e às didascálias, mas também ao discurso do herói ou heroína romanescas, cujo

elevado estatuto diegético não permite a associação a variedades tidas como inferiores

face à variedade padrão.

Another convention of the novel is the assignment of standard speech to


characters who could realistically speak a non-standard variety. Virtuous
characters who play a major part in the story may be treated in this way, the purity
of their speech reflecting the purity of their natures and their superiority to their
environment. It is a convention which says much about the status accorded to
standard speech as a pointer to being a worthy member of society. (Chapman,
1994: 221)

Embora esta convenção seja geralmente identificada no modo narrativo do sistema

literário, considerou-se, com base em outros estudos (Mills, 1972; Trussler [1994] 2000;

Innes, 1998), possível estender a presença deste factor mediador tanto ao texto dramático,

como aos sistemas teatral e fílmico televisivo. Com excepção de Pygmalion, já apontado

anteriormente como culminar do aperfeiçoamento de uma técnica de recriação de

variedades, as restantes obras de Bernard Shaw seguem este princípio, como disso são

exemplo as personagens Drinkwater, Burgess, Henry Straker ou Tim Haffingan em Captain

Brassbound’s Conversation (1899), Candida, Man and Superman (1903) e John Bull’s other

Island (1904) respectivamente. Tal como é referido por Mills:

[…] for the first and only time, Shaw uses comic speech as a necessary condition
of the central action of his play. The speech of the other low comic agents adds to
the general merriment of the plays in which they appear in a strictly tangential
fashion. (Mills, 1972: 56)

88
Parte II - Modelo de Análise

1.3.3.3. Outros factores de mediação

A recriação literária de variedades linguísticas terá ainda necessariamente em consideração

o grau de legibilidade e inteligibilidade do texto, no sentido em que a frequência de desvios

gráficos ou a utilização de léxico e estruturas gramaticais desconhecidas do leitor/

espectador podem comprometer a leitura, a interpretação e a compreensão do texto.

Segundo autores como Page ([1973] 1988), Blake (1991) ou Dimitrova (1997), esta

preocupação terá como consequência, não só o uso de marcas estereótipo

inequivocamente dialectais como já referido anteriormente, mas também a identificação de

uma taxa de frequência superior no início dos capítulos, em momentos de introdução de

uma nova personagem ou momentos de maior tensão no enredo:

[I]t will be important to use non-standard language most fully when a character
who uses it is introduced, since that helps to categorise them, or at moments of
stress, since that draws attention to his difference which may be one of the
causes of stress. For the rest of the time the non-standard language will
probably be played down. […] Furthermore, too extended a use of non-standard
language could lead to incomprehension on the part of the reader since it is
inevitable that the character will eventually have to resort to less familiar words
and phrases. (Blake, 1981: 13)

Um outro factor determinante na forma a assumir pela recriação será o meio a que se

destina o texto. Meios diferentes, não só conhecerão, necessariamente, diferentes

condicionantes inerentes ao meio, implicando formas de exposição e momentos de

recepção do texto diversas, como também, assumindo diferentes posições no sistema,

implicam tradições e estéticas distintas que demonstram ser importantes mediadores no

processo de recriação.

Por último, será ainda relevante ter em consideração certos movimentos de censura como

um último factor mediador da recriação de variedades ficcionais. No seguimento do New

Historicism e tal como discutido em I-2.2 deste estudo, a sociedade é aqui ponderada

como um sistema de circulação onde os seus elementos constituintes são mediados pela

acção de diferentes instituições e diferenciados entre forças dominantes e forças

89
Parte II - Modelo de Análise

subversivas. Neste contexto, a censura institucional constitui-se como um importante

factor de manutenção da força dominante, reagindo contra o “outro”, o diferente, o

potencialmente subversivo. Censura é um conceito historicamente marcado por episódios

que o levam a ser comummente entendido na sua acepção mais restrita de exame crítico

de obras, espectáculos ou publicações segundo critérios morais ou políticos a que é

reconhecido o poder de autorizar ou não a sua exposição ou publicação. Autores como

Merkle (2002) argumentam que o alcance dos diferentes significados do conceito de

censura é de tal forma complexo que o seu significado não poderá ficar restrito às práticas

de governos autoritários. Argumenta a autora que, se em regimes ditatoriais, censura

significaria repressão e boicote de informação ou punição pela disseminação de

determinada mensagem; actualmente, o conceito de censura conhecerá contornos

bastante mais abertos e difusos, distinguindo-se como acção contra a disseminação de

mensagens ou acções de ódio, obscenidade em nome do bem público geral (Merkle, 2002:

13). No presente estudo, censura será apenas entendido enquanto prática de um governo

autoritário para a repressão e boicote de expressão ou punição pela disseminação de

determinada mensagem identificada como subversiva ou perniciosa.

90
Parte II - Modelo de Análise

CAPÍTULO 2
TRADUÇÕES ORIENTADAS PARA A PÁGINA, O PALCO E O ECRÃ

Tal como definido no capítulo introdutório, o presente estudo tem por objectivo, não só a

identificação e análise das estratégias tradutórias accionadas aquando da tradução de

variedades linguísticas, mas também a ponderação e cruzamento dos dados obtidos

relativamente à tradução de variedades linguísticas com a variável meio. Considerando que

diferentes meios, porque com características inerentes diferentes, condicionam o processo

de tradução de forma diferenciada ao mesmo tempo que suscitam novas possibilidades de

resolução dos problemas, este estudo pretende avaliar o grau de influência da variável meio

no processo de tradução de variedades linguísticas, assim como a (in)existência de

estratégias ou procedimentos específicos para cada um dos meios em análise.

Ainda que neste estudo sejam apenas considerados os textos produzidos pela mão do

tradutor e não o texto revisto e reformulado numa fase posterior, a variável meio não deixou

de ser apreciada, na medida em que aqui se assume que a perspectiva de alteração

subsequente do meio participará activamente na opção de certas estratégias em

detrimento de outras.

O corpus seleccionado compreende três meios distintos, incluindo traduções orientadas

para a publicação em livro, a representação em palco e a produção em legendagem. À

tradução para a página tem sido reconhecida, e por muitos defendida, uma maior

aproximação ao texto de partida; à tradução para o palco tem sido confirmado o

movimento contrário de aceitabilidade, levando a que frequentemente lhe seja atribuída as

etiquetas de “adaptação” ou “versão”. Relativamente à tradução para legendagem, a

atenção dada às condicionantes técnicas, sempre vistas como limitadoras da criatividade e

causa de uma, aparentemente incontornável, redução do texto, levou à consideração desta

como “tradução menor” e, inclusive, à sua exclusão do conceito de tradução. O presente

capítulo tem por objectivo ponderar as diferentes características de cada um dos meios em

estudo, assim como apresentar uma revisão dos estudos mais relevantes, não só

91
Parte II - Modelo de Análise

relativamente a cada um dos meios em si, como também à tradução orientada para cada

um deles.

2.1. Sistema dramático, sistema teatral e sistema televisivo: terminologia

Um dos primeiros problemas a enfrentar pelo investigador no estudo do texto dramático e

da sua tradução será a profusão terminológica onde termos diferentes são empregues

relativamente ao que aparenta ser o mesmo conceito ou, pelo contrário, o mesmo termo é

empregue relativamente a conceitos diferentes. Contudo, para o investigador português, o

problema coloca-se não só pela diversidade terminológica em certos casos, mas também

pela inexistência de termos em português que dêem conta das diferentes posições do texto

dentro de cada sistema em que pode circular, das várias orientações da tradução possíveis

e das diferentes fases do processo de tradução. À semelhança do apontado por Susan

Bassnett (1990) relativamente à escassez terminológica na língua inglesa, esta situação

parece ser reveladora, não só do carácter recente desta reflexão no contexto português,

mas também da centralidade do texto na reflexão do sistema teatral e da tradução de

textos dramáticos, assim como da proeminência que é reconhecida ao texto face aos

restantes elementos em palco. Posto isto, este subcapítulo será dedicado à clarificação e

definição da terminologia utilizada no contexto deste estudo.

De entre todos os sistemas em que poderíamos reconhecer a circulação de textos, no

presente estudo, tendo em conta o corpus seleccionado, serão apenas tidos em

consideração os sistemas literário, teatral e televisivo, pretendendo assim fazer referência a

sistemas e circuitos diferentes: o do texto publicado, do texto representado em palco e do

texto produzido e legendado para televisão. Aceitando, na esteira de Even-Zohar, cada um

destes sistemas como um polissistema em si mesmo, será relevante no contexto deste

estudo reconhecer, dentro de cada um deles, o sistema dos textos originalmente escritos

numa determinada língua e o sistema dos textos traduzidos para essa mesma língua. No

primeiro caso, será ainda necessário fazer a distinção entre o texto enquanto elemento

singular e o texto como parte integrante de um todo e em interacção com outros elementos

verbais ou não verbais. Em consequência, será assim feita a distinção entre argumento

92
Parte II - Modelo de Análise

dramático, argumento teatral, argumento televisivo e texto dramático, texto teatral, texto

televisivo. Seguindo a mesma linha de argumentação, no sistema dos textos traduzidos

deverá igualmente ser considerada a distinção entre o texto traduzido com uma orientação

específica (seja a publicação, a representação teatral ou a produção televisiva) e o texto

como parte de um produto final onde outros elementos também participam. Será assim

feita a distinção entre tradução para publicação, tradução para teatro (em substituição do

TP e a acompanhar o TP) 1, tradução para televisão (em substituição ou a acompanhar o

TP), assim como entre texto dramático na LC, texto teatral na LC, legendagem teatral na LC,

dobragem para TV na LC e legendagem ou voice-over para TV na LC. No esquema seguinte

encontra-se esquematizada a tipologia de que este estudo tirará partido:

Figura 5: Terminologia relativa aos sistemas literário/dramático, teatral, televisivo

Serão abandonados termos como ‘adaptação’ ou ‘versão’, considerados pela autora como

não operativos pela resistência que apresentam ao processo de definição, mas também por

denunciarem uma assumpção implícita do texto como norma face ao qual qualquer desvio

deve ser denunciado. O argumento a favor de tais conceitos reclama a necessidade de dar

conta do grau de intervenção no texto por via das alterações a fazer aquando da

1 Embora seja por diversos autores utilizado o termo tradução teatral (theatre translation) com o mesmo
significado com que neste estudo é utilizado tradução para teatro, optou-se por cunhar um novo termo de forma
a evitar o significado também atribuído a tradução teatral como processo de transposição do texto escrito para
o palco (Zuber-Skerrit, 1980a). Tal como anteriormente apontado por Ubersfeld ([1978] 1999) e Bassnett-
McGuire (1981, 1985), o uso do termo tradução para o processo de transposição para o palco da acção
descrita em texto, contribui para uma atitude de proeminência do texto escrito, com a assumpção explícita de
que o processo de tradução do texto em acção tem igualmente de ser ‘fiel’.
Em prol da coerência do argumento, optou-se pelo termo tradução para televisão, relativamente ao texto a
circular no sistema televisivo.

93
Parte II - Modelo de Análise

transposição do texto para o palco. Seguindo o modelo de Jakobson (1959), o conceito de

tradução é, por vezes, feito corresponder à tradução interlinguística e o conceito de

adaptação à tradução intersemiótica; contudo, autores como Johnston (1996) e Perteghella

(2005) propõem a consideração destes conceitos relativamente ao grau de aproximação ou

afastamento face ao texto de partida, sendo que o conceito de tradução manifestaria uma

maior aproximação ao texto de partida e o conceito de adaptação, um maior afastamento.

O conceito de versão referir-se-ia à acção do trabalho do encenador a partir de uma

tradução literal, a uma interpretação particular deste. As opiniões são diversas, assim como

as propostas, permanecendo, no entanto, em todas elas a dificuldade de definição, não só

por uma certa sobreposição dos conceitos adaptação e versão, mas fundamentalmente,

por uma não demarcação do alcance dos conceitos que nos permita distinguir um texto

como tradução, adaptação ou versão. Denunciando uma perspectiva sobre a tradução

ainda profundamente marcada pelo conceito de fidelidade, a assumpção de tais conceitos

conduz, por um lado, à negação da tradução como acção em contexto que manifestará

sempre contornos diferentes porque mediada e condicionada por factores distintos e, por

outro, à redução do conceito de tradução ao nível linguístico.

Assumindo que qualquer tradução implica um maior ou menor grau de manipulação do

texto de acordo com certos propósitos definidos no contexto de chegada (Hermans, 1985:

9), o escopo do termo ‘tradução’ compreenderá neste estudo os termos de adaptação e

versão, conceitos que, consequentemente, não serão recuperados no presente estudo. O

grau de intervenção no texto, considerado como produto de acção em contexto, será

posicionado relativamente a um contínuo definido entre os extremos de adequação e

aceitabilidade, tal como proposto em I-1 e I-2.

2.2. Meios distintos, circuitos distintos, estéticas distintas

A noção de que os textos ficcionais circulam em meios e sistemas distintos remonta a

Aristóteles, cuja defesa do drama como modo primordialmente literário deu início a uma

discussão repleta de reacções a favor (de defesa do texto dramático como texto literário e

da representação como mera transposição do texto para o palco) e de reacções contra,

94
Parte II - Modelo de Análise

nomeadamente de autores como Brecht ([1964] 2001), Stanislavski (1968), Styan (1971) ou

Ubersfeld (1996) que consideram o drama como pertencente apenas ao sistema teatral.

Este extremar de posições levou à distinção entre texto dramático e texto teatral que,

embora extremamente frutuosa pelo aprofundamento da reflexão relativamente a cada um

dos sistemas, tem levado ao estabelecimento de duas visões exclusivas relativamente ao

texto dramático. Numa perspectiva literária, a assumpção da primazia, autonomia e

prioridade do texto dramático conduz a uma ponderação do texto longe dos elementos que

o rodeiam, levando à condenação de qualquer desvio; numa perspectiva teatral, a

consideração do texto dramático como um simples ponto de partida, como algo

incompleto que apenas conhecerá completude em palco quando em comunicação com os

restantes elementos 2, leva o texto a perder a sua posição de base da representação. Esta

segunda posição, procurando reagir à atitude de primazia do texto e tendo como vozes

principais investigadores da semiologia do teatro como Mukařovský (1976), Kowzan (1975)

ou Ubersfeld ([1978] 1999), assumia dois postulados principais: o texto como apenas um

dos sistemas que compreendiam o espectáculo teatral3 ; o texto escrito como algo

incompleto (“troué”) quando fora da representação (Ubersfeld, [1978], 1999: 7-8)4 . Segundo

Ubersfeld, consistindo o teatro na relação dialéctica entre o texto escrito e a representação,

a distinção entre os dois não pode deixar de ser errónea, sendo possível reconhecer o seu

fundamento numa outra noção igualmente falaciosa – a da representação como tradução.

Esta última, baseada no conceito de equivalência entre texto escrito e a sua representação,

reforça a assumpção de que o contexto da expressão permanecerá idêntico quando

2 Segundo críticos como Artaud em The Theatre and Its Double ([1958], 1993) as posições extremas de negação

do texto, nomeadamente do teatro avant-garde que declara que no centro/início está o gesto e não a palavra,
encontram a sua justificação no facto de ter sido continuamente negado ao teatro a natureza de arte com uma
linguagem própria e não apenas de texto representado.
3Procurando salientar a condição do texto como parte de um todo, Kowzan (1975) define cinco categorias de
expressão a compreender um espectáculo teatral: o texto proferido em palco (podendo ou não haver um guião
escrito); a expressão corporal; a aparência exterior do actor (gestos, características físicas, vestuário); o espaço
de representação (dimensão, efeitos de luz, cenários); o som não proferido pelos actores.
4 Ubersfeld, recuperando o exemplo de cena de abertura de Le Misanthrope de Molière, procura salientar o
facto de o leitor não dispor de informação relativamente à situação contextual do texto em si, podendo vir a
questionar-se sobre se os actores já estão em palco, quando ou como chegam eles, qual deles segue os
movimentos do outro, etc. Não aceitando a possibilidade do texto dramático para leitura, a autora propõe a
distinção entre texto escrito (T), a representação (P) e o texto que é mediado entre estes dois e que será
necessariamente uma componente da representação (T1), desenhando assim a soma de T + T1 = P, em que o
T1 será o texto que providenciará as respostas suscitadas pela incompletude do T ([1978], 1999: 9-10).

95
Parte II - Modelo de Análise

transferido do sistema linguístico para o sistema da representação. Assumpção essa que

nos conduz, uma vez mais, ao mito da leitura única e, consequentemente, de uma forma

única de representação, ficando qualquer desvio promovido pelo encenador vulnerável a

juízos de valor que assumem o texto escrito como norma. Não deixando de reconhecer a

existência de textos dramáticos publicados para a leitura, Ubersfeld salienta

veementemente o facto de nunca se aceder ao todo significativo do texto, na medida em

que este contém matrizes de performatividade que a leitura feita sob as convenções de um

texto literário como o narrativo não poderá desvelar:

Our initial premise is that within the theatrical text there are matrices of
‘performativity’. A theatrical text can be analysed by procedures that are (relatively)
specific to it, procedures that bring to light kernels of theatricality contained within
the text. [...] Although we can read Racine as we do a novel, to do so will in no way
enhance the intelligibility of Racine’s text. (Ubersfeld, [1978], 1999: 8)

Entre estas duas posições estremadas, houve, no entanto, espaço para vozes mais

moderadas como a de Veltrusky (1977), que considera a possibilidade de pertença do texto

a ambos os sistemas. Este autor considerou que a percepção de cada um dos textos será

feita dentro das convenções de cada sistema – segundo as convenções cénicas, quando

representado em palco, e segundo as convenções do modo dramático, quando publicado

em livro, permanecendo a eventual ligação que este possa ter com a representação fora

das fronteiras do género5:

All plays, not only closet plays, are read by the public in the same way as poems and
novels. The reader has neither the actors nor the stage but only language in front of
him. Quite often he does not even imagine the characters as stage figures or the
place of action as scenic set. Even if he does the difference between drama and
theatre remains intact because the stage figures and scenic sets are then immaterial

5 Short (1998) parece assumir a mesma posição de que o leitor consegue aceder ao significado do texto através
de um complexo, mas natural, processo de suposição e inferência a partir dos movimentos denunciados no
discurso das personagens e da informação disponibilizada nas didascálias. Diversos autores alertam para o
facto de poderem ocorrer diferentes tipos de leitura, não só porque diferentes são as leituras realizadas pelos
diversos intervenientes no processo (tradutor, encenador, actores, cenógrafos (Short, 1998: 7), mas também
porque será necessário fazer a distinção entre a leitura realizada antes ou depois da representação do mesmo
texto, tanto pelos intervenientes na representação como pelo leitor comum que lê o texto dramático (Bassnett,
1997: 101).

96
Parte II - Modelo de Análise

meanings whereas in the theatre they are the material bearers of meanings.
(Veltrusky, 1977: ---)

Embora esta discussão tenha ganho novos contornos por via de diferentes propostas no

tempo, a reflexão manteve-se sempre centrada em torno de dois sistemas apenas: o

sistema dramático com vista à publicação e o sistema teatral com vista à representação.

Actualmente, no entanto, a circulação de textos não ocorre apenas entre os sistemas

literário e teatral, pelo que não podem deixar de ser tidos em consideração sistemas como

o radiofónico, o cinematográfico ou o televisivo, entre outros. A relação entre todos estes

sistemas e a movimentação dos textos entre eles é talvez hoje mais evidente do que

alguma vez o foi. É agora tempo de trazer a uma discussão centenária novos elementos

pela consideração de novos sistemas, das condicionantes e tipos de texto que cada um

compreende, assim como das relações que entre eles se estabelecem a cada momento.

Tendo em conta o corpus seleccionado, o presente estudo restringir-se-á aos sistemas

dramático, teatral e televisivo, tendo como objectivos principais perceber as relações

estabelecidas entre eles, tanto dentro de um mesmo sistema cultural, como entre sistemas

culturais diferentes por via da tradução e as implicações que, do ponto de vista da

tradução, todas estas questões terão, nomeadamente na selecção de estratégias e

procedimentos de tradução.

Embora a relação entre os sistemas dramático e teatral seja mais evidente pela frequente

publicação de textos dramáticos orientados para a representação teatral e a não tão

frequente publicação de textos televisivos ou, inclusive, de textos desenhados para a

produção em televisão, as relações que os sistemas dramático e teatral estabelecem com o

sistema televisivo não poderão deixar de ser tidas em consideração. Contudo, a

identificação de sistemas distintos só será de facto proveitosa se implicar a assumpção de

estéticas, relações de intertextualidade e convenções diferentes partilhadas pelos membros

de uma comunidade e reconhecidas pelo público receptor6 . O texto dramático, enquanto

6 Será fundamental reter a noção de que a identificação de diferentes sistemas tem sido sempre definida (e
assim continua a ser) dentro do contexto ocidental e que generalizações fora desse contexto ocidental serão
difíceis de alcançar pela diferença existente entre convenções, principalmente no que respeita a convenções
teatrais e cinematográficas.

97
Parte II - Modelo de Análise

texto literário, relaciona-se com outros textos e géneros literários; os textos teatral e

televisivo, por sua vez, estabelecem um diálogo com outros textos teatrais e televisivos,

com outras estéticas de encenação e realização, assim como com os restantes elementos

que, juntamente com o texto, compreendem o todo semiótico que são os textos teatral e

televisivo. O texto escrito conhece o seu contraponto no texto oral a ser representado (seja

em teatro ou filme), mas com ele não pode ser confundido. Diversos são os casos em que

não são estabelecidas relações entre os sistemas, confirmando a possibilidade de

autonomia de cada um deles – não será difícil identificar exemplos de textos dramáticos

que já não são, ou nunca foram, representados em palco (“closet drama”) ou filme, de

representações que não se baseiam em qualquer texto escrito (“improvised drama”) ou de

textos fílmicos que não conheceram qualquer publicação. Contudo, nem sempre os casos

são tão claros e as fronteiras entre os sistemas tão bem definidas ou exclusivas. Não só

porque o texto pode manter diferentes tipos de relações com o espectáculo ou filme (pelo

que será relevante perceber qual a posição assumida pelo texto dentro da representação

ou do filme 7), mas também por certos textos poderem pertencer a mais do que um sistema

simultaneamente ou ser transpostos de um sistema para o outro8 . Por via da tradução os

textos poderão ainda circular para um contexto cultural diferente, mantendo-se ou não

dentro do mesmo sistema, por exemplo, um texto dramático numa língua A pertencente ao

sistema dramático, poderá ser traduzido para uma língua B com orientações específicas de

representação teatral, passando, no contexto de chegada, a pertencer ao sistema teatral.

Diversos foram os escritores que mostraram ter consciência da existência de sistemas

distintos e da possibilidade de circulação de um mesmo texto por diferentes sistemas.

Bernard Shaw foi certamente um deles, chegando inclusive a preparar as suas peças, não

7 Taylor (1996: 27) apresenta uma distinção entre diferentes tipos de textos teatral, segundo a posição de
centralidade ou periferia assumido pelo texto, considerando que este será um factor activo na escolha das
estratégias tradutórias: no caso de o texto assumir uma posição central, a tradução tenderá para o extremo de
adequação; no caso de o texto assumir uma posição periférica, a tradução tenderia para o extremo de
aceitabilidade, assumindo um maior número e desvios face ao TP por via de uma maior liberdade de acção
sentida pelo tradutor e/ou encenador. Aaltonen (2000), no seguimento da proposta de Taylor, faz a distinção
entre “teatro” e “teatro centrado no texto”.
8 O exemplo das peças de Shakespeare parece ser paradigmático da circulação de textos entre sistemas no
sentido em que as suas peças, desenvolvidas no sistema teatral isabelino, vêm posteriomente a pertencer ao
sistema literário dramático pela publicação dos Quartos e Folios no séc. XVII. Inúmeras têm sido as produções
cinematográficas e televisivas dos seus textos.

98
Parte II - Modelo de Análise

só para os sistemas dramático e teatral, como também para o sistema cinematográfico.

Pygmalion (1914) conheceu, ainda em vida do autor e com colaboração do mesmo, a

publicação em livro, a representação em palco e a realização em filme, pelo que nas

publicações posteriores a 1938 passaram a constar as indicações do autor relativamente a

aspectos técnicos e inclusão e exclusão de determinadas cenas consoante o meio em

causa. Tal como exposto no prefácio de Plays Unpleasant (1898), Bernard Shaw reconhecia

a possibilidade de circulação de um mesmo texto entre sistemas, considerando que o

propósito catártico e pedagógico das suas peças seria assimilado de forma análoga através

de diferentes meios, contando que certas alterações fossem consideradas. Alterações

necessárias, não tanto pela exigida acomodação às condicionantes inerentes a cada meio,

mas por forma a tirar pleno partido das potencialidades destes. Recusando a noção de

incompletude do texto publicado, B. Shaw, por via de prefácios, posfácios e

pormenorizadas descrições sob a forma de didascálias, procurou, ao mesmo tempo que

desafiava as fronteiras entre narrativa e drama, provar que o formato do texto dramático

apenas para a leitura poderia ser perfeitamente aceitável.

O argumento sustentador da distinção dos diversos sistemas em que circulam os textos,

assenta ele próprio em critérios vários: o momento de recepção, o grau de intervenção no

texto, o tipo de textos seleccionados e a função por estes assumida no contexto cultural.

Momento de recepção. Enquanto o leitor de um livro publicado mantém o controle do

momento e local de leitura, garantindo o ritmo e a possibilidade de voltar a reler

determinada passagem mais resistente; o espectador de uma representação teatral ou

exibição fílmica estará sempre confinado a um momento e local específicos e irrepetíveis,

em que o espectador assume uma posição quase passiva de recepção sem qualquer

domínio do ritmo em que esta se processa9 . É um momento único de produção de

significado que jamais se repetirá, resistindo, inclusivamente, à documentação. Andrew

9 Embora as traduções para legendagem em análise no presente estudo estejam confinadas a um momento de
recepção único por se tratar de legendagem para TV, nem sempre a legendagem está confinada a um momento
de recepção única. O desenvolvimento de formatos de leitura como o VHS, o DVD ou o iPod permitem ao
espectador controlar o momento de recepção tanto relativamente ao ritmo (permite rever determinada
passagem fílmica sempre que assim o deseje) como ao local ou momento em que acontece (os leitores
portáteis facilitam o visionamento de filmes em locais diversos, assim como permitem ver diferentes partes do
filme em momentos diferentes).

99
Parte II - Modelo de Análise

(1984: 101) aponta o momento de recepção como um dos factores distintivos dos sistemas

dramático e cinematográfico, na medida em que implicam diferentes níveis de percepção.

Enquanto no filme o espectador caminha da percepção para a significação, dos factores

externos para as motivações e consequências internas; na leitura de um livro, o processo

ocorre no sentido contrário, do signo (grafemas e palavra) para a proposição e daí para o

significado. Estes parâmetros demonstram ser igualmente válidos na distinção dos

sistemas dramático e teatral ou dramático e televisivo. Factor importante será ainda o

carácter imediato da recepção da representação teatral face ao tipo de recepção não

imediata de um filme ou de um livro, isto é, se no teatro as palavras proferidas pelo actor

são recebidas de imediato possibilitando um feedback directo e instantâneo, entre a

produção de um filme ou a publicação de um livro e a recepção deste poderão decorrer

meses, fazendo com que o feedback, a existir, raramente tenha consequências na alteração

do produto final.

Grau de intervenção no texto. Diversos estudos têm atestado a tendência para as edições

de textos dramáticos se manterem próximas do texto tal como escrito pelo autor, não

promovendo, como tal, processos de adequação ou de actualização do discurso ou do

enredo a novos contextos ou momentos históricos. Em contrapartida, os textos teatral e

televisivo parecem ser recorrentemente marcados por processos de intervenção no texto a

diferentes níveis consoante os propósitos de determinado encenador ou realizador. A

efemeridade do momento de recepção e as expectativas do público têm sido apontados

como factores justificadores das tendências apontadas. O primeiro, na medida em que,

retirando ao receptor o controle do tempo disponível e do ritmo de assimilação de

elementos ‘estranhos’, conduz o encenador/realizador a optar por estruturas poucos

resistentes à interpretação; o segundo, na medida em que o êxito e a viabilidade da edição,

representação ou produção dependerão em grande parte do cumprimento das expectativas

de um público que espera ler o texto original ao comprar o texto publicado, mas que aceita

os produtos teatral e fílmico como uma interpretação específica do encenador ou realizador.

Com este último factor parece estar relacionado o elevado estatuto conquistado pelo

encenador e o realizador, relativamente ao baixo estatuto reconhecido ao editor de uma

100
Parte II - Modelo de Análise

publicação. Ultrapassado o fantasma de fidelidade da representação face ao texto escrito,

o encenador, assim como o realizador, parecem ter conquistado um estatuto de agente

criativo, isto é, o público reconhece-lhes uma liberdade de intervenção no texto segundo a

sua interpretação particular, sendo hoje indispensável, aquando da publicitação de um

evento teatral ou fílmico, a referência ao nome do encenador ou realizador.

O tipo de textos seleccionados. Este tem sido outro dos factores apontados como distintivo

dos vários sistemas. A análise dos textos seleccionados para publicação, representação ou

produção em filme tem identificado regularidades que apontam no sentido de, para

publicação e produção televisiva, serem seleccionados os grandes clássicos, confinando

assim as peças fora do cânone e peças contemporâneas à efemeridade da representação e

ao esquecimento dos arquivos de teatro (Bassnett, 1990; Aaltonen, 1997, 2003). A

centralidade dos textos clássicos e certos factores económicos são normalmente

apontados como motivações principais desta circunstância – a aposta em textos clássicos

parece garantir elevadas taxas de venda e de audiências, fundamentais para a viabilidade

da edição ou produção. Tendo em conta que ambos os comportamentos são naturalmente

possíveis em qualquer um dos sistemas, num estudo que se pretende descritivo será

relevante perceber o estatuto do texto e do autor, tanto no sistema de partida como no de

chegada, assim como da editora, teatro ou estação de televisão promotoras da edição ou

produção, por forma a compreender melhor a posição e função a cumprir pelos textos

traduzidos no sistema de chegada.

Função assumida pelo texto. Autores como Esslin (1976) ou Bennett (1997) parecem

identificar a representação teatral como o meio primordial de intervenção social, encarando

o tipo de textos seleccionados e o maior grau de intervenção como consequências directas

da função definida e a cumprir pelo texto no contexto em que se insere e o carácter

imediato da recepção como uma das condicionantes impulsionadoras dessa circunstância:

[Theatre] in very practical terms teaches them [the audience], or reminds them of its
codes of conduct, its rules of social coexistence. All drama is therefore a political
event. (Esslin, 1976: 29)

101
Parte II - Modelo de Análise

Funções menos interventivas ou contestadoras têm sido reconhecidas aos textos

dramáticos ou televisivos, nomeadamente funções pedagógicas ou de confirmação do

status quo. Contudo, uma vez mais, caberá a um estudo descritivo perceber qual a posição

do texto no sistema cultural em que se insere, procurando analisar as estratégias

assumidas conjuntamente com a função prospectiva desenhada para o texto.

2.3. Meios distintos, orientações de tradução distintas

Aceitar que qualquer acto de tradução conduz o tradutor a estabelecer prioridades implica

a ponderação pelo investigador dos factores participantes na hierarquização dos elementos

a traduzir. Aceitar a variável meio como um desses factores obriga à consideração das

condicionantes inerentes de cada meio em estudo. Assim sendo, mostra-se agora relevante

ponderar sobre as características e condicionantes inerentes de cada um dos meios em

estudo, na medida em que tais elementos serão tidos em consideração aquando da análise

das estratégias tradutórias.

2.3.1. Condicionantes dos meios em estudo

Recuperando o modelo de variação segundo o meio apresentado em I-2.1.1.3 e aplicando

esse mesmo modelo ao sistema dos textos traduzidos, os diferentes tipos de texto a

compreender o corpus em estudo poderão ser diferenciados como:

a) textos escritos para serem lidos na LC;

b) textos escritos para serem ditos na LC como se não tivessem sido escritos;

c) textos escritos na LC para serem lidos enquanto ouvidos na LP e acompanhados por

imagem.

Embora se tratem todos eles de textos escritos, partilhando o mesmo canal (visual),

formato do sinal (gráfico) e código (verbal), a consideração da diferença existente

relativamente ao meio (escrita para ser lida na LC, escrita para ser dita na LC como se não

tivesse sido escrita e escrita na LC para ser lida enquanto ouvida na LP e acompanhada

por imagem), da sua posição e forma no produto final e (im)possibilidade de feedback

obriga, por um lado, o tradutor a hierarquizar os elementos e a orientar a tradução num

102
Parte II - Modelo de Análise

sentido particular; por outro, o investigador a ponderar as concretizações específicas do

modo, uma vez conseguido o produto final. Se no primeiro caso é possível reconhecer no

produto final (o texto publicado) uma manutenção do canal visual, do formato gráfico do

sinal, do meio escrita, do código verbal escrito e do papel constitutivo da linguagem com

uma muito restrita possibilidade de feedback; no segundo caso, textos escritos para serem

ditos na LC como se não tivessem sido escritos, o produto final (a representação teatral)

será inevitavelmente marcado por uma mudança de canal (de visual para auditivo

acompanhado por visual e auditivo), de formato do sinal (de gráfico para fónico), de meio

(de escrita para ser dita como se não tivesse sido escrita para a fala) e de código (do

código verbal escrito para o código verbal oral acompanhado por não-verbal e verbal

escrito). A linguagem mantém o seu papel constitutivo, mas o feedback é agora imediato e

a acorrer durante a representação. Os textos escritos na LC para serem lidos enquanto

ouvidos na LP e acompanhados por imagem, denunciam igualmente no produto final (a

legendagem) uma mudança de canal (de visual e auditivo para visual acompanhado por

imagem e sons não-verbais), de meio (de gestos e fala para escrita para ser lida enquanto

ouvida e acompanhada por imagem) e de código (dos códigos verbal oral para o código

verbal escrito acompanhado pelo código não-verbal e verbal oral). O texto de chegada

passa a assumir um papel ancilar no produto final, gozando de uma restrita possibilidade

de feedback, sempre não-imediato. No esquema seguinte tornar-se-ão mais explícitos os

diferentes movimentos de alteração do canal, do formato do sinal, do meio, do código, do

papel da linguagem e relativamente à possibilidade de feedback nas diferentes fases de

tradução e concretização do produto final:

103
Parte II - Modelo de Análise

Figura 6: Alterações relativas ao modo aquando do processo de tradução nos sistema literário, teatral e
televisivo.

Será aqui relevante salientar dois aspectos: a diferença existente entre o texto publicado e

a legendagem pelo facto de neste último caso o texto ser acompanhado pela imagem e

som constituintes do TP e de o TC assumir um papel ancilar; e o facto de, no caso do texto

teatral, as alterações de canal, formato do sinal, meio e código serem recebidos pelo

público por via dos actores que interpretam o texto, alvo de um feedback imediato.

A sobreposição da legenda na imagem, permitindo a co-presença dos textos de partida e

de chegada, assim como da imagem, impõem a consideração de certas condicionantes ao

processo de tradução como:

104
Parte II - Modelo de Análise

a) O espaço disponível. As legendas em TV são compostas por uma ou duas linhas a

surgir numa margem inferior do ecrã, centradas ou alinhadas à esquerda, com a

extensão máxima de 35 caracteres por linha10 . Segundo os estudos de Schröter

(2003) e Gottlieb (1994) as legendas para TV parecem manifestar um grau de

condensação superior que as legendas para DVD, apresentando, em consequência

um número superior de legendas de uma linha. O autor atribui estes resultados, por

um lado, à noção de a legenda de uma linha ser mais rápida e mais simples de ler;

por outro, à ponderação, por parte dos canais de televisão, de um público mais vasto

e mais variado com diferentes ritmos e níveis de leitura11. Os estudos de d’Ydewalle

et al. (1985, 1987, 1988, 1989) e Praet (1990) parecem apontar no sentido inverso,

isto é, que as legendas de uma linha, implicando um número de fixações oculares

(sacades) comparativamente maior, são comparativamente mais exigentes em termos

de processamento de informação; contudo, um número superior de estudos com

populações de maiores dimensões e compreendendo um maior número de variáveis

em termos de idade, momentos de recepção, etc, será necessário por forma a que

estes dados possam ser tidos como conclusivos.

b) O tempo de exposição. Embora seja admitida alguma variação relativamente ao

tempo de exposição de uma legenda12, a legenda não permanece no ecrã por menos

de 1,5 segundos, no caso de uma legenda singular, e menos de 3 segundos, no caso

10Será importante reconhecer que este número de caracteres compreendidos em cada linha da legenda poderá
conhecer variação tanto entre países como entre meios, sendo este um dos aspectos justificadores da distinção
a fazer entre legendagem para cinema, televisão, VHS ou DVD. A diferença nos processos de introdução da
legenda (por gravação ou digital) assim como as característica do ecrã (tela ou ecrã, quadrado ou “widescreen”,
curvo ou LCD) têm uma influência decisiva no espaço disponível para a legenda, o tamanho que esta poderá
assumir e o número de caracteres que esta poderá compreender.
11 Embora sejam igualmente feitos estudos de mercado e público-alvo relativamente aos diferentes produtos
televisivos, cinematográficos, VHS ou DVD, estes conhecem sempre uma maior indefinição no caso dos canais
de televisão generalistas pelo facto de terem uma emissão regular e independente da acção do espectador.
12 Para além do princípio de sincronização com a imagem, a variação no tempo de exposição é igualmente
condicionada pelo tamanho do ecrã, a extensão da legenda (legendas de uma linha conhecem um tempo de
exposição menor) ou o número de caracteres passíveis de leitura por um leitor médio. A falta de estudos
relativos aos ritmos de leitura no contexto português, assim como a inexistência de um código nacional de
legendagem, levou a que neste estudo fossem recolhidas informações junto de duas das principais empresas
de legendagem portuguesas - Sintagma e Solegendas - onde nos foi possível perceber que a variação acontece
dentro da própria empresa consoante o canal de televisão, a hora de emissão ou o público-alvo de determinada
tradução. Contudo, estudos realizados nos anos 80 por d’Ydewalle et al. (1985, 1987, 1988, 1989) parecem
confirmar o argumento de um ritmo mais rápido de leitura por parte de espectadores cada vez mais
familiarizados com os meios audiovisuais e com as exigências da leitura de legendas. A confirmar-se, estes
dados podem conduzir a uma total revisão da noção de legendagem como meio incontornavelmente redutor.

105
Parte II - Modelo de Análise

de uma legenda de duas linhas. Tendo em conta que a recepção em televisão é de

tipo linear, isto é, sem possibilidade de retorno ou segunda leitura, o tradutor para

legendagem em televisão não poderá deixar de ter em conta que será tão nocivo a

legenda não permanecer o tempo suficiente para a leitura e compreensão do seu

conteúdo, como permanecer mais tempo do que o necessário13 . Não esquecendo a

natureza multimedial do produto televisivo, será igualmente importante permitir ao

espectador tempo de leitura da componente não verbal (Gottlieb, 2001: 48);

c) A natureza polissemiótica do produto televisivo14 . O facto de o produto final

compreender imagem, som, texto oral e texto escrito, pode constituir-se como um

factor limitador do trabalho do tradutor pela necessidade de sincronização da

legenda com o texto oral e a imagem15; contudo, este pode igualmente ser um factor

adjuvante no sentido em que a imagem e som, tidos como elementos

complementares da legenda, permitirão um maior grau de condensação da legenda

que tenderá a não incluir informação redundante (Gottlieb, 2001: 47) 16. A tendência

para a adequação identificada por diversos estudos em textos para legendagem

parece conhecer parte da sua justificação na co-presença entre texto de partida e

texto de chegada, circunstância que conduz a um efeito de feedback (Gottlieb, 1992:

165) que pode ser positivo, no sentido em que permite ao tradutor um certo nível de

condensação pela percepção de certos sons e assumpção de um conhecimento,

pleno ou parcial, da língua de partida por parte do espectador como complementar;

13 Os estudos de d’Ydewaille et al. (1985, 1987, 1988, 1989) demonstram que a leitura da legenda se processa
de forma automática, isto é, os olhos processam a legenda em movimentos rápidos e numa sequência não
necessariamente linear (saltos, sacades), retendo a imagem visual-mental da legenda de tal forma que a maior
parte dos espectadores assume a dificuldade em não ler a legenda caso ela esteja no ecrã. O facto de a
legenda permanecer mais tempo que o necessário no ecrã terá como consequência uma segunda ou terceira
leitura da mesma legenda, fazendo com que o leitor se aperceba da legenda e se concentre nesta em
detrimento da imagem.
14 Delabastita (1989, 1993) foi um dos primeiros autores a reconhecer a necessidade de ter em consideração as
diferentes linhas semióticas em jogo na tradução do produto audiovisual, outros autores assumem hoje o
mesmo argumento, reclamando a falta de contextualização da grande maioria dos estudos sobre a legendagem
(Gottlieb, 1994; Kovačič, 1995, 1998b; Karamitroglou, 2000; Catrysse, 2001, Bogucki, 2004; Pavloviċ, 2004)
15 Tal como apontado por Fawcett (2003: 148) e Gottlieb (1992), um leitor médio empregará mais tempo a
interpretar um texto quando lido do que quando ouvido.
16 Problemas surgem, no entanto, em casos de jogos de sentidos entre imagem e palavras que nem sempre é
possível manter na tradução para uma segunda língua. O tradutor pode hoje dispor de tecnologia que lhe
possibilitaria ultrapassar problemas como este pela manipulação da imagem; contudo questões éticas se
levantam que nos levam uma vez mais a ponderar o estatuto do tradutor e o grau de intervenção que este
poderá assumir relativamente ao texto de partida (Gambier, 2003: 179 e 181).

106
Parte II - Modelo de Análise

ou negativo, no sentido em que pode dar lugar a juízos de valor por parte de um

espectador que, conhecendo a língua de partida, critica e assume qualquer desvio

face ao texto de partida como um erro de tradução. Cabe ao tradutor estabelecer

uma hierarquia de prioridades e decidir relativamente à necessidade e grau de

condensação, que elementos excluir da legenda e que elementos incluir.

Assim sendo, apesar da partilha de um mesmo canal e código, a tradução para publicação

e para televisão enfrenta diferentes desafios impostos por características inerentes ao meio

e diferenças no momento de recepção.

O movimento de alteração do meio e canal a ocorrer no processo de legendagem e a co-

presença do texto de partida oral e do texto de chegada escrito no produto final, promove o

estabelecimento de uma tensão já diversas vezes referida entre o modo escrito,

comummente associado a um registo formal e à variedade padrão tida como uso correcto

da língua pelo falante comum, e o modo oral a que é reconhecido um registo menos formal

e características discursivas nem sempre bem recebidas pelo leitor comum no modo

escrito. A necessidade de recriar na escrita as características do discurso oral, obriga o

tradutor à escolha entre a obediência às normas de ortografia e a adequação ao texto de

partida oral. Esta mesma tensão pode ser reconhecida aquando do processo de tradução

do texto dramático, na medida em que o tradutor produz um texto escrito a ser

concretizado em palco pela interpretação oral do actor. Quanto maior foi o envolvimento do

tradutor no processo de edificação do espectáculo, maior será o impacto na tradução para

o palco, isto é, o tradutor poderá assumir duas atitudes, uma em que entende a tradução

do texto dramático como essencialmente linguística e segundo as normas do sistema

literário, relegando as questões de adequação do discurso ao juízo do encenador e actores;

outra, em que, participando activamente no processo de transposição do texto escrito para

o palco, assume determinadas opções e estratégias de tradução tendo em vista a alteração

do meio escrito para o oral. Neste segundo caso, o grau de intervenção no texto será

consideravelmente maior, estabelecendo-se este como um lugar de tensão não só entre as

culturas de partida e de chegada, mas também entre as normas dos modos escrito e oral.

Tal como na tradução para legendagem, também na tradução para teatro deve ser tido em

107
Parte II - Modelo de Análise

consideração a presença simultânea de diferentes canais e formatos do sinal, diferentes

meios e diferentes códigos, no sentido em que tal participará activamente no processo de

tradução. Se, por um lado, a coexistência das linhas auditiva e visual poderão obrigar o

tradutor a enfrentar a questão da variação linguística, por outro, poderá funcionar como

elemento adjuvante por não fazer recair na linha verbal todo o potencial significativo,

permitindo um maior grau de padronização do discurso17.

O reconhecimento das alterações de canal, meio e código entre cada um dos tipos de

tradução, da tensão existente entre os modos escrito e oral e o impacto que todos estes

factores teriam necessariamente no texto traduzido, conduziram à centralização da reflexão

da tradução para o palco e para legendagem em torno dos conceitos de performatividade

(“performability”) e articulação (“speakability”), por um lado, e legibilidade, por outro.

2.3.2. A tradução orientada para a representação teatral: performatividade e

articulação

A reflexão sobre a tradução do texto dramático foi inaugurada, no contexto dos Estudos de

Tradução, por autores como Bassnett (1978, 1980, 1981, 1985, 1990, 1991, 1998), Zuber-

Skerrit (1980a, 1980b, 1984), Van den Broeck (1986, 1993) ou Delabastita (1993). Aceitando

a distinção entre texto dramático e texto teatral, foi promovida a identificação de uma

tradução orientada para a página e uma outra orientada para o palco, através da qual se

torna evidente a assumpção, não apenas de circuitos de distribuição diferentes, mas

também de processos e estratégias de tradução distintos 18. Não deixando de reconhecer

que qualquer leitura é à partida uma interpretação do texto, todos estes autores parecem

apontar, como característica fundamental da tradução para o palco, o facto de esta manter

uma relação específica com uma representação em particular, denunciando, como tal, uma

17 Embora a opção por uma elevada padronização do discurso possa parecer improvável pelo nível de
incongruência que assume com os elementos visuais, estudos como os de Horton (1999) relembram o facto de
que a escolha dependerá em grande parte do sistema de chegada, do grau de rigidez das práticas teatrais,
assim como do significado sociosemiótico assumido pelas variedades linguísticas no contexto de chegada.
18 Estes dois tipos de orientação da tradução têm conhecido diferentes denominações por autores como Van
den Broeck que a eles se refere como “retrospective translation” e “prospective translation” respectivamente
(1993: 105) ou Habicht (1993: 49), que prefere os termos “page-oriented translation” e “stage-oriented
translation”. Habicht, embora considerando esta distinção necessária e operativa, não deixa de alertar para o
facto de os parâmetros definidores desta distinção estarem também eles localizados num tempo e num espaço.

108
Parte II - Modelo de Análise

interpretação muito específica do texto19 . Parecem ser, portanto, duas visões de tradução

distintas que geram dois tipos de tradução diferentes: uma mais próxima do texto

dramático, outra mais próxima das opções e objectivos específicos de uma representação

em particular.

A posição assumida pela linha de semiótica do teatro anteriormente exposta teve o seu

impacto, não só na área dos Estudos de Teatro e na prática de representação, mas também

em disciplinas como os Estudos de Tradução. Os anos 80 são o palco das primeiras

publicações erguendo-se a discussão em torno dos conceitos de performatividade e

articulação formulados no contexto da Semiótica do Teatro. A centralidade de tais

conceitos é de imediato visível no subtítulo do livro que Zuber-Skerrit edita em 1980 - The

Languages of Theatre: Problems in the Translation and the Transposition of Drama (1980) -

onde tradução teatral compreende o processo de transposição do texto para o palco e

onde na introdução a autora explicitamente afirma concentrar a sua atenção na tradução

teatral tendo em consideração aspectos verbais e não verbais, assim como problemas de

encenação, na medida em que uma tradução para ser representada “must be actable and

speakable” (1980: xiii). A mesma perspectiva e foco na tradução como transposição da

página para o palco é assumida no segundo volume que edita - Page to Stage: Theatre as

Translation (1984). No volume organizado por Scolnicov e Holland (1989) - The Play Out of

Context: Transferring Plays from Culture to Culture - o foco parece estar agora na

movimentação de uma peça teatral entre sistema culturais; contudo, o conceito de

performatividade permanece no centro da discussão. A par das publicações mencionadas,

não poderá deixar de ser mencionado o nome de Susan Bassnett que, numa primeira fase,

terá sido quem mais contribuiu para o desenvolvimento da reflexão da tradução do texto

dramático e do texto teatral.

Nos seus primeiros artigos (1978, 1980, 1981), argumentando contra o desfavor a que a

tradução para teatro tem sido relegada em consequência da noção de que o texto

19 A especificidade da interpretação e tradução para o palco, assim como a necessidade de actualização do


discurso, têm sido apontadas por tradutores e encenadores (cf. questionário realizado por Jänis, 1996) como as
causas principais para o facto de, na maioria das vezes, ser realizada uma nova tradução para cada
representação.

109
Parte II - Modelo de Análise

dramático pode ser traduzido da mesma forma que o texto narrativo, Bassnett assume que

o texto dramático deve ser lido e traduzido de forma distinta e que este apenas conhece

completude quando representado. Na esteira de Ubersfeld, recusa igualmente a noção de

leitura única, que condenaria o tradutor a um modelo rígido de tradução segundo o qual

juízos de valor seriam formulados, apresentando em contrapartida os conceitos de

performatividade e função do texto como critérios a respeitar pelo tradutor.

Performatividade implica, neste sentido, a distinção entre texto escrito e representação,

assim como a pressuposição de que o texto teatral contém características intrínsecas que

o tornam passível de representação. Ao tradutor cabe determinar que estruturas são

‘representáveis’ e traduzi-las para a língua de chegada, ainda que alterações significativas

ao texto tenham de ocorrer. A consideração da função é relevante pelos efeitos no público

que o encenador procura alcançar: “the translator must take into account the function of the

text as an element for and of performance” (Bassnett, [1980] 1991: 132).

Esta posição de Susan Bassnett conhece, no entanto, alterações, vindo a autora a

apresentar o conceito de performatividade como “the implicit, undefined and indefinable

quality of a theatre text that so many translators latch on to as a justification for their various

linguistic strategies” (1985: 101-102). Coincidindo o surgir deste conceito com o advento do

teatro Naturalista, sendo, como tal, baseado no conceito de fidelidade, o conceito de

performatividade parece surgir como legitimação das alterações promulgadas pelo

encenador. Segundo a autora, a noção de identificação e descodificação de um código

subjacente ao texto dramático a ser traduzido e recodificado numa segunda língua relega o

tradutor para uma posição impossível, devendo, por isso, ser rejeitada. Bassnett defende

agora como solução a identificação das unidades deícticas e a análise do modo como

estas operam em ambas as línguas, na medida em que fundamental será, não tanto a

presença de todas a unidades, mas sim a manutenção da função que desempenham no

texto de partida. As palavras finais do artigo marcam, sem engano, a sua mudança de

posição:

It seems to me that the time has come to set aside “performability” as a criterion for
translating too, and to focus more closely on the linguistic structures of the text
itself. For, after all, it is only within the written that the performable can be encoded

110
Parte II - Modelo de Análise

and there are infinite performance decodings possible in any playtext. The written
text, troué though it may be, is the raw material on which the translator has to work
and it is with the written text, rather that with a hypothetical performance, that the
translator must begin. (1985: 102).

Nos artigos de 1991 e 1998, Susan Bassnett argumenta explicitamente contra o conceito

de performatividade, fundamentando a sua posição em dois pontos nucleares: a) a

resistência do conceito ao processo de definição; b) a recusa da noção de universalidade

do código gestual, que, segundo a autora, será descodificado de formas diferentes por

diferentes leitores, e, como tal, da possibilidade de descodificação e tradução desse código

para outras língua (1998: 90-91). Do tradutor não pode ser esperada a tarefa de

descodificação, tradução e recodificação do código gestual do texto, algo que será

conseguido num processo de tradução em conjunto onde vários serão os intervenientes

entre encenadores, técnicos, actores:

The task of the translator is to work with the inconsistencies of the text and leave the
resolution of those inconsistencies to someone else. Searching for deep structures
and trying to render the text ‘performable’ is not the responsability of the translator.
(1998: 105)

Patrice Pavis (1989, 1990, [1991] 1992), com uma perspectiva marcada não pelos Estudos

de Tradução, mas antes pelos Estudos de Teatro, mantém uma visão distinta do que é

tradução para teatro, afirmando que, envolvendo esta elementos vários além da tradução

linguística, a verdadeira tradução apenas toma lugar na mise en scène como um todo. O

processo de tradução deve assim ser encarado como um processo faseado com diferentes

participantes e que o autor organiza da seguinte forma:

T0: o texto original, correspondente à interpretação que o autor tem da realidade;

T : o texto da tradução escrita;

T1: T dependente da situação de enunciação inicial do T0 e do público futuro e que

receberá T3 e T4. Nesta fase o tradutor é simultaneamente o leitor e o

dramaturgo que escolhe de entre as indicações potenciais presentes no texto a

ser traduzido;

111
Parte II - Modelo de Análise

T2: a análise dramatológica

T3: acção de teste do texto em palco, isto é, concretização do T1 e T2 por via da

enunciação em palco;

T4: concretização em palco de T3 durante a qual o texto de partida é finalmente

recebido pelo espectador do contexto de chegada.

Esta foi, de facto, uma importante contribuição para a reflexão sobre a tradução de teatro

que, neste sentido, não deve ser entendida como um acto único e individual, mas sim um

processo em que diferentes elementos devem ser tidos em conta e onde diversos podem

ser os indivíduos que nele participam (tradutor, encenador, actores, etc). Com isto quer o

autor igualmente afirmar que o potencial teatral não é algo inerente ao texto dramático, mas

sim algo conseguido aquando do processo de construção da representação:

Theatricality does not manifest itself [...] as a quality or an essence, which is inherent
to a text or a situation, but as a pragmatic use of the scenic instruments of the
performance manifest and fragment the linearity of the text and of the word. (Pavis,
[1980] 1998: 471)

O conceito de performatividade tem, de facto, sido o foco da reflexão da tradução de

textos dramáticos, na medida em que nele parece radicar a distinção a fazer entre a

tradução orientada para a página e a tradução orientada para a representação em palco.

Embora autores como Snell-Hornby (1995a), Johnston (1996) ou Marco (2000) defendam

ainda o conceito como o parâmetro distintivo entre os dois tipos de tradução, autores como

Susan Bassnett ou Patrice Pavis e, mais recentemente, Heylen (1993), Mateo (1995a,

1995b), Aaltonen (1995, 1997, 2000, 2003), Totzeva (1999), Schultze (1998), Kruger (2000)

ou Espasa (2000) parecem recusar a centralidade de um conceito que, resistindo a qualquer

definição, se mostra pouco operativo, tanto para investigadores como para tradutores.

Enquanto conceito, performatividade parece querer dar conta, por um lado, da criação, na

língua de chegada, de ritmos de discurso fluente; por outro, de um conjunto de estratégias

de adaptação cultural20. Contudo, não sendo apresentada qualquer definição, o conceito

20 Este conceito tem ainda conhecido designações de “speakability” ou “breathability”, procurando dar conta da
criação de um discurso fluente, assim como as designações de “playability” ou “actability” quando do ponto de
vista da prática teatral.

112
Parte II - Modelo de Análise

fica aberto à definição pontual de cada tradutor ou encenador, isto é, a não definição do

conceito tem como consequência a decisão livre por parte de cada tradutor e/ou

encenador do que constituirá ou não um texto fluente ou representável para os actores. O

problema central parece estar, como tal, na impossibilidade de definição de um conceito

que, por natureza, dificilmente poderá conhecer uma definição exacta e restrita sob pena

de não poder dar conta das diversas possibilidades estéticas no tempo e no espaço. Assim

sendo, caberia sempre ao tradutor e/ou encenador decidir através de que parâmetros se

definiria a performatividade de um texto e como seria conseguida a fluência e naturalidade

do mesmo, desenhando-se agora uma importante questão de poder (Espasa, 2000:56).

Será crucial ter em consideração quem detém o poder de decisão na companhia teatral em

relação, não apenas à escolha do texto a traduzir, mas também do que é representável e,

consequentemente, do que é excluído como não representável. O conceito de

performatividade parece agora envolver e ser moldado dentro de um jogo de poder onde é

estabelecida uma hierarquia de estatutos entre os vários intervenientes no processo. Neste

sentido, será importante ter em consideração que, tal como apontado por Espasa (2000:

52-53), a noção de fluência em palco, ainda que a receber diferentes significações,

denunciará sempre uma procura de aceitabilidade às normas da cultura de chegada e de

invisibilidade do tradutor, recuperando novamente o paradoxo de que a boa tradução será

a que se mantém invisível, oculta na alegada naturalidade e fluência da língua de chegada.

A tensão existente entre as práticas teatrais, entre naturalismo e artificialidade, parece,

assim, aproximar-se da antiga questão de fluência e (in)visibilidade do tradutor nos Estudos

de Tradução. A tradução para teatro tem sido identificada com a tendência para a

aceitabilidade, que parece conhecer a justificação não só no facto de ser a cultura de

chegada a promover a tradução, mas também na efemeridade do evento e na natureza

imediata do processo de recepção (Bassnett, 1981, 1985; Mateo, 1995; Aaltonen, 1997). O

sucesso da tradução, e da representação, é julgado no momento de recepção sem

hipótese de apelo, tornando central a necessidade de ultrapassar qualquer resistência a

113
Parte II - Modelo de Análise

uma cultura estrangeira e de eliminar ruídos indesejados no canal ou estruturas linguísticas

não familiares 21.

Afastar a reflexão do conceito de performatividade, onde implícita está a noção do texto

truncado apenas completo quando representado, e da noção de fidelidade ao texto

dramático permite assumir diferentes tipos de tradução porque com orientações e

propósitos vários. No presente estudo, dentro da perspectiva descritiva que assume, a

atenção recairá na análise das estratégias tradutórias identificáveis nos textos, de forma a

que, pela identificação de regularidades de comportamentos, seja possível reconhecer

estratégias específicas de cada meio. Considera-se assim mais proveitosa a análise do

comportamento efectivo do tradutor do que a ponderação de um potencial teatral a ser

descodificado, traduzido e recodificado pelo tradutor na língua de chegada.

Intimamente relacionado com o conceito de performatividade tem sempre estado o

conceito de “speakability”, na medida em que, segundo Levy (1969, cf. Aaltonen 1997) -

autor que introduziu o conceito -, um texto apenas poderá ser entendido como

“performable” se lhe for reconhecida a necessária “speakability”. Assumindo que a

linguagem do teatro se afirma numa relação funcional com o falante, os espectadores e as

normas do modo oral, Levy distinguia o discurso teatral como uma forma estilizada do

discurso oral real condicionada pelas convenções teatrais, sendo neste sentido que a

facilidade de articulação surge como um dos requisitos do discurso teatral22 .

Embora recuperado por diversos autores, este conceito tem demonstrado ser igualmente

resistente a uma definição, conhecendo, inclusive, diferentes definições e escopos por via

de diferentes autores. Autores como Bassnett (1990; 1991) ou Espasa (2000) têm

manifestado as suas reticências relativamente a um conceito que consideram vago e pouco

operativo. Pavis (1992), atribuindo-lhe o significado de articulação e pronúncia “fácil” e

21Na esteira de Culler, Aaltonen (1997) organiza os diferentes tipos de aculturação em cinco níveis distintos:
semelhança do contexto social, partilha dos mesmo estereótipos culturais; partilha e conhecimento das
mesmas convenções de género; quebra do enquadramento ficcional e intertextualidade.
22Confirmando a importância do ritmo e a articulação do discurso em palco, assim como da sua coordenação
com a acção, os movimentos do actor e os restantes elementos em palco, Corrigan afirma:

The structure is action; not what is said or how it is said but when. [...] Duration per se in stage
speech is a part of its meaning and stage time is based upon breath. This means that the
translator must always, whenever he can, try to keep the same number of words in each
sentence. (1961: 99)

114
Parte II - Modelo de Análise

natural (1992: 143), não deixa de alertar para uma eventual banalização do discurso teatral.

Em contraste, autores como Corrigan (1961) ou Snell-Hornby (1994) insistem na

importância deste conceito num tipo de discurso que distinguem como “potencial action in

rythmical progression” (Snell-Hornby, 1994: 104) e que terá de necessariamente evocar

uma reacção por parte do espectador. Na mesma linha parecem posicionar-se Schultze

(1990) ou Aaltonen (1997) que assumem este conceito como um instrumento importante na

produção de significado literário e teatral e que não deveria ser confundido com ‘pronúncia

natural’, na medida em que relevante será o tipo de speakability e a sua função no processo

de produção de significado teatral (Schultze, 1990: 268).

2.3.3. Tradução orientada para a publicação e para a legendagem: legibilidade

A leitura é um processo complexo, processado em níveis distintos (ortográfico, lexical,

sintáctico, semântico, etc) e desenvolvido por diferentes processos - baseado no texto

(bottom-up) ou no conhecimento prévio (top-down) - que interagem entre si, permitindo ao

leitor formar e testar constantemente hipóteses acerca do texto (Spiro et al., 1980). O leitor

distingue-se, portanto, como o elemento central em todo o processo, variando o nível de

legibilidade de acordo o contexto social, a experiência, a formação ou a idade do leitor.

Os estudos desenvolvidos sobre o tópico da legibilidade têm-se, no entanto, focado na

correlação entre características observáveis nos textos e a compreensão. Legibilidade é

comummente definida como inteligibilidade ou fácil leitura determinada pelo nível de

dificuldade linguística. Na maior parte dos casos legibilidade é, inclusive, entendida como

uma propriedade do texto, esquecendo o facto de que o texto não tem qualquer grau de

legibilidade inerente, na medida em que esta conhece variação de acordo com diversos

elementos contextuais como referido anteriormente.

Diversos aspectos receberam a atenção de diferentes investigadores, sendo-lhes

reconhecida primazia na determinação do nível de legibilidade de um texto: seja a micro-ou

macroestrutura do texto, a extensão das frases, a familiaridade do vocabulário ou o recurso

a marcas gráficas desviantes. As conclusões são distintas e frequentemente contraditórias.

Se parece haver algum consenso quanto ao grau de complexidade sintáctica ser um

115
Parte II - Modelo de Análise

obstáculo primário na compreensão do texto, estudos como os de Pearson (1974-75)

chegaram à conclusão contrária, seleccionando a extensão das orações como mais

relevante. Contudo, estudos como os de Davison et al. (1985) ou Schlesinger (1968),

parecem concluir que este não é um elemento determinante e que pouco efeito parece ter

na compreensão do texto. Em confirmação parecem estar estudos como o de Praet et al.

(1990) que, agora no contexto da tradução para legendagem, permitem concluir que

legendas de uma linha podem ser mais confusas porque com um grau de redundância

maior face à imagem.

O assumir de que um texto tem em si um grau de legibilidade inerente e a procura de

aspectos no texto que definissem esse grau de legibilidade, motivou críticas de autores

como Kintsch e Vipond (1979) que insistem que o grau de legibilidade pode apenas ser

definido ou estudado pela combinação de diferentes métodos que, tendo em conta os

diferentes níveis de um texto, o contexto e diferentes leitores, procuraria estudar o grau de

legibilidade de um mesmo texto para leitores distintos. Embora este seja certamente o

método capaz de melhor analisar o processo de leitura, uma clara desvantagem reside nos

recursos que tal estudo exigiria.

No presente estudo, não tendo a análise do grau de legibilidade como seu objectivo

nuclear, o conceito de legibilidade será tido em consideração relativamente ao grau de

dificuldade de leitura, procurando assim ilustrar o entendimento e juízo feito pelo tradutor

que tenderá a evitar determinado tipo de desvios ou a optar por uma recriação menos

densa a favor de uma leitura sem sobressaltos e para evitar críticas de opacidade

enfrentadas por diversos autores e tradutores (Page, [1973] 1988). Será neste contexto

ponderado o recurso a marcas estereótipo, as características inerentes ao meio para qual

se traduz e o perfil do público definido para a tradução.

116
Parte II - Modelo de Análise

CAPÍTULO 3
A TRADUÇÃO DA VARIAÇÃO LINGUÍSTICA

Na medida em que a presença de variedades linguísticas em texto ficcional evoca e explora

conhecimentos extralinguísticos relativos à associação de formas linguísticas a escalas de

valor e hierarquias presentes na sociedade, a tradução de variedades linguísticas

apresenta-se como um momento controverso de sobressalto cultural (Leppihalme, 1997)1 e

de grande tensão (Lane Mercier,1997), levando certos autores a considerá-lo um exemplo

de tradução impossível (House, 1973; Fedorov, 1985, cf. Brodovich, 1997).

Em momentos anteriores (cf. I-2) foram ponderadas as dimensões comunicativa,

pragmática e semiótica do texto ficcional e, de forma mais específica, da recriação da

variação linguística em texto ficcional, dimensões fundamentais na compreensão da

presença e função dessa recriação, tanto no texto, como no contexto sociocultural

abrangente. Foi igualmente considerada a acção de estereótipos sociolinguísticos

denunciadores de juízos de valor e hierarquias sociais, que o texto ficcional importa e

recria, não só com objectivos ao nível diegético, mas também de posicionamento face à

ideologia dominante. A dificuldade de tradução da variação linguística advém, portanto,

não só da assimetria reconhecida entre dois sistemas linguísticos diferentes, mas

fundamentalmente, da necessidade de tradução das relações existentes entre os elementos

formais e os parâmetros extralinguísticos, isto é, a tradução dos significados

socioculturalmente determinados e expressivos de uma estrutura ideológica, face aos quais

o texto se posiciona e que conhecerão contornos necessariamente diferentes na cultura de

chegada. Tal como é apontado por Hatim (1990-91), as diferenças reconhecidas entre as

estruturas sócio-ideológicas, a valorização atribuída a determinadas categorias, grupos ou

mesmo variedades linguísticas e a natureza regional e local reconhecida a essas variedades

linguísticas, forçam o tradutor a uma visibilidade acrescida na medida em que este se vê

1 Leppihalme considera a tradução de variedades linguísticas um exemplo de sobressalto cultural (“cultural


bumps”), na medida em que diz respeito a elementos formais e linguísticos condicionados culturalmente e
regulados por convenções sociais (1997, 4).

117
Parte II - Modelo de Análise

obrigado a agir sobre o texto e, possivelmente, a trabalhar criativamente sobre o código

linguístico de chegada. Uma das dificuldades far-se-á sentir pelo facto de, nessa recriação,

o tradutor não poder deixar de considerar a tradição de recriação de variedades linguísticas

em texto ficcional da CC que, entre outros aspectos já explorados anteriormente, permitirá

ao receptor descodificar o uso conotativo das variedades linguísticas no texto.

Ultrapassar o problema de tradução dos significados sócio-semióticos e das funções

narrativas associadas à presença de variedades linguísticas em texto literário implica, numa

primeira instância, uma tomada de decisão relativamente à manutenção ou não-

manutenção da variação linguística no TC, sendo que qualquer uma das opções pode

incorrer em certos riscos identificados por diversos autores e organizados por Lane Mercier

(1997) da seguinte forma: o risco de criação de significados, o risco de perda de

significados, o risco de etnocentrismo, o risco de inautenticidade e o risco de

conservadorismo e/ou radicalismo.

A tensão identificada resulta, como tal, da necessidade de o tradutor laborar criativamente

sobre o código de chegada na tentativa de recriar no texto de chegada as relações e

associações reconhecidas entre elementos linguísticos e extralinguísticos no TP e inferidas

pelo receptor. Parece, portanto, incontestável o facto de a opção pela recriação de

variedades linguísticas em texto ficcional estar saturada da presença autoral, que age no

sentido da produção de significados específicos que assistem o receptor no

posicionamento do texto e do autor no contexto literário, teatral ou fílmico, assim como

social e, consequentemente, na interpretação da obra.

Tendo isto em consideração, será igualmente válido considerar que a recriação de

variedades linguísticas em texto traduzido e, numa etapa prévia, a opção de recriação ou

não da variação linguística presente no texto de partida, está também ela saturada da

presença do sujeito responsável pela tradução. A tensão causada pela dificuldade de

tradução procurará ser resolvida pelo agente tradutor que assume escolhas e estratégias

num processo de ganhos e perdas de significados denunciador, em última instância, da

posição do tradutor no contexto sociolinguístico e sócio-ideológico de chegada; da relação

entre as culturas de partida e de chegada; dos valores, normas e imagens em circulação no

118
Parte II - Modelo de Análise

contexto de chegada; da função a cumprir pelo texto na cultura de chegada e,

possivelmente, dos contornos do leitor implícito. É neste sentido que Lane Mercier (1997:

48) reconhece aqui um momento de dupla tensão ou violência: uma primeira, inerente à

recriação de variedades linguísticas em texto traduzido já referida anteriormente, e uma

segunda inaugurada pela presença do tradutor no texto:

[…] [T]he translation of literary sociolects would indeed appear to be paradigmatic of


the manner in which the translator supplements, deletes, transforms, subverts,
parodies source-text meaning by way of specific translation strategies, confirming
not only the violence of the translation process […], but also the translator’s
inevitable presence within the translated text. (Lane Mercier, 1997: 48)

No contexto do presente estudo importa analisar a forma como estes significados foram ou

não recriados no TC, procurando identificar os desvios micro e macro-textuais que as

opções estratégicas impõem ao texto, possíveis regularidades relativamente aos meios em

estudo, assim como a correlação possível entre as opções tomadas e parâmetros

extralinguísticos do contexto de chegada, na medida em que, na esteira de Lefevere (1992:

48), o estudo das estratégias de tradução relativas ao uso de variedades linguísticas

ficcionais é assumido por este estudo como um espaço privilegiado de ponderação da

correlação existente entre estratégias linguísticas e estruturas ideológicas.

O presente capítulo tem por objectivo apresentar uma revisão dos estudos mais relevantes

relativamente à tradução de variação linguística e o modelo de análise específico para este

estudo que recupera e desenvolve algumas das propostas de estudos anteriores.

3.1 Estratégia de não-manutenção da variação linguística

Perante a proposta de tradução de um texto marcado pela variação linguística, o tradutor

vê-se confrontado com a opção de recriar ou não essa variação no texto de chegada, isto

é, manter ou não as relações entre formas linguísticas e parâmetros socioculturais e

ideológicos. A opção de não-manutenção da variação linguística agora em discussão

poderá resultar numa completa normalização do discurso pelo uso exclusivo da variedade

padrão, ou, pelo contrário, numa completa dialectização do discurso pelo uso exclusivo de

119
Parte II - Modelo de Análise

uma variedade subpadrão. Ambos os movimentos foram identificados por autores como

Hatim (1990-91), Brisset (1996), Cronin (1996), Berezowski (1997) ou Findlay (2000) que,

além da procura de não comprometimento da integridade do texto, apontam diferentes

razões justificadoras.

A opção por uma total normalização, motivada, em primeira instância, pela associação feita

entre texto literário e variedade padrão, entre discurso escrito e variedade padrão ou entre

instituição e variedade padrão com base no prestígio socialmente reconhecido a todos

estes elementos, poderá mais facilmente ocorrer sob a pressão de estados autoritários que

procuram (geralmente através de um processo censório) reprimir movimentos de inovação,

ou de sociedades onde o intervalo entre variedades padrão e subpadrão em termos de

prestígio se afirma ao ponto de ser o público receptor a recusar um uso linguístico não-

padrão. Contudo, poderá igualmente partir do próprio tradutor que, consciente da natureza

local e específica de qualquer variedade do contexto de chegada e de que o seu

aproveitamento evocará, eventualmente, significados ausentes no TP, poderá, depois de

uma sempre controversa ponderação dos ganhos e perdas, reconhecer à variação

linguística uma função periférica ou pouco significativa na economia da narrativa em causa

e optar por uma completa neutralização da variação linguística. Em determinados

contextos como os reportados por Toury (1995) ou Hatim (1990-91) em que as variedades

dialectais conhecem fortes conotações regionais e étnicas, o uso de variedades subpadrão

com a função de desprestígio poderá, inclusive, ser interpretado como um gesto ofensivo e

desrespeitador. Basil Hatim refere ainda que em determinados contextos a não-

preservação da variação linguística conhecerá sempre uma boa recepção pela acção de

uma norma literária que identifica a variante padrão e/ou clássica como a única compatível

com o modo escrito e o texto literário.

Por outro lado, determinados momentos históricos e enquadramentos geográficos

parecem motivar o uso de uma variedade subpadrão como língua de chegada, conduzindo

igualmente a uma neutralização da variação linguística presente no TP. Estudos como os

de Brissett (1996), Cronin (1996), Findlay (2000), Chapdelaine (2006) ou Briguglia (2007)

parecem permitir a associação entre a opção de dialectização e movimentos nacionalistas

120
Parte II - Modelo de Análise

que procuram afirmar a sua autonomia cultural e linguística face à língua tida como língua

nacional (caso de Espanha) ou variedade do antigo país colonizador (caso do Quebeque ou

Irlanda). Segundo Brisset, em momentos de valorização e afirmação de uma identidade

específica, a tradução “becomes an act of reclaiming, of recentring of the identity, a re-

territorialization operation” (1996: 165). A variedade padrão parece ter agora que competir

com uma variedade marginal a que não só é reconhecida maior dignidade e prestígio,

como é considerada a única capaz de expressar a identidade do grupo que a sanciona. No

seguimento do exposto anteriormente, a tradução de variedades padrão por variedades

não-padrão, revela uma atitude clara de contestação e subversão do sistema linguístico e

cultural, assim como das relações de poder nele reconhecidas.

3.2. Estratégia de manutenção da variação linguística

Optando pela recriação da variação linguística no texto de chegada, o tradutor vê-se

confrontado com a necessidade de trabalhar criativamente o código linguístico do contexto

de chegada, procurando o equilíbrio entre as diversas mediações que agem sobre o texto,

a recriação de variedade linguísticas em particular e os objectivos que regem a recriação.

Embora escassos sejam os estudos dedicados à tradução de variação linguística, têm sido

identificados dois movimentos principais: por um lado, a tendência para a normalização do

texto pela substituição de parte do discurso subpadrão por discurso padrão; por outro, a

tendência de, em certos momentos históricos, se identificar a tendência contrária de

substituição de parte do discurso padrão por discurso subpadrão. Se com uma estratégia

de não-manutenção da variação linguística a variação se via anulada pelo recurso a uma

única variedade linguística (seja esta a variedade padrão ou uma variedade subpadrão) (cf.

II-3.1), com uma estratégia de manutenção a diferenciação discursiva é mantida, ainda que

seja possível identificar em certos casos estratégias de expansão da variedade padrão

(tendência de normalização ou centralização) ou de expansão de variedades não-padrão

(tendência de descentralização).

121
Parte II - Modelo de Análise

3.2.1. Tendência para a normalização do texto de chegada

A tendência de normalização foi primeiro identificada em estudos como os de

Vanderauwera (1985), Leuven-Zwart (1989), Schlesinger (1991) ou Baker (1992) vindo a ser

formulada por Toury (1995) como uma lei hipotética de padronização crescente, que

procura dar conta do facto de em texto traduzido se identificar a tendência de aproximação

do texto traduzido à variedade padrão pela utilização em menor frequência de elementos

subpadrão relativamente ao TP. A identificação desta tendência em diversos corpora e

diversos pares de línguas levou a que fosse formulado como potencial universal de

tradução (Baker, 1993).

De entre os diversos estudos dedicados à tendência de normalização, merece especial

atenção neste estudo o trabalho desenvolvido por Hatim (1990-91), Ben-shahar (1994),

Dimitrova (1997, 2002), Brodovich (1997), Hatim e Mason (1997), Rosa (1999, 2001, 2004),

Sánchez (1999), Leppihalme (2000a, 2000b), Hervey et al. (2001), Määtä (2004), Nevalainen

(2004).

Procurando desenvolver o estudo da tradução da variação linguística e tendo em conta as

dimensões comunicativa, pragmática e semiótica da recriação de variedades linguísticas

em texto literário, Ben-Shahar (1994) propõe a seguinte hipótese: “translators of literary

dialogue are likely to reduce a linguistic-poetic-pragmatic source text into a linguistic-

poetic, even merely linguistic one” (1994: 197). Na esteira de Hatim e Toury, a autora,

identificando no seu corpus uma acentuada estratégia de normalização, pretende reforçar

o argumento de que será indispensável a ponderação das dimensões pragmática e

semiótica na tradução de variação linguística. Dimitrova (1997), tendo em conta o trabalho

desenvolvido por Ben-Shahar, propõe a disposição das variedades num contínuo onde

seriam alinhadas, da esquerda para a direita, uma variedade regional específica, uma

variedade de origem regional ou rural geral, uma variedade de origem social específica, um

registo marcadamente coloquial, uma variedade neutra e uma variedade escrita elevada.

Verificando no seu corpus que os elementos característicos de uma variedade regional ou

social específica eram tendencialmente substituídos por elementos de um registo

marcadamente coloquial, Dimitrova avança com a formulação da hipótese de que os textos

122
Parte II - Modelo de Análise

traduzidos tendem a apresentar um discurso mais normalizado que os textos de partida,

isto é, tendo em conta o contínuo anteriormente exposto, o texto traduzido tenderá a

manifestar um movimento da esquerda para a direita.

Olga Brodovich (1997), trabalhando sobre o par de línguas inglês/russo, reafirma a

importante mediação da tradição literária na recriação da variação linguística que, segundo

a autora, tem tido como resultado um conservadorismo sufocador do discurso literário

traduzido e um cada vez maior distanciamento do discurso literário traduzido relativamente

ao discurso literário original. Fica igualmente patente que a padronização do discurso pode

ser motivado pela especificidade das variedades linguísticas, cujo recurso numa obra

literária localizada num espaço, que não o da cultura de chegada, pode originar uma

incongruência não aceite pelo leitor. Neste caso, a suspensão da descrença activada

aquando da tradução para a variedade padrão2 parece não o ser aquando da tradução

para variedades subpadrão. A mesma questão virá a ser colocada em Hervey et al. (2001),

onde é assumido o recurso a variedades linguísticas como uma forma de relocalização

indirecta do enredo, podendo, como tal, resultar numa certa incongruência facilmente

rejeitada pelo leitor.

Tendo por objectivo testar a hipótese de Dimitrova nos pares de línguas finlandês/inglês e

finlandês/sueco, Leppihalme (2000a) desenha um novo contínuo adequado ao contexto de

chegada em que baseia o estudo3 , fazendo explicitamente corresponder esse alinhamento

a uma escala de prestígio que reconhece às diferentes variedades. Confirmando as

conclusões de Dimitrova, identifica igualmente a tendência de normalização, isto é, as

estratégias identificadas denunciam um movimento da esquerda para a direita no contínuo.

Apresenta ainda a hipótese de a distância cultural poder favorecer uma maior normalização

do texto de chegada, justificada pelo facto de os leitores da CC manifestarem um maior

2No seguimento do conceito de “suspension of desbelief” cunhado por Samuel Coleridge (1987), poderemos,
no contexto do presente estudo, reclamar o conceito de suspensão da descrença linguística. O conceito de
suspensão da descrença pretende referir-se a uma alegada disponibilidade por parte do leitor ou espectador em
aceitar como verdade as premissas de um produto ficcional, ainda que este pareça contradizer a realidade
quotidiana. O leitor ou espectador aceita suspender provisoriamente o seu juízo em troca da promessa de
entretenimento. Numa mesma linha de pensamento, o conceito de suspensão da descrença linguística,
pretende aqui referir-se a uma disponibilidade por parte do leitor ou espectador em aceitar em texto traduzido
que a personagem assuma uma língua distinta da falada no contexto em que a acção se desenvolve.
3 A autora alinha igualmente num contínuo a variedade de origem regional específica, a variedade de origem
rural geral, uma linguagem marcadamente coloquial e uma linguagem neutra (Leppihalme, 2000a: 227).

123
Parte II - Modelo de Análise

interesse no enredo e na localização deste do que nas especificidades linguísticas da CP.

Relevante para o presente estudo é igualmente a hipótese que levanta quanto à diferença

no juízo dos falantes relativamente às variantes linguísticas consoante a idade. Embora

tenham sido apenas três os falantes inquiridos, será importante verificar que tal corrobora a

hipótese levantada por este estudo de que, passando a evolução do sistema linguístico por

uma alteração na apreciação e juízo de valor dos falantes relativamente às variedades

linguísticas e ao aceite como linguisticamente “correcto”, parecem viáveis as hipóteses de

que, não só um público mais jovem será mais tolerante relativamente à recriação de

variedades linguísticas, como também que o sistema de valores em geral estará a

conhecer alterações no sentido de uma avaliação mais positiva tanto das variedades

dialectais, como da noção de inovação no discurso e da associação dessa noção ao

conceito de modernidade 4. Num outro artigo, e baseando novamente o seu estudo no par

de línguas finlandês/inglês, Leppihalme (2000b) tem a oportunidade de confirmar

novamente a tendência de normalização dos textos de chegada, enunciando agora a

hipótese de as estratégias identificadas sofrerem a mediação das expectativas do leitor

implícito. Refere ainda o recurso ao que enuncia como estratégias de compensação, isto é,

referência a elementos não linguísticos que permitam compensar a padronização do

discurso e transmitir parte dos significados conotados pela variação linguística.

Tendo em conta as propostas de Dimitrova (1997) e Leppihalme (2000a, 2000b), e com

base no par de línguas inglês/português, Rosa (1999 e 2001) propõe um terceiro modelo de

análise, procurando dar conta dos juízos de valor conotados por cada variedade. Em vez

de alinhadas num contínuo, as variedades linguísticas seriam agora organizadas num

sistema constituído por um centro de prestígio, onde são admitidas as variedades

codificadas e suportadas pela norma, e uma periferia de menor prestígio onde se

encontram as variedades não codificadas. Entre cada um dos extremos encontram-se as

4 Um exemplo de evolução do sistema linguístico no sentido de uma maior permissividade relativamente à


introdução de marcas de oralidade ou subpadrão, é-nos apresentado por Ben-Shahar (1994), que identifica um
progressivo aumento da taxa de frequência de marcas de oralidade e subpadrão no contexto do estado de
Israel a partir dos anos 60, em que se notava uma forte tendência de padronização motivada por uma norma
explícita de que a literatura cumpria uma função educativa e de implementação da língua, até ao final dos anos
70 em que os tradutores já recorriam mais frequentemente a uma recriação criativa e inovadora das variedades
linguísticas em texto literário.

124
Parte II - Modelo de Análise

diversas variedades não codificadas, nomeadamente o registo marcadamente coloquial ou

a variedade social, que, num afastamento progressivo do centro, se posicionam em

diferentes pontos do sistema. A partir deste modelo será possível enunciar a estratégia de

normalização como uma estratégia de centralização e a estratégia contrária como uma

estratégia de descentralização, formulações que nos permitem dar conta, não só do valor

sócio-semiótico atribuído a cada variedade, como também da atitude subjacente à

estratégia assumida. Partindo de um corpus constituído por textos traduzidos para

legendagem, Rosa (1999 e 2001), identificando diferentes factores contextuais motivadores

de ambas as estratégias, levanta as hipóteses de os canais públicos de televisão serem

mais centralizadores que os canais privados e de poder estar em curso uma evolução do

discurso em legendagem no sentido de uma maior permissividade relativamente à

presença de variedades linguísticas não-padrão.

A sugestão de organização das variedades linguísticas num sistema repartido num centro

de prestígio e uma periferia de desprestígio, vem a ser retomado por Nevalainen (2004) e

Dimitrova (2002), cujos estudos confirmam novamente a tendência de normalização, assim

como a distanciação, cada vez mais evidente no contexto finlandês, entre os textos

literários traduzidos, com um discurso mais centralizador, e os textos literários originais na

língua de chegada, com um discurso mais inovador.

Rosa (2004), com base num corpus de maiores dimensões distribuído entre 1950 e 1999,

identifica a tendência geral de normalização e a preferência por marcas de oralidade para a

demarcação do discurso como subpadrão, regularidades que permitem concluir quanto ao

preterir de conteúdos interpessoais e de sinais informativos em favor de conteúdos

referenciais que o discurso exprime. Relativamente ao nível linguístico seleccionado para

assinalar a marginalidade de variedade menos prestigiada, Rosa (2004) identifica ainda a

diminuição de marcas lexicais no corpus translato e um aumento das marcas

morfossintácticas, apresentando as marcas ortográficas valores mínimos. Tal como

apontado pela autora, estes dados vêm contrariar estudos como os de Dimitrova (1997),

que identifica a regularidade de desvio de marcas gráficas traduzidas por recurso a marcas

lexicais e, em poucos casos, a marcas morfossintácticas, e estudos como os de Rosa

125
Parte II - Modelo de Análise

(1998, 1999), onde a autora teve oportunidade de identificar a regularidade de desvio de

marcas morfossintácticas traduzidas preferencialmente como desvio lexical. A ponderação

de determinados atributos contextuais como a data de publicação, o tipo de público

(infanto-juvenil ou adulto) ou a dimensão dos TC, e a correlação de estratégias de tradução

de variedades literárias com os atributos contextuais seleccionados permitiu a identificação

das seguintes regularidades: aumento da presença de variedades sub-padrão nas últimas

décadas do período em análise apesar da tendência geral de normalização; valores

superiores relativamente à variedade padrão nos TC destinados a um público infanto-

juvenil; acentuação da tendência para evidenciar uma percentagem média de variedade

padrão mais elevada, quanto maior for a intervenção de condensação do TP.

Diversos são os factores e linhas de mediação activadas no momento de tradução e

múltiplas podem ser as motivações de uma estratégia de normalização e centralização.

Dos diversos estudos consultados, será possível aferir os seguintes factores:

a) A relação de prestígio que associa as culturas de partida e de chegada: seguindo as

propostas de Even-Zohar (1977) e Lefevere (1985), poderá ser levantada a hipótese

de a tendência de padronização resultar do reconhecimento de maior prestígio à

cultura de partida pela cultura de chegada, favorecendo em consequência o

reconhecimento de que só a norma será adequada para a tradução de um autor e

um texto considerados mais prestigiados ou canónicos. Bassnett e Lefevere (1990)

não deixam de referir a tendência de padronização de elementos exóticos ou

estrangeiros por parte de culturas centrais como a inglesa ou francesa numa atitude

de aculturação de elementos reconhecidos como socioculturalmente marginais;

b) Um contexto ideológico de chegada e acção de normas sociais e/ou literárias

favorecedores: tal como referido anteriormente, contextos de afirmação de uma

língua e de uma tradição literária, assim como contextos marcados por estruturas

políticas autoritárias podem favorecer estratégias de normalização, na medida em

que tendem a associar ao uso de variedades linguísticas em texto ficcional a noção

de incorrecto e não de inovação (Hatim 1990-91; Ben-Shahar, 1994; Toury, 1995;

Dimitrova, 2002);

126
Parte II - Modelo de Análise

c) Distância entre as culturas de partida e de chegada relativamente a estruturas

sociais, dificultando a identificação de paralelos entre códigos e conotações por eles

importadas para o texto, a graus de permissividade e à presença de variação

linguística em texto literário (Hatim, 1990-91; Ben-Shahar, 1994; Leppihalme, 2000a,

2000b);

d) O estatuto e posição reconhecida ao texto de partida, pelo autor do texto de partida

e pelo tradutor no sistema literário e cultural de chegada, assim como o perfil

sociocultural, ideológico e psicológico do tradutor (Dimitrova, 1997, 2002; Rosa,

2004);

e) Esforço de dignificação da actividade do tradutor: no mesmo sentido em que o

prestígio reconhecido à cultura, autor e texto de partida poderão favorecer uma

estratégia de normalização, também o prestígio da norma, comummente associada à

noção de correcto, exercerá pressão sobre o tradutor, no sentido em que este se

sentirá com menor liberdade de criação e inovação que os escritores de textos

originais na língua de chegada. Segundo Dimitrova (1997: 62) os tradutores

permitem-se poucas liberdades linguísticas por considerarem a sua tarefa em

conformidade com as normas do discurso escrito. (Ben-Shahar, 1994, 1998;

Dimitrova, 1997, 2002; Sánchez, 1999; Rosa, 1999, 2001, 2004);

f) Orientações editoriais ou do agente que encomenda a tradução (Rosa, 2004);

g) O perfil do público visado, uma vez que a recriação é mediada pela reconstituição

(especulativa) das expectativas do leitor (Leppihalme, 2000b; Rosa, 2004);

h) Importância reconhecida à função preenchida pela variação linguística na economia

da narrativa. Uma presença de variação linguística apenas através do discurso de

personagens secundárias pode levar o tradutor a considerar a sua função como

periférica e, consequentemente, a optar por uma estratégia de normalização

(Leppihalme, 2000b; Rosa, 2004);

i) A hierarquização dos elementos textuais a traduzir. Tal como formulado em Rosa, o

tradutor pode delinear uma hierarquização favorecedora “dos conteúdos referenciais

127
Parte II - Modelo de Análise

e sinais comunicativos em detrimento de conteúdos interpessoais e de sinais

informativos” (2004: 294);

j) Inexistência de uma norma ortográfica reconhecida pelo leitor (Dimitrova, 1997);

k) Difícil acesso ou inexistência de estudos dedicados à variação. A falta ou a fraca

divulgação de estudos confina o tradutor a trabalhar com base na sua intuição, não

só por ele próprio não dispor do conhecimento em causa, mas também por o público

leitor não dispor desse mesmo conhecimento (Dimitrova, 1997, 2002; Sánchez, 1999;

Hervey et al., 2001; Rosa, 2001);

l) Problemas de legibilidade e inteligibilidade. No caso do texto escrito, a introdução de

marcas subpadrão, pode comprometer a legibilidade ou mesmo inteligibilidade texto,

pela possibilidade de introdução de marcas gráficas, mas, fundamentalmente pela

introdução de elementos imprevistos, forçando o leitor a uma atenção e esforço

redobrados na leitura (Leppihalme, 2000b; Rosa, 2001). A mesma dificuldade de

inteligibilidade poderá ser enfrentada pelo receptor de um texto oral, caso o tradutor

recorra a desvios cujo siginificado sócio-semiótico não seja facilmente reconhecido

pelo espectador;

m) Previsão do risco de incongruência linguística. A especificidade das variedades

linguísticas pode levar a uma relocalização indirecta do enredo, podendo esta, no

caso de uma não suspensão da descrença resultar numa situação de incongruência

linguística não aceite pelo leitor (Dimitrova, 1997, 2002; Hervey et al., 2001);

n) Condições de trabalho: tempo insuficiente, baixa remuneração e meios de pesquisa

insuficientes (Leppihalme, 2000b; Rosa 2004).

3.2.2. Movimento de não-normalização do texto de chegada

Nos termos propostos por Rosa (1999, 2001, 2004), a esta estratégia de não-normalização

do texto de chegada será reconhecido um movimento de descentralização, no sentido em

que, não só é mantida a variação linguística e são introduzidos elementos característicos

de variedades menos prestigiadas, como certos elementos de discurso padrão poderão

ser substituídos por elementos de discurso subpadrão.

128
Parte II - Modelo de Análise

Esse movimento inverso foi identificado por estudos como os de Brisset (1996) ou Cronin

(1996), onde são identificadas motivações nacionalistas de afirmação de uma variedade

particular tida como expressiva de uma identidade específica, e por Rosa (1999, 2001) e

Ramos Pinto (2007a, 2007b), onde a tendência descentralizadora parece surgir associada a

uma evolução do sistema linguístico no sentido de uma maior tolerância quanto à

introdução de elementos característico do discurso oral ou subpadrão, assim como ao

grau de responsabilidade assumido pelo tradutor ou entidade que encomenda a tradução

relativamente à manutenção do discurso em conformidade com a norma. Embora tenha

sido identificada pela maioria dos estudos uma tendência normalizadora, não deixa de ser

igualmente descrita uma evolução gradual da tendência contrária, denunciadora, por um

lado, de uma valorização das variedades oral ou subpadrão e, por outro, de uma cada vez

maior tolerância à presença de elementos característicos dessas variedades em texto

ficcional. Será importante reter que a descrição desta tendência corrobora igualmente a

hipótese de que será de esperar taxas de frequência superiores nas traduções efectuadas

nos últimos anos do período em análise.

Múltiplas podem igualmente ser as motivações de uma estratégia de descentralização. Dos

diversos estudos consultados, será possível aferir os seguintes factores:

a) Um contexto ideológico de chegada e acção de normas sociais e/ou literárias

favorecedores;

b) Proximidade entre as culturas de partida e de chegada relativamente tanto a

estruturas sociais, facilitando a identificação de paralelos entre códigos e conotações

por eles importadas para o texto, e graus de permissividade quanto à presença de

variação linguística em texto literário;

c) Situação do sistema literário de chegada. Na esteira da proposta de Even-Zohar

(1977), uma estratégia de descentralização poderá denunciar uma atitude de

renovação do discurso ficcional pela introdução de novos elementos ou pela

importação de elementos ou forma discursivas num sistema ainda em fase de

constituição ou afirmação;

129
Parte II - Modelo de Análise

d) Situação do sistema linguístico do contexto de chegada. O reconhecimento e

valorização das diversas variedades linguísticas e, possivelmente, a associação da

noção de inovação à modernidade do discurso, podem constituir-se como

elementos favorecedores de uma estratégia de descentralização;

e) Percepção da sociedade relativamente à actividade de tradução e ao estatuto do

tradutor. O reconhecimento do tradutor como criador e da actividade de tradução

como criação, e não uma mera transferência formal, permitirá ao tradutor uma

liberdade de criação e inovação paralela ao dos escritores de textos originais na

língua de chegada;

f) O estatuto e posição reconhecidas ao texto de partida, ao autor do texto de partida e

ao tradutor no sistema literário e cultural de chegada, assim como o perfil

sociocultural, ideológico e psicológico do tradutor;

g) O público-alvo visado. Tendo em conta que a lingua inglesa é a língua de partida

mais habitual no contexto de tradução português e que uma razoável percentagem

do público geral domina, ou pelo menos conhece, a língua inglesa, uma estratégia de

descentralização poderá denunciar uma tentativa de anulação do risco de “feedback

effect” negativo (Gottlieb, 1994: 105), isto é, a percepção da discrepância (que

tenderá a ser interpretada como negativa) entre os textos de partida e de chegada

por via de uma co-presença dos textos de partida e de chegada (no caso da

legendagem ou de uma edição bilingue) ou de um conhecimento prévio da obra. Se

a introdução de marcas características de um discurso marcadamente oral ou

subpadrão poderá levar à identificação da tradução como uma “má tradução”,

presentemente, a não recriação da variação linguística presente no texto de partida,

poderá conduzir igualmente a um juízo negativo do trabalho do tradutor, que o

público considerará resultante de uma má interpretação do texto de partida;

h) A hierarquização dos elementos textuais a traduzir. Uma estratégia de

descentralização denunciará uma valorização dos conteúdos interpessoais e dos

sinais informativos;

130
Parte II - Modelo de Análise

i) Importância reconhecida à função preenchida pela variação linguística na economia

da narrativa. O reconhecimento da centralidade da função da variação linguística no

texto de partida contribuirá certamente para a opção por uma estratégia de

descentralização.

3.3. Tipologia das estratégias de tradução da variação linguística

Na medida em que os diversos estudos de caso apresentam diferentes estratégias,

pareceu-nos relevante, no contexto do presente estudo, desenhar uma tipologia mais

refinada que desse conta e organizasse as diferentes estratégias identificados nos vários

estudos. Dentro da abordagem descritiva em que se insere o presente estudo e sem

intenções prescritivas, o modelo desenvolvido pretende reunir numa tipologia única as

diferentes estratégias identificadas em diferentes contextos de forma a reduzir a dispersão

de informação para estudos futuros.

Figura 7: Tipologia das estratégias identificadas na tradução da variação linguística em texto ficcional.

131
Parte II - Modelo de Análise

Tal como houve anteriormente oportunidade de verificar, a grande maioria dos estudos faz

referência a uma primeira opção por parte do tradutor entre a preservação ou a não-

preservação da variação linguística presente no texto de partida. A opção pela não-

preservação poderá ter como resultado a completa normalização (no caso do uso da

variedade padrão) ou a dialectização (no caso do uso de uma variedade subpadrão) do

texto de chegada. A opção pela preservação da variação linguística dá lugar a um múltiplo

processo de decisão instaurador de um espaço de tensão onde o tradutor se vê obrigado a

trabalhar criativamente o código linguístico de chegada.

O tradutor encontra-se primeiro confrontado com a decisão entre a manutenção ou

alteração das coordenadas de espaço e tempo, sendo que as quatro combinações

possíveis surgem neste modelo organizadas em dois grupos com base nas opções de

manutenção ou não-manutenção das coordenadas de espaço. A alteração das

coordenadas de espaço do TP para as coordenadas de espaço do contexto de chegada,

poderá ser motivada pela previsão do risco de incongruência proveniente da localização

indirecta resultante do uso de variedades linguísticas específicas de um espaço ou grupo.

A alteração das coordenadas de tempo poderá encontrar a sua motivação, não só na

previsão do risco de incongruência, mas também na tentativa em evitar uma recriação

linguística histórica para a qual o tradutor poderá não dispor da informação ou do tempo

necessários.

A não-preservação das coordenadas de espaço conduzirá o tradutor à escolha entre o uso

de características familiares ao leitor do contexto de chegada (e reconhecidas como

particulares de variedades não-padrão) e características não familiares ao leitor do

contexto de chegada. Ao primeiro grupo são reconhecidos as seguintes estratégias de

tradução distribuídos num contínuo denunciador do grau de normalização do discurso

implicado pela estratégia em causa e que se desenha de uma maior a uma menor

normalização do discurso:

a) Inclusão de indicações escritas, comumente entre parênteses, após momentos de

discurso directo, informando o leitor de que a personagem proferiu tais palavras

numa variedade não-padrão. Este procedimento procura compensar a anulação de

132
Parte II - Modelo de Análise

informação implícita invocada pela associação de formas linguísticas a estereótipos

sociais, através da introdução de excertos informativos explícitos;

b) Redução da variação linguística a formas de tratamento. Embora não deixe de anular

os objectivos de autenticidade manifestos no TP, este procedimento informará o

leitor da relação hierárquica entre as personagens;

c) Uso criativo do nível de formalidade do discurso padrão, procurando assim que a

variação linguística seja conseguida entre um discurso mais ou menos formal e não

tanto pela introdução de formas linguísticas características de discurso oral ou

subpadrão. Esta opção pode inclusive almejar a uma total ausência de formas não-

padrão;

d) Recurso a formas linguísticas características do discurso oral: numa atitude descrita

por autores como Dimitrova (1997) ou Rosa (2004), o tradutor, tendo em conta a

rigidez da norma ortográfica, procura com este procedimento importar significados

associados às variedades subpadrão pela introdução de formas linguísticas

características do discurso oral. É neste sentido que a maioria dos estudos aponta

para uma preferência no recurso a características de natureza lexical e grafo-

fonéticas particulares do discurso oral em detrimento a características

morfossintácticas;

e) Recurso a formas linguísticas provenientes de diferentes variedades, promovendo a

identificação de uma variedade subpadrão geral. O recurso a uma “variedade geral”

no TP ou a diferença entre os sistemas sociolinguísticos de partida e de chegada

poderão estar na base de um procedimento promotor de uma polarização entre

padrão/correcto/prestígio em oposição a subpadrão/incorrecto/menor prestígio;

f) Recurso a formas linguísticas de uma única variedade linguística, promovendo a

identificação de uma variedade regional e/ou social específica e importando para o

texto os significados sócio-semióticos reconhecidos por qualquer leitor a essa

variedade.

Sob a opção pelo recurso a formas linguísticas não familiares ao leitor da CC, foram

reconhecidos as seguintes estratégias:

133
Parte II - Modelo de Análise

a) Importação directa de determinadas formas lexicais do TP. Esta estratégia consiste

em não traduzir determinados itens lexicais presentes no TP, parecendo ocorrer em

casos em que os itens lexicais em causa eram já considerados estranhos no TP ou

em casos em que o vocabulário da língua de partida é familiar ao leitor do texto de

chegada, não constituindo, assim um obstáculo à compreensão do texto. A

tentativa de não incorrer no risco de incoerência pela manutenção das coordenadas

de espaço, poderá motivar a opção por uma estratégia de importação de itens

lexicais como a presente;

b) Introdução de formas lexicais presentes no TP, mas representando-as no TC

conforme a norma ortográfica da LC. Este procedimento parece denunciar uma

tentativa em evitar simultaneamente o risco de incoerência e de estranheza

resultante da importação directa de formas lexicais presentes no TP;

c) Concepção de um “dialecto virtual”. Este procedimento foi identificado em

traduções de A Clockwork Orange de Anthony Burgess onde também a língua de

partida consistia num discurso inventado, um “dialecto virtual”, ainda que elaborado

com base na língua de chegada.

Os procedimentos reconhecidos à opção de não manutenção das coordenadas de espaço

são idênticos aos reconhecidos à opção de manutenção das coordenadas de espaço e

recurso a formas linguísticas familiares com excepção da inclusão de indicações escritas

após momentos de discurso directo e a redução da variação linguística a formas de

tratamento e forma de tratamento. A exclusão de ambos os procedimentos conhece a sua

justificação na motivação de base da opção pela não manutenção das coordenadas de

tempo, na medida em que, optando o tradutor por uma translocalização do enredo no

contexto de chegada de forma a evitar o risco de incoerência linguística já diversas vezes

referido, não será de esperar que opte por procedimentos que anulem ou diminuam em

grande medida a presença de formas linguísticas características de variedades não-

padrão.

São reconhecidos como objectivos do presente estudo a identificação, com base na

tipologia desenvolvida, das estratégias presentes no corpus de chegada e o posterior

134
Parte II - Modelo de Análise

reconhecimento de possíveis regularidades existentes entre as estratégias identificadas e

elementos contextuais como o meio a que se destina, a data de tradução e a função que

lhe é reconhecida no contexto chegada.

3.4. Tipologia de classificação das variedades literárias em tradução e o

estabelecimento de uma escala de prestígio

Tendo em conta que a recriação ficcional de variedades linguísticas recupera e importa

significados sócio-semióticos reconhecidos às variedades, permitindo uma caracterização

indirecta das personagens e das relações de poder que entre elas se estabelecem, para

efeitos da análise pretendida por este estudo, será necessário identificar os significados

conotados pelas variedades para posteriormente definir as categorias que permitam dar

conta desses mesmos significados. No desenhar da tipologia de classificação foram tidas

em consideração as tipologias desenvolvidas por Dimitrova (1997, 2002), Rosa (1999,

2004) e Leppihalme (2000a, 2000b).

Na classificação das unidades frásicas constituintes dos corpora de partida e de chegada

foram assim utilizadas as categorias, frase padrão (frase distinguida pela ausência de

marcas desviantes - morfossintácticas, lexicais, gráficas - relativamente às descrições

disponíveis tanto do inglês britânico como do português europeu padrão) e frase não-

padrão (frase distinguida pela presença de marcas desviantes - morfossintácticas, lexicais,

gráficas - relativamente às descrições disponíveis tanto do inglês britânico como do

português europeu padrão). A classificação da frase como frase não-padrão foi

dependente da identificação do número mínimo de 1 elemento desviante, seja este de

natureza morfossintáctica, lexical ou gráfica.

De forma a dar conta dos elementos extralinguísticos conotados, a categoria ‘frase não-

padrão’ conheceu uma categorização secundária identificadora da distinção a fazer entre

‘frase oral’, expressiva de marcas de oralidade, e ‘frase subpadrão’, expressiva de marcas

subpadrão. Embora os estudos linguísticos disponíveis não classifiquem o discurso oral

como uma variedade não-padrão, a categoria ‘oral’ foi aqui definida como uma

subcategoria da categoria ‘frase não-padrão’, na medida em que as marcas de oralidade

135
Parte II - Modelo de Análise

em discurso ficcional são normalmente conotadas como desvio próximo do subpadrão

pelo desvio que representam face ao grau de formalidade que o discurso escrito costuma

assumir e, possivelmente, face à norma ortográfica, no caso de se tirar partido de marcas

gráficas. A categoria ‘frase subpadrão’ conheceu ainda uma sub-categorização onde se

pretende dar conta da identificação do estrato sociocultural baixo através da categoria

‘subpadrão social’ e de região periférica através da categoria ‘subpadrão regional’. Na

categoria ‘frase padrão’ terão assim lugar os significados de prestígio, estrato sociocultural

alto e região central. Tendo em conta que o uso de marcas desviantes classificáveis como

‘subpadrão social’ poderá ter a identificação de um grupo social específico como

motivação, e não apenas a identificação de classe social baixa, foi ainda considerada a

categoria ‘subpadrão social específico’.

Relativamente ao nível linguístico através do qual será codificado o desvio face à norma

padrão é à norma ortográfica, foram consideradas as categorias, ‘desvio morfossintáctico’,

‘desvio lexical’ e ‘desvio gráfico’.

Assim sendo, a tipologia desenhada foi a seguinte:

Figura 8: Tipologia da classificação das variedades literárias expressiva dos significados comunicativos e
do valor socio-semiótico das variedades.

Depois de considerada a proposta de estabelecimento de um contínuo de prestígio por

Dimitrova (1997) e o seu desenvolvimento e aplicação em Leppihalme (2000a, 2000b) e

Rosa (1999, 2004), foi igualmente elaborada neste estudo uma escala de prestígio que

procura dar conta do valor socio-semiótico das variedades em causa. Relativamente ao

contínuo estabelecido por Rosa (1999, 2004) referente ao mesmo contexto de chegada, a

136
Parte II - Modelo de Análise

escala de prestígio aqui proposta, além de considerar uma categoria adicional – subpadrão

social específico –, cuja justificação foi anteriormente exposta, vem organizar as variedades

de forma distinta reconhecendo à variedade subpadrão regional uma posição de maior

prestígio face à variedade subpadrão social. Procurando dar conta do valor socio-

semiótico das variedades seleccionadas, estas foram organizadas, no seguimento da

proposta de Rosa (1999) não sob a forma de um contínuo, mas antes de um sistema:

Figura 9: Sistema de prestígio de variedades literárias.

A este sistema é reconhecido um centro de prestígio, ocupado pela variedade codificada e

associada ao modo escrito, e uma periferia de menor prestígio da qual se aproximam

variedades não codificadas e associadas ao modo oral. No centro de prestígio encontra-se

posicionada a variedade padrão, sendo que num progressivo afastamento desse centro se

encontram as variedades oral, subpadrão regional, subpadrão social e subpadrão social

específico, denunciando um igualmente progressivo reconhecimento de menor prestígio

por parte da comunidade.

137
Parte II - Modelo de Análise

Uma vez evidente a escassez de estudos e de dados actualizados, face aos quais se

pudesse testar esta hipótese de alinhamento das variedades, foi realizado um questionário5

a 40 alunos da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa em Junho de 2006. Não

sendo possível neste estudo a recolha e o tratamento do número de dados necessário para

um estudo representativo e conclusivo do valor comunicativo e sócio-semiótico das

variedades linguísticas em Portugal, optou-se por efectuar um pequeno estudo ilustrativo,

cujos dados, ainda que não nos permitam reclamar representatividade, permitirão reclamar

intersubjectividade, constituindo-se assim, não só uma fonte de dados que nos permitem

testar a nossa hipótese de alinhamento das variedades, como também um estudo

preliminar onde diversas hipóteses de estudo poderão ser formuladas.

Ponderemos sobre os dados obtidos neste inquérito. Retendo por agora a nossa atenção

nos dados obtidos nos grupos II e III são observáveis os seguintes comportamentos:

a) No grupo II, os desvios denunciadores de oralidades, conheceram sempre a

percentagem mais alta na categoria ‘mais correcto’ independentemente do nível

linguístico do desvio (Grupo II.A.1 – 47%; Grupo II.B.2 – 81%; Grupo II.C.3 – 50 %);

b) No grupo II, a grande maioria dos inquiridos, classificou como ‘razoável’ os desvios

característicos de uma variedade subpadrão regional (Grupo II.B.3 – 72%; Grupo

II.C.1 – 50%). Embora seja reconhecida uma excepção no grupo II.A.3 onde 50%

dos inquiridos atribuíram a classificação de ‘menos correcto’, não poderemos deixar

de notar a percentagem elevadas de inquiridos que atribuíram a classificação de

‘mais correcto’ (35%), permitindo levantar a hipótese de que o desconhecimento de

forma lexical regional poderá estar na origem destes valores;

c) Ainda no grupo II, os desvios característicos de uma variedade subpadrão social

conheceram as percentagens mais altas na categoria ‘menos correcto’ (Grupo II.B.1

– 78%; Grupo II.C.2 – 76%). Embora uma excepção tenha sido já reconhecida no

Grupo II.A, não pode deixar de ser reconhecida a elevada percentagem na categoria

5O questionário a que os inquiridos responderam no dia 27 de Junho de 2006 poderá ser consultado no anexo
B. As características da amostra com base na qual foram recolhidos estes dados, assim como a totalidade dos
dados obtidos neste inquérito estão expostas no anexo C.

138
Parte II - Modelo de Análise

‘menos correcto’ (32%) atribuída à unidade frásica classificada como subpadrão

social;

d) No grupo III, onde cabia aos inquiridos a classificação das unidades frásicas

relativamente à variedade linguística, nível linguístico e nível de gravidade do desvio,

é possível observar a associação feita entre as categorias ‘oral’ e ‘variedade regional’

e a categoria ‘pouco grave’, assim como a associação da categoria ‘variedade

social’ e a categoria ‘muito grave’. Entre as categorias ‘oral’ e ‘variedade regional’

será importante observar que a segunda conhece percentagens mais elevadas na

categoria ‘grave’.

Com base nos dados conseguidos no inquérito, o alinhamento das variedades será

semelhante ao proposto anteriormente, pelo que se vê confirmada a hipótese levantada

por este estudo.

3.5. Contínuo relativo ao grau de incorrecção reconhecido às marcas linguístico-

textuais por um falante médio

À semelhança do procedimento adoptado anteriormente relativamente às variedade

literárias, foi igualmente desenhado um contínuo de ponderação do grau de incorrecção do

desvio, isto é, um contínuo que, estendendo-se do grau máximo de gravidade ao grau

mínimo, pretende dar conta do juízo de um falante médio relativamente ao grau de

gravidade que este atribui ao desvio. A proposta do presente estudo é de que os níveis

linguísticos seleccionados podem ser organizados num contínuo como o seguinte:

Figura 10: Contínuo relativo ao grau de incorrecção reconhecido às marcas linguístico-textuais

139
Parte II - Modelo de Análise

Também neste caso a hipótese formulada foi testada com os dados adquiridos através do

questionário realizado, sendo que os seguintes comportamentos puderam ser

identificados:

a) Os desvios de natureza morfossintáctica conhecem os valores mais elevados na

categoria ‘muito grave’. Deve no entanto ser feito o apontamento de que os desvios

morfossintácticos denunciadores de oralidade e de um registo coloquial, são

classificados maioritariamente como ‘pouco graves’;

b) Embora os valores relativos aos desvios de natureza lexical e gráfica se encontrem

bastante próximos, é possível verificar que os desvios de natureza lexical conhecem

valores superiores na categoria ‘pouco grave’ relativamente aos desvios de natureza

gráfica e que estes conhecem valores superiores na categoria ‘grave’ relativamente

aos desvios de natureza lexical.

Assim sendo, o alinhamento proposto pelos dados obtidos no inquérito será semelhante ao

exposto anteriormente, pelo que se vê igualmente confirmada a hipótese levantada pelo

presente estudo.

A análise aqui proposta pretende efectuar um estudo comparativo do TP e dos diversos TC

incluídos no corpus paralelo, envolvendo os seguintes procedimentos:

a) Identificação e classificação das variedades literárias presentes no TP e nos TC,

com base na tipologia definida em I-3.5;

b) Análise comparativa das percentagens de ocorrência e das médias identificadas em

cada uma das categorias e identificação de comportamento de manutenção ou

desvio;

c) Classificação das estratégias identificadas como gerais, predominantes ou

secundárias segundo o definido em I-1.3.

d) Identificação de possíveis relações de correlação entre as regularidades e

estratégias reconhecidas nos sub-corpora e as variáveis contextuais seleccionadas.

140
Parte II - Modelo de Análise

3.6. Factores contextuais condicionantes da acção de tradução

Seguindo a proposta de Toury e procurando contribuir para a formulação de normas e de

leis hipotéticas probabilísticas, os dados obtidos numa primeira análise quantitativa serão

trabalhados no sentido da identificação de regularidades tradutórias e de relações de

correlação entre as regularidades identificadas e elementos do contexto sociocultural de

chegada, procurando responder a diversas perguntas: qual a relação de prestígio entre as

culturas de partida e de chegada? Qual o contexto histórico, sociocultural e ideológico

motivador da tradução? Qual a valorização das variedades linguísticas e literárias nos

sistema sociolinguísticos de partida e de chegada? Qual a valorização dos diferentes meios

a que se destinaram as traduções constituintes do corpus em estudo?

Procurando descortinar o contexto sociocultural em que será considerada a actividade do

tradutor, foram definidos determinados elementos contextuais, cujo cruzamento com os

dados quantitativos obtidos nos permitirá responder às perguntas de partida. A saber: o

meio a que se destinou, o momento histórico em que foi realizada a tradução e a função

que lhe é reconhecida no contexto de chegada.

3.6.1. Meio a que se destina a tradução

Tendo em conta as especificidades de cada um dos meios expostas no capítulo anterior ,

assim como a tipologia da variação segundo o meio exposta em II-1, na análise a

desenvolver no presente estudo serão ponderadas três categorias que consideramos dar

conta dos diferentes tipos de texto constituintes do corpus reunido: texto escrito para ser

lido, texto escrito para ser dito como se não fosse escrito e texto escrito para ser lido

enquanto ouvido e acompanhando imagem. Tais categorias darão conta, respectivamente,

dos textos traduzidos para publicação em livro, dos textos traduzidos para representação

em palco, e dos textos traduzidos para emissão em ecrã televisivo sob a forma de

legendagem.

O facto de as variedades linguísticas não conhecerem na sua grande maioria uma norma

ortográfica, estando por isso associadas ao discurso oral, torna a recriação literária dessas

variedades um momento de particular dificuldade e tensão pela necessidade de

141
Parte II - Modelo de Análise

importação de características do modo oral para o modo escrito, comummente associado

à norma padrão. A hipótese levantada pelo presente estudo é a de que a recriação literária

de variedades linguísticas será correlata, entre outros elementos, da consideração do meio

a que se destina, sendo levantada por este estudo a hipótese de ser possível identificar

estratégias e/ou procedimentos específicos de cada um dos meios em estudo. Assim

sendo, uma vez classificadas as unidades tradutórias nos sub-corpora de partida e de

chegada e obtidas as percentagens médias para cada uma das categorias definidas,

proceder-se-á a uma análise comparativa das percentagens médias e à ponderação de

relação de correlação entre as regularidades de comportamento identificadas e as variáveis

contextuais definidas.

3.6.2. Data de realização da tradução

A ponderação e cruzamento das datas atribuídas aos textos traduzidos em estudo numa

análise comparativa das percentagens médias, permitirá avaliar a evolução do sistema

linguístico português e perceber em que sentido ocorre essa evolução. A hipótese

levantada por este estudo é a de que a evolução do sistema linguístico português passa

pela alteração na apreciação e no juízo de valor dos falantes relativamente às variedades

linguísticas e ao aceite como linguisticamente “correcto”, sendo assim de esperar que as

traduções mais recentes apresentem percentagens mais altas na categoria variedade

subpadrão.

Tendo este estudo como um dos objectivos principais a ponderação da variável meio como

correlata das estratégias e procedimentos de tradução, serão organizados, com base nas

categorias definidas relativamente ao meio, três contínuos distintos onde os textos de

chegada serão distribuídos cronologicamente, de forma a ser igualmente considerada a

evolução do sistema linguístico no contexto de cada um dos meios identificados.

3.6.3. Função prospectiva da tradução

Considerando a função prospectiva reconhecida a uma tradução como um importante

elemento mediador do processo tradutório, foi desenhado, no contexto do presente

142
Parte II - Modelo de Análise

estudo, um modelo que procura dar conta das diferentes funções a assumir por um texto

ficcional no contexto de chegada.

Figura 11: Funções prospectivas a assumir por textos traduzidos no contexto de chegada.

No seguimento das propostas do New Historicism and Cultural Materialism, assim como da

proposta de Lefevere expostas em II-2.2, é possível aqui reconhecer movimentos de

consolidação, subversão e contenção que devem ser analisados dentro do contexto de

produção do texto.

Será aqui relevante fazer a distinção entre a função prospectiva mediadora do processo

tradutório e a função de facto reconhecida no contexto de chegada, assim como

reconhecer a possibilidade de não-coincidência dos dois conceitos, na medida em que a

função reconhecida a uma tradução pelo público receptor poderá diferir da função

esperada pelo tradutor e/ou agente promotor da tradução. Embora o estudo da função

enfrente dificuldades em termos de o desvelar da motivação promotora e propósitos a

cumprir pela tradução, é reconhecido neste estudo a possibilidade do investigador levantar

143
Parte II - Modelo de Análise

hipóteses relativamente à função a cumprir por determinada estratégia tradutória, tendo

sido esse o argumento sustentador do modelo aqui apresentado. No contexto deste

estudo, com base em elementos recolhidos por via de entrevistas aos tradutores ou

agentes promotores da tradução, serão levantadas hipóteses relativamente à função

prospectiva da tradução e da relação a existir entre estas e as estratégias tradutórias

identificadas nos textos.

144
Parte
III

Metodologia de Análise

Selecção e concepção do corpus

Concepção do corpus paralelo

Metodologia de anális semi-automática do corpus paralelo


Parte III - Metodologia

CAPÍTULO 1
SELECÇÃO E CONCEPÇÃO DO CORPUS

Tendo em conta que a selecção e concepção do corpus, no qual se baseia um qualquer

estudo, se apresentam como etapas fundamentais para a prossecução e êxito da análise,

este capítulo pretende dar conta das etapas de definição e concepção, assim como dos

problemas enfrentados, tanto do corpus paralelo como dos sub-corpora em que se baseia

este estudo.

A maioria dos estudos em Tradução, segundo Baker (1995: 225), tem encarado o conceito

de corpus como um conjunto relativamente reduzido de textos não digitalizados e, como

tal, trabalhados manualmente. Alguns destes estudos são alvo de sérias críticas por

pretenderem retirar conclusões gerais sem terem previamente em conta problemas de

representatividade ou legitimidade do corpus, outros, por não apresentarem a motivação ou

as etapas de concepção do corpus em análise. Este capítulo é assim norteado pelo intuito

de criar um estudo, que, expondo de forma transparente e clara todo o processo, permita,

não só a acumulação de dados para efeitos de formulação de leis teóricas, como também

um espaço para uma possível contestação futura.

1.1. Critérios de concepção e selecção de um corpus

Sinclair propõe a seguinte definição de corpus: “corpus is a collection of pieces of language

that are selected and ordered according to explicit linguistic criteria in order to be used as a

sample of language” (1995: 19). Por seu lado, Atkins, Clear e Olster, adicionando algo mais,

definem corpus como “a subset of an ETL1, built according to explicit design criteria for a

specific purpose” (1992:1). O corpus é, portanto, um conjunto de textos organizados em

categorias seleccionadas com base em critérios específicos - quantitativos e qualitativos

(Doorslaer, 1995); internos e externos (Sinclair, 1995) - definidos de acordo com o objectivo

do estudo e o método seleccionado.

1 ETL é o acrónimo de "Electronic Text Libray" (Atkins, CLear e Olster, 1992: 1).

145
Parte III - Metodologia

Segundo Sinclair, que não deixa de chamar a atenção para o facto de corpus ser agora

uma "buzz-word", na medida em que "all sort of things are being called corpora because it

is so fashionable" (1995:17), a criação de um corpus de linguagem representativo segue

necessariamente determinados critérios externos e internos, qualitativos e quantitativos. Os

critérios externos são extralinguísticos e socioculturais, dizendo respeito aos participantes,

à ocasião e ao contexto social dos fragmentos de textos em análise. Os critérios internos

são textuais e decorrentes das características linguísticas dos textos, dizendo respeito à

recorrência a padrões de língua entre os fragmentos de textos. Segundo Doorslaer (1995),

outros critérios devem ser tidos igualmente em conta aquando da selecção dos textos a

incluir no corpus, nomeadamente critérios qualitativos e quantitativos. Seguindo este autor,

a necessidade e exigência de critérios quantitativos deve-se à aspiração por estudos cada

vez mais representativos e exaustivos de onde se possam extrair normas colectivas

(1995:246); contudo, operando com um corpus de linguagem literária, nem só em métodos

e critérios quantitativos se pode basear a selecção - estes devem ser temperados e

acompanhados por critérios qualitativos que tenham em conta as características

específicas dos constituintes do corpus (1995:249).

Retomando a proposta de Sinclair (1995), um corpus assume certas características por

defeito, cabendo ao investigador clarificar o leitor quanto a possíveis desvios relativamente

ao esperado. Os valores das características assumidas por defeito são os seguintes:

a) Quantidade. Espera-se que um corpus compreenda uma grande quantidade de dados.

Toury, em Descritive Translation Studies and Beyond, avança o seguinte:

Needless to say, one assumed translation, or even one pair of texts, would not
constitute a proper corpus for study, if the intention is indeed to expose the
culturally determined interdependencies of function, process and product, not
even for that one translation. Any aspiration to supply valid explanations would
therefore involve an extension of the corpus according to some principle:
translator, school of translators, period, text-type, text linguistic phenomenon, or
any other principle which could be given a justification. (1995: 38)

146
Parte III - Metodologia

Uma vez que a bibliografia secundária não fornece dados específicos quanto ao que seriam

limites (mínimos ou máximos) aconselháveis, foi tida como referência, à semelhança de

Rosa (2004), a dimensão de corpora analisados em projectos similares como Kenny (1999),

Overas (1996, 1998) e Gellerstam (1986). Este estudo procurou a selecção de um corpus

suficientemente grande para que fosse possível a identificação de regularidades partilhadas

por diversos textos, mas não de uma grandeza demasiada que pudesse vir a comprometer

uma análise sólida e fundamentada das unidades que o compõem.

A dimensão do corpus está naturalmente relacionada com a metodologia e análise

adoptadas, o enquadramento teórico e os objectivos do estudo; contudo, condicionantes

como o número de investigadores (no presente caso, apenas um), a limitação temporal e a

disponibilidade das traduções conhecidas dos textos literários em causa, mostraram ser

factores condicionantes e restritivos da dimensão do corpus.

Intimamente ligada à questão da dimensão do corpus está a questão da representatividade

do mesmo. Num estudo como o presente, com base num corpus não representativo o

propósito não poderá ser o de extrapolação de comportamentos gerais com base numa

amostra, mas antes o testar de hipóteses a partir de dados que permitirão reclamar

intersubjectividade. No seguimento da proposta de Sinclair que desvaloriza a exigência de

representatividade neste tipo de corpora2, optou-se por uma exposição clara de todas as

categorias da tipologia adoptada, assim como a sua motivação, de forma a que a descrição

seja o mais completa e replicável possível.

b) Qualidade. Uma vez que o valor assumido por defeito relativamente a esta categoria é a

autenticidade, impõe-se esclarecer que este se trata de um corpus especial, na medida em

que integra linguagem exclusivamente ficcional e não quotidianamente utilizada de forma

genuína e espontânea pelos falantes (Sinclair, 1995: 23-24).

2 Considerando a dificuldade de definição de um corpus de linguagem representativo, Sinclair defende que “[u]

ntil we know a lot more about the effects of our design strategies, we must rely on publishing a list of exactly
what is in a corpus […]. Users and critics can then consider the constitution and balance of the corpus as a
separate matter from the reporting of the linguistic evidence of the corpus” (1991: 13).

147
Parte III - Metodologia

c) Simplicidade. É esperado que o corpus seja apresentado em caracteres ASCII3. Neste

sentido, todo o corpus foi primeiro convertido para formato "texto simples" sobre o qual se

realizou uma primeira análise, e posteriormente reanalisado de forma qualitativa, por forma

a serem tidos em conta factores gráficos como, por exemplo, o uso de itálicos.

c) Atributos contextuais documentados. No seguimento do parâmetro anterior, os

detalhes relativamente aos constituintes do corpus devem, segundo Sinclair, ser

apresentados separadamente dos constituintes em si, sendo tidos em consideração

apenas na selecção dos textos a incluir no corpus ou na consideração de um tipo

específico de análise. No presente estudo foi, no entanto, considerado que no estudo da

tradução estes dados devem, no entanto, ser tidos em conta aquando da análise, na

medida em que um dos objectivos do estudo é perceber o grau de correlação entre estes e

as variáveis textuais. No seu mais recente estudo (2004), Olohan não deixa de alertar que

da parceria entre os Estudos de Tradução e a Linguística de Corpus devem resultar estudos

que, combinando dados quantitativos e qualitativos, explorem os factores pragmáticos e o

contexto de que os textos traduzidos necessariamente são fruto. Tendo em conta os avisos

de diversos autores presentes na bibliografia secundária (Mason, 2001; Olohan, 2004; Nord

1991; Lambert 1995, Laviosa, 1997, Doorslaer, 1995 e outros), os constituintes do corpus

resultaram de um aperfeiçoamento qualitativo dos métodos quantitativos da selecção,

impondo-se por essa mesma razão a identificação por uma lista de atributos extratextuais e

a sua apresentação em anexo neste estudo (vide anexo B).

No seguimento da proposta apresentada em II-1.3.1, foram seleccionados, para uma

identificação dos textos de partida, os seguintes conjuntos de atributos extratextuais:

a) Textos dramáticos de partida: língua; modo literário; género literário; autor; título;

meio (impresso em volume ou periódico, manuscrito); título do volume; local de

publicação; editora; data de publicação; número de páginas.

3 Nos anos 60, a necessidade de padronização da linguagem computacional conduziu ao American Standard
Code for Information Interchange (ASCII). O texto formatado em ASCII, convertendo um conjunto de
caracteres numa representação numérica, permite aos computadores armazenarem e partilharem dados com
outros computadores e programas, pelo que o ASCII não contém informações de formatação como o negrito,
itálico ou tipos de letra.

148
Parte III - Metodologia

b) Textos televisivos de partida: língua; género televisivo; subgénero televisivo;

realizador; título; meio; data de produção.

Ainda no seguimento da proposta apresentada em II-1.3.1, foram tidos em consideração,

relativamente aos textos de chegada, os seguintes conjuntos de atributos:

a) Traduções para publicação: língua; modo literário; género literário; autor; título;

meio; local de publicação; editora; data de tradução; data de publicação; publicação

em colecção (sim/não); título da colecção; número de volumes da colecção; número

do volume; número de páginas do volume; número de páginas da tradução;

características especiais (imagens, tabelas, ilustrações, banda desenhada);

publicação do nome do(s) tradutor(es) (sim/não); nome do(s) tradutor(es); tiragem; re-

edições e republicações.

b) Traduções para teatro (palco): língua; género teatral; subgénero teatral autor; título;

meio; encenadores; local de representação; hora de representação; data de tradução;

data de encenação; número de páginas; nome do(s) tradutor(es); re-encenações.

c) Traduções para TV (legendagem): língua; género televisivo; subgénero televisivo;

realizador; autor; título; meio; tradução comercializada (sim/não); formato de

comercialização (VHS, DVD); local de emissão; data de tradução; data de

comercialização/emissão; hora de emissão; quadro de programação, nome do(s)

tradutor(es); re-emissões.

Impõem-se ainda como essenciais mais dois aspectos a ter em consideração aquando da

concepção do corpus:

a) O método de selecção do corpus. Relativamente ao método de selecção do corpus

impõe-se novamente a necessidade de uma apresentação clara dos critérios com

base nos quais se definiu e descreveu o corpus em que se baseou o presente estudo.

A população-alvo pode ser descrita do ponto de vista da produção ou da recepção e

apurada com base em métodos de selecção aleatória ou análise sistemática da

população-alvo e das categorias a preencher. Pretendendo este estudo definir um

corpus que represente sobretudo a produção, a população-alvo será definida como

um conjunto de obras produzidas como traduções para português de textos

149
Parte III - Metodologia

dramáticos britânicos, recorrendo a um método de selecção não aleatória dos textos

baseado em métodos quantitativos e qualitativos, externos e internos.

b) A escolha por um corpus de amostras ou de textos integrais. As críticas ao uso

de corpus de amostras prendem-se, sobretudo em relação a textos ficcionais, ao

facto de, considerando o texto ficcional como uma unidade orgânica, o uso de

amostras vir, por um lado, quebrar o jogo de relações entre os diferentes elementos

do texto e, por outro, poder incorrer no perigo "of having all his soldiers the same

height" (Sinclair, 1995). Contudo, a automatização da análise permite-nos

actualmente trabalhar com amostras suficientemente vastas que permitam a

ponderação e análise de padrões textuais mais extensos, acrescendo ainda o

benefício de ser possível ter em conta um número de textos que possibilita uma

análise diacrónica por um só investigador, que a consideração de textos integrais

tornaria impraticável.

1.2. O Corpus paralelo inglês/português

1.2.1. Concepção do corpus paralelo

O corpus paralelo concebido para este estudo abarca dois sub-corpora: um primeiro

composto por textos ficcionais originalmente escritos em inglês (TD-Ing); e um segundo

composto pelas respectivas traduções em português (TDT-Port).

A constituição do corpus a servir de base para o estudo aqui proposto exigiu uma tipologia

que permitisse uma classificação específica e exigente dos diferentes tipos de corpora de

tradução. Com base na tipologia proposta por Laviosa (1997), desenvolvida no contexto do

projecto TEC4 (um corpus comparável monolingue), e da sua aplicação em Rosa (2004),

serão tidos em conta os diferentes parâmetros considerados por esta autora, traduzindo

isto um esforço em repartir com outros projectos uma mesma tipologia que permita uma

mais fácil e eficaz partilha de dados entre a comunidade científica dos Estudos de

Tradução. A tipologia referida compreende diversos parâmetros organizados em cinco

4 Acrónimo de Translational English Corpus.

150
Parte III - Metodologia

níveis hierárquicos: o nível I compreende parâmetros referentes a aspectos gerais, os

seguintes incluem parâmetros que vão tornando a classificação progressivamente mais

específica e particular para o estudo pretendido.

NÍVEL I

I.a. Tipos de Corpus: Texto Integral, Amostras, Misto ou de Monotorização

I.b. Tipos de Corpus: Sincrónico ou Diacrónico

I.c. Tipos de Corpus: Geral ou Terminológico

I.d. Tipos de Corpus: Monolingue, Bilingue ou Multilingue

I.e. Tipos de Corpus: Língua(s) do corpus

I.f. Tipos de Corpus: Escrito, Oral ou Misto

NÍVEL II

II.a. Tipos de Corpus Monolingue: Simples ou Comparável

II.b. Tipos de Corpus Bilingue e Multilingue: Paralelo

NÍVEL III

III.a. Tipos de Corpus Simples: Translato ou Não-Translato

III.b. Tipos de Corpus Comparável: Dependente da tradução ou Independente da tradução

III.c. Tipos de Corpus Paralelo: Monodireccional ou Bidireccional

Com base na tipologia delineada, os diferentes corpora necessários para o presente estudo

são classificados da seguinte maneira:

a) Sub-corpus dos textos ficcionais britânicos (TD-ing): especial, ficcional, composto

por amostras, diacrónico, geral, monolingue, em inglês (variedade britânica), Misto

(escrito e oral), simples e não-translato.

b) Sub-corpus dos textos ficcionais traduzidos para português (TDT-Port): especial,

ficcional, composto por amostras, diacrónico, geral, monolingue, em português

(variedade europeia), escrito, simples e translato.

151
Parte III - Metodologia

c) Corpus paralelo: especial, ficcional, composto por amostras, diacrónico, bilingue,

em inglês e português, linguagem geral e escrita, paralelo e monodireccional não

alinhado.

Em combinação com os três primeiros níveis, foi adicionado, ainda com base na proposta

de Laviosa (1997), um outro nível de classificação que permitiu uma classificação específica

dos corpora translatos:

NÍVEL IV

IV.a. Tipos de corpus translato (número de línguas de partida): Língua de partida única, Duas

línguas de partida ou Várias línguas de partida

IV.b. Tipos de corpus translato (modo de tradução): Modo de tradução único, Modo de

tradução duplo ou Modo de tradução múltiplo. Podemos reconhecer o recorrer a um, dois ou a

diferentes dos seguintes modos de tradução:

Escrito: Tradução escrita de um TP escrito

Tradução escrita de um TP oral ou transcrito

Tradução escrita de um TP oral

Oral: Tradução Oral de um TP escrito

Interpretação: simultânea, consecutiva, bidireccional (um intérprete alterna duas línguas

como LP e LC)

IV.c. Tipos de corpus translato escrito a partir de um TP escrito (modo específico) 5 : Texto para

ser dito, Texto para ser dito como se não tivesse sido escrito, Texto para ser lido, Texto para

ser lido como se fosse ouvido ou pensado, Texto para ser lido enquanto ouvido, ouvido e

acompanhado por imagem ou ouvido e acompanhado por representação, Texto para ser lido

em substituição do que é ouvido, Misto (integra textos em dois ou mais modos específicos)

IV.d. Tipos de corpus translato (método de tradução): Método de tradução único, Método de

tradução duplo ou método de tradução múltiplo. Podemos reconhecer o recurso a um dos

5Com base na tipologia de Ian Mason (2001), foi adicionada esta categoria, por forma a que a tipologia utilizada
desse conta de um corpus que compreendesse textos em meios distintos, ainda que o estudo recaia sobre a
produção e o modo seja apenas um, o escrito.

152
Parte III - Metodologia

seguintes métodos: Tradução humana, Tradução automática ou Tradução humana assistida

pelo computador

IV.e. Tipos de corpus translato: LC como língua materna, LC como língua estrangeira, LC como

língua de uso habitual ou Misto

IV.f. Tipos de corpus translato (estatuto de tradutor): Profissional ou Estudante

IV.g. Tipos de corpus translato: Publicado, Não publicado ou Misto 6

De acordo com o novo conjunto de parâmetros, o TDT-port apresenta-se ainda como um

corpus com uma única língua de partida (inglês britânico), um único modo de tradução

(escrito - tradução escrita de um TP escrito ou de um TP oral transcrito), ainda que

compreenda textos com diferentes sub-categorias deste mesmo modo (textos para serem

lidos, textos para serem ditos como se não tivessem sido escritos e textos para serem lidos

enquanto ouvidos e acompanhado por imagem), um único método de tradução (tradução

humana), profissional, com a língua de chegada como língua materna e língua estrangeira e

de textos publicados e não publicados.

1.2.2. Motivação metodológica e prática para a constituição do TDT-Port

Recuperando a classificação anteriormente apresentada, o TDT-Port apresenta-se como

um corpus especial, ficcional, composto por amostras, diacrónico, geral, monolingue, em

português europeu, escrito, simples e translato, com uma única língua de partida (inglês

britânico), um único modo de tradução (escrito - tradução escrita de um TP escrito ou de

um TP oral transcrito), ainda que compreenda textos com diferentes especificações deste

mesmo modo (textos para serem lidos, textos para serem ditos como se não tivessem sido

escritos e textos para serem lidos enquanto ouvidos e acompanhados por imagem), um

único método de tradução (tradução humana), profissional, com a língua de chegada como

língua materna e língua estrangeira e de textos publicados e não publicados.

6O valor "misto" na categoria IV.g. foi igualmente adicionado para feitos deste estudo, na medida em que um
corpus que se pretende multimedial incluirá necessariamente textos publicados e não publicados.

153
Parte III - Metodologia

No sentido de um estudo claro e replicável, como tem vindo a ser defendido ao longo deste

capítulo, haverá agora lugar para a justificação de algumas das opções tomadas na

concepção e selecção dos textos a incluir no TDT-port, selecção essa feita com base em

dados qualitativos e quantitativos, assim como na ponderação de uma selecção de

bibliografia secundária.

1.2.2.1. Corpus diacrónico

Embora o estudo da evolução das normas de tradução se tenha vindo a delinear como um

dos objectvos a ter em conta na análise, não foi esse o principal critério de selecção do

corpus. Relativamente a limites temporais foi apenas imposto o critério de serem

unicamente incluídas traduções de textos publicados no século XX, de forma a: a)

minimizar o grau de influência da variável relativa à actualização do discurso; b) poder

incluir a legendagem como um dos tipos de tradução em análise; c) estudar as normas de

tradução num período ainda pouco estudado7 no que ao modo dramático diz respeito; d)

estudar a tradução num período de profundas mudanças culturais e ideológicas e a forma

como a tradução poderá ter sido influenciada por estas mudanças.

Neste sentido, o escopo cronológico foi definido pela data das traduções seleccionadas,

delimitando uma amplitude temporal de 1945 a 2001.

1.2.2.2. Uma única língua de partida - o inglês

Na sequência da escolha de um corpus monodireccional, optou-se por incluir somente uma

língua de partida - o inglês - e apenas na sua variedade britânica, ainda que tenha sido

ponderado o facto de a inclusão de outras línguas de partida tornarem o estudo mais

abrangente. As limitações temporais para a realização deste estudo, o facto de ser

realizado por apenas um investigador, assim como a competência linguística deste foram

elementos determinantes para mais esta restrição. A escolha da variedade britânica da

língua inglesa prende-se, não só ao facto de esta ser, tal como foi avançado por Rosa

7 Os estudos realizados sobre a tradução em Portugal recaem sobretudo no século XIX, embora já sejam
conhecidos estudos como o de Rodrigues (5º vol, 1999), de Christine Zurbach (1997) ou de Rosa (2004).

154
Parte III - Metodologia

(2004), a variedade mais leccionada na Europa, mas sobretudo porque a ponderação de

diferentes variedades não britânicas do inglês conduziria à introdução de uma nova variável

tida como não pertinente para o estudo pretendido.

1.2.2.3. O suporte expressivo e o modo de tradução

De acordo com o objectivo proposto de estudar a diferença nas normas de tradução

segundo o meio, e perante a inclusão de traduções para teatro (palco) e TV (legendagem),

impôs-se a necessidade de optar entre a análise do texto escrito ou do produto final: a

representação teatral, o filme. A opção pela análise do produto final suscitaria inúmeros

problemas teóricos e metodológicos (nomeadamente a consideração da polémica questão

da tradução intersemiótica), ao mesmo tempo que levaria a uma diminuição drástica do

corpus, na medida em que nos obrigaria a seleccionar apenas os textos dramáticos, cujos

espectáculos estivessem ainda em cena ou registados em vídeo ou DVD. Neste sentido, e

na medida em que interessava aqui estudar as opções do tradutor e não tanto a relação do

texto traduzido com os restantes elementos que compõem o produto final, a opção feita

pendeu no sentido de ser considerado apenas um meio ou suporte expressivo – o escrito –

assim como dois modos de tradução – a tradução escrita de um TP escrito e a tradução

escrita de um TP oral transcrito.

1.2.2.4. Um corpus monolingue

Embora a consideração de um corpus multilingue permitisse alargar o escopo da análise,

optou-se por considerar apenas uma língua de textos de chegada - o português - e apenas

na sua variedade europeia. Este critério deve-se não só à competência linguística da

investigadora, como também à impossibilidade de realizar uma pesquisa fora do país, que

se mostrava indispensável para a obtenção dos textos e das informações extratextuais

relativas aos mesmos. Ainda que seja reconhecida pela autora deste estudo a fragilidade

do argumento, optou-se pelo local de publicação como critério de selecção, tendo sido,

como tal, apenas incluídos textos publicados em Portugal.

155
Parte III - Metodologia

1.2.2.5. Um único método de tradução

Optando por um corpus de linguagem geral, constituído por textos ficcionais, o método de

tradução seria naturalmente a tradução humana, deixando de parte a tradução automática

ou a assistida por computador.

1.2.2.6. Amostras ou textos integrais

Não deixando de ter em conta as críticas feitas, nomeadamente por Sinclair (1995), ao uso

de amostras em detrimento de textos integrais, este estudo considerou pertinente o uso de

amostras, na medida em que a análise semi-automática tornaria possível a consideração de

amostras suficientemente vastas, que minimizariam os problemas normalmente apontados

aos corpora de amostras. Pretendendo este estudo debruçar-se sobre a tradução da

variação linguística, foram seleccionadas, tanto nos textos de partida como nos respectivos

textos de chegada, todas as falas da principal personagem falante de cockney - Eliza. Esta

amostra mostrou ser suficientemente grande de modo a permitir a consideração de

padrões textuais como, por exemplo, a evolução da personagem, mas não de uma

extensão excessiva, que obrigasse à redução do número de obras a incluir no corpus.

1.2.2.7. Tradução profissional e estudante

Como se pode ler em Rosa (2004), é considerada tradução profissional, a tradução

realizada por tradutores "para os quais a tradução constitui uma ocupação quer principal

quer secundária, independentemente do tipo de formação específica que têm" (2004: 423).

Por tradução estudante é tida a tradução "produzida num contexto de ensino" (2004: 423).

Para efeitos deste estudo foram apenas tidas em consideração traduções profissionais 8.

1.2.2.8. Disponibilidade dos textos - publicados e não publicados

Na selecção de um corpus que pretende abarcar traduções a serem apresentadas em

diferentes meios, a consideração e inclusão de textos não publicados tornou-se uma

8Os resultados apresentados por Lörscher (1991 e 2005) apresentam a distinção entre tradução profissional e
não-profissional.

156
Parte III - Metodologia

necessidade, na medida em que as traduções orientadas para a representação teatral ou

legendagem raramente conhecem a publicação em livro ou em qualquer outro suporte.

Com a transcrição e disponibilização de tais traduções neste estudo, espera-se assim

contribuir para a divulgação de traduções desconhecidas até ao momento e que poderão

ser alvo de análise por estudos futuros.

1.2.3. Selecção e constituição do corpus translato

1.2.3.1. Etapas da constituição do corpus translato

Tendo este estudo como objectivo o estudo da tradução para português da variação

linguística em textos dramáticos britânicos num contexto multimedial, a recolha e

constituição dos corpora referidos foi iniciada pela constituição do TDT-Port, tendo sido a

partir dos textos nele incluídos que vieram a ser definidos os textos a conformar o TD-Ing.

A delineação dos limites do TDT-Port tomou lugar pelas seguintes etapas:

1.2.3.1.1. Identificação da população-alvo

A identificação da população-alvo começou por ser feita através do levantamento de todos

os textos dramáticos em língua inglesa traduzidos e publicados em Portugal no século XX.

Contudo, as limitações de qualquer uma das bases de dados consultadas (PORBASE,

Catálogo de Livros Publicados da APEL, Volume V de A Tradução em Portugal) tanto pela

sua incompletude, como pelas limitações que apresentam em termos de pesquisa,

confirmaram, por um lado, a morosidade de uma tarefa a ser efectuada por um só

investigador; por outro, o não atingir de resultados fiáveis que justificassem tamanha

diligência. Sendo objectivo deste estudo a análise de estratégias de tradução num contexto

multimedial e que, tratando-se de textos dramáticos, um dos meios a ter necessariamente

em conta seria a representação teatral, mostrou-se mais prático e exequível a recolha de

dados, e consequente listagem, de todas as traduções portuguesas de textos dramáticos

representados (ou pelo menos ensaiados) em Portugal por companhias profissionais 9.

9Esta restrição permitiu um resultado mais completo e fiável, na medida em que não há um registo completo
das companhias amadoras existentes em Portugal no século XX e que estas poucos registos mantêm dos seus
espectáculos.

157
Parte III - Metodologia

Nesta etapa foram consultadas a CET Base (Base de dados dos espectáculos realizados

em Portugal do Centro de Estudos de Teatro da Faculdade de Letras da Universidade de

Lisboa) e a base de dados informatizada e arquivos manuais do Museu Nacional de Teatro.

Embora seja uma listagem necessariamente incompleta face à realidade, a relação

conseguida reunia ainda assim cerca de 1780 textos 10.

1.2.3.1.2. Selecção dos textos a incluir no TDT-Port

Conseguida esta primeira lista, procedeu-se a movimentos graduais de circunscrição que

permitissem atingir um corpus pertinente para a prossecução do objectivo deste estudo e

de possível análise por um só investigador. Dessa lista foram identificados os textos de

língua inglesa e, em seguida, os textos cujo autor era de nacionalidade britânica11 ,

resultando daí uma segunda relação de 362 textos.

Sendo objectivo deste estudo analisar a tradução de textos escritos e traduzidos no século

XX, foram em seguida identificados os textos, cuja data de representação se situaria entre

1901 e 2001. Daqui resultou uma listagem de 253 textos, permitindo concluir que a grande

maioria dos textos em língua inglesa foram traduzidos e representados no século XX.

Com base nas recomendações de Malmkjaer (1998), foram seguidamente excluídos todos

os textos com menos que duas representações/traduções conhecidas para teatro, de forma

a se evitar, tanto quanto possível, o perigo de analisar o estilo de um só tradutor quando o

objectivo será procurar normas de tradução. Deste movimento de restrição resultou um

conjunto de 29 textos.

A partir dessa relação já reduzida de autores e textos dramáticos, e tendo em conta que

este estudo pretende estudar a tradução num contexto multimedial, foram identificados os

textos que tivessem conhecido traduções apresentadas em dois ou mais meios distintos.

Neste sentido foram consultadas as seguintes fontes:

10 Todos os dados recolhidos foram obtidos no ano de 2005.


11 Embora seja amplamente reconhecido por este estudo as limitações deste critério, ele não deixou de ser
considerado por dois motivos: a) a impossibilidade de confirmar as variedades linguísticas de cada um dos
textos pela leitura de cada um deles; b) a possibilidade oferecida pela CET Base de fazer uma pesquisa por
nacionalidade de autor.

158
Parte III - Metodologia

a) O Catálogo de Livros disponíveis, disponível em CD-ROM pela Associação

Portuguesa de Editores e Livreiros, que permitiu ter acesso às obras publicadas em

Portugal entre 1901 e 2001 pelas editoras suas associadas. Esta pesquisa revelou-se,

no entanto, bastante lacunar por na realidade não dar conta de certas edições

encontradas posteriormente nas bases de dados apresentadas nas alíneas c), d) e e).

b) O Quinto volume de A Tradução em Portugal de 1999 que reúne as referências de

traduções portuguesas publicadas até 1930.

c) O Catálogo do Fundo British Council, disponível através da base de dados da

Fundação Calouste Gulbenkian onde se encontra alocado. Incluindo obras

publicadas entre 1600 e 1979, tornou possível completar a informação pelo acesso a

traduções publicadas durante o século XX em décadas não abarcadas pelo quinto

volume de A Tradução em Portugal.

d) O Catálogo Colectivo em Linha das Bibliotecas Portuguesas (PORBASE) que, embora

pretenda possibilitar o acesso ao depósito legal da Biblioteca Nacional, apresenta

certas limitações tanto em termos de catalogação de certas edições ainda não

introduzidas na base, como pelas limitações da pesquisa. Foi, no entanto, possível

dar conta de diversas referências que permitiram acrescentar dados à informação

adquirida anteriormente.

e) A pesquisa feita na PORBASE via internet foi confirmada in loco na base SIRIUS da

Biblioteca Nacional e no ficheiro manual da mesma, permitindo completar ainda mais

a informação recolhida até então.

f) A Internet Movie Database, onde foi possível reunir dados sobre todas as adaptações

cinematográficas e televisivas dos diferentes textos dramáticos em causa.

g) A base de dados informatizada da empresa Blockbuster de aluguer de vídeos e DVD,

que permitiu tomar conhecimento das edições em VHS e DVD das adaptações

conhecidas e da sua comercialização em Portugal12 .

12 Mostrou-se importante conhecer as versões comercializadas em Portugal, na medida em que uma tradução
só é encomendada depois de garantida a sua comercialização num determinado país. Será de notar que as
versões comercializadas em VHS e DVD conhecem traduções diferentes realizadas por tradutores/empresas
distintas.

159
Parte III - Metodologia

h) O volume Estreias em Portugal (1918 - 1957) de Luís de Pina através do qual foi

possível perceber quais as versões cinematográficas exibidas em Portugal e reunir

dados relativamente aos cinemas em que tinham sido exibidos os filmes em causa no

período em questão.

i) A informação recolhida neste volume foi confirmada e complementada com a

consulta da Base de Dados do Centro de Informação e Documentação da

Cinemateca Portuguesa que permitiu não só confirmar os dados obtidos

anteriormente, como também recolher informações relativamente aos filmes exibidos

em Portugal na segunda metade do século XX.

j) A base de dados da Videoteca Municipal de Lisboa onde foi possível reunir dados

relativamente às versões em VHS das adaptações cinematográficas dos textos

dramáticos em causa.

k) As bases de dados electrónicas das três principais estações portuguesas de televisão

- RTP, SIC e TVI - por forma reunir os dados necessários quanto à emissão dos filmes

em causa.

l) O arquivo manual da RTP onde foi possível reunião informação relativa aos filmes

emitidos nas primeiras décadas do século XX, visto que a base de dados electrónica

apenas reúne dados relativos às emissões com data posterior a 1962.

Tendo em conta os resultados conseguidos com este último movimento de restrição, o

texto Pygmalion de George Bernard Shaw e as suas respectivas traduções foram tidos

como os mais pertinentes para o estudo pretendido. Esta escolha teve lugar com base em

três critérios determinantes: a) ser a única obra distribuída por diferentes meios13; b) o facto

de as traduções portuguesas serem em número considerável, cumprindo o objectivo de

mais de duas traduções em cada um dos meios seleccionados); c) de diversas serem as

personagens falantes de uma variedade subpadrão (neste caso cockney).

13Embora pudessem ter sido integrados neste corpus textos distintos em cada um dos meios optou-se, perante
a oportunidade, pela selecção de um texto que se distribuísse pelos diferentes meios por forma a reduzir ao
mínimo possível o número de variáveis a ter em conta.

160
Parte III - Metodologia

Além de Pygmalion, foi ainda incluído o texto My Fair Lady, cujo argumento se baseia na

obra de G. Bernard Shaw. Apesar de não fazer parte da relação de textos anteriormente

apresentada e de não ser de um autor britânico, My Fair Lady foi seleccionado para integrar

o corpus por, além de apresentar um texto bastante próximo do de G. Bernard Shaw14 e de

cumprir os mesmo critérios que levaram à selecção de Pygmalion, de imediato se ter

mostrado uma mais valia para o corpus, uma vez que permitia aumentar o número de

traduções do corpus, tornando-o mais sólido e representativo, sem que assim aumentasse

as variáveis a ter em consideração.

1.2.3.1.3. Recolha de dados contextuais específicos dos textos seleccionados

Definidas as diversas traduções que conformariam o corpus e definido que os meios em

causa seriam a publicação em livro, representação teatral e legendagem, foi necessário

persistir na pesquisa no sentido de recolher o maior número de informação quanto possível

relativamente ao contexto específico de publicação, representação ou exibição dos textos

em causa (vide anexo B). Assim sendo, foram ainda consultados:

a) Os elementos paratextuais das obras publicadas.

b) As editoras. De forma a completar a informação obtida pela consulta dos elementos

paratextuais das obras publicadas, foram contactadas as editoras ainda em

funcionamento, tendo sido possível obter informações relativamente ao volume da

tiragem ou público alvo, assim como relativamente ao impacto da tradução na data

de publicação.

c) Programas de espectáculos e jornais. Relativamente às traduções orientadas para

a representação teatral, foram consultados os programas dos espectáculos (quando

disponíveis) e as críticas e anúncios publicados em jornais nacionais 15

14 Embora My Fair Lady seja uma comédia musical assinada por Alan Jay Lerner (texto) e Frederic Loewe
(música), é um texto que se apresenta como uma versão musical de Pygmalion, cujo argumento segue
praticamente na íntegra. Neste sentido, embora os textos, assim como as suas traduções, sejam consideradas
como autónomas (o mesmo acontece com a diferentes versões de Pygmalion), a inclusão de My Fair Lady
mostrou ser uma mais valia para o corpus pretendido.
15
Foram consultados os seguintes jornais no arquivo da Biblioteca Nacional: O Século, O Diário Popular e O
Mundo Literário.

161
Parte III - Metodologia

d) Os registos de emissão da RTP. Consultando manualmente os ficheiros diários de

programação relativamente aos anos compreendidos entre 1957 e 1972 e numa base

de dados electrónica os dados relativos aos anos subsequentes, foi possível reunir os

dados necessários relativamente à data e hora exacta de emissão, o quadro de

emissão em que foi o filme apresentado, assim como o número de re-emissões, tanto

no Canal 1 como no Canal 2.

e) Os registos de emissão da SIC, que permitiram recolher o mesmo tipo de

informações relativamente aos quadros de emissão da SIC. Não sendo possível a

consulta pessoal dos registos por um investigador, a recolha desta informação foi

conseguida via e-mail e telefone, sendo de louvar a disponibilidade e atenção com

que o presente estudo foi acolhido.

f) Os registos de emissão da TVI não foram consultados nesta etapa, na medida em

que anteriormente tinha sido recolhida a informação de que os filmes em causa não

tinham sido exibidos por esta estação de televisão.

1.2.3.2. Textos incluidos no TDT-Port

Embora sejam dezasseis as traduções conhecidas de Pygmalion e My Fair Lady, apenas

doze conformam o corpus a analisar, na medida em que uma foi excluída por ser o único

elemento de tradução para DVD (legendagem) e por ter sido de todo impossível ter acesso

a três das traduções: tradução para cinema (legendagem) da adaptação cinematográfica de

Pygmalion de 1938 visionada no cinema Monumental; tradução para teatro (palco) de My

Fair Lady ensaiada no Teatro Monumental; e a tradução para VHS (legendagem) de My Fair

Lady de 1994. Os textos que vieram a integrar o TDT-Port são agora aqui expostos

cronologicamente e agrupados consoante o meio a que se destinam:

162
Parte III - Metodologia

Traduções para publicação

[TC1] Pigmalião: análise da peça de Bernard Shaw, precedida da respectiva tradução

portuguesa, de G. Bernard Shaw, trad. de Marina Lopes Prieto. Coimbra: Edição de autor,

1962, 136pp.

[TC2] My Fair Lady: Comédia musical em dois actos baseada no Pygmalion de Bernard

Shaw, de Alan Jay Lerner e Frederick Loewe, trad. de H. Silva Letra e trad. dos versos de

Gervásio Lopes. Lisboa: Portugália Editora, 1966, 151pp.

[TC3] Pigmalião: romance em cinco actos, de G. Bernard Shaw, trad. de Fernando Mello

Moser, Lisboa: Edições Verbo (Bilioteca Básica Verbo/RTP, nº 74), 1972, 178pp.

[TC4]. Pigmalião, de G. Bernard Shaw, trad. de Mário de Abreu. Mem Martins: Publicações

Europa-América (Livros de Bolso Europa-América, nº 483), 1987, 127pp.

[TC5]. My Fair Lady, Minha Linda Senhora, de Alan Jay Lerner e Frederic Loewe, trad. de

Filipe La Féria e Helena Rocha. Lisboa: Publicações Europa-América (Grandes Clássicos do

Teatro), 2001, 137p.

Traduções para teatro (palco)

[TC6] Pigmalião, de G. Bernard Shaw, trad. de António Lopes Ribeiro, 1944 (texto

dactilografado, policopiado e não-publicado).

[TC7] Pigmalião, de G. Bernard Shaw, trad. Luís Francisco Rebelo e José Palma e Carmo,

1974 (texto dactilografado, policopiado e não publicado).

[TC8] My Fair Lady, Minha Linda Senhora, de Alan Jay Lerner e Frederic Loewe trad. de

Filipe La Féria e Helena Rocha, 2001 (texto dactilografado, policopiado e não publicado).

Traduções para TV (legendagem)

[TC9] Minha Linda Lady, filme de George Cukor, trad. de J. Nunes de Carvalho e

legendagem de Teresa Sustelo, 1987 (legendas transcritas manualmente a partir do produto

exibido a 8 de Abril de 1987, no Canal 1 da RTP, e a 6 de Outubro de 1991, no Canal 2 da

RTP).

163
Parte III - Metodologia

[TC10] Pigmalião, filme de Anthony Asquith, trad. de Ruth Saraiva, 1994. (legendas

transcritas manualmente a partir do produto exibido a 9 de Fevereiro, no Canal 1 da RTP).

[TC11] Pigmalião, filme de Alan Cook, trad. de Rosário Vieira, 1995 (legendas transcritas

manualmente a partir do produto exibido a 28 de Março, na SIC).

[TC12] Minha Linda Lady, filme de George Cukor, trad. de Eulália Ramos, 1996 (legendas

transcritas manualmente a partir do produto exibido a 24 de Dezembro na SIC).

1.2.4. Concepção e constituição do corpus não-translato

Recuperando a classificação anteriormente apresentada, o TD-Ing apresenta-se como um

corpus especial, ficcional, composto por amostras, diacrónico, geral, monolingue, em inglês

(variedade britânica), misto (escrito e oral), simples e não-translato. A selecção dos textos a

integrar neste corpus, tendo sido definido que o corpus paralelo seria dependente da

tradução, esteve inteiramente dependente dos textos seleccionados para integrarem o TDT-

Port, isto é, foram incluídos os textos identificados como respectivos textos de partida dos

textos incluídos no TDT-Port. Os textos são agora apresentados respeitando as categorias

delineadas aquando da exposição dos textos do TDT-Port:

Textos de partida das traduções para publicação e das traduções para teatro (palco)

[Pyg16] Androcles and the lion; Overruled; Pygmalion, de G. Bernard Shaw, London:

Constable, 1916 (versão disponível em www.bartleby.com).

[Pyg57] Pygmalion, de G. Bernard Shaw, London: James Brodie, 1957.

[MFL56] My Fair Lady: a musical play in two acts based on Pygmalion by Bernard Shaw, de

Alan Jay Lerner e Frederic Loewe, New York: New America Library, 1956.

Textos de partida das traduções para TV (legendagem)

[Pyg38] Pygmalion, argumento escrito do filme Pygmalion de Anthony Asquith e Leslie

Howard, 1938. [in David Lean (s.d.), Pygmalion, dialogue cutting continuity, USA: Loew's

Incorporated].

164
Parte III - Metodologia

[Pyg83] Pygmalion, argumento escrito do filme Pygmalion de Alan Cooke, 1983. [in Dukore,

Bernard F. (1980), The Colected screenplays of Bernard Shaw, London: George Prior

Publishers].

[MFL64] My Fair Lady, argumento escrito do filme My Fair Lady de George Cukor, 1964.

(screenplay oficial disponível em http://www.script-o-rama.com/movie_scripts/m/my-

fair-lady-script-transcript.html).

165
Parte III - Metodologia

166
Parte III - Metodologia

CAPÍTULO 2
CONCEPÇÃO DO CORPUS PARALELO ELECTRÓNICO

Tendo este estudo em vista proceder a uma análise semi-automática dos dados, este

capítulo pretende dar conta dos processos de digitalização, formatação, selecção dos

textos e, posteriormente, de identificação das unidades de classificação necessárias à

criação do corpus paralelo electrónico. A descrição pormenorizada de todos os passos

adoptados pretende, mais uma vez, tornar este estudo o mais claro e replicável possível.

2.1. Criação do sub-corpus não-translato

Como referido no capítulo anterior, os textos a constituir o sub-corpus não-translato foram

seleccionados pela identificação dos respectivos textos de partida a compreender o sub-

corpus translato. No caso de Pygmalion, sendo conhecidas diversas versões desse mesmo

texto, os textos de partida foram identificadas através de: a) informação disponibilizada em

entrevista pelos próprios tradutores; b) informação presente em elementos paratextuais; c)

análise das diferenças reconhecidas entre cada um dos textos. No caso de My Fair Lady,

não havendo diferentes versões do texto, o processo de correspondência foi evidente.

Relativamente aos textos de partida das traduções orientadas para legendagem, foram

conseguidos os guiões disponibilizados pelas distribuidoras e disponíveis no arquivo da

Cinemateca Portuguesa.

A impossibilidade de recorrer a corpora electrónicos já disponíveis, obrigou a que este sub-

corpus fosse criado ab initio, recorrendo a processos de digitalização seguidos de cotejo

dos textos junto das edições publicadas e banda sonora dos filmes. No caso da versão de

1916 de Pygmalion, face à impossibilidade de aceder de imediato ao texto já fora do

mercado editorial, recorreu-se a uma versão digitalizada do texto disponível em

www.bartleby.com, vindo este a ser confirmado mais tarde com o exemplar disponível na

British Library em Londres. As restantes versões publicadas - versão de 1957 de Pygmalion

e 1956 de My Fair Lady -, disponíveis no mercado, foram digitalizadas com recurso ao

167
Parte III - Metodologia

programa TextBridge, versão Pro11. Os argumentos dos filmes seleccionados, não

publicados, mas disponibilizados pelas distribuidoras, foram igualmente digitalizados,

recorrendo ao mesmo programa e equipamento.

O texto foi ainda submetido a uma anotação indicativa do texto de que provém, da

personagem a que cada frase é atribuída e das fronteiras de frase ortográfica. Assim sendo,

no início de cada frase surgem entre parênteses angulares abreviaturas indicadoras do

texto de partida (Pyg16 - Pygmalion de 1916; Pyg38 - Pygmalion de 1938; Pyg57 -

Pygmalion de 1957; Pyg83 - Pygmalion de 1983; MFL56 - My Fair Lady de 1956; MFL64 -

My Fair Lady de 1964); da personagem (E - Eliza) e do número de frase (por exemplo: <s1>

para frase 1). Como exemplo será transcrita a sexta frase de Eliza na versão de 1938 de

Pygmalion:

<Pyg38 E S6> I can give you change for a tanner, kind lady.

O sub-corpus não-translato compreende amostras compostas por todas as falas da

personagem Eliza Doolitle, tanto em Pygmalion como em My Fair Lady. A dimensão do sub-

corpus não-translato resulta, portanto, do grau de alterações feitas pelos autores entre as

diversas versões conhecidas dos textos a compreender o sub-corpus.

A dimensão do sub-corpus não-translato pode ser melhor percepcionada pela contagem

de todas as frases e palavras exibidas na tabela seguinte:

NÚMERO DE FRASES NÚMERO DE PALAVRAS

Pygmalion (1916) 487 4380


TP PUBLICADOS
Pygmalion (1957) 586 4999
EM VOLUME
My Fair Lady (1956) 348 2561

Pygmalion (1938) 348 2877


TP - ARGUMENTOS
My Fair Lady (1964) 392 2850
FÍLMICOS
Pygmalion (1983) 485 4278

Tabela 1: Dimensão do sub-corpus não-translato (número de frases e palavras)

168
Parte III - Metodologia

2.2. Criação do sub-corpus translato

Tal como havia sido feito com os textos do sub-corpus não-translato, alguns dos textos do

sub-corpus translato - traduções orientadas para a publicação em volume e representação

teatral - foram digitalizados, recorrendo ao programa TextBridge, versão Pro11. Procedeu-

se posteriormente à selecção de todas a falas da personagem Eliza Doolittle e cotejo com

os textos em suporte de papel. No caso das traduções orientadas para a legendagem, as

falas da personagem foram transcritas manualmente a partir das gravações em VHS e DVD

disponibilizadas para este estudo.

Por uma questão de uniformidade, foram seguidos os mesmos critérios na anotação das

frases do sub-corpus translato, tendo sido tida ainda em consideração uma anotação

adicional indicadora de processos de manutenção, divisão, união, supressão e acrescento

de frases nos textos de chegada relativamente aos textos de partida. Assim sendo, no

início de cada frase surgem entre parênteses angulares abreviaturas indicadoras: 1) do

texto de chegada numerados de 1 a 12, respeitado primeiro uma divisão por meios e

depois uma ordem cronológica; 2) da personagem (E - Eliza); e 3) dos diferentes processos 1

em seguida exemplificados:

Frase mantida na tradução (1:1)


<Pyg57 E S6> I can give you change for a <TC3 E S7> Tenho troco de dez xelins, minha
tanner, kind lady. rica senhora.

Frase dividida na tradução (1:2)


<Pyg57 E S112>I know what lessons <TC4 E S111> Sei tão bem cumo vossemecê
cost as well as you do; and I’m ready to canto custam umas lições! <s112> E estou
pay. pronta pagá-las!

Frases unidas na tradução (1:½)


<Pyg57 E S104> I want to be a lady in a <TC4 E S105> <s2> Quero trabalhar cumo uma
flower shop stead of sellin at the corner of senhora numa loja de flores imbez de ser
Tottenham Court Road. bendedeira numa esquina de Tottenham Court
Road, <s2> mas eles no m’aceitam se eu no falar
<Pyg57 E S105> But they wont take me melhor.
unless I can talk more gentel.

1 A tipologia identificadora dos diferentes processos seguiu de perto o modelo desenvolvido no âmbito do
projecto COMPARA desenvolvido por Ana Frankenberg-Garcia e Diana Santos. Os resultados do projecto,
assim como a metodologia seguida podem ser consultados em http://www.linguateca.pt/COMPARA/
anotacao_gramatical.php.

169
Parte III - Metodologia

Frase suprimida na tradução (1:0)


<Pyg57 E S15> I can give you change, <TC4 E S15> Eu faço-le troco, Cap’tão.
Captain.

<Pyg57 E S16> Garn! <s>


<Pyg57 E S17> Oh do buy a flower off me, <TC4 E S16> Compre-me lá uma flor, Cap’tão!
Captain.

Frase acrescentada na tradução (1:1+1ad)


<Pyg57 E S38> You… <TC4 E S39> O senhor…

<TC4 E S40> <add> Oraiessa!

A dimensão do sub-corpus translato, igualmente perceptível pela contagem do número de

frases e palavras exibida na tabela seguinte, apresenta-se variável por via das diferentes

estratégias de tradução adoptadas, sendo que este estudo se propõe a analisar o grau de

correlação entre tais estratégias e o meio a que se destinam. A tabela seguinte apresenta,

assim, uma organização específica da contagem do número de frases e palavras que

permite a apreciação da sua distribuição pelos diferentes meios reconhecidos no sub-

corpus translato.

NÚMERO DE FRASES NÚMERO DE PALAVRAS

Pigmalião (TC 1 - 1962) 488 4498

My Fair Lady (TC 2 - 1966) 341 2402


TRADUÇÃO ORIENTADA
PARA A PUBLICAÇÃO EM Pigmalião (TC 3 - 1972) 593 5144
LIVRO
Pigmalião (TC 4 - 1987 601 5175
My Fair Lady, Minha Linda Senhora (TC 5 - 2001) 364 2312

Pigmalião (TC 6 - 1945) 521 4112


TRADUÇÃO ORIENTADA
PARA A REPRESENTAÇÃO Pigmalião (TC 7 - 1974 520 4690
TEATRAL
My Fair Lady, Minha Linda Senhora (TC 8 - 2001) 350 2180

Minha Linda Lady (TC 9 - 1987) 313 1882

Pigmalião (TC 10 - 1994) 320 2257


TRADUÇÃO ORIENTADA
PARA A LEGENDAGEM
Pigmalião (TC 11 - 1995) 478 3366
Minha Linda Lady (TC 12 - 1996) 361 2043

Tabela 2: Dimensão do sub-corpus translato (número de frases e palavras).

170
Parte III - Metodologia

2.3. DIMENSÃO DO CORPUS PARALELO

Com base no anteriormente exposto, o corpus paralelo analisado apresenta os seguintes

valores relativamente à sua dimensão:

NÚMERO DE FRASES NÚMERO DE PALAVRAS

SUB-SUB-CORPUS NÃO-TRANSLATO 2646 21945


SUB-SUB-CORPUS TRANSLATO 5250 40061

SUB-CORPUS PARALELO 7896 62006

Tabela 3: Dimensão do corpus paralelo (número de frases e palavras).

Este sub-corpus, podendo ser apontado como bastante reduzido face a outros corpora

criados e analisados no âmbito de projectos em Estudos de Tradução, mostra-se bastante

mais abrangente e representativo que os sub-corpora até agora analisados manualmente.

Embora este estudo não possa aspirar a retirar conclusões universais, será de considerar

que, num estudo realizado por um só investigador, este sub-corpus representa já um

progresso considerável, na medida em que, almejando uma análise semi-automática e

sistemática, permitirá atingir conclusões consideravelmente mais representativas e

possíveis de testar futuramente em corpora mais vastos.

2.4. As unidades de classificação

A frase ortográfica foi a unidade linguística seleccionada como unidade de classificação,

tanto nos textos de partida como nos textos de chegada. Tendo em conta os objectivos

deste estudo e a classificação já proposta, a escolha da frase ortográfica como unidade de

classificação mostrou-se evidente, correspondendo esta à unidade de tradução.

Com base nas definições encontradas na Oxford Dictionary English Grammar (1998: sp 2)

editada por Sylvia Chalker e na Nova Gramática do Português Contemporâneo (1984:

119-122) de Celso Cunha e Lindley Cintra foi possível estabelecer, para os textos de partida

e textos de chegada respectivamente, a frase ortográfica como uma sequência de palavras

2 Não foi possível distinguir o número de página, por ter sido consultada a versão online desta edição.

171
Parte III - Metodologia

iniciadas por maiúscula e terminada com pontuação de fim de frase, a saber, ponto final,

ponto de exclamação e ponto de interrogação, seguida de uma nova sequência de palavras

iniciada por letra maiúscula, ou sem seguimento nenhum, no caso de fim de parágrafo. Não

foi considerado pertinente o facto de estarem ou não compreendidos entre parêntesis

curvos ou rectos ou aspas simples ou duplas. Nem os dois pontos nem o ponto e vírgula

foram considerados pontuação de final de frase, na medida em que, embora assinalem

descontinuidade na construção frásica, são sempre considerados inferiores ao ponto final.

As reticências foram consideradas marca de final de frase nos casos em que a frase

apresentava uma descontinuação total face ao que a procedia.

172
Parte III - Metodologia

Capítulo 3
METODOLOGIA DE ANÁLISE SEMI-AUTOMÁTICA DO CORPUS PARALELO

Este capítulo tem por objectivo apresentar a metodologia de análise e as grelhas de

etiquetagem que nortearam o processo de classificação das unidades frásicas, assim como

a descrição da sua aplicação semi-automática ao corpus electrónico descrito nos capítulos

anteriores.

3.1. Metodologia de análise

Tendo em conta os objectivos do presente estudo de identificação de regularidades de

comportamento e estratégias tradutórias, mostrou-se relevante o desenvolvimento de uma

metodologia de aplicação dupla que, procedendo à classificação das unidades frásicas dos

TP e dos TC pela consideração de um mesmo sistema de categorias, permitisse o estudo

comparativo numa fase posterior. Foi assim possível não só uma análise cronológica

comparativa, como também a identificação de estratégias de expansão ou contracção.

Foi objectivo deste estudo desenvolver uma metodologia de aplicação generalizada

norteado por dois parâmetros fundamentais: a) ter em conta as categorias aplicadas em

estudos anteriores (Dimitrova, 1997, 2001; Leppihalme, 2000a, 2000b; Rosa, 2004) por

forma a que, permitindo a comparação com os dados neles apresentados, possa contribuir

com informação adicional para a discussão da tradução de variação linguística; b)

desenvolver uma metodologia que pudesse ser aplicada independentemente da dimensão

dos textos. Optou-se assim por uma metodologia de análise semi-automática de unidades

frásicas de corpora paralelos não-alinhados.

O processo foi iniciado com a definição das categorias relevantes para a análise a que se

propunha o presente estudo, seguindo-se a etiquetagem de todas as unidades nos TP

(UTP) e nos TC (UTC) segundo o sistema de categorias desenhado. Uma vez obtido o

alinhamento de classificação das unidades constituintes do corpus e as percentagens de

frequência reconhecidas nas diferentes categorias em cada um dos TP e dos TC,

173
Parte III - Metodologia

procedeu-se à apreciação comparativa destas, à identificação de regularidades de

comportamento e à análise da correlação a existir entre as regularidades identificadas e as

variáveis contextuais definidas.

Tendo como propósito a identificação de regularidades de comportamento globais, a

análise dos dados obtidos foi levada a cabo tendo em conta algumas técnicas de análise

desenvolvidas pela estatística descritiva, tirando, como tal, partido de medidas de

tendência central como a média e a mediana, que nos permitem identificar os valores em

torno dos quais se concentram os dados obtidos; de medidas como a standardização dos

dados ou a construção de boxplots que nos permitiram confirmar a (in)existência de casos

extremos; e de medidas de dispersão como o desvio padrão, que nos permitiram aferir

quanto à homogeneidade dos grupos de dados tidos em conta e, como tal, quanto à

validade da média como medida pertinente e representativa do comportamento típico de

um determinado grupo de dados.

Foram assim definidos intervalos de desvio padrão que, permitindo identificar o grau de

homogeneidade do grupo de textos em consideração e de dispersão dos dados, nos

alertasse relativamente a uma análise possivelmente abusiva e quanto à necessidade de

consideração de níveis inferiores de análise. Aquando da análise das variedades

prestigiadas e não prestigiadas foram considerados os seguintes intervalos de desvio

padrão:

Intervalos de desvio padrão Interpretação

< = 5% Grupo de dados homogéneo

> 5% e < = 10% Grupo de dados ainda considerado homogéneo, mas


merecedor de atenção, justificando a consideração de
um nível inferior de análise.

> 10% Grupo notoriamente não homogéneo


Figura 12: Intervalos de desvio padrão definidos para a análise dos dados relativos à
recriação de variedades prestigiadas e não prestigiadas.

Aquando da análise dos níveis linguísticos de que a recriação de variedades ficcionais tira

partido, tendo em conta a dimensão superior de dados obtidos, foram tidos em

consideração os seguintes intervalos de desvio padrão:

174
Parte III - Metodologia

Intervalos de desvio padrão Interpretação

< = 10% Grupo de dados homogéneo

> 10% e < = 15% Grupo de dados ainda considerado homogéneo, mas
merecedor de atenção, justificando a consideração de
um nível inferior de análise.

> 15% Grupo notoriamente não homogéneo


Figura 13: Intervalos de desvio padrão definidos para a análise dos dados relativos aos
níveis linguísticos de que a recriação de variedades tira partido.

Sendo um dos objectivos do presente estudo a análise da correlação a existir entre as

regularidades de comportamento tradutório identificadas e as variáveis contextuais

definidas, foi considerada a aplicação de técnicas de inferência. Contudo, a dimensão do

corpus e a natureza não representativa deste, embora não fossem elementos impeditivos

de tal análise, vieram a mostrar a não relevância da sua aplicação pela impossibilidade de

deste corpus serem retiradas previsões probabilísticas de comportamentos futuros. O

estudo de correlação tirou assim apenas partido, por um lado, das técnicas de descrição

paramétrica já referidas, acompanhadas por modelos de descrição gráfica quando

considerado que tal facilitaria a identificação de movimentos de manutenção ou alteração

de comportamento, e, por outro, de técnicas de identificação de correlação que nos

permitiram aferir quanto à direção do relacionamento de correlação entre variáveis.

3.2. Instrumentos de análise semi-automática

Uma vez criado o corpus electrónico (cf. II-2), procedeu-se à segmentação dos textos

constituídos em unidades frásicas, tendo sido seguidos os seguintes passos:

a) Cotejo e revisão manual dos textos digitalizados;

b) Segmentação manual dos textos em frases ortográficas;

c) Conversão dos ficheiros em extensão .doc para ficheiros texto simples (*.TXT)

através do programa Word 2003 (Microsoft Office XP Professional);

d) Etiquetagem de todas as frases dos TP e TC, recorrendo ao programa Systemic

Coder 4.68 (2005) desenhado por Mick O'Donnell da Wagsoft;

175
Parte III - Metodologia

e) Quantificação das etiquetas introduzidas através da ferramenta "statistics"

disponibilizada pelo programa Systemic Coder;

f) Cotejo de todas os dados quantitativos, recorrendo ao programa Excel 2003

(Microsoft Office XP Professional for Mac);

g) Cálculo dos valores médios, dos valores de desvio padrão e do coeficiente de

correlação, recorrendo ao pacote de análise estatística SPSS;

h) Elaboração de tabelas e gráficos desenhados de acordo com o tipo de análise

comparativa a que se pretendia submeter os dados quantitativos.

3.3. Etiquetagem das unidades frásicas e criação do Esquema de codificação

De forma a proceder à etiquetagem das frases relativamente aos parâmetros previamente

identificados como pertinentes em II-3.4 foi necessário criar um sistema que, tornando

operativas as distinções e categorias desenvolvidas no terceiro capítulo da parte II deste

estudo, fizesse corresponder a cada uma das unidades constituintes do corpus electrónico

uma categoria através de uma etiqueta. O programa Systemic Coder permitiu, por via de

selecção manual das categorias correspondentes a cada unidade tradutória, a etiquetagem

das unidades de ambos os sub-corpora e o reconhecimento das percentagens de

frequência reconhecidas nas categorias definidas. Este foi, no entanto, um processo que

exigiu um grande investimento de tempo e de participação do investigador.

A análise da recriação e tradução de variedades linguísticas ficcionais tomou lugar através

da distinção e etiquetagem de cada uma das unidades como variedade padrão, variedade

oral ou variedade subpadrão, sendo que esta última categoria reconhecia ainda as

subcategorias de variedade subpadrão regional, variedade subpadrão social e variedade

subpadrão social específica. É assim clara a distinção a fazer entre a variedade padrão a

que é reconhecido grande prestígio e as variedades não-padrão entendidas como pouco

prestigiadas, sendo que na segunda categoria são incluídas as variedades oral, subpadrão

regional e subpadrão social específico. De futuro, a expressão “variedades não-padrão”

será empregue sempre que for feita referência às variedades oral, regional, social e social

específico como um todo em oposição à variedade padrão. Apesar de em termos

176
Parte III - Metodologia

linguísticos não ser possível identificar a variedade oral, mas sim o modo oral proveniente

da diferenciação a fazer entre modo escrito e modo oral, a presente classificação procurou

ilustrar não tanto a classificação seguida em Linguística, mas antes a valorização e o juízo

feitos pelo falante comum anteriormente discutido em II.3.4. Com base na percepção

empírica da autora, em estudos prévios (Rosa, 2004) e nos dados obtidos pelo questionário

desenvolvido no contexto deste estudo, foram definidas três categorias adicionais das

quais as categorias padrão, oral e subpadrão seriam ramificações, sendo estabelecida a

distinção entre variedade prestigiada (variedade padrão), variedade menos prestigiada

(variedade oral) e variedades não prestigiadas (variedades subpadrão regional, subpadrão

social e subpadrão social específico). Foi assim objectivo tornar explícita a posição-entre

da “variedade oral” que, embora não seja entendida como variedade subpadrão pelo

falante comum, também não é por ele interpretada como variedade padrão, em grande

medida pela sua não-associação ao modo escrito. A associação estabelecida pelo falante

comum entre modo escrito, variedade padrão e norma ortográfica surge como um dos

factores principais para a recuperação de determinadas marcas do modo oral (gráficas,

lexicais e morfossintácticas) na demarcação do discurso como não-padrão ou subpadrão.

Neste sentido, foram identificadas como unidades a incluir na categoria variedade oral as

unidades em que foram identificadas marcas que, apesar de não violarem as regras da

norma linguística do inglês britânico ou do português europeu, representam características

de oralidade que o falante comum tende a desvalorizar. Em casos de sobreposição de

categorias, optou-se por classificar a unidade tradutória segundo o tipo de desvio mais

proeminente.

A título de exemplo, são aqui apresentadas algumas das unidades classificadas e a sua

classificação correspondente. Nem todas as categorias foram seleccionadas no processo

de classificação, pelo que apenas serão apresentadas as categorias para as quais puderam

ser seleccionados exemplos.

177
Parte III - Metodologia

Textos de partida

Variedade Prestigiada > Variedade Padrão > utc padrão


<Pyg16 E S65> They walked to the bus when the rain stopped.
<Pyg38 E S153> I saw her with my own eyes.
<MFL64 E S282> I want to know what I may take away with me.
<Pyg83 E S474> I'll advertize it in the papers that your duchess is only a flower girl that you
taught, and that she’ll teach anybody to be a duchess just the same in six months for a thousand
guineas.

Variedade menos Prestigiada > Variedade Oral


<Pyg16 E S13> If it's worse it's a sign it's nearly over.
<MFL64 E S134> I won’t let anybody wallop me.
<MFL56 E S5> Oh, he’s your son, is he?
<Pyg38 E S38> I'm short for my lodging.

Variedade não-prestigiada > Variedade Social


<MFL64 E S54> But don’t keep comin’ around countin’ on half-crowns from me!
<Pyg38 E S66> And to pay for em tə-oo: make no mistake.
<Pyg83 E S30> You just shew me what youve wrote about me.
<Pyg16 E S42> Aint no call to meddle with me, he aint.

Textos de chegada
Variedade Prestigiada > Variedade Padrão > utc padrão
<TC2 E S289> Ele trata uma florista como se ela fosse uma duquesa.
<TC3 E S389> Quem me dera que me tivesse deixado onde me encontrou.
<TC5 E S321> Se não fosse o Coronel Pickering eu nunca teria sabido como se comporta uma
senhora.
<TC7 E S383> Esqueci-me da minha língua natal e já não sei falar senão a vossa.
<TC10 E S274> É um autocarro, pronto para partir, | sem consideração por ninguém.||

Variedade menos Prestigiada > Variedade Oral


<TC1 E S113> Onde é que eu as havia de arranjar?
<TC3 E S51> Se calhar gostava que o tratassem da mesma maneira.
<TC7 E S35> Eu sei lá ler uma coisa destas!
<TC9 E S28> Ele que se meta na sua vida, | e deixe uma pobre rapariga. ||
<TC10 E S114> Se soubesse no que ia meter-me, | não tinha vindo.||

178
Parte III - Metodologia

Variedade não-prestigiada > Variedade Regional


<TC1 E S32> Ora deixe lá ver o que escrebeu.
<TC4 E S30> Como é que eu sei que é berdade o que escrebeu de mim?
<TC6 E S38> Ora amostre lá o que bocemecê 'screbeu de mim.
<TC1 E S3> Dous ramos de violetas botadas p’rá lama!
<TC6 E S60> Pois debia ter bergonha de fazer uma coisa dessas!

Variedade não-prestigiada > Variedade Social


<TC3 E S29> Atão, pra que é que vossemecê se pôs a ‘screver o que eu dezia?
<TC4 E S49> Eu sou tão séria cumo calquer senhora.
<TC6 E S44> Oh, meu s’nhor, num mo dâch fazê queixa pru le chamá manjor!
<TC7 E S13> Chamei-le Freddy como podia ter-le chamado charlie ou outro desses nomes
inlegantes que me passasse pela indeia!
<TC11 E S25> Só l’e pedi | que me comprasse ‘ma flor.||

Como último nível de classificação foi considerada uma etiquetagem que desse conta do
nível linguístico a que pertencem as marcas (lexicais, morfossintácticas ou gráficas)
reconhecidas nas variedades oral, subpadrão regional, subpadrão social e subpadrão social
específico em oposição à variedade padrão caracterizada pela ausência de marcas. Foi
assim feita a distinção entre marcas morfossintácticas (utp-m ou utc-m), gráficas (utp-g ou
utc-g) e lexicais (utp-l ou utc-l). Como marcas subpadrão foram interpretadas todas as que
correspondessem a um uso distinto da norma linguística do inglês britânico ou do
português europeu, revelando a pertença a uma região periférica, o estrato sociocultural
baixo da personagem ou a pertença a um grupo social específico. Como marcas de
oralidade foram identificadas todas as que representam características de oralidade e que,
tal como referido anteriormente, o falante comum tende a desvalorizar. Tendo em conta a
dificuldade sentida na identificação e classificação das marcas de oralidade, são aqui
apresentados alguns exemplos:

Marcas morfossintácticas de oralidade


- Formas de tratamento
- Interjeições como “Ah”, “Well”, “Now”, “Why” nos textos de partida ou “Céus”, “Valha-
me Deus”, “Vamos”, “Ora”, “Bem”, “Então” nos textos de chegada.
- Uso das chamadas “question tags”
- Repetição de palavras
- Elipse de funções sintácticas ou de parte da oração

179
Parte III - Metodologia

Marcas gráficas de oralidade


- Contracções
- Elisões
- Uso de apóstrofes para indicar processos de elisão

Marcas lexicais de oralidade


- Interjeições
- Escolha vocabular como “wallop” em vez de “hit” or “strike” nos textos de partida ou
“arranjar” em vez de “conseguir” nos textos de chegada.

3.4. Esquema de codificação


Será agora apresentado o esquema de codificação das unidades desenvolvido pelo

investigador no âmbito do presente estudo e utilizado pelo programa Systemic Coder. Este

deve ser lido da esquerda para a direita tendo em conta que a escolha de uma determinada

categoria limita a classificação às categorias imediatamente dependentes dessa primeira e

assim sucessivamente até se esgotarem todas as possibilidades e ramificações do sistema

de classificação.

180
Parte III - Metodologia

Figura 14: Esquema de codificação das unidades constitutivas dos sub-corpora não-translato e translato

181
Parte III - Metodologia

182
Parte
IV

Análise

Elementos contextuais

Análise dos sub-corpora não-translato e translato


Parte IV - Análise

CAPÍTULO 1
ELEMENTOS CONTEXTUAIS

Recuperando a proposta desenhada em I-2 a favor da consideração de factores

contextuais, este capítulo tem por objectivo apresentar uma breve resenha relativamente à

presença dos textos em estudo no contexto de chegada. Será aqui apresentada a listagem

das obras traduzidas, dos tradutores, das respectivas datas de tradução, do número de

retraduções e em que circunstâncias foram apresentadas, assim como uma análise sucinta

do contexto imediato de apresentação (colecções e quadros de programação), da

formação dos tradutores e do público-alvo.

1.1. Pygmalion e My Fair Lady no contexto de partida

Bernard Shaw não é de certo o autor mais conhecido do grande público em Portugal, mas

Pygmalion é uma das suas mais famosas peças, em grande parte pelas adaptações que

conheceu para filme (cinema e televisão) e musical (teatro e cinema).

Apenas após a estreia a 16 de Outubro de 1913 em Viena, no Hofburg Theater, sob a

direcção de Hugo Thiming e com Max Paulsen e Lyli Morgerg como protagonistas, terá

Pygmalion estreado em Londres a 11 de Agosto de 1914 no His Majesty’s Theatre. A

primeira publicação do argumento parte de uma tradução alemã de 1913, vindo, em 1914,

a ser publicado na Hungria, na Suécia e nos Estados Unidos da América inserido nas

edições de Novembro das revistas novaiorquinas Everybody’s Magazine e Nash’s Magazine.

Apenas em 1916 se concretizaria a publicação inglesa pela Editorial Constable, numa

edição conjunta de três peças de Bernard Shaw (Pygmalion, Androcles and the Lyon e

Overruled).

Conhecendo um enorme êxito, tanto no palco como nas livrarias, Pygmalion é objecto, num

espaço de três anos, de três adaptações para cinema: uma primeira com o alemão Erich

Engel como realizador e Gustaf Grüngens e Jenny Jugo como protagonistas; uma segunda

realizada pelo holandês Ludwig Berger e com Lyli Bowmeester e Johan de Meester como

183
Parte IV - Análise

protagonistas e, uma terceira, com Anthony Asquith e Gabriel Pascal como realizadores e

Bernard Shaw (entretanto galardoado com o Prémio Nobel, que rejeitou, em 1925) como

colaborador na adaptação do guião. B. Shaw vem a falecer em 1950, mas o êxito da mais

famosa vendedora de flores conhecerá ainda novos episódios. Em 1956 serve de base à

comédia musical My Fair Lady com encenação de Alan Jay Lerner e música de Frederic

Loewe (Rex Harrison e Julie Andrews interpretavam os papeis de Higgins e Eliza), musical

esse que, depois de ver o seu argumento publicado em 1958, será, em 1964, objecto de

uma adaptação para cinema pela mão de George Cukor, agora com Audrey Hepburn no

papel de Eliza. Em 1983 surge uma nova adaptação de Pygmalion, agora para televisão

pela Twentieth Century Fox, com realização de Alan Cook e interpretação de Peter O’Toole

e Margot Kidder nos papéis de Higgins e Eliza.

1.2. A presença de Pygmalion e My Fair Lady no contexto de chegada

Mais do que qualquer outra peça de Bernard Shaw, Pygmalion veio a conhecer uma intensa

divulgação em Portugal, conhecendo diversas publicações em livro e sendo, por diversas

vezes, a contemplada para os quadros de programação, tanto de teatros, como de

estações de televisão.

Pygmalion é primeiro dado a conhecer ao público português pelas mãos de António e

Francisco Ribeiro Lopes que, em 1945, decidiram trazer esta peça ao palco do Teatro da

Trindade, escolhendo Assis Pacheco e Maria Lalande para os papéis de Higgins e Eliza

respectivamente (cf. anexo B.4). Passados 49 dias sobre a estreia a 30 de Outubro, levam o

mesmo espectáculo ao Teatro Sá da Bandeira em Aveiro e ao Teatro Avenida em Coimbra,

facto que, apoiado pelas críticas entusiasticamente positivas que podemos encontrar nos

jornais da época (cf. anexo B.3), testemunha o êxito que a peça conheceu então. Em 1961

é apresentada por Marina Prieto uma tradução da versão de 1961 como tese de

licenciatura à Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra.

Em 1964, o musical My Fair Lady de Alan J. Lerner é ensaiado pela primeira vez em

Portugal no Teatro Monumental, contando com João Villaret e Laura Alves como

protagonistas (cf. Anexo B.5). A peça não chega, no entanto, a estrear por razões que não

184
Parte IV - Análise

foi possível a este estudo apurar. Será por iniciativa da Portugália Editora que o libreto de

My Fair Lady conhecerá a edição em livro dois anos depois, com tradução de H. Silva Letra

e Gervásio Lopes.

Por sua vez, Pygmalion conhece igualmente a publicação em livro, em 1972, pela Editorial

Verbo que, convidando Fernando de Mello Moser para tradutor, a escolhe como uma das

obras a publicar na primeira série da colecção “Livro RTP. Biblioteca Básica Verbo”. Em

1974, Artur Ramos, então encenador e produtor da RTP, decide levar à cena a peça de

Bernard Shaw deixando a tradução nas mãos de Luís Francisco Rebelo e José Palma e

Carmo1 e entregando os papeis de Higgins e Elisa a Rosério Paulo e Lurdes Norberto. Os

ensaios tomam lugar no Teatro Maria Matos, onde a peça deveria estrear em meados desse

mesmo ano; contudo, com a revolução de Abril, novos ideais, interesses e oportunidades

surgiram, levando a companhia a optar por levar à cena uma peça de Bernardo Santareno

que havia sido proibida pela censura do Estado Novo. Treze anos depois, em 1987, a

editora Europa-América publica novamente Pygmalion com tradução de Mário Abreu,

vindo, em 2003, a apoiar uma reedição desta tradução a ser distribuída com o jornal Diário

de Notícias e a integrar a colecção “Prémios Nobel da Literatura”. A 8 de Abril do mesmo

ano, o filme My Fair Lady de Alan Jay Lerner e Frederick Lowe, com tradução de J. Nunes

de Carvalho e legendagem de Teresa Sustelo, é exibido no Canal 1 da RTP, vindo a ser

emitido uma vez mais no Canal 2 da RTP em 1991. A história desta vendedeira de flores

parece despertar grande interesse junto do público português, na medida em que, entre

1991 e 1998, foram exibidas todas as versões fílmicas deste enredo. A 9 de Fevereiro de

1994, é exibida a versão cinematográfica de 1938 de Pygmalion no Canal 1 da RTP; a 28 de

Março de 1995 a versão de 1983 na SIC e a 24 de Dezembro de 1996, novamente o filme

My Fair Lady na SIC. Em 1994 é lançada no mercado português a edição especial em DVD

do filme My Fair Lady, agora com a imagem restaurada. Em 2003 estreia em Portugal o

musical My Fair Lady no Teatro Politeama com encenação de Filipe La Féria e com Anabela

e Carlos Quintas nos papeis de Eliza e Higgins. É publicada, no mesmo ano, pela Europa-

1 Aquando da preparação de Pigmalião para encenação, todas as peças encenadas no Maria Matos eram apoiadas pela RTP,

sendo que na última semana em que a peça estivesse em cena, esta era filmada e exibida na RTP a nível nacional.

185
Parte IV - Análise

América a tradução do libreto de Filipe La Féria e Helena Rocha em que se baseara o

espectáculo do mesmo.

Figura 15: Cronograma com as diversas versões e traduções de Pygmalion e My Fair Lady nos sistemas de
partida e de chegada.

1.3. O público-alvo

Tendo em conta a categorização proposta pela APEL (1987), o público-alvo das diferentes

traduções constituintes do corpus translato pode ser identificado como público adulto.

Considerando, no entanto, que esta é uma categorização ainda bastante abrangente e

definida com base numa análise do público de publicações em livro, procedeu-se neste

estudo a uma definição mais restrita com base em certos atributos extratextuais das

traduções em causa. Esta análise foi feita individualmente a cada tradução e organizada

segundo o meio a que se destinava a tradução.

186
Parte IV - Análise

1.3.1 Traduções para publicação

A tradução de 1963, sendo parte constituinte de uma tese de licenciatura proposta à

Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, apresenta um público-alvo muito

particular e específico. Assim sendo, embora hoje nos seja um testemunho valioso

enquanto objecto de estudo, não poderemos obter informação quanto à recepção por parte

do grande público, uma vez que, sendo uma publicação de autor, a tiragem, além de

pequena (500 exemplares), não conheceu qualquer tipo de distribuição senão a oferta

particular.

A tradução de 1966 terá sido um caso bem diferente, na medida em que foi uma

publicação distribuída a nível nacional. Embora não nos tenha sido possível contactar a

editora já extinta, apurar o preço de capa ou a tiragem que a publicação conheceu,

poderemos concluir que a edição terá tido desenhada para um público adulto, conhecedor

de cinema e com algum poder de compra, na medida em que a edição foi integrada na

“Colecção Clássicos do Cinema” e estaria disponível a um preço acima da média pela

encadernação rica que apresentava e recurso a papel de fotografia (no interior do livro

foram publicadas 8 páginas com impressões de determinadas cenas do filme My Fair Lady

(1964)).

A edição da tradução de 1972 é também ela um caso particular, na medida em que fez

parte de uma colecção pioneira em Portugal - a “Biblioteca Básica Verbo” - concebida em

parceria com a RTP e que, pela primeira vez, procurou chegar, segundo as palavras de

Fernando Guedes (director da colecção), “a todas as casas de Portugal”2. O público-alvo,

identificado como “o grande (mesmo grande) público”, encontrou disponível uma edição de

bolso a 15$00 distribuída em 3500 locais de venda. O tempo de antena dedicado a esta

colecção na emissão da RTP levou novos autores e títulos às casas dos portugueses e, a

julgar pela tiragem de 120 000 exemplares que esgotou em dois dias, percebemos ter sido

uma edição acarinhada pelo público português.

Dentro desta mesma linha de acção veio a surgir a tradução de 1987, incluída na colecção

“Livros de Bolso Europa América” com um público-alvo igualmente definido como “o

2 As citações aqui apresentadas das palavras do Dr. Fernando Guedes foram retiradas da carta que gentilmente escreveu em

resposta a diversas questões que à autora do presente estudo deu oportunidade de colocar.

187
Parte IV - Análise

grande público”3. Tal como os restantes volumes da colecção, esta edição veio a conhecer

uma distribuição nacional em “livrarias e quiosques por todo o país”. Em 2003, os direitos

foram concedidos para uma segunda re-publicação da tradução, desta vez a ser distribuída

com o jornal Diário de Notícias.

Igualmente patrocinada pela Europa-América, agora em parceria com o Teatro Politeama,

foi a tradução de 2001, publicada como parte integrante da colecção “Grandes Clássicos

do Teatro”. Uma vez mais o público-alvo foi definido como o “grande público”, procurando

dar a conhecer o libreto de uma peça musical que já não se encontrava em circulação no

mercado livreiro português.

1.3.2. Traduções para o palco

O público-alvo de uma representação teatral é sempre definido sob moldes mais restritos,

tendo em conta o público particular do local de representação. Dados como a hora de

representação, o local e o preço do bilhete dão-nos, no entanto, indicações mais precisas

do público específico esperado.

A tradução de 1945, subindo ao palco no Teatro da Trindade, definiu de imediato como

público-alvo um grupo de lisboetas que assídua e regularmente visitavam as casas de

teatro do Chiado e Bairro Alto. A representação de Pigmalião foge um pouco ao contexto

previsto pelo sucesso que veio a conhecer: não só esteve cerca de dois meses em cena,

como veio a conhecer os palcos e públicos de Aveiro (Teatro Sá da Bandeira) e Coimbra

(Teatro Avenida).

A tradução de 1973 destaca-se também pela definição particular de um público-alvo que ia

além do presente na sala de espectáculo. Embora a representação não se tenha chegado a

concretizar, a parceria feita entre o teatro Maria Matos e a RTP por intermédio do

encenador Artur Ramos, levava a que a última representação das peças representadas

neste teatro fossem emitidas na RTP.

3As citações aqui apresentadas relativamente à edição de 1987 pela Europa-América, foram retiradas do email gentilmente
enviado pelo departamento de comunicação da editora em resposta a diversas questões por este estudo colocadas.

188
Parte IV - Análise

A tradução de 2001 a subir ao palco do Teatro Politeama, ao contrário da publicação do

libreto que esperava um público geral, assumia como público-alvo os habitantes de Lisboa

independentemente da sua disponibilidade financeira, a julgar pela diversidade de bilhetes

disponíveis. A proeminência do encenador e dono do teatro, assim como a publicidade feita

ao espectáculo aliado à memória do filme e bom conhecimento da história, terão

contribuído para o sucesso desta representação que levou a companhia ao palco do

Coliseu do Porto e resultou na emissão nacional da representação no Canal 1 e no Canal 2

da RTP e na publicação de um DVD.

1.3.3. Traduções para TV - legendagem

A tradução de 1987 é emitida às 14:00 do dia 8 de Abril do mesmo ano no Canal 1 da RTP,

inserida no quadro de programação do ciclo “Lotação Esgotada”. O mesmo filme, com a

mesma tradução e legendagem, veio, uma vez mais, a ser exibido a 6 de Outubro de 1991

no Canal 2 da RTP no ciclo “Noites de Cinema”. Excertos do filme e da tradução foram

ainda apresentados a 10 de Janeiro de 1998 no Canal 2 da RTP no programa “O Filme da

Minha Vida”, com Maria Elisa Domingues como convidada de Inês de Medeiros. Igualmente

no Canal 1 da RTP veio a ser emitida a tradução de 1994 a 9 de Fevereiro pelas 14:00.

Se parece haver alguma consistência na hora de emissão das traduções no canal público

português, o mesmo se vem a confirmar no único canal privado português a emitir o filme.

A tradução de 1995, emitida a 28 de Março no ciclo “Tardes de Cinema” da SIC, ocorre

igualmente às 14:00, assim como a emissão da tradução de 1996 a 24 de Dezembro no

quadro de programação especial de Natal da SIC.

O Facto de todas as traduções terem sido emitidas num dia de semana pela 14:00,

permite-nos definir o público-alvo como adulto e com uma idade superior a 50 anos.

1.4. Colecções e quadros de programação

Analisando os títulos das colecções e dos quadros de programação em que as traduções

presentes no corpus translato foram integradas, desenha-se uma imagem clara dos autores

189
Parte IV - Análise

e dos textos de partida como elementos centrais nos sistemas literário, teatral e

cinematográfico.

Com excepção da tradução de 1963, as restantes traduções publicadas em livro são

integradas em colecções que se apresentam como o resultado de uma selecção dos textos

a conhecer por qualquer leitor médio: expressões como “clássicos do cinema”, “biblioteca

básica”, “clássicos do teatro” ou a referência a uma selecção criteriosa ou reunião de obras

de autores a quem foram atribuídos Prémios Nobel da Literatura confirma a imagem de

textos intemporais e imprescindíveis a qualquer biblioteca pessoal. A isto acresce o facto

de nas colecções “Biblioteca Básica Verbo” e “Livros de Bolso Europa-América” apenas

8% e 5% respectivamente dos textos seleccionados serem peças de teatro - apesar de a

leitura e publicação de peças de teatro não ser habitual no sistema cultural português,

estes foram considerados textos insubstituíveis no património cultural de qualquer

português.

A integração das traduções para TV (legendagem) em quadros de programação intulados

“Lotação Esgotada” vem confirmar uma imagem semelhante de clássicos intemporais a

conhecer pelos mais novos e a relembrar pelos mais velhos. A consulta dos arquivos e

relatórios de programação da RTP permitiu concluir que o mesmo critério de selecção foi

seguido nos quadros de programação intulados “Noites de cinema”, “Tardes de cinema” ou

“Especial de Natal”.

Embora no caso das traduções para o palco, estas não tenham sido integradas num

quadro de programação especial, foi possível concluir através de elementos publicitários

que também estas foram apresentadas ao público como clássicos do teatro a conhecer por

qualquer amante dos palcos.

1.5. Os tradutores

Tendo em conta o currículo dos tradutores cujas traduções foram incluídas no corpus, é

possível identificar determinadas regularidades relativamente à sua formação profissional e

ao meio para o qual traduzem. Parecendo confirmar o que tem sido apontado como

elemento distintivos dos sistemas dramático e teatral (cf. II-2), as traduções para

190
Parte IV - Análise

publicação foram realizadas por tradutores profissionais, experientes na tradução de textos

literários, ainda que, na sua maioria, textos de narrativa; enquanto as traduções para o

palco foram realizadas por encenadores, dramaturgos ou actores, sendo que em um dos

casos ambos os tradutores estavam directamente envolvidos na representação como

encenador e actriz do espectáculo. As traduções para TV (legendagem) foram igualmente

realizadas por tradutores profissionais, sendo, no entanto, de destacar a formação

específica em tradução destes tradutores, muito provavelmente exigida pelos

conhecimentos técnicos (software de legendagem) reclamados por este tipo de tradução.

Embora este pequeno grupo de tradutores não possa ser tomado como representativo da

classe de tradutores para legendagem em Portugal, este estudo não pode deixar de notar o

carácter de excepção a reconhecer à tradução de 1987, tendo sido esta realizada por um

tradutor profissional, mas experiente em tradução para publicação e legendada por uma

outra pessoa experiente e conhecedora do software de legendagem. Tendo em conta as

datas de tradução, este aspecto parece apontar para uma cada vez maior especialização

da tradução de legendagem, assim como da formação dos tradutores a quem agora é

exigido o conhecimento de diferentes tipos de software para que as traduções possam ser

feitas no menor tempo possível e com custos menos elevados.

191
Parte IV - Análise

192
Parte IV - Análise

CAPÍTULO 2
ANÁLISE DOS SUB-CORPORA NÃO TRANSLATO E TRANSLATO

Tal como discutido em capítulos anteriores, procedeu-se neste estudo a uma análise semi-

automática das unidades de tradução constituintes dos sub-corpora reunidos, da qual

resultaram dados quantitativos, cuja análise será apresentada neste capítulo. No

seguimento do modelo de análise proposto por este estudo, foram aceites como objectivos

norteadores desta primeira fase da análise a identificação de regularidades de

comportamento na tradução de variedades linguísticas ficcionais e a subsequente

identificação das estratégias gerais de recriação de variedades ficcionais segundo o

modelo proposto em II-3.3. A análise dos dados recolhidos decorrerá, inicialmente, com a

descrição dos dados e a identificação de regularidades de comportamento, para, numa

segunda fase, proceder com o estudo de possíveis correlações existentes entre as

regularidades identificadas e as variáveis contextuais seleccionadas, a saber, o meio a que

se destina a tradução, a data de tradução e a função prospectiva.

2.1. Análise dos dados quantitativos do sub-corpus não translato

Fazendo primeiramente recair a sua atenção no sub-corpus não translato, este estudo

procederá à identificação das principais regularidades na recriação de variedades

linguísticas ficcionais, procurando assim definir a função que esta assume na diegese,

nomeadamente na caracterização de personagens e das relações de poder que governam

as relações interpessoais e na produção de momentos cómicos.

2.1.1. Recriação de variedades linguísticas

A tabela 4 apresenta as percentagens médias relativas à recriação de variedades ficcionais

prestigiadas e menos prestigiadas no sub-corpus não translato.

193
Parte IV - Análise

Variedade Variedade pouco Variedades não prestigiadas


prestigiada prestigiada

Sub-corpus não Padrão Oral Subpadrão Subpadrão Subpadrão Social


translato Regional Social Específico

% Média 50% 22% 0% 28% 0%

Desvio Padrão 3% 4% 0% 1% 0%

Tabela 4: Percentagens médias relativas à recriação de variedades ficcionais no sub-corpus não


translato.

Os valores de desvio padrão vêm confirmar a homogeneidade do sub-corpus, sendo que

em nenhuma das categorias é ultrapassado o limite de 5% de desvio1 . Considerando os

valores apresentados, torna-se evidente a predominância de recriação da variedade

prestigiada (50%) face a uma recriação notória, mas mais moderada, de variedades não

prestigiadas (28%, subpadrão social). Relevante será destacar a ausência de ocorrências

nas restantes categorias de variedades não prestigiadas e a percentagem mais reduzida de

22% assumida pela variedade oral.

Tendo em conta a ponderação feita em II-1 relativamente à recriação de variedades

linguísticas em texto ficcional e os diferentes níveis de mediação que condicionam a

recriação, nomeadamente os diferentes propósitos narrativos que esta pode assumir na

economia do texto, será possível reconhecer, tanto em Pygmalion como em My Fair Lady,

os propósitos narrativos centrais de caracterização indirecta das personagens e do seu

posicionamento na escala sócio-semiótica importada, assim como de introdução de

momentos cómicos. Tal como discutido previamente e a partir da advertência do próprio

Bernard Shaw introduzida após a terceira fala da personagem Elisa2, podemos concluir

quanto à mediação por parte de condicionantes de natureza artística, linguística e

1 cf. III-3.1 onde foram definidos intervalos de desvio padrão que, permitindo identificar o grau de
homogeneidade do grupo de textos em consideração, nos alertariam relativamente a uma análise possivelmente
abusiva e quanto à necessidade de consideração de níveis inferiores de análise. Aquando da análise das
variedades prestigiadas e não prestigiadas foram considerados os seguintes intervalos de desvio padrão: < =
5% (grupo de dados homogéneo); > 5% e < = 10% (grupo de dados ainda considerado homogéneo, mas
merecedor de atenção, justificando a consideração de um nível inferior de análise); > 10% (grupo notoriamente
não homogéneo).
2 Tal como apresentado anteriormente (cf. II-1.3.1), Bernard Shaw deixa, após a terceira fala de Elisa uma

advertência relativamente à recriação de variedades linguísticas em texto ficcional: “Here, with apologies, this
desperate attempt to represent her dialect without a phonetic alphabet must be abandoned as unintelligible
outside London” (1957: 9).

194
Parte IV - Análise

pragmática que precipita o relegar da função mimética do diálogo a uma posição

secundária face ao seu poder caracterizador das personagens e das relações interpessoais.

28% das unidades tradutórias em análise surgem em recriação de variedade subpadrão

social representativa na sua totalidade de grupo sociocultural baixo e conotando, segundo

o modelo apresentado em II-3.4, marginalidade social, pertença a um estrato sociocultural

baixo e um baixo nível de escolaridade. A ausência de marcas subpadrão conotadoras de

proveniência de uma região periférica ou de pertença a um grupo social específico

confirmam, não só a concentração da gama de variedades na dicotomia padrão vs

subpadrão e o recurso a marcas estereótipo, mas também o propósito de não identificação

da personagem com uma região ou um grupo social particulares. Recuperando a distinção

entre discurso marcado e discurso neutro (cf. II-1.3.3.1), compreendemos que o discurso

marcado da personagem Elisa serve assim o propósito comunicativo de identificar

indirectamente o seu estatuto social que, neste caso, se apresenta em estrita relação com a

pertença a um estrato sociocultural baixo e à denúncia de um baixo nível de escolaridade.

É, contudo, central reconhecer que, em desafio das normas literárias discutidas em II-1, o

discurso subpadrão surge, tanto em Pygmalion como em My Fair Lady, também como

elemento definidor do perfil de uma das personagens principais, contrastando com o

recurso comum a variedades subpadrão como elementos sinalizadores de marginalidade e

do papel secundário das personagens. Neste caso particular, para além da função de

primeira ordem de identificação indirecta do estatuto social baixo de uma vendedora de

rua, a recriação de variedades subpadrão serve as funções de segunda ordem de gerar

empatia relativamente a uma personagem que, apesar de ignorante e de aparência suja e

descuidada, denuncia honestidade e perspicácia, assim como de distinção das relações

interpessoais a reconhecer entre Elisa e as restantes personagens: relações de

solidariedade entre Elisa e os restantes vendedores presentes em Covent Garden e

relações de poder entre Elisa e personagens como o professor Higgins, a senhora Eynsford

Hill e o coronel Pickering. Participa, assim, tanto num processo de distinção e

individualização da personagem face às personagens que não partilham o mesmo perfil

195
Parte IV - Análise

linguístico, como de associação e pertença a um grupo de personagens a que é

reconhecido um perfil linguístico semelhante.

Apesar do tom satírico que trespassa ambas as peças (ainda que mais evidente em

Pygmalion do que em My Fair Lady), o recurso ao discurso subpadrão social cumpre aqui

não tanto uma função satírica definida pela tradição literária, mas antes uma função de

produção de cómico e de estabelecimento de uma relação de solidariedade entre o leitor/

espectador e a personagem. A análise dos momentos cómicos permite-nos rapidamente

concluir que estes são particularmente notórios quando Elisa surge em ambientes que não

o seu, isto é, ambientes considerados como não comuns para uma personagem com o seu

perfil e estatuto social. Recuperando os conceitos propostos em I-2, a introdução de

momentos cómicos terá de ser atribuída à configuração particular de três factores: a

presença de uma variedade subpadrão, a arena e o grau de formalidade reconhecido à

situação e/ou à arena. Tendo em conta os conceitos de dinamismo e estatismo (cf.

II-1.3.3.1) desenvolvidos por Hatim e Mason (1997: 27-28), é possível reconhecer que se,

numa arena facilmente identificada como a zona londrina de Covent Garden, a presença de

uma vendedora de flores falante de uma variante subpadrão (a ser identificada

explicitamente pelo prof. Higgins como “cockney”) não desafia a expectativa do leitor/

espectador, a presença desta mesma personagem na casa de habitação do prof. Higgins,

assim como em casa da Mrs Higgins, e o recurso a um discurso subpadrão numa arena a

que é reconhecido um grau de prestígio e um grau de formalidade mais elevados surgem

como elementos desafiadores da expectativa do leitor/espectador, sendo através da

desadequação entre discurso e arena que é introduzido o cómico.

É importante reconhecer que, embora o cómico seja sempre conseguido pela

desadequação entre o discurso subpadrão, a arena e o grau de formalidade a ela

associado, num primeiro momento são seleccionados na recriação os níveis

morfossintáctico, gráfico e lexical para assinalar a marginalidade da variedade subpadrão

social, enquanto, num segundo momento, o cómico ocorre preferencialmente pelo recurso

a desvios de natureza lexical. Tendo em conta o enredo partilhado por ambas as peças

constituintes do corpus e para uma melhor ponderação da recriação de variedades

196
Parte IV - Análise

linguísticas ficcionais assim como da produção de cómico, provou-se relevante a divisão

dos dados em três grupos distintos, em denúncia das três fases reconhecidas na evolução

da personagem Elisa, e a apreciação da recriação particular de variedades ficcionais em

cada uma delas. No processo de aprendizagem e evolução de Elisa em que se centra a

acção de ambos os textos em análise, é possível reconhecer três fases: uma primeira em

que Elisa é caracterizada como uma típica falante de “cockney” de estatuto social baixo,

uma fraca escolaridade e sem conhecimento das práticas de comportamento partilhadas

pelas camadas mais altas da sociedade; uma segunda, em que, por intermédio dos

ensinamentos do prof. Higgins, o seu baixo estatuto social e sua baixa escolaridade são

denunciadas, não pela pronúncia ou práticas de comportamento que Elisa já domina, mas

sim pelo recurso a certas expressões e vocábulos característicos de variedades subpadrão;

e, finalmente, uma terceira fase, em que Elisa se apresenta em pleno domínio da variedade

padrão, tanto ao nível da pronúncia padrão como ao nível do léxico e morfossintaxe, e das

práticas de comportamento partilhadas nas mais altas camadas da sociedade. A primeira

fase corresponderá, como tal, aos actos I e II em Pygmalion e às cenas 1 a 5 do acto 1 em

My Fair Lady; a segunda face corresponderá ao acto III em Pygmalion e à cena 6 do acto 1

em My Fair Lady; a terceira fase, aos actos IV e V em Pygmalion e ao acto II em My Fair

Lady.

A tabela 5 apresenta as percentagens médias relativas à recriação de variedades ficcionais

agora organizadas em três grupos correspondentes às três fases reconhecidas no processo

de aprendizagem de Elisa.

197
Parte IV - Análise

Variedade Variedade pouco Variedades não prestigiadas


prestigiada prestigiada

Padrão Oral Subpadrão Subpadrão Subpadrão


Regional Social Social
Específico

Sub-corpus Primeira Fase


não translato
% média 13% 27% 0% 60% 0%

Desvio Padrão 2% 3% 0% 2% 0%

Segunda Fase

% média 63% 21% 0% 21% 0%

Desvio Padrão 4% 2% 0% 2% 0%

Terceira Fase

% média 83% 16% 0% 1% 0%

Desvio Padrão 2% 2% 0% 3% 0%

Tabela 5: Percentagens médias das variedades ficcionais no sub-corpus não translato nas diferentes
fases de evolução da personagem Elisa face ao número total de unidades identificados em cada uma
das três fases definidas.

Face aos dados apresentados podemos concluir quanto a uma progressiva evolução de

aproximação à norma padrão, que denuncia uma progressiva aproximação da personagem

ao centro de prestígio e de subida na hierarquia social. Há um movimento de correlação

negativo evidente, em que à presença cada vez mais notória da variedade padrão

corresponde uma presença cada vez menos expressiva das variedades oral e subpadrão

social.

2.1.2. Recriação das variedades menos prestigiadas

Após a ponderação da recriação de variedades prestigiadas e menos prestigiadas, cabe

agora a este estudo ver de que forma foram recriadas as variedades oral e subpadrão,

procurando identificar regularidades de comportamento relativas ao nível linguístico. A

análise decorreu com a ponderação das percentagens médias correspondentes aos tipos

de marcas linguístico-textuais - morfossintaxe, escolha lexical e grafia - seleccionadas pelo

presente estudo. A tabela seguinte sistematiza os dados relativos às percentagens

correspondentes ao número de desvios morfossintácticos, gráficos e lexicais perante o

número total de marcas linguístico-textuais contabilizadas no sub-corpus não translato.

198
Parte IV - Análise

Morfossintaxe Grafia Escolha Lexical

Sub-corpus
não translato % média 37% 42% 22%

Desvio Padrão 2% 3% 2%

Tabela 6: Percentagens médias das marcas linguístico-textuais distintivas do discurso como oral
ou subpadrão no sub-corpus não translato.

Da leitura da tabela é possível concluir uma vez mais quanto à homogeneidade do corpus,

tendo em conta que os valores de desvio padrão se mostram muito inferiores ao limite

definido3 . Relativamente à recriação de variedades ficcionais, concluímos que o sub-corpus

não translato recorre preferencialmente a marcas gráficas (42%) e menos a marcas

morfossintácticas (37%) ou a marcas lexicais (22%). Manifestando uma considerável

diferença relativamente a textos de outros autores ingleses, nomeadamente Dickens, que

recorrem preferencialmente a marcas morfossintácticas na recriação de variedades

subpadrão (Rosa 2004: 720), o sub-corpus translato parece vir confirmar o estudo de Page

([1973] 1988: 57), onde se conclui que, sendo os desvios morfossintácticos de mais difícil

interpretação pelo leitor, a recriação em texto literário tende a tirar partido preferencialmente

de desvios de natureza gráfica que sugerem uma pronúncia não-padrão e se apresentam

como um desvio à norma ortográfica.

Relativamente à produção de momentos cómicos, mostrou-se importante perceber de que

forma eram recriadas as variedades menos prestigiadas em cada uma das fases

reconhecidas no processo de aprendizagem e evolução da personagem Elisa em que se

centram ambos os argumentos. Na tabela seguinte encontram-se sistematizadas as

percentagens médias das marcas linguístico-textuais no total de desvios identificados em

cada uma das fases definidas.

3cf. III-3.1 onde, à semelhança de procedimentos anteriores, e por forma a identificar o grau de homogeneidade
do grupo de textos em consideração e de dispersão dos dados, foram definidos intervalos de desvio padrão
que nos alertassem relativamente a uma análise possivelmente abusiva e quanto à necessidade de
consideração de níveis inferiores de análise. Aquando da análise dos níveis linguísticos de que a recriação de
variedades ficcionais tira partido, tendo em conta a dimensão superior de dados obtidos, foram tidos em
consideração os seguintes intervalos de desvio padrão: < = 10% (grupo de dados homogéneo); > 10% e < =
15% (grupo de dados ainda considerado homogéneo, mas merecedor de atenção, justificando a consideração de
um nível inferior de análise); > 15% (grupo notoriamente não homogéneo).

199
Parte IV - Análise

Morfossintaxe Grafia Escolha lexical

Sub-corpus Primeira Fase


não translato
% média 39% 38% 23%

Desvio Padrão 1% 1% 2%

Segunda Fase

% média 23% 15% 62%

Desvio Padrão 1% 1% 2%

Terceira Fase

% média 42% 52% 8%

Desvio Padrão 2% 2% 0%

Tabela 7: Percentagens médias das marcas linguístico-textuais distintivas do discurso como oral
ou subpadrão no sub-corpus não translato nas diferentes fases de evolução da personagem Elisa
face ao total de unidades identificadas em cada um das três fases definidas.

Como se pode concluir pela leitura da tabela 7, enquanto na primeira fase a recriação tira

partido dos três níveis linguísticos em proporções bastante semelhantes, numa segunda

fase a recriação tira fundamentalmente partido de desvios de natureza lexical (reduzindo a

presença dos desvios morfossintácticos e gráficos a um número mínimo) e em recriação de

variedade oral que, sendo comuns no modo escrito dificilmente seriam interpretados como

desvios. Numa terceira fase, os desvios identificados surgem apenas em momentos

específicos e introduzidos intencionalmente pela personagem Eliza que pretende

demonstrar o controle que detém sobre a língua.

2.2. Análise dos dados quantitativos do sub-corpus translato

Concentrando-se na análise do sub-corpus translato, cabe agora a este estudo, após a

recolha e organização dos dados, identificar as principais regularidades na recriação de

variedades linguísticas ficcionais, de modo a que seja possível não só reconhecer os

moldes em que a recriação se faz em texto traduzido para português, mas também

identificar, através de um estudo comparativo com os dados recolhidos pela análise do

sub-corpus não translato, as principais regularidades nas opções tradutórias.

200
Parte IV - Análise

Proceder-se-á a uma análise global dos dados recolhidos, a ser acompanhada

posteriormente por uma análise particular e condicionada, que procurará explorar níveis

inferiores de análise e identificar novas regularidades de comportamento. A esta análise

mais refinada, e com base nos dados e conclusões obtidas, seguir-se-á uma análise

qualitativa da correlação existente entre as regularidades identificadas e o meio a que se

destina a tradução, a data de tradução e a função prospectiva definida. Tendo em conta as

funções primárias da recriação de variedades linguísticas em texto ficcional, a análise terá

em consideração não apenas a opções assumidas ao nível da recriação, mas também os

diferentes contornos que estas possam ter introduzido nos textos em termos da

caracterização das personagens, das relações interpessoais e da produção de cómico.

2.2.1. Análise global do sub-corpus translato

Variedade prestigiada Variedade pouco Variedades não


(Padrão) prestigiada (Oral) prestigiadas (Subpadrão)

Sub-corpus % média 60% 15% 25%


translato
Desvio Padrão 10% 5% 10%

Estratégia ↑ 21% ↓ 31% ↓ 13%

Sub-corpus % média 50% 22% 28%


não translato

Tabela 8: Percentagens médias das variedades ficcionais prestigiadas e menos prestigiadas nos
sub-corpora translato e não translato.

A tabela 8 apresenta as percentagens médias relativas à recriação de variedades ficcionais

prestigiadas e menos prestigiadas nos sub-corpora translato e não translato. Os valores de

desvio padrão vêm confirmar a homogeneidade do sub-corpus, na medida em que nenhum

dos valores ultrapassa o limiar de 10% de desvio; contudo, tendo em conta os intervalos de

desvio padrão propostos em III-3.1, os valores aqui apresentados provam necessária a

ponderação individual dos casos relativamente às categorias padrão e subpadrão. Apesar

de uma análise global tornar possível a distinção de regularidades de comportamento

partilhadas por todas as traduções constitutivas deste sub-corpus, não podemos deixar de

201
Parte IV - Análise

ter em consideração a possibilidade de existirem novas regularidades de comportamento a

um nível mais particular de análise.

A leitura das percentagens médias agora apresentadas, torna evidente a predominância da

recriação de variedades prestigiadas, contando com 60% das unidades frásicas, face a

uma expressão mais reduzida das variedades oral e subpadrão. Encontramos, desta forma,

denunciada uma estratégia de centralização (cf. III-3.2.1), na medida em que, com base no

modelo proposto em II-3.4, se evidencia um movimento da periferia para o centro através

de uma estratégia de expansão de 20% da variedade padrão e de contracção de 30% e

11% das variedades oral e subpadrão respectivamente4.

Os dados apresentados revelam que parte das unidades identificadas como variedade oral

ou subpadrão foram recriadas como variedade padrão, apresentando-se esta como uma

das regularidades identificadas com o universal de normalização, tal como definido em

I-1.5. Tendo em conta o modelo proposto relativamente à valorização e grau de prestígio

das variedades, parece verificar-se em confirmação de estudos anteriores “uma preferência

pela selecção de repertoremas dotados de valor sócio-semiótico menos negativo no sub-

corpus translato” (Rosa, 2004: 725), isto é, uma preferência por variedades mais

prestigiadas em detrimento de variedades não prestigiadas. Esta ocorrência aponta, como

tal, para uma perda de parte dos significados comunicativos e sócio-semióticos de

caracterização da personagem, identificação do seu estatuto social e das relações de

poder estabelecidas no mundo ficcional, na medida em que o discurso se apresenta agora

mais próximo do discurso padrão, tido como não-marcado pelo leitor/espectador.

O estudo da correlação a existir entre as regularidades identificadas e os elementos

textuais e extratextuais definidos para a análise, permitirá a identificação deste

comportamento como resultante apenas do universal de tradução, confirmando-o, ou como

decorrente de normas tradutórias que este estudo procurará identificar.

4 Nesta tabela, assim como nas restantes tabelas presentes neste estudo, a estratégia de expansão vem
assinalada com uma seta ascendente (↑), enquanto a estratégia de contracção vem assinalada por uma seta
descendente (↓).

202
Parte IV - Análise

Tendo em conta o modelo proposto em II-3.5, serão tidas agora em consideração as

regularidades de comportamento relativamente ao nível linguístico preferencialmente

seleccionado para a distinção do discurso como oral ou subpadão.

Morfossintaxe Grafia Escolha lexical Recurso ao itálico

Sub-corpus % média 19% 50% 31% 3%


translato
Desvio Padrão 12% 22% 15% 8%

Estratégia *** *** *** ***

Sub-corpus % média 37% 42% 22% 0%


não translato

Tabela 9: Percentagens médias das marcas linguístico-textuais distintivas do discurso como oral ou
subpadrão nos sub-corpora translato e não translato.

A análise global das marcas textuais revelou-se uma interpretação abusiva dos dados

obtidos, pelo que foi abandonada. A não homogeneidade do corpus nesta matéria,

comprovada pelos valores de desvio padrão assumidos5 , levou ao abandono da análise

global, alertando-nos para a necessidade de uma análise particular dos dados, sobre a qual

o presente estudo se debruçará em seguida.

2.2.2. Ponderação de níveis inferiores de análise na análise global do sub-corpus

translato

Tendo em conta os limites de espaço impostos a um estudo desta natureza, a análise

particular dos dados terá desde logo em conta o meio a que as traduções se destinam.

5 Relembramos que, face à dimensão superior do grupo agora em análise, provou-se pertinente redefinir os
limites de homogeneidade, sendo agora tidos em consideração os intervalos de 0% a 10% (intervalo
identificativo de um corpus homogéneo) e de 10 a 15% (intervalo que, embora identifique o corpus como
homogéneo, reclama ponderação de um nível inferior de análise.

203
Parte IV - Análise

2.2.2.1. Recriação das variedades linguísticas

Variedade prestigiada Variedade pouco Variedades não


(Padrão) prestigiada (Oral) prestigiadas (Subpadrão)

Sub-corpus Tradução para publicação


translato
% média 58% 19% 23%

Desvio Padrão 8% 4% 10%

Estratégia ↑ 16% ↓ 14% ↓ 17%

Tradução para o palco

% média 52% 14% 34%

Desvio Padrão 2% 1% 3%

Estratégia ↑ 4% ↓ 36% ↑ 21%

Tradução para Legendagem

% média 70% 12% 18%

Desvio Padrão 9% 3% 10%

Estratégia ↑ 40% ↓ 45% ↓ 36%

Sub-corpus % média 50% 22% 28%


não translato

Tabela 10: Percentagens médias das variedades ficcionais no sub-corpus translato e organizadas
segundo o meio a que as traduções se destinam.

Em consonância com os dados obtidos na análise global do sub-corpus translato, as

traduções para publicação apresentam um movimento de centralização e de opção pela

variedade padrão mais prestigiada. A uma estratégia de expansão de 16% da variedade

padrão parece corresponder uma estratégia de contracção de 14% da variedade oral e de

17% das variedades subpadrão. As estratégias de expansão e de contracção surgem

representadas na tabela pelo recurso aos símbolos ↑ e ↓ a ser interpretados como

estratégias de expansão e estratégias de contracção respectivamente. O facto de os valores

de desvio padrão recaírem no intervalo de 5% a 10%, é promotor de um nível ainda mais

detalhado de análise que possa reconhecer novas regularidades de comportamento. A

ponderação dos valores apresentados individualmente por cada TC permitiu a identificação

de dois grupos distintos, alertando-nos para a necessidade de considerar outras variáveis

para além do meio. Os valores de desvio padrão associados aos dois grupos permitem a

204
Parte IV - Análise

continuação da análise com a certeza de que se trata de um agrupamento pertinente pela

homogeneidade apresentadas entre os seus constituintes.

Variedade prestigiada Variedade pouco Variedades não


(Padrão) prestigiada (Oral) prestigiadas (subpadrão)

Sub-corpus Tradução para Publicação I (TC 1 e TC 2)


translato
% média 66% 23% 11%

Desvio padrão 1% 2% 2%

Estratégia ↑ 32% ↑5% ↓ 60%

Tradução para Publicação II (TC 3, TC 4 e TC 5)

% média 52% 17% 31%

Desvio padrão 1% 4% 3%

Estratégia ↑ 4% ↓ 23% ↑ 11%

Sub-corpus % média 50% 22% 28%


não translato

Tabela 11: Percentagens médias relativas à recriação de variedades ficcionais nas traduções para
publicação.

Os dados agora expostos, embora confirmem a preferência pela variedade padrão (66% e

52%) e uma estratégia global de expansão das unidades de variedade padrão, denunciam

uma estratégia de expansão da variedade padrão mais tímida no grupo II (↑4% face a

↑32% no grupo I), assim como diferentes estratégias relativamente às variedades oral e

subpadrão. No primeiro grupo, composto pelos TC1 e TC26 , é possível reconhecer

percentagens mais elevadas na variedade oral do que nas variedades subpadrão,

correspondendo a esta ocorrência as estratégias de expansão da variedade oral (↑5%) e de

contracção das variedades subpadrão face aos textos de partida (↓60%), em denúncia da

recriação de unidades subpadrão como unidades das variedades padrão e oral. Esta

estratégia confirma não só um movimento de centralização, mas também um movimento

de convergência, pela não preferência de variedades nos extremos do contínuo. Os dados

aqui apresentados parecem confirmar os resultados de Rosa (2004) que conclui que à

6Relembramos que o acrónimo TC representa a expressão Texto de chegada, tendo sido os textos de chegada
constituintes do sub-corpus translato numerados de 1 a 12 seguindo uma organização, primeiro, pelo meio a que
se destina a tradução - traduções para publicação, palco e legendagem - e, segundo, pela ordem cronológica de
data de tradução dos TC presentes em cada um dos três grupos previamente formados. Cf. III-1.2.3 e III-1.2.4.

205
Parte IV - Análise

tendência de normalização parece estar associada a preferência por marcas de oralidade

para a distinção do discurso como subpadrão em texto literário.

No segundo grupo, constituído pelos TC3, TC4 e TC5, é possível reconhecer o movimento

contrário, sendo identificada às variedades subpadrão uma percentagem superior ao valor

reconhecido à variedade oral. O estudo comparativo com os textos de partida permite

identificar uma estratégia de contracção das unidades de variedade oral (↓23%) a ser

acompanhado por uma estratégia de expansão das unidades subpadrão (↑11%),

denunciando, por um lado, uma preferência pelos extremos do contínuo e, por outro, um

movimento de descentralização (cf. III-3.2.2). As percentagens apresentadas levam-nos a

concluir que, apesar de parte das unidades de variedade oral terem sido recriadas como

variedade padrão, uma percentagem bastante superior veio a ser recriada como variedade

subpadrão.

A identificação destas regularidades permitiu a este estudo colocar a hipótese de esta

variância resultar de uma evolução do sistema linguístico português. Tendo em conta as leis

de padronização e de interferência propostas por Toury (1995) (cf. I-1.5), espera-se que o

alinhamento cronológico das traduções denote uma presença cada vez maior de

variedades não-padrão e uma maior valorização da aceitabilidade, assim como uma menor

tolerância à interferência, resultando a variância agora identificada de uma maior

aceitabilidade da presença de variedades ficcionais em texto literário. Esta hipótese será

explorada em maior detalhe aquando da análise da correlação existente entre os dados

recolhidos e a variável data de tradução (cf. IV-2.2.4.1).

Um movimento de centralização bastante acentuado poderá ser igualmente reconhecido

nas traduções para legendagem, onde é possível identificar a mais elevada percentagem na

variedade padrão e as menos expressivas nas variedades oral e subpadrão. A proximidade

do valor de desvio padrão ao limiar de 10% conduz-nos novamente a uma consideração

particular dos dados, permitindo-nos reconhecer também aqui dois movimentos distintos.

206
Parte IV - Análise

Variedade prestigiada Variedade pouco Variedades não


(Padrão) prestigiada (Oral) prestigiadas (Subpadrão)

Sub-corpus Tradução para Legendagem I (TC 9 e TC 10)


translato
% média 78% 13% 9%

Desvio padrão 3% 3% 0%

Estratégia ↑ 56% ↓ 41% ↓ 66%

Tradução para Legendagem II (TC 11 e TC 12)

% média 63% 10% 27%

Desvio padrão 5% 0% 5%

Estratégia ↑ 26% ↓ 50% ↓ 5%

Sub-corpus % média 50% 22% 28%


não translato

Tabela 12: Percentagens médias relativas à recriação de variedades ficcionais nas traduções para
legendagem.

Pela leitura da tabela 12, apesar de ambos os grupos apresentarem um claro movimento de

centralização através de estratégias de expansão da variedade padrão e diminuição da

variedade oral, é possível reconhecer diferentes estratégias relativamente às variedades

subpadrão. Se no grupo I, constituído pelos TC9 e TC10, a preferência pela variedade

padrão (78% face a 13% de variedade oral e 9% de variedades subpadrão) parece ser

confirmada por uma estratégia de contracção bastante expressiva das variedades oral

(↓41%) e subpadrão (↓66%), no grupo II, constituído pelos TC11 e TC12, é possível

reconhecer uma presença quase idêntica relativamente às variedades subpadrão no total

de unidades dos sub-corpora de textos não translatos e translatos para legendagem.

Podendo reconhecer a percentagem mais baixa na variedade oral (10%), em denúncia de

uma estratégia de contracção de 50%, é possível concluir quanto a uma preferência pelos

extremos do contínuo. A variância aqui identificada sugere, uma vez mais, uma evolução do

sistema linguístico português sendo por este estudo colocada a hipótese de que um

alinhamento cronológico dos textos traduzidos para legendagem denotará uma evolução

no sentido de uma maior tolerância quanto à presença de variedades linguísticas em texto

traduzido para legendagem. Perante os dados recolhidos, tanto textuais como

extratextuais, podemos, no entanto, formular uma outra hipótese no sentido de um

diferente grau de tolerância relativamente a variedades ficcionais por canais privados e

207
Parte IV - Análise

canais públicos de televisão, na medida em que é possível fazer corresponder o grupo I às

traduções promovidas por um canal público de televisão (RTP) e o grupo II às traduções

promovidas por um canal privado (SIC). Assim como a hipótese anterior, também esta

segunda hipótese conhecerá uma maior atenção aquando da análise da correlação

existente entre os dados recolhidos e certas variáveis contextuais definidas pelo presente

estudo.

As traduções para o palco (cf. tabela 10) apresentam um claro movimento de

descentralização, sendo possível identificar uma estratégia de expansão de 21% na

categoria variedades subpadrão, fazendo com que esta categoria conheça nas traduções

para o palco a percentagem mais alta de entre todos os grupos identificados. Embora seja

de verificar um movimento de expansão da variedade padrão de 4%, esta categoria

conhece um dos valores mais baixos de entre todos os grupos, sendo acompanhada por

uma percentagem muito pouco expressiva de variedade oral (14%). Tendo em conta os

valores assumidos pelas variedades padrão e subpadrão, percebemos que a estratégia de

contracção da variedade oral na ordem dos 36%, parece estar associada a uma preferência

pelos extremos do contínuo e à recriação de parte das unidades de variedade oral como

unidades de variedade subpadrão. É assim possível reconhecer um claro movimento de

descentralização a ser identificado como o mais acentuado.

Tendo em consideração o modelo apresentado em II-3.4 em que diferentes variedades

subpadrão eram reconhecidas, procedeu-se à identificação das percentagens de

ocorrência das variedades subpadrão regional, social e social específico.

208
Parte IV - Análise

Variedade Variedade pouco Variedades não prestigiadas


prestigiada prestigiada

Padrão Oral Regional Social Social Específico

Sub-corpus TC 1 66% 22% 1% 11% 0%


translato

% médias TC 2 67% 24% 0% 9% 0%

TC 3 52% 18% 0% 30% 0%

TC 4 53% 12% 5% 29% 0%

TC 5 52% 20% 0% 29% 0%

TC 6 50% 13% 1% 36% 0%

TC 7 54% 14% 0% 32% 0%

TC 8 51% 15% 0% 35% 0%

TC 9 76% 15% 0% 9% 0%

TC 10 80% 10% 0% 10% 0%

TC 11 66% 11% 0% 23% 0%

TC 12 59% 11% 0% 30% 0%

Sub-corpus % média 50% 22% 0% 28% 0%


não translato

Tabela 13: Percentagens médias relativas à recriação de variedades subpadrão regional, social e social
específico no sub-corpus translato.

A leitura da tabela 13 torna evidente o facto de apenas três das traduções incluídas no sub-

corpus translato recorrerem a marcas conotadoras de regionalidade, e de forma muito

pouco expressiva, na recriação de variedades subpadrão, assim como uma ausência

completa de desvios denunciadores de pertença a um grupo social específico.

Relembrando que a recriação de variedades subpadrão em texto ficcional é feita

preferencialmente com base em marcas estereótipo, é-nos possível concluir que a

preferência pelas variedades subpadrão social resulta do desejo de evitar o perigo de

incongruência narrativa pela introdução de aspectos específicos ao contexto de chegada.

Tendo em conta o

209
Parte IV - Análise

testemunho deixado pelos tradutores em prefácio nos TC1 e TC4 7, é possível concluir que

o recurso a desvios característicos de uma variedade regional específica (o dialecto

nortenho) se deve, em grande medida, à falta de estudos publicados sobre as variedades

linguísticas em território português, assim como sobre o valor sócio-semiótico que estas

assumem em texto literário. A falta ou fraca divulgação de estudos confina o tradutor a

trabalhar com base na sua intuição, o que, em casos como os presentes, se traduz em

trabalhar com os dialectos com que estão mais familiarizados e de que dispõem mais

informação. Será relevante ter em consideração que os desvios regionais, se actualmente

reclamam um estatuto de variedade linguística distinta (mas não inferior) da norma padrão,

às datas de tradução dos TC1 e TC6 (1962 e 1945 respectivamente), às variedades

regionais tenderia a ser reconhecido pelo falante comum um estatuto de inferioridade face

à norma padrão, sendo-lhes associadas as noções de ‘incorrecto’, ‘inferior’, ‘pobre’. É

assim possível levantar a hipótese de que a recriação de variedades regionais procura

responder ao desafio de recriar uma variedade subpadrão social e não tanto a distinção da

personagem como proveniente de uma região específica. Em confirmação parece estar o

facto de a presença de variedades subpadrão regional assumir uma expressão muito ténue,

reduzindo-se, de facto, a um único tipo de desvio - a indistinção entre [b] e [v] característica

do dialecto nortenho. Tendo em conta que são apenas três os casos de ocorrência de

variedade subpadrão regional e que esta nunca excede o valor de 5%, o foco de análise

recairá preferencialmente nas variedades subpadrão social, sendo feita referência à

variedade regional apenas quando pertinente.

7 Na tradução de 1962, é-nos deixado o seguinte testemunho na “Advertência para a tradução”: “na falta de
melhor e até porque não estou familiarizada com o falar do vulgo das nossas grandes cidades, optei, para este
efeito, pelos modos de dizer populares da região nortenha que melhor conheço” (1962: 9). Na tradução de 1987
são dedicadas palavras semelhantes ao leitor, sendo ainda possível testemunhar uma recriação que recorre a
elementos estereótipo de diferentes variedades:

“Não existe em Portugal nenhuma cidade de certa importância que possua uma linguagem tão
característica […] por isso é necessário optar por uma solução que confira alguma
verosimilhança especialmente às personagens [...]. Achei por bem optar por pô-las a falar
aproximadamente segundo o padrão dialectal das Beiras, embora por vezes se possam
encontrar expressões de outras áreas e até mais tipicamente Lisboa” (1987: 6).

O tradutor testemunha ainda que a recriação foi conseguida com base na intuição pessoal: “Obviamente que
não pretendi - nem para isso possuo competência - converter estas passagens [...] em pequenos tratados de
Fonética ou de Dialectologia. Por isso, aos especialistas peço a sua complacência” (1987: 6).

210
Parte IV - Análise

Cabe agora perceber qual o impacto de ambos os movimentos - centralização e

descentralização - na caracterização da personagem, na definição das relações

interpessoais e na produção de cómico.

A regularidade de tradução em que as variedades subpadrão conhecem uma expressão

bastante reduzida, sendo a variação linguística recriada preferencialmente pela variedade

padrão e variedade oral, vem confirmar o resultado de estudos anteriores (cf. Dimitrova

1997, Rosa 1999, 2004; Leppihalme 2000a, 2000b) que identificam uma tendência global

para a normalização. Os textos de chegada manifestam assim a opção por repertoremas

menos desprestigiados que os identificados no TP, apresentando um desvio no valor sócio-

semiótico destes que se vê reduzido na mesma proporção reconhecida à estratégia de

contracção identificada. No seguimento de Rosa, “os conteúdos interpessoais e os sinais

informativos que estas variedades literárias encerram são [...] preteridos em favor de

conteúdos referenciais que o discurso citado exprime” (2004: 725). Esta forte normalização

do discurso resulta, por vezes, numa profunda alteração do perfil linguístico de certas

personagens secundárias, que no TP apresentam um discurso vincadamente subpadrão e,

por outras, à redução da definição das relações interpessoais ao recurso de determinadas

formas de tratamento8. São disso exemplo o seguinte excerto:

EXEMPLO

Texto de partida [MFL56, p.15]

Eliza: (wailing) Two banches of violets trod into the mad! A full day wages. Why don’t yu look where you’re

goin?

Mrs Eynsford-Hill: Get a Taxi, Freddy. Do you want me to catch pneumonia?

Freddy: I’m sorry, mother. I’ll get a taxi right away. […]

Eliza: (to Mrs Eynsford-Hill) Oh, he’s yo son, is he? Wal, if yu’d done yo duty by him as a mother should, you

wouldn’t let him spawl a poor girl’s flowers and then ran aways without pyin.

Mrs Eynsford-Hill: Go on about your business, my girl. (She follows her son)

8 Apesar de este aspecto da análise vir a ser explorado em pormenor mais adiante, é importante relembrar que,
nas traduções para o palco assim como nas traduções para legendagem, ao contrário do que acontece nas
traduções para publicação, o vestuário, a entoação e o comportamento das personagens (presentes no TP no
caso do texto fílmico) auxiliarão o espectador na definição das relações interpessoais, surgindo estes como um
factor de compensação à normalização do discurso.

211
Parte IV - Análise

Eliza: (muttering to herself, as she collects the flowers) Two banches of flowers trod into the mad

Pickering: (calling off) Taxi! Taxi!

Eliza: (to Pickering) I say, Captain, buy a flower off a poor girl.

Pickering: I’am sorry. I haven’t any change.

Exemplo [TC2, pp. 12 e 13]

Eliza: (Choramingando) Dois ramos de violetas calcados na lama! O lucro de todo um dia. Porque não

olha para onde põe os pés?

Srª Eynsford-Hill: Arranja um táxi, Freddy. Queres que eu apanhe uma pneumonia?

Freddy: Perdoe-me mãe. Vou arranjar imediatamente um táxi. (Afasta-se). [...]

Eliza: (para a Srª Eynsford-Hill) Oh, ele é seu filho? Bem, se fizesse como deve o seu papel de mãe, não o

deixaria calcar as flores de uma pobre rapariga e depois fugir sem pagar.

Srª Eynsford-Hill: Trata da tua vida, sim, rapariga. (Segue o filho).

Eliza: (lamentando-se, enquanto reúne as flores) Dois ramos de violetas calcados na lama.

Pickering: Taxi! Taxi!

Eliza: (para Pickering) Capitão, compre uma flor a uma pobre rapariga.

Pickering: Sinto muito, mas não tenho dinheiro miúdo.

A função de primeira ordem de caracterização indirecta da personagem Elisa, assim como

a definição das relações interpessoais de solidariedade ou de poder que mantém com as

restantes personagens, vê-se assim reduzida, sustentando-se agora mais na acção (no

caso das traduções para o palco e para legendagem) e na informação directa das

didascálias (no caso das traduções para publicação). Será de notar a interferência na

produção de cómico no mesmo sentido, sendo que por vezes determinados momentos

cómicos presentes no TP se vêem diminuídos no seu propósito cómico ou, inclusive,

anulados nos textos de chegada. Este é um factor particularmente relevante tendo em

conta que, com base na publicitação do texto/filme como comédia, a atenuação ou

anulação de momentos cómicos poderá ter como consequência última o não-cumprimento

das expectativas do leitor/espectador e a possível rejeição da tradução.

212
Parte IV - Análise

EXEMPLO

Texto de Partida [Pyg38]

Taxi driver: Ever been in a taxi before?

Eliza: Undreds and tousans of times! Impidence!

Texto de chegada [TC9]

Taxista: Alguma vez andou de taxi?

Elisa: Centenhas, milhares de vezes. Impudência!

O movimento contrário poderá ser verificado nas traduções em que foi identificado um

movimento de descentralização. Em contraste com a regularidade anteriormente descrita, a

variedade subpadrão social conhece neste segundo grupo uma presença bastante

expressiva, desafiando o universal de normalização. A opção por repertoremas a que é

reconhecido um valor sócio-semiótico semelhante ou mais negativo do que os identificados

no TP denuncia uma maior atenção dada aos conteúdos interpessoais e aos sinais

informativos que as variedades ficcionais exprimem. O perfil reconhecido à personagem no

TP é assim mantido nos textos de chegada, assim como as relações interpessoais, tanto de

solidariedade como de poder. Será, no entanto, importante notar que nos casos em que a

recriação recorreu a um número muito superior de desvios subpadrão ou a desvios de

prestígio inferior relativamente aos desvios identificado no TP, o perfil da personagem veio a

ser igualmente alterado, tornando-se mais negativo e mais marcado. Exemplo disso serão

os TC 5 e TC8 em que a recriação de uma linguagem calão bastante mais desprestigiada

que os desvios subpadrão identificados no TP, assim como a apresentação da personagem

como belfa (troca do “e” por “g”) resultou numa alteração do perfil da personagem que

agora nos surge como pouco respeitadora, insultuosa e com uma deficiência de fala.

Exemplo

Texto de partida [MFL56, p. 32]

Eliza: Oh, we are proud! He ain’t above giving lessons, not him: I heard him say so. Well, I ain’t come here

to ask for any compliment; and if my money’s not good enough I can go elsewhere.

213
Parte IV - Análise

Higgins: Good enough for what?

Eliza: Good enough for ye-oo. Now you know don’t you? I’m come to have lessons, I am. And to pay for

‘em too: make no mistake.

Texto de chegada [TC8, Acto I, cena III]

Elisa: Não lhe integuessa se eu vim de táxi, mas integuessa-lhe dar lições. (Para o professor Higgins)

Olhó, pgofessog, se o meu dinheigo não pegesta é que me ponho já na alheta, tá óvigue?

Higgins: Não presta para quê?

Elisa: Se calhag não peguesta paga si. Venho cá paga o senhogue me dague lições, mas eu pago as

lições, tá, óvigue?

Em consequência, também na produção de cómico se nota uma alteração de

comportamento, na medida em que, se na maioria dos casos são mantidos os momentos

cómicos identificados no TP, nos casos em que é possível identificar o recurso a desvios de

valor sócio-semiótico mais negativo do que no TP deve ser igualmente identificada a

introdução de momentos cómicos ausentes no TP e a alteração do seu perfil, levando a

que a função satírica do TP, antes velada, seja agora evidente nos textos de chegada.

Exemplo

Texto de partida [MFL56]

Eliza: My aunt died of influenza, so they said. (Mrs Eynsford-Hill clicks her tongue synpathetically) But it’s

my belief they done the old woman in. [...]

Mrs Higgins: Done her in?

Eliza: Yes, Lord love you! Why should she die of influenza when she come through diphteria right enough

the year before? Fairly blue with it she was. [...]

Lord Boxinghton: (nervously loud) Done her in? Done her in did you say?

Higgins: (hastily) Oh, that’s the new small talk. To do a person in means to kill them.

Texto de chegada [TC8, Acto I, cena VI]

Elisa: É o que dizem, mas cá para mim morreu de gripe uma porra!

Senhora Eynsford-Hill: Uma quê?!

214
Parte IV - Análise

Higgins: É uma palavra muito em voga na alta sociedade.

Elisa: Limparam o sebo à velha.

Senhora Eynsford-Hill: Limparam o quê à pobre senhora?

Elisa: O sebo! Sim. Porque é que ela havia de marar com uma gripe, se ela tinha escapado um ano antes

a uma soltura? [...]

Elisa: Foi, foi. Foi no salão que lhe limparam o sebo!

Senhora Boxington: Limparam-lhe o quê?

Senhora eynsford-Hill: A porra do Sebo!

Clara: Oh mamã!

Senhora Eynsford-Hill: Oh, filha, é chique!

Apesar da fraca expressão assumida pela variedade subpadrão regional, será importante

colocar a hipótese de a sua presença, pelo reconhecimento imediato do desvio em causa

(indistinção entre [b] e [v]) como característico da região norte de Portugal, ter vindo a

introduzir alguma incongruência pelo recurso a um dialecto característico de uma região

específica portuguesa quando a acção decorre em Londres 9 . A identificação da

personagem como natural da região norte de Portugal conseguida por via indirecta pela

identificação dos desvios regionais como típicos da região nortenha, teve possivelmente de

ser reajustada aquando da identificação explícita feita pelo prof. Higgins de que a

personagem era natural de Londres.

2.2.2.2. Recriação das variedades menos prestigiadas

Após o estudo da presença das variedades padrão, oral e subpadrão no sub-corpus

translato, cabe agora a este estudo ver de que forma foram recriadas as variedades oral e

subpadrão, procurado identificar regularidades de comportamento relativas ao nível

linguístico. A análise procedeu com a ponderação das percentagens médias

correspondentes aos tipos de marcas linguístico-textuais, morfossintaxe, escolha lexical e

9 Tal como referido em II-3.2.1, a opção por recorrer a desvios de diversos dialectos evitando a distinção de
dialectos regionais decorre da previsão do risco de incongruência linguística. A especificidade das variedades
linguísticas pode levar a uma translocalização indirecta do enredo, podendo esta, no caso de uma não
suspensão da descrença resultar numa situação de incongruência linguística não aceite pelo leitor.

215
Parte IV - Análise

grafia - seleccionadas pelo presente estudo, encontrando-se sistematizados na tabela 14

os dados relativos às percentagens correspondentes ao número de desvios

morfossintácticos, gráficos e lexicais perante o número total de marcas linguístico-textuais

contabilizado nos sub-corpora translato e não translato.

Morfossintaxe Grafia Escolha lexical

Sub-corpus Trad. para publicação


translato
% média 21% 46% 33%

Desvio Padrão 1% 13% 13%

Estratégia *** *** ***

Trad. para o palco

% média 22% 54% 24%

Desvio Padrão 6% 11% 9%

Estratégia ↓ 40% ↑ 28% ↓ 10%

Trad. para Legendagem

% média 15% 53% 32%

Desvio Padrão 9% 24% 16%

Estratégia *** *** ***

Sub-corpus não % média 37% 42% 22%


translato

Tabela 14: Percentagens médias relativas ao número total de marcas linguístico-textuais distintivas do
discurso como oral ou subpadrão nos sub-corpora translato e não translato.

Os dados sistematizados tornam evidente a não validade deste agrupamento condicionado

na medida em que os grupos formados, com excepção das traduções para teatro, não

demonstram homogeneidade ou regularidade de comportamento, tal como nos é

evidenciado pelos valores de desvio padrão assumidos. Procedeu-se assim a uma análise

individual dos TC incluídos os grupos compostos pelas traduções para publicação e

traduções para legendagem (grupos que apresentaram um desvio padrão superior a 15%),

por forma a identificar novas regularidades de comportamento.

Relativamente às traduções para publicação, evidenciam-se, em confirmação de

regularidades identificadas anteriormente, dois grupos distintos, um primeiro inclusivo dos

TC1 e TC2 e, um segundo, constituído pelo TC3, TC4 e TC5.

216
Parte IV - Análise

Morfossintaxe Grafia Escolha lexical

Sub-corpus Tradução para publicação I (TC1 e TC2)


translato
% média 22% 31% 47%

Desvio Padrão 1% 2% 3%

Estratégia ↓ 41% ↓ 26% ↑ 114%

Tradução para publicação II (TC3, TC4 e TC5)

% média 21% 55% 24%

Desvio Padrão 1% 4% 3%

Estratégia ↓ 43% ↑ 31% ↑ 8%

Sub-corpus não % média 37% 42% 22%


translato

Tabela 15: Percentagens médias relativas às marcas linguístico-textuais distintivas do discurso como
oral ou subpadrão nos dois grupos identificados nas traduções para publicação.

No primeiro grupo, é manifesta a preferência por marcas ao nível da escolha lexical (47%),

categoria que conhece uma estratégia de expansão de 114% face ao texto de partida, em

contraposto a uma não preferência por marcas morfossintácticas (22%) e gráficas (31%)

que conhecem uma estratégia de contracção de 41% e 26% respectivamente. Apesar da

opção pela manutenção da variação linguística nos textos de chegada, é possível

reconhecer a opção por desvios a que é reconhecido um menor grau de gravidade no

contexto de chegada, podendo esta estratégia ser interpretada como uma tentativa de

preservação do discurso e de aproximação à norma padrão. Os dados obtidos, embora

contrariem os resultados de Rosa (2004) que identifica uma diminuição de marcas lexicais e

gráficas e um aumento de marcas morfossintácticas, vêm confirmar os resultados de

Dimitrova (1997) e Rosa (1998, 1999).

O segundo grupo, embora manifeste a mesma não preferência por marcas denunciadoras

de desvio morfossintáctico (21%), resultante de uma estratégia de contracção de 43%,

denuncia, no entanto, uma patente preferência por marcas gráficas, que conhecem uma

percentagem de ocorrência de 55% em resultado de uma estratégia de expansão de 31%,

e por marcas lexicais, que, denunciando uma estratégia de expansão de 8%, apresentam

uma ocorrência de 24%. O estudo comparativo dos dois grupos parece denunciar uma

217
Parte IV - Análise

aparente correlação, por um lado, entre o movimento de centralização e o recurso a

desvios com um valor sócio-semiótico menos negativo, e por outro, o movimento de

descentralização e o recurso a marcas de conotação mais negativa relativamente ao seu

nível de gravidade. Prova-se agora relevante explorar a hipótese de uma alteração dos

sistema linguístico português não apenas em relação a uma maior aceitabilidade da

presença de variedades linguísticas em texto ficcional, mas também de uma maior

aceitabilidade de desvios à norma ortográfica na recriação das variedades oral e subpadrão

em texto ficcional.

As traduções para legendagem, confirmando igualmente as regularidade identificadas

aquando da análise da recriação de variedades prestigiadas e não prestigiadas, tornam,

uma vez mais, evidente a divisão em dois grupos distintos.

Morfossintaxe Grafia Escolha lexical

Sub-corpus Tradução para legendagem I (TC9 e TC10)


translato
% média 22% 32% 46%

Desvio Padrão 4% 2% 3%

Estratégia ↓ 41% ↓ 24% ↑109%

Tradução para legendagem II (TC11 e TC12)

% média 8% 73% 19%

Desvio Padrão 2% 2% 0%

Estratégia ↓ 79% ↑ 75% ↓ 14%

Sub-corpus não % média 37% 42% 22%


translato

Tabela 16: Percentagens médias relativas às marcas linguístico-textuais distintivas do discurso como
oral ou subpadrão nos dois grupos identificados nas traduções para legendagem.

No primeiro grupo, composto pelos TC9 e TC10, é manifesta a preferência por marcas

lexicais, cuja presença de 46% parece resultar de uma estratégia de expansão de 109%,

face a marcas de nível morfossintáctico e gráfico que, conhecendo uma estratégia de

contracção de 41% e 24% respectivamente face ao texto de partida, assumem

percentagens de ocorrência de 22% e 32% respectivamente. Uma vez mais, o movimento

de centralização identificado em relação à recriação de variedades prestigiadas e não

218
Parte IV - Análise

prestigiadas exibe uma aparente correlação com o recurso a marcas a que é reconhecido

um menor grau de gravidade. No segundo grupo, composto pelos TC11 e TC12, é possível

reconhecer uma preferência por desvios gráficos que assumem uma presença na ordem

dos 73%, enquanto os desvios morfossintácticos conhecem percentagens de ocorrência

de 8% e os desvios lexicais de 19%. Em consonância parece estar a estratégia de

contracção das marcas morfossintácticas (↓ 79%), agora acompanhada por uma estratégia

de contracção das marcas de natureza lexical (↓ 14%) e uma estratégia de expansão das

marcas gráficas de 75%. A preferência por marcas gráficas, a que é reconhecido um grau

mais elevado em termos da gravidade do desvio face às marcas lexicais preferencialmente

seleccionadas no grupo I, parece denunciar um discurso inovador resultante de uma maior

aceitabilidade de desvios à norma ortográfica. As regularidades encontradas parecem

novamente suportar as hipóteses de uma evolução do sistema linguístico português, tal

como proposto anteriormente, assim como de uma distinção a fazer entre a tradução

promovida por canais públicos e canais privados de televisão, propostas a ser exploradas

aquando da ponderação da correlação existente entre as regularidades identificadas e as

variáveis contextuais.

As traduções para teatro, denunciando uma clara homogeneidade, tornam evidente a

preferência por marcas gráficas (54%), que apresentam uma estratégia de expansão de

28% em detrimento de marcas lexicais e morfossintácticas, que conhecem percentagens

de ocorrência de 24% e 22% respectivamente em resultado de estratégias de contracção

de 10% e 40% respectivamente face ao texto de partida.

Morfossintaxe Grafia Escolha lexical

Sub-corpus Trad. para o palco


translato
% média 22% 54% 24%

Desvio Padrão 6% 11% 9%

Estratégia ↓ 40% ↑ 28% ↓ 10%

Sub-corpus não % média 37% 42% 22%


translato

Tabela 17: Percentagens médias relativas às marcas linguístico-textuais distintivas do discurso como
oral ou subpadrão nos dois grupos identificados nas traduções para o palco.

219
Parte IV - Análise

O estudo comparativo dos dados relativos às traduções para o palco e aos grupos II das

traduções para publicação e legendagem (três grupos que apresentam o mesmo tipo de

estratégias) permite-nos concluir que as traduções para o palco, apesar de conhecerem um

número inferior de marcas de natureza gráfica, apresentam valores iguais ou superiores

relativamente a marcas de natureza morfossintáctica, denunciando uma opção de valor

sócio-semiótico mais negativo.

Na tabela 18 são sistematizados os dados relativos às percentagens correspondentes ao

número de desvios em recriação das variedades oral e subpadrão perante o número de

marcas linguístico-textuais contabilizadas no sub-corpus translato em cada um dos níveis

seleccionados para a categorização. Procedeu-se a esta organização dos dados de forma a

poder ser identificada a variedade preferencialmente recriada em cada um dos níveis

linguísticos. Tendo em conta os grupos identificados anteriormente, os dados foram

organizados seguindo esse mesmo modelo, vindo a provar-se uma vez mais a sua

pertinência e homogeneidade pelos valores de desvio padrão que apresentam.

220
Parte IV - Análise

Morfossintaxe Grafia Escolha Lexical

Oral Subpadrão Oral Subpadrão Oral Subpadrão

Sub-corpus Trad. para publicação I


translato
% média 89% 11% 17% 83% 74% 26%

Desvio Padrão 14% 14% 12% 12% 0% 0%

Trad. para publicação II

% média 73% 27% 12% 88% 23% 77%

Desvio Padrão 8% 8% 12% 12% 10% 10%

Trad. para o palco

% média 73% 27% 17% 83% 33% 67%

Desvio Padrão 4% 4% 12% 12% 8% 8%

Trad. para Legendagem I

% média 90% 10% 55% 45% 58% 42%

Desvio Padrão 11% 11% 10% 10% 4% 4%

Trad. para Legendagem II

% média 88% 12% 32% 68% 45% 55%

Desvio Padrão 14% 14% 2% 2% 4% 4%

Tabela 18: Percentagens médias relativas às marcas linguístico-textuais distintivas do discurso como
oral ou subpadrão face ao número total de desvios identificados em cada um dos níveis
estabelecidos.

A leitura da tabela torna evidente a preferência por marcas de natureza lexical e gráfica na

recriação de variedades subpadrão social, sendo possível identificar que, em todos os

grupos definidos, a maioria dos desvios morfossintácticos expressa oralidade. Será, no

entanto, de verificar que nos grupos a que foram reconhecidos movimentos de

descentralização (traduções para publicação II, traduções para o palco e traduções para

legendagem II), podem agora ser identificados os valores mais elevados de desvios

morfossintácticos em recriação de variedades subpadrão. Tendo uma vez mais em conta o

contínuo que coloca os desvios morfossintácticos no extremo de maior gravidade, é assim

novamente confirmada a correlação entre o movimento de descentralização e o recurso a

marcas linguístico-textuais de valor sócio-semiótico mais negativo na recriação de

variedades subpadrão.

De uma forma geral, os desvios gráficos parecem conhecer a preferência dos tradutores na

recriação de variedades subpadrão, sendo de notar como excepção as traduções para

221
Parte IV - Análise

legendagem I que, em confirmação do movimento de centralização anteriormente

identificado, tornam manifesto o facto de, em cada um dos três níveis seleccionados, a

maioria dos desvios ser expressiva de oralidade e não de variedades subpadrão.

Os desvios lexicais conhecem em dois dos grupos definidos - traduções para publicação I

e traduções para legendagem I - percentagens mais elevadas na categoria desvio lexical

expressivo de oralidade. Os restantes grupos em estudo - traduções para publicação II,

traduções para o palco e traduções para legendagem II - apresentam regularidades

contrárias, na medida em que o valor mais elevado de ocorrência pode agora ser

reconhecido na categoria de desvios lexicais expressivos de variedades subpadrão.

Tendo ainda em atenção a análise dos níveis linguísticos seleccionados para a recriação de

variedades ficcionais, provou-se igualmente relevante ponderar os valores de ocorrência de

cada categoria no total de desvios em recriação de variedades não-padrão. Espera-se

assim ser possível, por um lado, identificar as categorias alvo de uma maior preferência na

recriação das variedades ficcionais e, por outro, definir um contínuo hierarquizador das

diferentes categorias manifestador das preferências pelo alinhamento destas da que

conhece o valor menos expressivo à que recebe o valor mais elevado. A tabela 19

sistematiza as percentagens relativas aos desvios morfossintácticos, gráficos e lexicais face

ao número total de desvios expressivos das variedades oral e subpadrão.

222
Parte IV - Análise

Variedade oral Variedades Subpadrão

Morfossintaxe Grafia Escolha Total Morfossintaxe Grafia Escolha Total


Lexical Lexical

Trad. para publicação I

% média 19% 6% 35% 60% 2% 26% 12% 40%

Desvio Padrão 1% 5% 8% *** 3% 4% 3% ***

Trad. para publicação II

% média 15% 7% 5% 27% 6% 49% 18% 73%

Desvio Padrão 8% 6% 2% *** 2% 10% 6% ***

Trad. para o palco

% média 16% 9% 8% 33% 6% 45% 16% 67%

Desvio Padrão 4% 7% 1% *** 2% 9% 3% ***

Trad. para Legendagem I

% média 20% 18% 27% 65% 2% 14% 19% 35%

Desvio Padrão 2% 2% 9% *** 3% 5% 3% ***

Trad. para Legendagem II

% média 7% 24% 8% 39% 1% 50% 11% 62%

Desvio Padrão 1% 2% 1% *** 1% 0% 1% ***

Tabela 19: Percentagens médias relativas às marcas linguístico-textuais distintivas do discurso como
oral ou subpadrão face ao número total de desvios identificados.

Antes de um olhar particular sobre as percentagens reconhecidas em cada um dos níveis

linguísticos definidos, será relevante atender às percentagens totais reconhecidas às

variedades oral e subpadrão. Neste nível de análise tornam-se evidentes os valores mais

elevados reconhecidos aos desvios expressivos de oralidade nas traduções para

publicação I e nas traduções para legendagem I, em contraposto com os restantes grupos

que denunciam valores mais elevados na categoria de desvios expressivos de variedades

subpadrão. Os movimentos de centralização e descentralização anteriormente identificados

parecem ser uma vez mais confirmados.

Procedendo agora a um alinhamento hierarquizador das categorias segundo a

percentagem de ocorrência, são identificados os seguintes aspectos. Nas traduções para

publicação I, a percentagem mais elevada é reconhecida aos desvios lexicais conotadores

de oralidade, sendo as variedades subpadrão maioritariamente recriadas através de

desvios gráficos que se destacam com a segunda percentagem mais elevada. Esta

223
Parte IV - Análise

regularidade parece confirmar o movimento de centralização identificado anteriormente,

tanto pelo facto de a categoria que conhece uma percentagem mais elevada ser expressiva

de oralidade, como pelo facto de a variedade subpadrão ser recriada maioritariamente

através de desvios gráficos e lexicais, procurando evitar o recurso a desvios

morfossintácticos com um valor sócio-semiótico mais negativo. O movimento de acentuada

centralização reconhecida às traduções para legendagem I parece ser igualmente

confirmado pelos dados agora em análise, na medida em que, neste grupo, as

percentagens mais elevadas são reconhecidas aos desvios lexicais e gráficos em

expressão de oralidade. Igualmente em confirmação de regularidades anteriormente

identificadas, será de reconhecer que as variedades subpadrão são preferencialmente

recriadas através de desvios lexicais, aos quais é reconhecido um valor sócio-semiótico

menos negativo.

Nas traduções para publicação II, os desvios gráficos e lexicais em recriação de variedades

subpadrão vêm a conhecer as percentagens mais elevadas, confirmando não só o facto de

a distinção do discurso como menos prestigiado ser conseguida maioritariamente pela

demarcação deste como subpadrão, como também o movimento de descentralização

identificado anteriormente. As traduções para o palco denunciam regularidades

semelhantes, sendo nas categorias de desvios gráficos em recriação de variedades

subpadrão reconhecida a percentagem de ocorrência mais elevada. Também aqui parece

ser confirmado o movimento de descentralização identificado, sendo ainda de destacar o

facto de a categoria de desvios morfossintácticos expressivos de variedades subpadrão

conhecer a percentagem mais elevada de entre todos os grupos definidos. Nas traduções

para legendagem II, os desvios gráficos são alvo de uma preferência clara tanto quando em

expressão de oralidade, como em expressão de variedades subpadrão. Sendo neste grupo

manifesto o equilíbrio existente entre a presença de desvios expressivos de oralidade e de

desvios expressivos de variedades subpadrão, parece também assim ser confirmado o

movimento reconhecido anteriormente de uma normalização do discurso menos acentuada

quando em comparação com as restantes traduções para legendagem, pela presença mais

significativa de marcas de desvio expressivas de variedades subpadrão.

224
Parte IV - Análise

Num estudo que tem por objectivo a análise da recriação da variação linguística em

diferentes meios, torna-se relevante perceber que presença efectiva têm os desvios no

número de unidades identificadas como não-padrão. Terminada a análise da distribuição

dos diferentes níveis linguísticos pelo número total de desvios, procedeu-se à análise da

frequência de ocorrência de desvios caracterizadores do discurso como não-padrão

relativamente ao número de unidades tradutórias identificadas. Procedeu-se, assim, ao

cálculo do número de desvios existentes em média em cada unidade tradutória e em cada

unidade tradutória não-padrão.

Nº de desvios por Nº de desvios por unidade


unidade tradutória tradutória não-padrão

Sub-corpus Tradução para publicação I 0,6 1,4


translato
Tradução para publicação II 1 2,5

Tradução para o palco 1,3 2,7

Tradução para legendagem I 0,3 1,2

Tradução para legendagem II 0,6 1,5

Tabela 20: Percentagens médias relativas às marcas linguístico-textuais distintivas do discurso


como oral ou subpadrão face ao número total de unidades tradutórias e unidades tradutórias
não-padrão.

Pela leitura da tabela 20 é possível reconhecer que as traduções para o palco são as que

mais tiram partido de desvios denunciadores de discurso não-padrão, tanto face ao número

total de unidades tradutórias, como de unidades tradutórias não-padrão. A um movimento

de descentralização bastante acentuado (o mais significativo de entre todos os grupos

identificados) parece ser possível associar não só a recriação mais expressiva de

variedades subpadrão, mas também a introdução de desvios de forma regular e em número

mais significativo. Às traduções para publicação II e legendagem II, grupos a que foram

igualmente reconhecidos movimentos de descentralização, são reconhecidos os segundos

valores mais elevados, sendo possível identificar os valores mais baixos nos grupos a que

foram reconhecidos movimentos de centralização (traduções para publicação I e traduções

para legendagem I). Aos movimentos de centralização parece ser igualmente possível

225
Parte IV - Análise

associar não só o recurso preferencial à norma padrão, mas também a distinção do

discurso como subpadrão pela introdução do menor número possível de desvios.

2.2.3. Correlação das regularidades identificadas com as variáveis contextuais: o meio

a que se destina o TC

Tendo este estudo como objectivo a ponderação da variável meio na recriação de

variedades linguísticas em texto ficcional, procedeu-se a uma ponderação qualitativa da

correlação a existir entre as regularidades identificadas e as características inerentes aos

meios em estudo, previamente discutidos em II-2.3.1.

Com base nas regularidades de comportamento identificadas pela análise quantitativa, a

variável meio parece não ser uma variável condicionante da escolha entre a recriação ou

não recriação de variedades linguísticas, na medida em que todas as traduções denunciam

a opção pela preservação da variação linguística. Tendo em consideração o modelo

apresentado em II-3.3.3 concluímos que todas as traduções constituintes do sub-corpus

translato optam igualmente pela preservação das coordenadas de espaço e de tempo do

TP, assim como pelo recurso a marcas familiares reconhecidas como não-padrão no

contexto de chegada. Embora assumam estratégias diferentes na recriação e as diferentes

variedades apresentem percentagens de frequência também distintas, é possível concluir

que todos os textos de chegada recorrem a marcas oralidade na recriação do discurso

desprestigiado e que, evitando desvios denunciadores de pertença a uma região ou grupo

social específicos, recorrem a marcas de diversas variedades linguísticas desviantes do

padrão e de reconhecimento imediato pelo leitor que permitem a sua identificação como

subpadrão.

Parece, no entanto, não ser possível excluir por completo a variável meio como

condicionante da forma como é gerida a presença de cada uma das variedades em texto

ficcional, a proeminência dada a determinada variedade em detrimento de outra. Apesar

das diferenças reconhecidas no seio das traduções para publicação e das traduções para

legendagem, que nos conduzem à ponderação de outras variáveis para além do meio, não

podemos deixar de reconhecer a tendência geral das traduções para legendagem no

226
Parte IV - Análise

sentido de uma preferência pela variedade padrão e por movimentos de centralização,

assim como a tendência contrária das traduções para o palco, que apresentam o mais

notório movimento de descentralização e de preferência pelos extremos do contínuo.

Tendo em conta as motivações diversas que poderão estar na base de uma estratégia de

centralização discutidas em II-3.2.2, a associação estabelecida entre modo escrito, norma

ortográfica e variedade padrão pelo falante comum, o baixo prestígio reconhecido à

actividade de tradução e as condições de trabalho nem sempre favoráveis a um trabalho

cuidado, parecem estar na base das percentagens menos expressivas de desvios

subpadrão reconhecidas nas traduções para publicação e legendagem. Se além de uma

fraca aceitação do TC pela presença de marcas desviantes e a uma possível interpretação

de tais marcas como erros e não como resultantes de uma manipulação intencional, for tido

em consideração as condições adversas enfrentadas pelas grande maioria dos tradutores

(tanto em termos de insuficiência de tempo para uma tradução ponderada, como pela baixa

remuneração que o obriga a uma tradução no menor tempo possível para que maior seja o

número de traduções realizadas ou os meios de pesquisa que tem ao seu dispor) é possível

compreender que a estratégia de centralização aqui identificada poderá ser grandemente

condicionada por factores extralinguísticos. Esta circunstância ressoa, contudo, de forma

mais acentuada nas traduções para legendagem, conduzindo a movimentos de

centralização ainda mais expressivos, na medida em que se fazem sentir num meio com

limites de tempo de exposição, com um grau de legibilidade mais restritivo e onde as

condições de trabalho parecem ser ainda mais adversas pela existência de prazos mais

limitados, um mercado mais competitivo e remunerações mais baixas. A fraca expressão

das variedades não-padrão conhece, neste caso, a justificação adicional da necessidade

de facilitar uma leitura rápida de um texto exposto por breves segundos e que não reclame

para si a atenção do leitor a ser repartida com os restantes elementos do produto

audiovisual; contudo, a natureza polissemiótica do produto final de que a legenda faz parte

deve ser entendido, por um lado, como aspecto hierarquizador dos diferentes elementos

em que a linguagem escrita vê reforçada o seu papel ancilar e, por outro, como um

elemento compensador desta opção de tradução, na medida em que o tradutor espera que

227
Parte IV - Análise

a identificação do discurso como subpadrão seja assistida por elementos visuais

(nomeadamente vestuário e restantes adereços) que complementam a caracterização da

personagem e assistem o espectador na interpretação.

Relativamente às traduções para teatro, devem, antes de mais, ser relembrados dois

aspectos: primeiro, que, pelas diferentes linhas semióticas em acção aquando da

representação em palco, a interpretação e identificação das diversas variedades linguísticas

será conseguida não através do texto escrito, mas do texto proferido em palco em conjunto

com os restantes elementos constitutivos do produto teatral final, desde a entoação às

vestes das personagens (cf. II.2 e II.3); segundo, que o processo de tradução para o palco

é, mais do que em qualquer outro caso, conhece a participação de diferentes indivíduos,

sendo que frequentemente o tradutor retorna ao texto por sugestão do encenador ou dos

actores. Assim sendo, prova-se relevante destacar, em primeiro lugar, o facto de a recriação

de variedades linguísticas ficcionais ter sido trabalhada de forma tão cuidada pelos

tradutores em análise, que, não deixando a questão entregue apenas à consideração do

encenador e actores, denunciam uma visão do papel do tradutor e da tradução não apenas

como mera transferência de significados, mas como parte integrante do processo de

interpretação da obra e de definição do espectáculo. Pela sua condição de textos escritos

para serem ditos como se não tivessem sido escritos, as traduções para o palco serão

incluídas num produto final marcado por uma mudança de canal (de visual para visual e

auditivo), de meio (de escrita para a fala) e de código (do código verbal escrito, para os

códigos não verbal, verbal oral e verbal escrito), pelo que, o recurso a marcas de oralidade,

que em texto ficcional participam na distinção do discurso como subpadrão, não terão o

mesmo impacto no espectador, na medida em que a maioria passará despercebida em

palco onde o discurso é, por natureza, oral. Um argumento semelhante poderá ser

apresentado relativamente aos desvios gráficos que, se em textos escritos participam na

distinção do discurso como subpadrão, pela associação estabelecida previamente referida

entre modo escrito, norma ortográfica e a norma padrão, em palco vêem-se anulados pelo

modo oral característico deste meio. Parecem aqui encontrar justificação tanto a

percentagem mais elevada reconhecida na categoria variedades subpadrão, como a

228
Parte IV - Análise

estratégia mais expressiva de expansão dessa mesma categoria face ao texto de partida.

Em confirmação desta circunstância deverá ser reconhecido o valor bastante tímido e

inferior assumido pela variedade oral.

A variedade meio parece assim participar na gestão da recriação de variedades linguísticas

na medida em que é tendo em conta as características inerentes ao meio, assim como as

normas activas no sistema a que pertence, que é definida a proeminência a assumir por

cada variedade.

Cabe agora perceber se a variedade meio participa igualmente na gestão dos níveis

linguísticos na recriação das variedades subpadrão. Os dados relativos aos níveis

linguísticos seleccionados na recriação de variedades menos prestigiadas anteriormente

analisados não nos permitem, também neste caso, seleccionar o meio a que se destinaram

as traduções como a única variável a condicionar a preferência reconhecida por

determinado nível linguístico; contudo, não deixam igualmente de confirmar a existência de

uma relação de correlação entre o meio e o nível linguístico preferencialmente seleccionado

para a recriação de variedades não-padrão, assim como a presença que o número de

desvios assume no total de unidades tradutórias. Não afastando a necessidade de analisar

os dados segundo a data de publicação e a função prospectiva, procedeu-se, neste

estudo, à análise do grau de participação da variável meio na recriação de variedades não-

padrão, fazendo recair a nossa atenção, primeiro, nos grupos que denunciam movimentos

de centralização e, posteriormente, nos grupos que denunciam movimentos de

descentralização.

Nas traduções para legendagem I, o discurso subpadrão é preferencialmente recriado

através de desvios lexicais, marcas conotadas como menos negativas e que parecem

comprometer em menor grau tanto a norma ortográfica, como os níveis de legibilidade

porque de leitura e interpretação mais acessível. Os desvios gráficos e morfossintácticos

expressam preferencialmente oralidade e conhecem percentagens de ocorrência inferiores

às marcas lexicais; circunstância contrária ao que ocorre nas traduções para publicação I

em que as variedades subpadrão são preferencialmente recriadas através de desvios

gráficos. Será relevante reconhecer que, embora ambos os grupos denunciem uma opção

229
Parte IV - Análise

por desvios de conotação menos negativa e procurem tirar partido do impacto visual que

os desvios gráficos têm sobre o leitor que associa o modo escrito à variedade padrão, nas

traduções para legendagem a maioria dos desvios gráficos denuncia oralidade, sendo as

variedades subpadrão preferencialmente recriadas através de desvios lexicais. Se além

desta regularidade for ainda ponderado o facto de as traduções para legendagem

apresentarem uma frequência de ocorrência de desvios por unidade tradutória inferior à

reconhecida nas traduções para publicação, é possível concluir quanto a uma recriação da

variação linguística que tira partido de um número mais reduzido de desvios e que

selecciona preferencialmente desvios de conotação menos negativa. O baixo prestígio da

profissão do tradutor parece explicar o número reduzido de desvios gráficos em ambos os

grupos em análise, na medida em que a identificação feita entre a variedade padrão e o

modo escrito pelo falante comum conduz ao juízo negativo de qualquer desvio da norma

ortográfica e ao consequente receio, por parte do tradutor, de os desvios serem

interpretados como erros e não como resultado de uma manipulação intencional. Contudo,

as regularidades identificadas nas traduções para legendagem parecem resultar, pelo

menos em parte, das características inerentes ao meio que, por um lado, apresenta

limitações (como o tempo de exposição) que conduzem o tradutor a optar por desvios

menos comprometedores da leitura, mas que, por outro, fazem acompanhar os textos de

elementos extralinguísticos que assistem o espectador e que, de certa forma, surgem como

elemento compensador da normalização do discurso. Posto isto, poderá parecer

contraditório que as marcas morfossintácticas assumam aqui valores superiores em relação

às traduções para publicação I e os restantes grupos, tendo em conta que as marcas

morfossintácticas têm sido assumidas como os desvios a que é reconhecido um grau de

valorização mais negativo e que mais comprometem a leitura; contudo, dois aspectos

devem ser tidos em consideração: primeiro, os desvios morfossintácticos foram

introduzidos na sua maioria em recriação de variedade oral, sendo um tipo de desvio que,

não deixando de marcar a sua diferença relativamente à norma padrão, demonstra ser

230
Parte IV - Análise

pouco disruptivo da leitura, reclamando pouca atenção sobre si10 ; segundo, a percentagem

de desvios morfossintácticos subpadrão, embora pareça contraditória face à tendência

geral de normalização atribuída às traduções para legendagem, parece justificada se

interpretada como uma estratégia que, recorrendo a desvios demarcadores do discurso

como subpadrão de forma mais imediata e inequívoca, permite evitar a introdução de

desvios de forma regular e constante. Será assim possível concluir que o movimento de

centralização manifestado pelas traduções para publicação I e pelas traduções para

legendagem I, a que parece estar associado uma escolha preferencial por desvios de

conotação menos negativa (desvios lexicais e gráficos), parece vir a ser reforçado nas

traduções para legendagem I que, além da opção predominante por desvios de conotação

menos baixa quando em comparação com as traduções para publicação I, manifestam

ainda uma presença menos regular de desvios por unidade de tradução. A presença de

desvios morfossintácticos conotadores de oralidade, embora a um primeiro olhar pareçam

contrariar tal conclusão, demonstram, após uma análise cuidada, confirmar as opções

primeiras, na medida em que permitem a introdução de um número mais reduzido de

marcas.

Concentremos agora a nossa atenção sobre as traduções em que houve oportunidade de

verificar um assumido movimento de descentralização - traduções para publicação II,

traduções para teatro e traduções para legendagem II. É possível agora reconhecer que,

embora as traduções para legendagem apresentam um movimento predominante de

descentralização, denunciando uma preferência clara por marcas gráficas, é uma vez mais

possível reconhecer percentagens mais baixas nos desvios conotadores de variedades

subpadrão face às traduções para publicação, assim como percentagens mais elevadas

nos desvios conotadores de oralidade. Apesar de em ambos os meios se tirar partido do

código verbal escrito, as traduções para legendagem parecem sustentar a sua estratégia na

associação feita entre o modo escrito e a norma padrão pelo falante comum, confiando que

pequenos desvios de coloquialidade assistidos pelos restantes elementos audiovisuais

10 Os resultados do questionário realizado no âmbito do presente estudo (cf. anexo C) permite confirmar esta
circunstância, visto que à frase “Para que é que vens com tantos livros”, classificada pela maioria dos inquiridos
como oral e marcada por desvio morfossintáctico, foi reconhecida uma percentagem de 92% na categoria
“pouco grave”.

231
Parte IV - Análise

serão o bastante para a identificação do discurso como subpadrão, ao mesmo tempo que

menos disruptivos da leitura e menos focalizadores da atenção do espectador sobre as

legendas. Deverá ainda ser tido em ponderação que, ao contrário do que é possível

identificar nas traduções para publicação, a preferência agora reconhecida por desvios

gráficos subpadrão foi motivadora de uma presença mais reduzida de desvios lexicais,

tanto em recriação de variedade oral como de variedades subpadrão. Esta circunstância

parece confirmar a tendência de recorrer ao menor número possível de desvios

demarcadores do discurso como não-padrão; tendência que não se faz sentir nas

traduções para publicação onde é reconhecida uma frequência de ocorrência por unidade

tradutória tão superior à frequência identificada nas traduções para legendagem como

próxima da frequência identificada às traduções para teatro.

Relativamente às traduções para teatro, houve anteriormente oportunidade de concluir

quanto à preferência por variedades subpadrão, fazendo-se esta sentir não só em termos

de uma percentagem mais significativa de unidades tradutórias identificadas como

subpadrão, mas também pela presença mais regular e constante de desvios por unidade

tradutória. Tendo agora em conta as percentagens assumidas por cada nível linguístico face

ao número total de desvios e não de unidades tradutórias, percebemos que a percentagem

assumida pelos desvios subpadrão, embora superior à percentagem reconhecida nas

traduções para legendagem, é ligeiramente inferior à percentagem assumida pelas

traduções para publicação. Tal regularidade poderá parecer surpreendente, visto que, não

podendo tirar partido da identificação dos desvios de oralidade ou dos desvios ortográficos

em recriação de variedades subpadrão, seria de esperar uma recriação preferencialmente

conseguida através de desvios subpadrão; contudo, devem ser tidos em consideração três

aspectos: a) a percentagem superior de desvios morfossintácticos, marcas de valor sócio-

semiótico mais negativo; b) o recurso a uma entoação “cantada” a que os tradutores fazem

referência no início do documento entregue aos actores e que qualquer espectador

identificará como próprio de um falante de baixa escolaridade e pertencente a um estrato

social cultural baixo; c) participação dos outros elementos em palco na identificação do

discurso como subpadrão e da personagem como pertencente a um estrato social cultural

232
Parte IV - Análise

baixo. A variável meio prova ter também, neste caso, condicionado a recriação das

variedades linguísticas, na medida em que, por um lado, conduziu o tradutor a um recurso

mais significativo de desvios morfossintácticos e a uma presença mais expressiva de

marcas desviantes no total de unidades tradutórias como forma de manter presente e de

forma inequívoca um elemento essencial no enredo (não esqueçamos o facto de a

representação teatral não oferecer a oportunidade de revisitar determinada passagem de

interpretação menos acessível), mas que, por outro, permitiu a participação de elementos

extralinguísticos na configuração do perfil da personagem, surgindo como elementos de

suporte e confirmação da caracterização indirecta conseguida através do discurso.

Parece assim ser possível reconhecer a participação da variável meio na gestão dos níveis

linguísticos de que se tirou partido na recriação de variedades menos prestigiadas, na

medida em que, as características inerentes ao meio provam novamente ter participado na

proeminência assumida por determinado tipo de marca linguístico-textual em detrimento de

outro.

2.2.4. Correlação das regularidades identificadas com as variáveis contextuais: data

de tradução

Tendo sido a data de tradução umas das variáveis contextuais definidas pelo presente

estudo, proceder-se-á ao estudo da correlação existente entre as regularidades

encontradas e a data de tradução reconhecida a cada uma das traduções. O alinhamento

cronológico das traduções, assim como o estudo comparativo dos valores reconhecidos

aos sub-corpora não translato e translato, tornarão possível a identificação de

regularidades de comportamento de acordo com a data de publicação. Tendo em conta o

objectivo deste estudo em analisar a influência da variável meio na recriação de variedades

literárias em texto ficcional traduzido, assim como o facto de o corpus seleccionado não

apresentar uma distribuição representativa de todos os meios nas décadas em análise, o

estudo da evolução cronológica foi também ela realizada de forma condicionada, tendo

sido desenhados três alinhamentos cronológicos dizendo respeito a cada um dos meios em

estudo.

233
Parte IV - Análise

2.2.4.1. Evolução cronológica da recriação das variedades padrão, oral e subpadrão e

das respectivas estratégias de tradução

A figura agora apresentada reorganiza cronologicamente os dados apresentados

anteriormente relativos à inclusão das variedades padrão, oral e subpadrão nas traduções

para publicação em análise. Cada uma das figuras seguintes incluirá informação relativa

aos valores identificados nos TP e nos TC relativamente à presença das variedades padrão,

oral e subpadrão. Espera-se assim tornar explícita não só a análise comparativa entre os

valores assumidos em cada categoria e entre os TC e os TP, mas também os movimentos

de alteração de estratégia.

70% Var. Padrão TC


Var. Padrão TP
60%
Var. Oral TC
Var. Oral TP
50%
Var. Subpadrão TC
40% Var. Subpadrão TP

30%

20%

10%

0%
1962 1966 1972 1984 2001

Figura 16: Alinhamento cronológico expressivo da recriação das variedades padrão, oral e
subpadrão nas traduções para publicação presentes nos sub-corpora não translato e
translato.

A leitura da figura torna possível identificar a década de 70 como um marco de alteração do

comportamento tradutório tanto em relação à recriação da variedade padrão, como em

relação às variedades oral e subpadrão. Apesar de a variedade padrão (linha verde escuro)

apresentar valores sempre superiores relativamente aos textos de partida (linha verde

ponteada), notamos que a partir da década de 70 a sua presença é mais moderada e

acompanhada por uma presença mais notória das variedades subpadrão (linha azul), cujos

valores conhecem uma expressão mais significativa não só relativamente aos textos de

partida (linha azul ponteada), como também à variedade oral nos textos de chegada (linha

234
Parte IV - Análise

rosa). O cruzamento das linhas azul e rosa comprova uma mudança de estratégia na

década de 70 mantida nas décadas seguintes, sendo possível reconhecer, por um lado,

uma nova hierarquização das variedades recaindo agora a preferência nas variedades

subpadrão e, por outro, uma atitude diferente face ao texto de partida. A variedade oral, a

que é reconhecida uma estratégia de expansão face aos textos de partida (linha rosa

ponteada) na década de 60, denuncia a partir da década de 70 uma estratégia de

contracção, chegando a apresentar na década de 80 valores consideravelmente reduzidos

relativamente ao texto de partida. O movimento contrário pode ser identificado

relativamente às variedades subpadrão que na década de 60 apresentam de forma regular

percentagens inferiores às reconhecidas ao texto de partida e nas décadas seguintes uma

estratégia regular de expansão das variedades subpadrão. Os movimentos de franca

centralização e normalização do discurso (as variedades padrão e oral conhecem valores

mais elevados relativamente aos textos de partida, enquanto as variedades subpadrão

conhecem valores bastante inferiores aos reconhecidos nos textos de partida), assim como

de convergência (opção pelas variedades no centro do contínuo) na recriação reconhecidos

na década de 60, parecem dar lugar aos movimentos contrários de descentralização e

preferência pelos extremos do contínuo nas décadas seguintes.

A presença mais expressiva de instâncias de variedades subpadrão nos últimos anos do

alinhamento cronológico aqui apresentado vem confirmar as normas hipotéticas formuladas

anteriormente segundo as quais se esperava que no final do período em análise se

registaria uma tendência cronológica, sociocultural e ideologicamente condicionada no

sentido de uma maior inclusão de desvios de variedades subpadrão em resistência ao

universal de normalização. Apesar de todos os casos denunciarem uma opção pela

manutenção da variação linguística, esta é conseguida em moldes diferentes no tempo,

sendo possível reconhecer uma clara evolução no sentido de uma maior aceitabilidade da

presença de variedades subpadrão em texto literário. Será relevante ponderar o facto de os

dados agora apresentados virem confirmar as regularidades identificadas em Rosa (2004)

de um aumento da presença de variedades subpadrão nas últimas décadas do período em

análise - se na década de 60 a variação linguística parece ser maioritariamente conseguida

235
Parte IV - Análise

pelo recurso a desvios expressivos de oralidade e variedade padrão, a partir da década de

70 é possível identificar um recurso bem mais expressivo de desvios expressivos de

variedades subpadrão. As regularidades identificadas parecem confirmar a hipótese

colocada relativamente a uma alteração do sistema linguístico no sentido não apenas de

uma maior aceitabilidade do recurso de variedades subpadrão em texto literário, como

também de uma alteração no valor sócio-semiótico das diferentes variedades linguísticas.

Não esquecendo o contexto de controlo editorial vivido no Portugal de Salazar, tanto em

relação à escolha dos textos a ser publicados, como ao discurso neles recriado, não será

difícil aceitar que, face a um discurso bastante normalizado, as marcas de oralidade se

destacassem como marcas de discurso subpadrão. Contudo, reconhecendo na década de

70 o marco de alteração de comportamento tradutório, anos antes da revolução de Abril,

prova-se relevante interpretar esta mudança de estratégia à luz de uma evolução tanto do

sistema linguístico, que reconhece cada vez mais prestígio à variedade oral, como do

sistema literário, marcado por uma cada vez maior aceitabilidade face ao recurso de

marcas de oralidade e variedades subpadrão em texto literário. A tradução de 1972 parece

ilustrar de forma evidente estes dois movimentos contemporâneos, mas de certa forma

contrários: o movimento de centralização e normalização promovido pelo controlo editorial

em vigor e um movimento de descentralização em resultado de uma evolução do sistema

linguístico em favor de uma maior valorização das variedades não-padrão e da sua

aceitação em texto literário. A demarcação das marcas desviantes pelo recurso ao itálico

denuncia uma estratégia de compromisso entre as norma literárias, a identificação da

recriação das variedades ficcionais como um elemento fundamental na economia do texto

e a evolução do sistema linguístico que já se faria notar em textos escritos originalmente na

língua de chegada.

Exemplo [TC3, p. 55]

Higgins: Está bem. Obrigado, senhora Pearce. Despache-a já para a casa de banho.

236
Parte IV - Análise

Liza: [erguendo-se com relutância] Vossemecê é um brutalhão, é o que é. Se num m’agradar

num fico cá, pois atão. E num consinto que ninguém me bata. Eu num pedi pra ir ao palácio,

nem nunca tive sarilhos com a Polícia, isso é que não. Sou uma rapariga séria…

Senhora Pearce: Não responda rapariga. Não percebeu o que aquele senhor diz. Venha

comigo [Adianta-se para a porta, que segura para Eliza].

Liza: [ao sair] Pois o qu’eu disse é verdade. Eu cá num me chego ó pé do rei, se m’arrisco a

que me cortem a cabeça. Se eu soubesse no que me metia nunca cá tinha vindo. Sempre fui

uma rapariga séria e num era pra falar pra ele nem nada; e num lhe devo nadinha; e num

m’interessa: e num fazem de mim gato-sapato; eu tenho cá os meus prencípios, como toda a

gente...

A direcção da evolução parece apontar para uma progressiva familiarização do leitor

quanto à presença de variedades ficcionais não-padrão em texto literário e uma

consequente interpretação dos desvios não como erros, mas como desvios intencionais

resultantes de uma estratégia tradutória, permitindo ao tradutor abandonar o receio de que

o recurso a desvios subpadrão faça recair sobre o seu trabalho o estigma de “má

tradução”.

A figura seguinte organiza cronologicamente os dados relativos à inclusão das variedades

padrão, oral e subpadrão nas traduções para o palco.

237
Parte IV - Análise

60% Var. Padrão TC


Var. Padrão TP
50% Var. Oral TC
Var. Oral TP
40% Var. Subpadrão TC
Var. Subpadrão TP
30%

20%

10%

0%
1945 1974 2001

Figura 17: Alinhamento cronológico expressivo da recriação das variedades padrão, oral e
subpadrão nas traduções para o palco presentes nos sub-corpora não translato e translato.

As traduções para o palco denunciam um comportamento bastante regular nas diferentes

décadas em estudo, não sendo possível identificar o mesmo tipo de alteração de

comportamento tradutório a partir de um ponto específico no contínuo cronológico como

havia sido identificado nas traduções para publicação. Embora seja possível reconhecer

ligeiros movimentos de contracção ou expansão das diferentes variedades em estudo,

torna-se evidente a regularidade de comportamento tradutório, sendo possível reconhecer

uma estratégia de ligeira expansão da variedade padrão (linha verde) face ao texto de

partida (linha verde ponteada), assim como uma franca estratégia de expansão das

variedades subpadrão (linha azul) face ao texto de partida (linha azul ponteada). A

variedade oral (linha rosa) denuncia uma constante e clara estratégia de contracção face ao

textos de partida (linha rosa ponteada). A presença das variedades subpadrão e o assumir

de uma estratégia de expansão a reconhecer desde a década de 40 revela-nos que no

sistema teatral, possivelmente pelo facto de o canal não ser a escrita e por tirar partido de

um código verbal oral, o recurso as variedades subpadrão é mais bem aceite pelo público,

fazendo-se sentir muito antes do que no modo escrito das traduções para publicação. Tal

não parecerá certamente inusitado se for tida em consideração a longa tradição de recurso

a variedades ficcionais no sistema teatral presente em Gil Vicente, Camões ou no teatro de

revista, textos mais próximos das traduções agora em análise. Embora esta seja uma linha

238
Parte IV - Análise

de investigação aliciante, a sua prossecução não se enquadra no escopo do presente

estudo.

A última figura, dizendo respeito às traduções para legendagem, apresenta uma

organização cronológica dos dados relativos à recriação das variedades padrão, oral e

subpadrão nas traduções para canais de televisão portugueses ao longo de duas décadas.

80,000% Var. Padrão


Var. Padrão TP
66,667% Var. Oral
Var. Oral TP
53,333% Var. Subpadrão
Var. Subpadrão TP
40,000%

26,667%

13,333%

0%
1987 1994 1995 1996

Figura 18: Alinhamento cronológico expressivo da recriação das variedades padrão, oral e
subpadrão nas traduções para legendagem presentes nos sub-corpora não translato e
translato.

O alinhamento cronológico das traduções para legendagem denuncia uma alteração do

comportamento tradutório em meados da década de 90, na medida em que, apesar de os

valores reconhecidos à variedade padrão (linha verde) se mostrarem sempre superiores aos

reconhecidos nos textos de partida (linha verde ponteada), na segunda metade da década

de 90, a presença da variedade padrão conhece uma expressão progressivamente menos

notória, sendo acompanhada por uma mais evidente expressão das variedades subpadrão.

O movimento progressivo de ascensão das variedades subpadrão (linha azul) faz-se notar

inequivocamente na segunda metade da década de 90, chegando a conhecer valores que

ultrapassam os valores reconhecidos ao texto de partida (linha azul ponteada) em denúncia

da progressão de estratégias de contracção para estratégias de expansão. Embora seja

possível reconhecer um movimento bastante regular relativamente à variedade oral, será

relevante ter em consideração o facto de nos textos de chegada de 1987 e 1994 a

239
Parte IV - Análise

variedade oral assumir um lugar de proeminência na recriação de variedades não-padrão,

conhecendo valores superiores aos reconhecidos às variedades subpadrão; ocorrência que

conhecerá alteração pelo recurso maioritário às variedades subpadrão na recriação de

discurso não-padrão.

A presença de variedades subpadrão e a progressão que lhe é reconhecida são, por si só,

claros indicativos da interferência do contexto histórico, sociocultural e ideológico e,

embora não possamos esquecer a tendência geral de centralização e normalização do

discurso, parece ser inegável que as estratégias de centralização são atenuadas na

segunda metade da década de 90, tanto pela recriação em expansão das variedades

subpadrão, como pela recriação em contracção da variedade padrão. Também

relativamente às traduções para legendagem parece ser confirmada a norma hipotética de

acordo com a qual se espera que textos de chegada mais recentes denunciem uma

tendência de maior aceitabilidade relativamente à inclusão de desvios de variedades

subpadrão e de resistência ao universal de normalização. Esta hipótese parece, no entanto,

ser igualmente posta em questão quando recuperamos o facto de dois sub-grupos

poderem ser identificados neste conjunto relativamente ao canal de TV promotor da

tradução: as traduções de 1987 e 1994 foram promovidas pela RTP, um canal público com

o seu próprio grupo de tradutores; enquanto as traduções de 1995 e 1996 foram

promovidas pela SIC, um canal de TV privado, cujas traduções são feitas por tradutores ou

companhias de tradução contratadas para o efeito. As regularidades identificadas não

serão certamente alheias a ambas as circunstâncias, isto é, a uma evolução dos sistema

linguístico e à diferença entre o estatuto/ papel social/ tradição do canal de TV que

promove a tradução. Contudo, para uma ponderação consistente de tais variáveis será

necessário desenvolver um estudo mais abrangente que inclua traduções de ambos os

canais distribuídos pelas mesmas décadas, um estudo que não será possível desenvolver

de momento.

Tendo em conta as regularidades encontradas, parece ser possível concluir que cada um

dos sistemas em análise - sistema literário, sistema teatral e sistema fílmico - e

consequentemente os subsistemas dos textos traduzidos dentro de cada um destes

240
Parte IV - Análise

sistemas, conheceu diferentes estádios e movimentos de progressão relativamente à

inclusão e recriação de variedades não-padrão, denunciando a participação e influência de

outros elementos, nomeadamente o prestígio reconhecido ao meio e à actividade de

tradução ou a função prospectiva desenhada para a tradução. É, no entanto, possível

identificar uma evolução geral do sistema linguístico português que passa por uma

alteração na apreciação e juízo de valor dos falantes relativamente às variedades

linguísticas, parecendo viável concluir quanto a uma alteração a acontecer no sentido de

uma avaliação mais positiva tanto das variedades dialectais, como da noção de inovação

no discurso e da associação dessa noção ao conceito de modernidade.

2.2.4.2. Evolução cronológica do recurso a marcas linguístico-textuais de variedades

pouco prestigiadas e das respectivas estratégias de tradução

A figura agora apresentada organiza cronologicamente as percentagens médias que cada

tipo de marca linguístico-textual (morfossintácticas, lexicais e gráficas) assume no total de

desvios contabilizados nas traduções para publicação. Tal como nas figuras anteriores,

também aqui são facultados os valores relativos a cada um dos tipos de marcas linguísticas

nos TC e nos TP, permitindo a análise comparativa em duas linhas distintas.

60% Morfossintaxe TC
Morfossintaxe TP
Escolha Lexical TC
48%
Escolha Lexical TP
Grafia TC
36% Grafia TP

24%

12%

0%
1962 1966 1972 1984 2001

Figura 19: Alinhamento cronológico expressivo do recurso a marcas morfossintácticas, lexicais


e gráficas nas traduções para publicação presentes nos sub-corpora não translato e translato.

241
Parte IV - Análise

A leitura da figura permite-nos perceber que o recurso a desvios morfossintácticos (linha

verde) na recriação de variedades pouco prestigiadas conhece uma progressão bastante

regular e de sentido descendente, isto é, no sentido de uma presença cada vez menor

deste tipo de marca linguístico-textual em texto literário, pelo que a estratégia de

contracção se mostra mais evidente nas últimas décadas do período em análise.

Relativamente aos desvios lexicais e gráficos, é possível reconhecer a década de 70 como

um marco de alteração na estratégia de recriação de variedades não-padrão, no sentido em

que se na década de 60 esta é conseguida preferencialmente através de desvios lexicais

(linha rosa) que denunciam uma estratégia de clara expansão face ao texto de partida (linha

rosa ponteada), as década de 70 e seguintes, ainda que mantendo a estratégia de

expansão relativamente aos desvios lexicais, recorre preferencialmente a desvios gráficas

(linha azul) para a demarcação do discurso como não-padrão. O cruzamento das linhas

rosa e azul denuncia este assumir de uma nova estratégia, sendo, inclusive, possível

reconhecer a progressão de uma estratégia de contracção para uma estratégia de

expansão relativamente aos desvios gráficos face ao textos de partida (linha azul

ponteada).

Tendo em conta a proposta apresentada em II-3.5 onde é estabelecido um contínuo

hierarquizador dos três níveis linguísticos em análise, posicionando os desvios

morfossintácticos no extremo de maior gravidade e, num afastamento progressivo para o

extremo de menor gravidade, os desvios gráficos e lexicais, parece confirmada a norma

hipotética segundo a qual se espera que nas últimas décadas do período em análise se

evidencie a tendência para uma maior inclusão de desvios a que é reconhecida maior

gravidade em texto literário. A possível alteração dos sistemas linguístico e literário, de que

foi feita referência anteriormente, tornou possível, por um lado, e motivou, por outro, o

recurso a desvios gráficos em resistência à norma ortográfica de que agora o tradutor

poderá tirar partido sem incorrer no risco de estes serem interpretados como erros de

tradução.

A figura seguinte sistematiza as percentagens médias relativas ao recurso aos diferentes

níveis linguísticos em análise nas traduções para o palco.

242
Parte IV - Análise

70,0% Morfossintaxe
MorfossintaxeTP
Escolha Lexical
52,5% Escolha Lexical TP
Grafia
Grafia TP
35,0%

17,5%

0%
1945 1974 2001

Figura 20: Alinhamento cronológico expressivo do recurso a marcas morfossintácticas, lexicais


e gráficas nas traduções para o palco presentes nos sub-corpora não translato e translato.

A leitura da figura torna evidente a regularidade de comportamento evidenciado

relativamente tanto aos desvios morfossintácticos como aos desvios lexicais e gráficos,

sendo, no entanto, possível reconhecer um movimento progressivo de aproximação das

percentagens médias assumidas por cada um dos níveis linguísticos. São mantidas nos

três textos de chegada em estudo as mesma estratégias face ao texto de partida

relativamente aos desvios gráficos que apresentam uma estratégia de expansão de (cf.

linha azul e linha azul ponteada) e aos desvios morfossintácticos que apresentam uma

estratégia de contracção (cf. linha verde e linha verde ponteada). É, no entanto, possível

identificar uma alteração de estratégia relativamente aos desvios lexicais aqui denunciada

pelo cruzamento das linhas rosa e rosa ponteada.

A última figura agora apresentada organiza cronologicamente as percentagens médias

respeitantes à introdução de desvios morfossintácticos, lexicais e gráficos no total de

desvios identificados nas traduções para legendagem.

243
Parte IV - Análise

80% Morfossintaxe
Morfossintaxe TP
Escolha Lexical
64%
Escolha Lexical TP
Grafia
48% Grafia TP

32%

16%

0%
1987 1994 1995 1996

Figura 21: Alinhamento cronológico expressivo do recurso a marcas morfossintácticas, lexicais


e gráficas nas traduções para legendagem presentes nos sub-corpora não translato e
translato.

Ao contrário da regularidade encontrada nas traduções para o palco, é aqui evidente uma

profunda alteração de comportamento e de estratégia a reconhecer, uma vez mais, em

meados da década de 90. Embora mantendo sempre uma estratégia de contracção dos

desvios morfossintácticos, esta parece acentuar-se na segunda metade da década de 90,

fazendo com que os desvios morfossintácticos conheçam na tradução de 1995 um valor

inferior a 10%. O cruzamento das linhas azul e rosa vem novamente confirmar uma

alteração de comportamento contrapondo dois grupos distintos: um primeiro grupo, a

reconhecer nos finais dos anos 80 e na primeira metade da década de 90, em que a

recriação de variedades pouco prestigiadas selecciona preferencialmente desvios

conotadores de oralidade em detrimento de desvios gráficos e, um segundo grupo, a

reconhecer na segunda metade da década de 90, que denuncia a opção contrária, sendo

conferida uma proeminência clara aos desvios gráficos em detrimento dos desvios lexicais.

Esta opção é acentuada e confirmada pelo estudo comparativo entre os textos de chegada

e os textos de partida, na medida em que às regularidades anteriormente identificadas

corresponde ainda uma alteração de estratégia face ao texto de partida: a uma estratégia

de expansão dos desvios lexicais e de contracção dos desvios gráficos a reconhecer nos

primeiros anos do período em análise, segue-se uma estratégia de expansão dos desvios

gráficos e de contracção dos desvios lexicais nos últimos anos.

244
Parte IV - Análise

2.2.5. Correlação das regularidades identificadas com as variáveis contextuais: a

função prospectiva

Reconhecendo o texto traduzido, literário ou não literário, como elemento activo num

determinado momento histórico do qual este é simultaneamente produto e actor, prova-se

fundamental, não apenas assumir o facto de o processo de tradução ter sido iniciado pela

cultura de chegada, mas também identificar por que via foi patrocinada a tradução e que

funções se esperava que viesse a preencher. Recuperando as propostas enunciadas em

I-2.2, o texto é aqui entendido como um espaço de negociação entre o criador, o papel

reconhecido ao tradutor, e as instituições e práticas da sociedade, mostrando-se

fundamental fazer acompanhar o estudo das normas, proposto por Toury como um dos

objectivos do EDT, da ponderação do contexto de relações de poder e expectativas em que

a negociação das escolhas do tradutor ocorre.

A partir do modelo proposto em II-3.6.3 procedeu-se, com base em elementos

extratextuais já expostos no capítulo anterior, notícias de jornal dedicadas a algumas das

traduções em estudo e conversas informais com alguns dos tradutores e agentes

promotores da tradução, à identificação das funções prospectivas de cada um dos TC e da

possível correlação entre estas e as regularidades textuais e estratégias tradutórias

identificadas. Tal como enunciado em II-3.6.3, deve ser reconhecida a possibilidade de o

investigador, apesar das dificuldades enfrentadas na definição da função desenhada para

cada um dos TC, levantar hipóteses relativamente à motivação promotora e aos propósitos

a cumprir pelo TC, não esquecendo a distinção a fazer entre a função prospectiva

mediadora do processo tradutório e a função de facto reconhecida à tradução no contexto

de chegada.

Tradução para publicação (1962)

Relembrando o carácter especial desta tradução que, apresentada como tese de

licenciatura, apenas conheceu uma publicação de autor com uma tiragem de 500

exemplares sem distribuição nacional, foram reconhecidas as seguintes funções:

245
Parte IV - Análise

a) Divulgação de um autor e de um argumento desconhecidos. Apesar da pequena

tiragem e divulgação que esta tradução veio a conhecer, não pode deixar de ser

reconhecido o propósito de divulgação de um texto que não conhecia qualquer

tradução em português e de um autor que, além de pouco divulgado em Portugal,

não fazia parte dos curricula de estudos das universidades portuguesas.

b) Renovação do cânone. Pelas razões apontadas previamente, pode ser assim

igualmente reconhecida a intenção de renovação do cânone português que ainda não

reconhecia Bernard Shaw como um autor central da literatura universal11 .

c) Confirmação das práticas linguísticas e de tradução. O ambiente de censura e controlo

editorial (também relativamente ao discurso empregue nos textos publicados) vivido

na década de 60, assim como as estratégias tradutórias identificadas por outros

estudos (Rosa, 2004, Seruya, 2005) e por este estudo aquando da ponderação da

variável meio, permitem concluir que a estratégia predominante de centralização do

discurso denuncia uma atitude de confirmação das práticas linguísticas e de tradução

reconhecidas na década de 60 em Portugal.

Tradução para publicação (1966)

À tradução publicada pela editora Portugália foram reconhecidas as seguintes funções:

a) Entretenimento.

b) Divulgação de um autor e de um argumento desconhecidos. Tirando partido do êxito

mundial reconhecido ao filme My Fair Lady (1964), a editora Portugália promove a

primeira tradução deste argumento no círculo editorial português.

c) Confirmação das práticas linguísticas e de tradução. A estratégia predominante de

centralização e padronização do discurso denuncia, igualmente, com base nos

argumentos apresentados anteriormente, uma atitude de confirmação das práticas

linguísticas e de tradução activas na década de 60 em Portugal.

11Apesar do prémio Nobel de literatura atribuído a Bernard Shaw em 1925, os seus ideais socialistas afastavam-
no dos manuais escolares e das colectâneas de literatura inglesa promovidas pelas Universidades portuguesas.

246
Parte IV - Análise

d) Consolidação do estatuto da entidade promotora da tradução. Tanto a opção por

estratégias tradutórias em conformidade com a norma, como a escolha de um

argumento de um filme de grande êxito e com uma actriz de conceituada reputação

na história do cinema (de quem a editora tira partido na capa da edição), participam

na consolidação do estatuto da editora, através de um processo de associação e

transferência de prestígio.

Tradução para publicação (1972)

Com base em elementos extratextuais e textuais foram identificadas a esta tradução da

Editorial Verbo as seguintes funções:

a) Entretenimento.

b) Divulgação de um autor e de um argumento desconhecidos. Tendo em conta que a

primeira tradução de Pygmalion (1962) não conheceu distribuição profissional, é

possível reconhecer a intenção de divulgar um autor e um argumento que

permaneciam desconhecidos do grande público.

c) Confirmação da centralidade do autor e do texto. Relembrando a colecção em que

esta publicação foi inserida - Biblioteca básica Verbo/RTP -, promovida como o

propósito de reunir obras de leitura indispensável a qualquer leitor médio,

percebemos que Bernard Shaw assume, na década de 70, um lugar indiscutível no

cânone literário universal12.

d) Divulgação generalizada de um texto. A inclusão desta tradução numa das colecções

de grande circulação do grande público português, tanto nos anos 70 como agora,

vindo a conhecer a maior campanha promocional realizada até então, assim como a

maior distribuição a nível nacional (disponível em qualquer livraria ou quiosque a um

preço acessível à maioria dos portugueses), denuncia a intenção clara de uma

divulgação generalizada tanto do texto como do autor. A escolha deste argumento em

particular é igualmente prova desse propósito na medida em que, por via dos filmes

12Fernando Guedes, director da colecção e da editora Verbo, apresentou a colecção nos anos 70 como uma
colecção onde foram seleccionados os autores essenciais, tendo sido orientada pela “qualidade das obras, [pelo]
cuidado e rigor na escolha [e pelo] requinte gráfico” (2005:10).

247
Parte IV - Análise

realizados e da adaptação musical My Fair Lady, este era certamente o texto mais

conhecido de Bernard Shaw.

e) Renovação das práticas linguísticas e de tradução. O reconhecimento da década de

70 como um momento de mudança de estratégia tradutória (comportamento

identificado aquando da ponderação das variáveis meio e data de tradução e

suportado por estudos anteriores (Rosa, 2004)) relativamente tanto à recriação de

variação linguística, como aos níveis linguísticos de que o tradutor tira partido na

recriação de variedades não-padrão, levam-nos a identificar o propósito de renovação

das práticas linguísticas e de tradução nesta tradução. Seria abusivo reconhecer a

esta tradução o papel de introdutor e instigador dessa renovação; contudo, admitindo

uma alteração progressiva do sistema linguístico e de tradução promovida por

diversos agentes e textos, traduzidos ou escritos originalmente em português, não

podemos deixar igualmente de reconhecer a opção clara do tradutor em participar

nesse movimento de renovação tanto das práticas linguísticas como das práticas de

tradução. Relevante será, no entanto, ter em consideração o elevado estatuto de que

este tradutor em particular gozava enquanto professor universitário e crítico literário,

factor que terá sido fundamental numa melhor aceitação da recriação de variedades

linguísticas em texto ficcional. Apesar de não ter sido publicada com a tradução

qualquer nota do tradutor, o artigo “Falares e idiolectos em Pygmalion, de G. B. Shaw,

como problemas de tradução” (1984) escrito pelo tradutor e publicado como separata

denuncia a hierarquização dos elementos dos textos, surgindo a recriação de

variedade linguísticas no topo das prioridades de forma a cumprir os objectivos

propostos por Bernard Shaw para esta peça e enunciados como sendo:

[...] explorar dramaticamente o facto [...] da existência de diferenças de linguagem,

entre ingleses, com nítido efeito de ferrete social e constituindo sério obstáculo a uma

plena ascensão e integração em camadas superiores da sociedade. (Moser, 1984:

223).

248
Parte IV - Análise

Numa hierarquização dos elementos parece ser atribuída pelo tradutor maior

importância à recriação de variedades linguísticas e dos valores que expressam do

que a elementos referenciais, apresentando-se esta peça como um desafio

particular na medida em que “o problema [se] desloca para o campo linguístico da

relação fonológica e realizações fonémicas que impliquem distinção de

classe” (Moser, 1984: 223) sem que em português exista “[um] falar que seja tão

comunicativo na sua difícil inteligibilidade, nem que seja do mesmo modo aceite

como susceptível de acarretar discriminação social, ou pelo menos grave

preconceito” (Moser, 1984: 223). Estratégias de não recriação da variação

linguística ou de normalização do discurso são assim afastadas sob pena de se

perderem linhas de significado que o tradutor reconhece como essenciais.

Tradução para publicação (1984)

Reconhecendo a esta tradução um percurso bastante semelhante ao da tradução anterior,

foram reconhecidas as seguintes funções:

a) Entretenimento

b) Divulgação de uma nova tradução. Tendo em consideração os 12 anos que separam

esta tradução da anterior (tradução para publicação de 1972), assim como o facto de

não ter havido novas reedições ou reimpressões da tradução de 1972, não será difícil

reconhecer o propósito de relembrar o argumento da vendedora de flores ao público

português com uma nova tradução, visto ser promovida por uma outra editora,

Publicações Europa-América.

c) Divulgação generalizada de um texto. A publicação desta tradução no contexto de

uma colecção de livros de bolso é reveladora do propósito claro de divulgação

generalizada do texto, a ser garantida por três linhas de acção diferentes: uma boa

distribuição nacional; um preço de capa acessível; a promoção do argumento

denunciando a relação que este mantém com a adaptação fílmica My Fair Lady (o

recurso à imagem de Audrey Hepburn na capa da edição é disso um claro indicador,

cf. Anexo B.1).

249
Parte IV - Análise

d) Confirmação da centralidade do texto e do autor. Tendo em conta a inclusão desta

tradução numa colecção intitulada “Livros de Bolso Europa-América” (mencionada

explicitamente na capa da edição), apelando ao leitor médio a quem propõe as obras

e autores centrais da literatura universal, vê-se assim confirmada, uma vez mais, o

lugar central que tanto o autor como o argumento ocupam no cânone da literatura

universal.

e) Confirmação de práticas linguísticas e de tradução. Reconhecendo nesta tradução

uma manutenção de estratégias tradutórias identificadas como inovadoras na década

de 70 face às normas de tradução precedentes, vemos confirmado o facto de a

alteração de estratégia tradutória reconhecida na década de 70 não ter sido um acto

isolado, mas sim um elemento participante numa alteração conjuntural, que veio a

conhecer confirmação nesta tradução de 1987. No prefácio à tradução (pp.12-15), o

tradutor enuncia os aspectos que reconhece como centrais na obra, dando-nos a

conhecer não só a hierarquização que deles faz, como também a forma como estes

participaram na escolha das estratégias tradutórias. O “respeito” pelas opções e

intenções de Bernard Shaw com esta obra, assim como a necessidade de coerência

relativamente ao lugar (“ambientes típicos de Londres”), ao tempo (“princípios do séc.

XX”) e ao modo (“gradual conversão da personagem Elisa”) levou à não-adopção de

uma estratégia de normalização e à procura de recriação de variedades linguísticas

que, embora considere “um trabalho um pouco fictício”, parece ser inevitável no

sentido de uma “solução que dê alguma verosimilhança à personagem Elisa”.

Tradução para publicação (2001)

A uma tradução posicionada simultaneamente nos sistemas literário e teatral, foram

reconhecidas as seguintes funções:

a) Entretenimento.

b) Divulgação de uma nova tradução. Os 35 anos passados entre a primeira tradução

desta obra, o encerramento da editora promotora da tradução de 1966 e a ausência

250
Parte IV - Análise

de exemplares no mercado, terão sido os factores motivadores do lançamento de

uma nova tradução deste texto.

c) Divulgação generalizada de um texto. Identificando o grande público como público-

alvo, assumiu como propósito promotor a divulgação generalizada do argumento de

My Fair Lady e da tradução de Filipe La Feria e Helena Rocha em particular, tendo

sido esta suportada por um preço de capa acessível e pela promoção da relação que

mantém com o espectáculo My Fair Lady, Minha Linda Senhora levado à cena no

Teatro Politeama em Novembro de 2002 (cf. Anexo B.2).

d) Confirmação da centralidade do texto e do autor. A inclusão do texto numa colecção

intitulada “Grandes Clássicos do Teatro” denuncia, uma vez mais, a promoção deste

texto como um dos textos dramáticos centrais do cânone literário universal.

e) Renovação das práticas de tradução. Pela relação que esta tradução mantém com a

tradução para o palco levada à cena no Teatro Politeama já referida anteriormente,

não podemos deixar de assumir esta tradução como participante activa num

movimento mais lato de renovação de certas práticas de tradução no que à tradução

de textos dramáticos diz respeito. Embora denuncie uma posição de confirmação das

práticas de tradução relativamente à recriação de variedades linguísticas que se

fazem notar desde a década de 70, é clara a posição de renovação de certas práticas

de tradução para publicação de textos dramáticos, na medida em que aproxima dois

sistemas que tradicionalmente não cruzam as suas linhas de acção. A análise deste

movimento não tem naturalmente espaço no presente estudo; contudo, é possível

confirmar, com base em Ramos Pinto (2009), a tendência recente para a publicação

de traduções de textos dramáticos realizadas primeiramente para a representação em

palco por parte de editoras como a Europa-América, Relógio d’Água ou Campo das

Letras.

Tradução para o palco (1945)

A esta primeira tradução do argumento de Bernard Shaw para português foram

reconhecidas as seguintes funções:

251
Parte IV - Análise

a) Entretenimento.

b) Renovação do cânone e divulgação de um autor e de um argumento desconhecidos.

Tendo em conta que as primeiras traduções de obras de Bernard Shaw datam de

1943 e 1944, ambas traduções para publicação, percebemos que este seria um autor

não muito conhecido do grande público e ausente dos palcos portugueses. É assim

possível observar uma atitude de introdução de um autor e argumento desconhecidos

do público português e, consequentemente, de renovação do repertório teatral.

c) Renovação das práticas linguísticas e de tradução. A falta de estudos relativamente ao

discurso em textos traduzidos para o palco no contexto português e à recriação de

variedades linguísticas em palco em particular, assim como a ausência de notas dos

tradutores, encenador ou companhia teatral relativamente a este aspecto, tornaram

difícil avaliar o grau de inovação do discurso face às normas em vigor nos anos 40;

contudo, através de artigos publicados em jornais da época (Diário Popular,

30.10.1945 e 31.10.1945) foi possível perceber que a recriação de variedades

linguísticas causou algum estranhamento no público que teve oportunidade de

assistir à representação, permitindo-nos concluir quanto ao propósito de renovação

das práticas linguísticas e, consequentemente, das práticas de tradução para teatro a

reconhecer a esta tradução.

d) Crítica social. Relembrando o clima de censura vivido nos anos 40 em Portugal, assim

como a opção de encenar a versão de 1914 de Pygmalion em particular, mostrou-se

fundamentada a hipótese de a crítica social ter sido um dos aspectos promotores

desta tradução e uma das suas funções prospectivas. Se, por um lado, é esperado

que haja um reconhecimento dos aspectos críticos do texto em palco e uma

consequente transposição dessa crítica para o contexto de chegada, por outro,

espera-se que a localização da peça numa cidade e sociedades específicas façam

com que essa crítica seja velada e passe entre malhas da censura prévia.

252
Parte IV - Análise

Tradução para o palco (1974)

Reconhecendo o carácter especial desta tradução pelo facto de a sua representação nunca

ter tomado lugar, facto que não impede a ponderação da mediação da função prospectiva,

foram identificadas as seguintes funções:

a) Entretenimento.

b) Divulgação generalizada de um texto. Embora seja sempre reconhecido a uma peça

teatral o público muito específico do momento e espaço da representação, será

importante assumir um público mais lato a esta tradução na medida em que estava

prevista a emissão nacional no canal televisivo RTP.

c) Renovação de práticas linguísticas e de tradução. Com base nas palavras de Artur

Ramos numa entrevista informal, encenador da peça, e tendo em consideração a

emissão nacional da representação em horário nobre (sexta-feira à noite),

percebemos que, não estando previstas quaisquer alterações ao texto para a emissão

televisiva, esta tradução denuncia a intenção de participar no processo de renovação

do discurso em televisão que seguia normas restritas de padronização.

d) Crítica social. Terão sido a Revolução de Abril e o levantar da censura as razões para

o abandono da representação de Pygmalion no Teatro Maria Matos e sua substituição

por uma peça de Bernardo Santareno, mas também são estes os elementos que nos

permitem ponderar a hipótese de a escolha desta peça em particular ter conhecido o

propósito de uma crítica social velada. O clima de liberdade agora vivido anulava a

necessidade de uma crítica velada e reclamava a crítica aberta e a promoção de

autores proibidos até então.

Tradução para o palco (2001)

Apesar de esta tradução manter uma clara relação com a tradução para publicação de

2001, os textos têm sido neste estudo considerados como pertencentes a sistemas

diferentes, seguindo normas de tradução e cumprindo funções distintas no contexto de

chegada. São a esta tradução reconhecidas as seguintes funções:

a) Entretenimento.

253
Parte IV - Análise

b) Introdução e divulgação de um autor e argumento desconhecidos. Embora a

encenação de My Fair Lady, Minha Querida Senhora tenha sido preparada e

publicitada em 1964 no Teatro Monumental, o espectáculo nunca veio a realizar-se

por razões que não foi a este estudo possível apurar. A tradução de 2001 foi assim a

primeira tradução deste argumento a estrear em Portugal, introduzindo e divulgando

um texto e um autor que, embora conhecidos nos ecrãs de cinema e nas páginas da

edição de 1966, eram ainda estranhos aos palcos portugueses.

c) Confirmação da centralidade do texto e do autor. Para além da publicitação do

espectáculo ter procurado apelar à memória dos espectadores apresentando-o como

a estreia em Portugal de um dos maiores clássicos do teatro musical, o anúncio do

Teatro Politeama como o agente promotor da tradução e da representação, seria por

si só uma confirmação da centralidade do texto e do autor traduzidos, na medida em

que é conhecida do grande público a linha de acção assumida pela direcção do

Teatro Politeama de promover o reencontro entre o público português e os grandes

clássicos do teatro musical.

d) Consolidação do estatuto da entidade promotora da tradução. No seguimento da linha

de acção do Teatro Politeama referida no item anterior, não será despiciendo concluir

que a escolha e representação deste argumento participam na consolidação do

estatuto de promotor de clássicos do teatro reconhecido ao Teatro Politeama, agente

promotor da tradução.

e) Confirmação das práticas linguísticas e de tradução. Reconhecendo nesta tradução

uma manutenção de estratégias tradutórias identificadas nas traduções de décadas

anteriores, reconhecemos nesta tradução uma acção de confirmação das práticas

linguísticas e de tradução. O testemunho deixado pelo tradutor e encenador no

programa do espectáculo, expressa de forma clara a tomada de decisão no sentido

da recriação de variedades linguísticas em resultado de uma hierarquização dos

elementos do texto que favorece os conteúdos interpessoais em detrimentos dos

conteúdos referenciais que o discurso exprime.

254
Parte IV - Análise

f) Crítica social. Não sendo possível reconhecer a crítica social como motivação principal

para a promoção desta tradução, certas escolhas tradutórias 13, cuja análise não faz

parte do escopo deste estudo, denunciam o aproveitamento do texto para alguma

crítica social que naturalmente perpassa no texto e contribui para a introdução de

momento cómicos.

Tradução para legendagem (1987)

A qualquer tradução para legendagem deverá ser reconhecida, antes de mais, a sua função

primária de elemento ancilar que acompanha a imagem e auxilia a interpretação do produto

audiovisual; contudo, podem ser reconhecidas outras funções não inerentes ao produto

audiovisual e que terão de ser vistas e definidas pela ponderação do contexto:

a) Divulgação de um argumento desconhecido. Tendo sido esta a primeira exibição deste

filme e tradução em televisão portuguesa, é possível identificar o propósito de

introdução e divulgação de um filme desconhecido do público português.

b) Confirmação da centralidade do texto. A emissão do filme no quadro de programação

intitulado “Lotação Esgotada”, cujo objectivo foi definido segundo os termos de

divulgar e relembrar os grandes clássicos do cinema, denuncia a centralidade do

texto e do seu estatuto de clássico no sistema fílmico.

c) Confirmação de práticas linguísticas e de tradução. Também neste caso, a falta de

estudos relativamente ao discurso em textos traduzidos para legendagem no

contexto português e à recriação de variedades linguísticas em televisão em

particular, assim como a ausência de notas dos tradutores ou normas especificas do

canal de televisão relativamente a este aspecto, tornaram difícil avaliar o grau de

13Embora não seja possível neste estudo proceder à análise textual que esta questão reclama, percebemos que
a inclusão de certas passagens ausentes no texto de partida, assim como da tradução para publicação de
2001, tinham como objectivo uma crítica social velada ao mesmo tempo que suportavam o carácter cómico
característico do argumento. A passagem seguinte (assinalada a itálico) é um claro exemplo:

Senhora Eynsford-Hill: Pronto, parou de chover. Já não precisamos de nenhum táxi. Vamos de
autocarro, ouvistes, Clara?
Higgins: Ouvistes?!!! Pela boca morre o peixe!
Clara: De autocarro, que ridículo! Tudo por tua culpa, estúpido!
Higgins: Estamos a viver numa época de novos-ricos que querem fazer-se passar por senhores, mas
traem-se cada vez que abrem a boca. Ao menos aquela é genuína.

255
Parte IV - Análise

inovação do discurso face às normas em vigor nos anos 80; contudo, a promoção do

canal público de televisão em causa (RTP) como serviço público, assim como a

experiência pessoal de espectadora, conduziu à identificação das estratégias

tradutórias assumidas como estando em confirmação das práticas linguísticas e de

tradução em vigor no sistema televisivo português dos anos 80.

d) Consolidação do estatuto da entidade promotora da tradução. Tendo em conta o

estatuto de canal público e a promoção deste como elemento de “serviço público”, a

estratégia predominante de padronização e centralização reconhecidas a esta

tradução parecem participar na consolidação do estatuto da entidade promotora

enquanto serviço público, aqui entendido como guardião do “bom português”.

Tradução para legendagem (1994)

Reconhecendo uma vez mais a função primária de elemento ancilar, são reconhecidas as

seguintes funções a esta tradução:

a) Divulgação de um autor e argumento desconhecidos.

b) Confirmação de práticas linguísticas e de tradução e consolidação do estatuto da

entidade promotora da tradução. Tendo sido esta tradução promovida pelo mesmo

canal público de televisão e sendo-lhe igualmente identificada uma estratégia

predominante de centralização e padronização do discurso, somos levados a

observar, tal como na tradução para legendagem de 1987, uma atitude de

confirmação de práticas linguísticas e de tradução, assim como de consolidação do

estatuto da entidade promotora da tradução.

Tradução para legendagem (1995)

A esta tradução são reconhecidas, para além da sua função primária de elemento ancilar,

as seguintes funções:

a) Divulgação de um filme desconhecido. Apesar de o argumento de Pygmalion ser já do

conhecimento do público, esta adaptação televisiva do argumento nunca tinha

256
Parte IV - Análise

chegado aos ecrãs portugueses, denunciando o propósito de divulgação e introdução

de novos produtos audiovisuais.

b) Confirmação da centralidade do texto. A emissão do filme num quadro de

programação intitulado “Tardes de Cinema”, cujo critério de selecção dos filmes se

baseava no estatuto de clássicos que lhes é reconhecido, denuncia a centralidade do

texto e do seu estatuto de clássico no sistema cinematográfico.

d) Consolidação do estatuto da entidade promotora da tradução. Tendo em conta que a

emissão foi promovida por um canal de televisão ainda bastante recente14 , a escolha

de um filme reconhecido como um clássico do cinema denuncia o propósito de

afirmação e consolidação do estatuto que o canal de televisão tinha conquistado até

então.

e) Renovação de práticas linguísticas e de tradução. A identificação a segunda metade

da década de 90 como um momento de alteração de estratégia tradutória

relativamente tanto à recriação de variação linguística, como aos níveis linguísticos de

que o tradutor tira partido na recriação de variedades não-padrão, leva-nos a

confirmar o propósito de renovação das práticas linguísticas e de tradução nesta

tradução. Também neste caso, seria abusivo reconhecer a esta tradução o papel de

introdutor e instigador dessa renovação; contudo, reconhecendo uma alteração

progressiva do sistema linguístico e das práticas de tradução promovida por diversos

agentes e textos, não podemos deixar igualmente de observar a opção clara do

tradutor em participar nesse movimento de renovação tanto das práticas linguísticas

como das práticas de tradução. Outro aspecto deve ser, no entanto, tido em

consideração. Relembrando o facto de esta tradução ter sido promovida por um

canal de televisão privado, que, por um lado, se viria a definir e a ser definido em

comparação com o canal público RTP que até então monopolizava os ecrãs

portugueses e que, por outro, foi o grande responsável pela democratização do

mercado de tradução audiovisual em Portugal por não assumir um grupo próprio de

14A primeira emissão do canal de televisão SIC, o primeiro canal privado generalista e de emissão nacional em
Portugal, ocorreu às 20h do dia 6 de Outubro de 1992.

257
Parte IV - Análise

tradutores, a promoção de estratégias de descentralização poderá denunciar não só a

participação num movimento de renovação das práticas linguísticas e de tradução,

mas também uma tomada de posição face às normas promovidas pelo canal público.

Tradução para legendagem (1996)

A esta segunda tradução de My Fair Lady são reconhecidas, para além da sua função

primária de elemento ancilar, as seguintes funções:

a) Confirmação da centralidade do texto e consolidação do estatuto da entidade

promotora da tradução. A emissão do filme num quadro de programação intitulado

“Sessões Especiais de Natal”, em que a escolha dos filmes se baseava no seu

estatuto incontestável de clássicos do cinema, confirma a percepção deste filme

como um clássico do cinema. Tendo em conta que esta emissão foi promovida pelo

mesmo canal privado que promoveu a tradução de 1995, é possível concluir que,

também neste caso e pelas mesmas razões, a escolha de um clássico de cinema vem

participar no processo de afirmação deste canal de televisão.

b) Renovação de práticas linguísticas e de tradução. Identificando nesta tradução uma

manutenção de estratégias tradutórias identificadas como inovadoras na tradução de

1995, vemos confirmado o propósito de participação desse mesmo movimento de

renovação das práticas linguísticas em televisão e das práticas de tradução em

legendagem. Sendo igualmente promovida pelo canal privado SIC, esta tradução vem

assim confirmar as hipóteses levantas anteriormente (cf. tradução 1995, alínea e)).

Identificadas as funções prospectivas de cada um dos TC constitutivos do corpus translato

em análise e tendo em conta as regularidades identificadas aquando da análise da

recriação de variedades prestigiadas e não prestigiadas, assim como dos níveis linguísticos

de que a recriação tira partido, é agora possível ponderar a possível correlação entre as

regularidades de comportamento e as funções prospectivas identificadas.

Relembrando as palavras de Lane Mercier (cf. I-2.2), em que à recriação de variedades

linguísticas é reconhecido um significado extradiegético de posicionamento do autor ou

258
Parte IV - Análise

tradutor e da sua ideologia face à tradição e às normas presentes no contexto circundante,

é possível observar no corpus translato tanto um movimento de consolidação, através do

qual as normas dominantes se perpetuam, como um movimento de subversão através do

qual novos elementos são introduzidos no sistema com vista à renovação deste e/ou das

práticas linguísticas e/ou de tradução. Foi igualmente possível confirmar a hipótese

anteriormente colocada quanto à alteração do sistema tradutório, na medida em que às

estratégias que primeiramente se constituíam como um elemento de subversão foi, mais

tarde, reconhecida uma função de consolidação.

Focando a nossa atenção nas motivações de natureza poética (cf. I-2.2), parecem

desenhar-se três fases distintas, cronologicamente consequentes e em que os três grupos

em análise se posicionam de forma distinta, tal como se torna explícito na figura 22.

Prática Dominante Prática dominante


Não-recriação ou contracção Recriação de variedade
de variedades linguísticas linguísticas

Tradução TC 1, TC2 TC 3 TC4, TC 5


para Movimento de Movimento de Subversão Movimento de consolidação
publicação consolidação Estratégia de Estratégia de descentralização
Estratégia de centralização e descentralização e expansão e expansão das variedades
contracção das variedades das variedades ficcionais ficcionais
ficcionais

Tradução TC6, TC7 TC8


para Teatro Movimento de Subversão Movimento de Subversão
(palco) Estratégia de Estratégia de descentralização
descentralização e expansão e expansão das variedades
das variedades ficcionais ficcionais

Tradução TC 9, TC10 TC11, TC12


para TV Movimento de Movimento de Subversão
(legendagem) consolidação Estratégia de
Estratégia de centralização e descentralização e expansão
contracção das variedades das variedades ficcionais
ficcionais

Figura 22: Movimentos de consolidação e de subversão identificados no corpus translato.

Aceitando a hipótese de uma alteração do sistema tradutório no sentido de uma melhor

aceitação de estratégias de descentralização e recriação de variedades linguísticas em

texto traduzido, é possível reconhecer que, se num primeiro momento a prática dominante

seria de centralização e contracção das variedades não-padrão, posteriormente, a prática

dominante vem a desenhar-se como de descentralização e manutenção ou expansão das

259
Parte IV - Análise

variedades não-padrão. No processo de alteração de práticas dominantes houve

naturalmente lugar para um período de coexistência de estratégias, sendo que as

estratégias que viriam no futuro a constituir a prática dominante terão sido, no momento,

interpretadas como subversivas e desafiadoras da prática dominante actual, assumindo

uma função de renovação.

Apesar de a ponderação da variável data de tradução ter localizado em diferentes

momentos históricos a alteração de estratégias de centralização para estratégias de

descentralização, conduzindo-nos tal à consideração das tradições estabelecidas em cada

um dos meios, assim como do prestígio que lhes é reconhecido no sistema de chegada, é

possível reconhecer as três fases anteriormente referidas nos três meios em análise, ainda

que nem todas sejam ilustradas pelos textos constituintes do corpus em estudo. Numa

primeira fase, as estratégias de centralização do discurso e de opção pelo tipo de desvio

linguístico menos comprometedor da norma ortográfica e a ser interpretado como menos

grave pelo falante comum, surgem em denúncia de uma função de consolidação das

práticas de tradução dominantes. Em contrapartida, numa segunda fase, a estratégia

contrária de descentralização do discurso, assim como de opção por desvios

comprometedores da norma ortográfica e a ser interpretados como mais graves pelo

falante comum vem denunciar uma função de subversão e renovação das práticas de

tradução. Numa terceira fase, e uma vez aceites as novas práticas de tradução como

dominantes, a estratégia de descentralização denuncia agora uma função de confirmação e

consolidação das práticas dominantes e não de renovação.

Qualquer proposta explicativa desta alteração no sistema tradutório terá de passar

necessariamente, tal como referido anteriormente, por factores diversos como: a

recuperação de uma tradição de recriação de variedades ficcionais estabelecida no sistema

de textos originais, a maior valorização do trabalho do tradutor, a alteração na

hierarquização dos elementos textuais a traduzir (denunciando agora uma maior valorização

dos conteúdos interpessoais e dos sinais informativos) e o reconhecimento e valorização da

função preenchida pelas variedades ficcionais na economia do texto. As traduções para

legendagem levam, no entanto, à ponderação de um outro factor. No seguimento de

260
Parte IV - Análise

estudos anteriores (Rosa, 1999, 2001) e tendo em conta a relação de correlação verificada

entre as estratégias tradutórias distintas identificadas a cada um dos grupos e a entidade

promotora da tradução, mereceu a atenção do presente estudo a hipótese de uma possível

distinção a fazer entre canais de televisão públicos e privados relativamente às estratégias

assumidas e ao seu grau de inovação ou não conformidade face à prática dominante. Em

1997, Rosa levantava a questão: “[s]erá a tradução para legendagem exibida pelos canais

privados (e produzida por empresas privadas) menos redutora e mais descentralizadora

relativamente a variedades sócio-culturais e registos do que a exibida pelos canais

públicos?” (1997: 46). A análise efectuada pelo presente estudo permite a observação de

certas regularidades de comportamento em confirmação desta hipótese, suportando a

conclusão de que existe uma relação de correlação entre as duas variáveis. Às traduções

promovidas pela canal público RTP, enunciado como “serviço público”, são reconhecidas

estratégias em conformidade com a norma e de consolidação das práticas linguísticas

padrão; enquanto às traduções promovidas pelo canal privado (SIC) são reconhecidas

estratégias em desvio face à norma e de renovação das práticas linguísticas e de tradução

para legendagem. Tal como apontado em Rosa (1997, 1999), o canal privado, não

assumindo o compromisso de “serviço público” poderá sentir-se menos responsável por

manter um nível de discurso considerado mais prestigiado e correcto; contudo, tendo em

conta que a RTP mantém um grupo próprio de tradutores, pode ser igualmente

considerado o facto de, tendo a SIC promovido todo um processo de democratização da

tradução para legendagem abrindo o mercado a novos tradutores, esta ter sido uma forma

de tanto o canal de televisão como os próprios tradutores marcarem a diferença face ao

canal público de televisão, vindo os textos traduzidos a participar num processo mais lato

de criação de uma imagem de modernidade, renovação e inovação com que o novo canal

privado se procurava afirmar no sistema televisivo português.

Relativamente às traduções para teatro, um último aspecto merece uma atenção particular.

Em confirmação das palavras de autores como Esslin (1976) ou Bennett (1997) que

identificam a representação teatral como o meio primordial de intervenção social

(cf.II-2.1.2), as traduções para teatro incluídas no corpus em análise parecem demarcar-se

261
Parte IV - Análise

das restantes no sentido em que assumem de forma bastante activa uma atitude de crítica

social promotora não só das estratégicas linguísticas anteriormente identificadas, mas

também da escolha destes dois textos em detrimento de outros. A opção de um autor

controverso, afamado pelos seus ideais socialistas e a opção particular da versão de 1916

da peça Pygmalion confirmam o propósito de que a representação deste argumento

cumprisse objectivos semelhantes aos que havia cumprido no sistema de partida. Outros

autores ou outros argumentos de Bernard Shaw teriam certamente maior impacto, na

medida em que tornariam tais objectivos de crítica e subversão mais explícitos; contudo,

Pygmalion apresenta-se como um candidato ideal, na medida em que o êxito do filme de

1938 e a autorização prévia pela comissão de censura para o seu visionamento em

cinemas portugueses, a categorização do argumento como ‘comédia’ e a apresentação de

Bernard Shaw como um dramaturgo central no sistema teatral ocidental detentor de um

prémio Nóbel permitiram a este argumento escapar por entre as malhas da censura. Tal é

confirmado pela escolha desse mesmo argumento em 1974 e pelo seu abandono por um

outro de Bernardo Santareno em 1974 assim que foi levantada a cortina censória. O

propósito de crítica social mantém-se igualmente activo na tradução de 2001, sendo

confirmado pela necessidade sentida pelos tradutores e encenador de enfatizar ou inserir

determinados momentos satíricos no sentido de uma “actualização” e adaptação da peça

ao Portugal de hoje:

Será a “Minha Linda Senhora” menos académica que a original, mais acre e

divertida, com a ironia e as preocupações de Shaw sublinhadas a vermelho. Ao pô-lo

em cena em português estamos também a falar de Portugal, dos nossos ricos, dos

nossos pobres e dos falsos ricos que querem passar por ricos esquecendo-se de

que “pela boca morre o peixe” (La Feria, 2003: 4)

A opção por um autor central no sistema europeu para a apresentação de uma mensagem

satírica, assim como para a consolidação do estatuto da entidade promotora da tradução

(tanto dos teatros, como das editoras ou canais de televisão), permite-nos concluir quanto

262
Parte IV - Análise

ao posicionamento periférico da cultura de chegada face à cultura de partida, na medida

em que os tradutores parecem recorrer ao prestígio atribuído à cultura de partida, assim

como aos autores e a estes textos ficcionais em particular, por forma a introduzir no

sistema de chegada elementos de renovação das práticas linguísticas.

Não sendo objectivo deste estudo estabelecer uma relação de causalidade entre as

regularidades de comportamento observadas e as funções identificadas, é, no entanto,

possível concluir quanto à relação de correlação entre ambos os elementos em análise,

confirmando a necessidade de um estudo mais desenvolvido da variável função como

elemento mediador de escolhas tradutórias e do seu grau de influência no processo de

tradução.

263
Parte IV - Análise

264
CONCLUSÃO

No capítulo introdutório foi apresentado como objectivo principal do presente estudo a

análise da tradução de variedades linguísticas em textos ficcionais de língua inglesa

(britânica) para português europeu traduzidos no séc. XX. Para tal, foi reunido um corpus

que permitisse não só o estabelecimento de um alinhamento cronológico capaz de nos

elucidar quanto à opção por diferentes estratégias tradutórias em períodos distintos, mas

também a inclusão de textos não literários e a ponderação do grau de influência da variável

meio na escolha de estratégias tradutórias. Doze traduções de Pygmalion de Bernard Shaw

e My Fair Lady de Alan Jay Lerner, distribuindo-se por três meios distintos - traduções para

publicação, traduções para teatro (palco) e traduções para TV (legendagem) - foram

incluídas no corpus de análise. Este veio a ser submetido, numa primeira fase, a uma

análise estatística quantitativa e, numa segunda fase, a uma análise qualitativa através da

qual se procurou identificar possíveis relações de correlação entre as regularidade de

comportamento tradutório identificadas e as variáveis contextuais definidas: o meio a que

se destina a tradução, a data de tradução e a função prospectiva. Procurou-se, assim,

ponderar não só sobre as características linguísticas dos textos em análise, mas também

sobre o contexto histórico face ao qual a acção do tradutor deve ser interpretada.

Assumindo que traduzir implica manobrar as normas de tradução e saber operar dentro

delas, foi objectivo deste estudo apreciar a tensão entre normas de tradução e

comportamento desviante que, em determinadas circunstâncias, poderá inclusive conduzir

a uma renovação das normas tradutórias.

Neste momento, expostos os parâmetros teóricos que permitiram a formação de um

modelo de análise adequado aos objectivos que se pretendiam atingir, assim como os

parâmetros que guiaram a selecção, classificação e análise de ambos os sub-corpora

definidos, cabe agora reservar espaço para a problematização de questões decorrentes

dos dados e reflectir sobre alguns dos aspectos dos dados obtidos. A primeira questão a

ser colocada será certamente em que medida terá o presente estudo cumprido os

objectivos propostos? Isto é, como são recriadas as variedades ficcionais nos textos de

265
partida? Que funções cumprem? Que estratégias foram reconhecidas na tradução de

variedades ficcionais nos textos de chegada? Terá a recriação de variedades ficcionais

conhecido contornos e funções semelhantes nos textos de chegada ou terá, pelo contrário,

conhecido alterações significativas? Qual o grau de influência de variáveis contextuais

como o meio, a data de tradução ou a função prospectiva?

A tradução desenha-se como um momento privilegiado de contacto entre o Eu que traduz

e o Outro traduzido, sendo assim reveladora da relação de poder e de prestígio que entre

os dois sistemas se estabelece. Neste sentido, a tradução surge como um dos vários

elementos participadores no estabelecimento de uma escala de prestígio reveladora dos

parâmetros ideológicos activos no sistema de chegada, da ideologia dominante e da escala

de valores que compreende, assim como de possíveis movimentos contra-ideológicos.

Assumindo ideologia como um corpo axiomático que conhece variação no tempo e no

espaço, provou-se relevante alinhar os TC num contínuo cronológico, procurando

reconhecer momentos de alteração de comportamento expressivos de movimentos de

consolidação ou de subversão da ideologia, isto é, de valorização ou de desvalorização da

ideologia dominante, assim como das relações de poder e dos elementos linguístico-

textuais que as exprimem. Foi neste sentido que no presente estudo foram reconhecidos

movimentos de centralização e de descentralização, denunciadores de uma posição de

valorização/consolidação da ideologia dominante ou de uma posição irreverente de

desvalorização/subversão dessa mesma ideologia. O séc. XX em Portugal assistiu a

profundas viragens ideológicas, tendo estas conduzido, por vezes, a uma renovação do

sistema político. O desgaste e o declínio das estruturas de autoridade e de poder (tanto

políticas como sociais) conduziram à renovação da ideologia dominante, fazendo com que

determinadas propostas subversivas, às quais foi em momentos reconhecido um

movimento de descentralização, viessem a assumir posteriormente um lugar central no

sistema, relativamente ao qual novos movimentos de descentralização se viriam a

desenhar.

Contemplando todos estes factores, provou-se ainda relevante procurar responder a um

outro conjunto de perguntas: qual a posição assumida pelos sistemas de chegada e de

266
partida no sistema literário europeu e qual a sua relação de prestígio? Que atitude poderá

ser reconhecida aos promotores das traduções pela escolha de tais textos em detrimento

de outros? Qual a função prospectiva desenhada para cada uma das traduções e qual o

grau de correlação entre os factores contextuais definidos e as características linguístico-

textuais seleccionadas? Que momentos de alteração de comportamento podem ser

identificadas após um alinhamento cronológico dos textos de chegada? A tais questões

podem ser acrescidas as seguintes: qual a posição ocupada pelo sistema de textos

traduzidos dentro do polissistema de chegada e que tipo de atitude é denunciada pelo

assumir de determinadas estratégias tradutórias? Qual o grau de prestígio das diferentes

variedades linguísticas no sistema de chegada e como é tal sistema transposto e recriado

em texto ficcional? Qual o grau de prestígio reconhecido aos diferentes meios em estudo e

como pode esse factor influenciar o processo de decisão do tradutor?

Proposta de um modelo e de uma metodologia de análise de variedades ficcionais

Diversos trabalhos em Estudos de Tradução abordaram já o tópico da tradução de

variedades ficcionais, contudo, os estudos existentes abordam a questão de forma muito

sucinta ou no âmbito de um estudo mais abrangente, baseando-se em corpora muito

limitados e constituídos apenas por textos literários. O presente estudo apresenta-se,

deste modo, como um contributo original no sentido em que, conciliando as propostas dos

Estudos Descritivos de Tradução, da Gramática Sistémico-Funcional, da Sociologia, da

Pragmática, do New Historicism e Cultural Materialism e da Análise de Corpora em

Tradução, propôs um modelo e uma metodologia de análise semi-automática de

variedades ficcionais que procurou dar conta tanto das formas linguístico-textuais de que a

recriação tirou partido e dos significados comunicativos e sócio-linguísticos que as

variedades expressam, como da possível correlação entre estes e variáveis contextuais

como o meio a que se destina a tradução, a data de tradução e a função prospectiva.

Além de uma tipologia organizadora das diferentes estratégias anteriormente identificadas

por diferentes estudos de caso, foi apresentada, partindo das propostas de Dimitrova

(1997), Leppihalme (2000a, 2000b) e Rosa (1999, 2004), uma escala de prestígio das

267
diferentes variedades linguísticas (cf. II-3.3). Esta escala constitui um passo complementar

relativamente a estudos anteriores na medida em que não só organiza as variedades de

forma distinta, como as organiza sob a forma de um sistema por forma a dar conta do valor

socio-semiótico das variedades seleccionadas. Tendo em conta o estudo descritivo de

âmbito circunscrito realizado anteriormente (Ramos Pinto, 2007b) foram também neste

caso dados passos adicionais no sentido de testar um primeiro ordenamento das

variedades num contínuo de prestígio através da organização de um questionário. A análise

dos dados obtidos a partir do questionário permitiu, apesar da não representatividade do

grupo de inquiridos, estabelecer um contínuo em que a variedade padrão se encontra no

extremo de maior prestígio, seguida pela variedade oral, variedade regional e variedade

social, posicionando-se esta última no extremo de maior desprestígio. A definição deste

contínuo e da escala de prestígio que expressa permitiu posteriormente identificar

movimentos de centralização e de descentralização, assim como movimentos de

consolidação e de subversão.

Relativamente aos níveis linguísticos seleccionados na recriação de variedades linguísticas

menos prestigiadas em texto ficcional, foi pelo presente estudo apresentado um contínuo

expressivo da valorização reconhecida pelo falante comum a marcas morfossintácticas,

gráficas e lexicais, ocupando as marcas morfossintácticas e lexicais os extremos de menor

e maior prestígio e as marcas gráficas a posição intermédia. A organização deste contínuo

e a confirmação dos seus princípios organizadores através de um questionário constituem,

também neste caso, passos adicionais não só relativamente ao estudo previamente

realizado pela autora (Ramos Pinto, 2007b), como relativamente a outros estudos em que a

valorização reconhecida pelos falantes aos níveis linguísticos não teve oportunidade de ser

explorada em detalhe (Dimitrova, 1997, Leppihalme 2000a, 2000b e Rosa, 1999, 2004).

De acordo com os parâmetros definidos pelo modelo de análise, foi desenhada uma

metodologia de análise semi-automática de formas linguístico-textuais expressivas de

significados sócio-linguístico, que pensamos constituir um passo adicional face à proposta

apresentada em Rosa (2004). A descrição detalhada da sua criação e aplicação,

fundamentada no intuito de a tornar replicável e aperfeiçoável, possibilitou a obtenção de

268
dados passíveis de integração em corpora de maiores dimensões ao serviço de estudos

futuros, assim como a integração em estudos comparativos.

Recriação de variedades ficcionais em texto traduzido

Tendo em consideração a tipologia apresentada em II-3.3 concluímos que todas as

traduções constituintes do sub-corpus translato optam pela preservação da variação

linguística, pela preservação das coordenadas de espaço e de tempo do TP, assim como

pelo recurso a marcas familiares reconhecidas como não-padrão no contexto de chegada.

Embora assumam estratégias diferentes na recriação e as diferentes variedades

apresentem percentagens de frequência também distintas, é possível concluir que todos os

textos de chegada recorrem a marcas de oralidade na recriação do discurso desprestigiado

e que, evitando desvios denunciadores de pertença a uma região ou grupo social

específicos, recorrem a marcas de diversas variedades linguísticas desviantes do padrão e

de reconhecimento imediato pelo leitor que permitem a sua identificação como subpadrão.

A análise comparativa das percentagens a reconhecer em cada uma das categorias

presentes no contínuo tornou possível identificar dois grupos com estratégias distintas de

recriação de variedades ficcionais: um primeiro grupo, constituído pelos TC1, TC2, TC9 e

TC10, a que é reconhecido um movimento de centralização e um segundo grupo,

composto pelos restantes textos de chegada, a que pode ser reconhecido um movimento

de descentralização.

Ao movimento de centralização é reconhecido uma predominância da variedade padrão

prestigiada e o recurso preferencial a marcas de variedade oral em recriação de variedades

subpadrão, denunciando um movimento de convergência. Em conjunto com estes dados,

será relevante ponderar o facto de estes textos de chegada não só denunciarem um

predomínio da variedade padrão, como também estratégias de expansão da variedade

padrão e de contracção das variedades oral e subpadrão face ao texto de partida. Conclui-

se, assim, quanto a uma substituição de repertoremas de valor negativo por repertoremas

de valor menos negativo ou positivo (variedades oral e padrão), denunciando, assim, a

tendência em preterir conteúdos interpessoais e de sinais informativos em favor de

269
conteúdos referenciais que o discurso exprime. A recriação como variedade padrão de

unidades presentes no TP como variedade subpadrão tem como consequência directa o

facto de os significados comunicativos e sócio-semióticos, ao serviço da caracterização

indirecta da personagem em estudo, do posicionamento desta no sistema ficcional e da

introdução de momentos cómicos, se perderem proporcionalmente a esta redução.

Tendo em conta o grau de contracção das variedades não-padrão, mostrou-se relevante

voltar aos textos de chegada em análise e averiguar quanto à presença ou ausência de

estratégias de compensação que tornassem possível ao leitor inferir de algum modo as

linhas de significação atenuadas pela recriação em contracção das variedades ficcionais.

Seguindo o modelo apresentado em II-3.3.3 houve oportunidade de verificar o recurso a

duas estratégias de compensação: o uso criativo do grau de formalidade e a introdução de

forma de tratamento de modo recorrente a fim de tornar evidente as relações de poder e de

solidariedade entre as personagens.

Ao movimento de descentralização, a reconhecer de forma acentuada nos TC3, TC4, TC5,

TC6, TC7 e TC8 e de forma menos acentuada nos TC11 e TC12, é reconhecida uma maior

expressão das variedades menos prestigiadas (tanto oral como subpadrão), assim como

uma preferência pelo extremo do contínuo na medida em que a variação linguística é

predominantemente conseguida pela recriação de variedades subpadrão que assumem

percentagens de ocorrência superiores à variedade oral. As funções de primeira e de

segunda ordem de caracterização indirecta da personagem e de introdução de momentos

cómicos são assim mantidas, sendo, porém, de notar, a sua acentuação ou, inclusive, uma

alteração do perfil da personagem nos casos em que foi possível reconhecer uma muito

acentuada estratégia de expansão da variedade subpadrão. Pelo prestígio que lhes é

reconhecido, a presença mais acentuada das variedades subpadrão e o recurso a marcas

subpadrão de menor prestígio do que o reconhecido às marcas subpadrão presentes no TP

resultaram numa caracterização da personagem distinta da desenhada no TP.

Adicionalmente, por vezes, não só o perfil da personagem recebe novos contornos como

são introduzidos ou enfatizados momentos cómicos ausentes ou atenuados no TP.

270
Relativamente aos níveis linguísticos de que a recriação tirou partido, a análise global das

percentagens reconhecidas a cada uma das categorias permitiu identificar uma preferência

pela selecção de marcas lexicais e gráficas, em detrimento de marcas morfossintácticas

que parecem ser preferencialmente recriadas em expressão de oralidade. Importantes

denotam, no entanto, ser as regularidades identificadas de acordo com os movimentos de

centralização e descentralização reconhecidos. Ao movimento de centralização podemos

associar uma preferência por marcas lexicais, a que se segue a escolha de marcas gráficas

e morfossintácticas, revelando estratégias de expansão das primeiras e de contracção das

restantes. Ao movimento de descentralização parece estar associada a preferência por

marcas gráficas, a que se segue a escolha de marcas lexicais e morfossintácticas, agora

em denúncia de uma estratégia de expansão das primeiras e de contracção das restantes.

O estudo comparativo dos dois grupos que aqui se desenham possibilitou, como tal,

identificar uma aparente correlação, por um lado, entre o movimento de centralização e o

recurso a desvios de valor sócio-semiótico menos negativo relativamente ao seu nível de

gravidade e, por outro, entre o movimento de descentralização e o recurso a desvios de

valor sócio-semiótico mais negativo.

Parece assim ser possível concluir que a recriação de variedades ficcionais segue

diferentes estratégias, podendo ser reconhecido em algumas das traduções uma clara

estratégia de normalização e num segundo grupo uma clara estratégia de descentralização.

O presente estudo possibilitou confirmar num corpus mais vasto e com base num par de

línguas distinto as regularidades identificadas por estudos anteriores relativamente ao

movimento de normalização dialectal (cf. II-3.2.2). Contudo, o facto de diferentes tradutores

responderem de forma diversa a um problema idêntico vem confirmar a hipótese de que a

recriação de variedades ficcionais é governada pelas normas vigentes no sistema de

chegada num determinado momento histórico, não podendo, portanto, ser entendido como

uma manifestação de um universal de tradução. A opção por estratégias de convergência

(opção pelas variedades posicionadas no centro do contínuo) ou por estratégias de não-

convergência (opção pelas variedades posicionadas nos extremos do contínuo) parece ser

também ela governada pelas normas em acção, não se relacionando com o universal de

271
tradução de normalização dialectal proposto por Dimitrova (1997). Contudo, não deixa de

ser relevante a oportunidade oferecida pelo presente estudo de, por um lado, confirmar a

correlação entre estratégias de normalização e de convergência anteriormente identificada

por Shlesinger (1989) e confirmada por Laviosa-Braithwaite (1996 e Laviosa 1998a, 1998b)

e, por outro, a identificação de uma aparente correlação entre as estratégias de

descentralização e de não-convergência que não tinha sido possível aferir em estudos

anteriores e que esperamos vir a merecer maior atenção no futuro.

Uma vez confirmada a acção tradutória como governada pelas normas em vigor, vale a

pena agora reflectir sobre os factores que conduziram a diferentes comportamentos

tradutórios entre tradutores contemporâneos num mesmo sistema.

Correlação entre as regularidades identificadas e as variáveis contextuais

Meio a que se destina a tradução

O estudo da relação de correlação entre os dados obtidos e o seu contexto circundante

focou primordialmente três variáveis: o meio a que se destina a tradução, a data de

tradução e a função prospectiva. Relativamente à variável meio foi possível concluir quanto

à participação do meio na forma como é gerida a recriação de variedades ficcionais, assim

como na selecção de determinados níveis linguísticos na recriação de variedades menos

prestigiadas.

Mantendo a distinção entre os dois grupos referidos anteriormente (um primeiro a que é

reconhecido um movimento de centralização e um segundo a que é reconhecido um

movimento de descentralização), o estudo comparativo dos textos de chegada permitiu

verificar que as traduções para legendagem, em resultado tanto das restrições de espaço,

tempo e nível de legibilidade, como pelo suporte que recebem pela co-presença dos

restantes elementos visuais e auditivos, denunciam uma tendência mais acentuada para

uma recriação em contracção de variedades menos prestigiadas relativamente às

traduções para publicação e traduções para o palco. Apesar de no seio das traduções para

legendagem ser igualmente possível distinguir dois grupos quanto à expressividade do

movimento de centralização (apresentando o segundo grupo uma atenuação considerável

272
do movimento de centralização reconhecido no primeiro grupo), não podemos deixar de ter

em conta o facto de as traduções para legendagem apresentarem em qualquer dos casos

uma estratégia de centralização mais acentuada face às traduções para publicação e às

traduções para o palco.

Também relativamente aos níveis linguísticos preferencialmente seleccionados na recriação

de variedades menos prestigiadas, as traduções para legendagem parecem demarcar-se

relativamente às restantes traduções. Ainda que nas traduções para legendagem seja

igualmente possível verificar a coincidência entre a presença mais notável de variedades

não-padrão e a selecção preferencial de desvios de natureza gráfica, não pode ser ignorada

uma estratégia geral de opção por desvios a que é reconhecido um menor grau de

gravidade e um maior grau de legibilidade. A preferência recai nos desvios de natureza

lexical, conhecendo os desvios gráficos e morfossintácticos valores bastante inferiores.

Esta opção vem a ser reiterada por uma presença em menor número de desvios em

demarcação do discurso como não-padrão, confirmando o cuidado por parte dos

tradutores na recriação de um discurso não resistente à leitura e cuja interpretação seria

coadjuvada pelos restantes elementos constituintes do produto audiovisual final.

Nas traduções para o palco é possível reconhecer uma recriação em contracção da

variedade oral, que, por via da alteração do canal, não será reconhecida pelo espectador

como discurso subpadrão, e, em consequência, a recriação em expansão da variedade

subpadrão, que, feita acompanhar de uma contracção da variedade padrão, conhece aqui

os valores mais expressivos. Apesar de integradas num produto audiovisual com diversas

linhas semióticas que assistem o espectador na interpretação, as traduções para o palco,

uma vez integradas no produto final em palco marcado por uma alteração do canal, não

poderão tirar partido do impacte que os desvios característicos da variedade oral assumem

pela associação feita entre norma padrão e escrita, sendo que o tradutor opta por uma

recriação de variedades subpadrão com recurso a desvios inequivocamente subpadrão. As

marcas de oralidade introduzidas poderão servir como “pistas” para os actores aquando

dos ensaios, mas serão anuladas numa fase última da representação. A presença mais

expressiva reconhecida às variedades subpadrão deve ainda ser atribuída a dois factores

273
essenciais: a necessidade de manter uma linha importante de congruência entre os

elementos auditivos e os elementos visuais, sob pena de novas linhas de significação

ausentes no TP serem introduzidas no TC, e a necessidade de se manter viva na memória

do espectador a distinção a fazer entre as personagens. Esta circunstância parece ser

confirmada por uma presença persistente e regular de desvios, a mais elevada de entre

todos os grupos definidos no corpus translato.

Contudo, e tendo em conta que ambos os argumentos seriam válidos no caso das

traduções para legendagem, foi possível concluir que a distinção a fazer entre os meios

passa não só pelas características técnicas que os distinguem, mas também pelas

diferentes linhas de tradição e os contextos de produção e de recepção que os enquadram.

Tal como discutido anteriormente (IV-2.2.3), diversos poderão ser os factores

extralinguísticos correlatos de estratégias de centralização, sendo possível distinguir como

relevantes a fraca aceitação do TC pela presença de marcas desviantes, o receio de uma

possível interpretação de tais marcas como erros e não como resultantes de uma

manipulação intencional; as condições adversas enfrentadas pelas grande maioria dos

tradutores (insuficiência de tempo para uma tradução ponderada, baixa remuneração,

meios de pesquisa insuficientes). Esta circunstância ressoa, contudo, de forma mais

acentuada nas traduções para legendagem, na medida em que se fazem sentir num meio

com limites de tempo de exposição, com um grau de legibilidade mais restritivo e onde as

condições de trabalho parecem ser ainda mais adversas pela existência de prazos mais

limitados, um mercado mais competitivo e remunerações mais baixas. Factores como a

tradição de recriação de variedades ficcionais estabelecida ou o prestígio reconhecido a

cada um dos meios em estudo foram certamente correlatos das diferentes regularidades

identificadas, não deixando estes de ser tidos em consideração aquando da ponderação da

variável data de tradução.

Os dados relativos às traduções para publicação, embora permitam distinguir dois

movimentos distintos, vêm confirmar os resultados de Rosa (2004) relativamente ao facto

de à tendência de normalização parecer estar associada a preferência por marcas de

oralidade para a distinção do discurso como subpadrão em texto literário.

274
Relativamente aos níveis linguístico-textuais preferencialmente seleccionados, será

importante ter em consideração o facto de as traduções para legendagem, apesar de poder

ser feita a distinção entre dois grupos com opções ligeiramente diferentes, denunciarem

uma recriação que tira partido de um número mais reduzido de desvios e que selecciona

preferencialmente desvios de conotação menos negativa relativamente às traduções para

publicação e às traduções para o palco. A variável meio parece participar no processo de

selecção dos níveis linguísticos na medida em que promove a opção por desvios menos

comprometedores da leitura, confiando que os elementos extralinguísticos assistem o

espectador na interpretação e funcionam como elementos compensadores das estratégias

de contracção. Será igualmente relevante salientar os valores menos elevados a reconhecer

aos desvios de natureza gráfica nas traduções para o palco face às traduções para

publicação e tradução para legendagem, na medida em que, por via da alteração de canal,

vêem igualmente anulada a sua participação na distinção do discurso como subpadrão. A

recriação de variedades ficcionais é, deste modo, concretizada fundamentalmente através

de desvios de natureza lexical e morfossintáctica, sendo de notar que as marcas

morfossintácticas assumem nas traduções para o palco os valores mais elevados.

Data de tradução

O reconhecimento da tradução como acção em contexto, histórica e variável dentro de um

sistema também ele histórico e variável tornou relevante a consideração da data de

tradução assim como o alinhamento cronológico dos diferentes textos de chegada, vindo a

ser identificados movimentos de alteração de estratégias de tradução em determinados

momentos históricos. Nas traduções para publicação, foi possível identificar uma alteração

de comportamento no sentido de uma estratégia de contracção das variedades menos

prestigiadas nas primeiras décadas do intervalo de tempo em análise, seguida de uma

estratégia de expansão das variedades menos prestigiadas nos últimos anos do

alinhamento cronológico. Em confirmação dos dados obtidos em Rosa (2004), a década de

70 pôde ser identificada como um momento de alteração de comportamento no sentido de

um maior favorecimento da recriação de variedades ficcionais. Verificou-se uma sequência

275
evolutiva semelhante nas traduções para legendagem, sendo possível identificar uma

recriação cada vez mais expressiva de variedades menos prestigiadas em denúncia de uma

alteração de estratégia de contracção nos primeiros anos do intervalo de tempo em estudo

para uma estratégia de expansão nos últimos anos. Nas traduções para o palco, as

estratégias assumidas conhecem um percurso de grande regularidade ao longo do período

de tempo em estudo.

Apesar do exemplo de excepção constituído pelas traduções para o palco, as

regularidades identificadas nos sistemas literário e televisivo permitem confirmar a norma

tradutória hipotética segundo a qual a estratégia de contracção de variedades menos

prestigiadas seria menos expressiva nos últimos anos dos dois alinhamentos cronológicos

em análise, sendo, inclusive, possível verificar uma estratégia de recriação em expansão

mais acentuada nos últimos anos. É igualmente importante notar os diferentes ritmos de

evolução a reconhecer a cada meio, na medida em que cada um dos meios em análise

distingue diferentes décadas como o momento de alteração de estratégia relativamente à

recriação de variedades menos prestigiadas. Uma possível proposta explicativa poderá

passar por três factores: a tradição de recriação de variedades ficcionais estabelecida em

cada um dos meios em análise, o prestígio reconhecido a cada um dos meios em estudo e

a forma como a recriação de variedades ficcionais era concretizada nos textos

originalmente escritos na língua de chegada. Se as traduções para teatro apresentam uma

forte regularidade de comportamento denunciando uma tradição já bastante desenvolvida e

enraizada de recriação de variedades linguísticas em palco, as traduções para publicação,

assim como as traduções para legendagem, parecem seleccionar as décadas de 70 e de

90 respectivamente como momentos de alteração de comportamento, denunciando,

possivelmente, não só uma alteração do sistema linguístico, mas também uma percepção

distinta do discurso ficcional escrito e do discurso ficcional escrito traduzido. O prestígio

reconhecido ao modo escrito característico do texto publicado e do texto para legendagem

poderá ser interpretado como um agente activo na recriação tardia de variedades ficcionais

relativamente ao texto para teatro; contudo, não será despiciendo ponderar o prestígio

reconhecido ao meio em si como elemento participante, na medida em que, por um lado, o

276
elevado prestígio atribuído ao texto publicado poderá ter favorecido estratégias de

normalização e centralização com o propósito de preservação do discurso e, por outro, o

baixo prestígio reconhecido à legendagem poderá ter contribuído para uma atitude

conservadora por parte do tradutor que receia que os desvios linguísticos sejam

interpretados como erros de tradução. Por último, o que intuímos ser uma recriação cada

vez mais recorrente de variedades desviantes da norma em textos literários originalmente

escritos em português europeu, contribuindo para o estabelecimento de uma tradição de

recriação de variedades ficcionais em português, terá consequentemente favorecido uma

tradição de leitura e interpretação das formas de recriação de tais variedades e a sua

recriação em texto traduzido, isto é, a presença recorrente de variedades ficcionais em

texto original, justificadas por práticas literárias que procuravam um maior realismo do

discurso ficcional, permitiu o desenvolvimento de uma tradição de recriação e interpretação

de variedades ficcionais que posteriormente veio a ser recuperada em texto traduzido. A

presença mais tardia de estratégias de descentralização e recriação da variedades

subpadrão em texto traduzido relativamente a textos originalmente escritos em português

parece ser, em consequência, revelador do posicionamento periférico do sistema de

literatura traduzida face ao sistema de literatura original no seio do polissistema de

chegada, assim como do baixo prestígio reconhecido à profissão do tradutor. Dentro do

sistema de texto traduzido, porém, deve ser ainda reconhecido um posicionamento mais

central da tradução para publicação face à tradução para legendagem, na medida em que

a recriação de variedades ficcionais em texto literário traduzido terá igualmente favorecido

a recriação de variedades ficcionais em texto traduzido para legendagem. Tal circunstância

denuncia, como tal, uma maior valorização da tradução literária relativamente à tradução

para legendagem, assim como uma progressiva valorização da tradução para legendagem,

entendida agora como produto tradutório onde as diferentes linhas de significado devem

estar expressas e não apenas como elemento ancilar para compreensão do TP.

A oportunidade de análise em paralelo de diferentes meios e o alinhamento cronológico dos

textos de chegada segundo o meio a que se destinam não só possibilitou trazer a uma

discussão centenária, e centrada nos sistema literário e teatral, novos elementos pela

277
consideração de novos sistemas, das condicionantes e tipos de texto que cada um

compreende, mas também a ponderação das relações que entre os sistemas se

estabelecem e os movimentos de influência a correr tanto dentro do sistema cultural de

chegada, como entre os sistemas culturais de partida e de chegada. Neste sentido,

mostrou-se relevante ter em consideração três aspectos: a) a transferência de sistemas

sofrida pelo texto que na cultura de partida ocupava um lugar central no sistema literário e

que na cultura de chegada veio conhecer um posicionamento mais periférico no sistema

teatral; b) o recurso explícito a elementos dos sistema fílmico na publicitação de algumas

das edições publicadas e das representações teatrais; c) a recuperação nas traduções para

legendagem de estratégias de recriação de variedades ficcionais constituintes de uma

tradição desenvolvida no sistema literário.

A ponderação de todos estes elementos, assim como o reconhecimento da posição

periférica ocupada pela literatura traduzida no sistema de chegada e a identificação de

estratégias de descentralização a que poderia ser atribuída uma atitude de subversão

conduziram à ponderação da variável função prospectiva definida pelo promotor da

tradução.

Função prospectiva

Com base tanto em elementos textuais como extratextuais, foram identificadas as funções

prospectivas de cada um dos textos de chegada constituintes do corpus em análise

segundo o modelo proposto em II-3.6.3. Tendo sempre em atenção a data de tradução e os

movimentos anteriormente reconhecidos no sistema de chegada relativamente às práticas

tradutórias dominantes em acção em cada um dos três subsistemas em análise, foi

possível distinguir as regularidades identificadas como também correlatas da função

prospectiva desenhada para cada tradução.

Houve oportunidade de concluir quanto à distinção a fazer entre três fases distintas, sendo

possível reconhecer uma primeira fase em que a função de consolidação das práticas de

tradução é alcançada por uma estratégia de normalização do discurso, assim como de um

recurso preferencial a desvios de valor sócio-semiótico menos negativo; uma segunda fase

278
de coexistência de dois movimentos contrários em que paralelamente ao movimento de

confirmação é possível distinguir um movimento de subversão e renovação das práticas

tradutórias concretizado pela assumpção de estratégias de descentralização e não

normalização do discurso, assim como pela opção de desvios de valor sócio-semiótico

mais negativo do que no TP e, por último, uma terceira fase em que, sendo agora

reconhecidas as estratégias de descentralização como prática dominante, são identificadas

funções de confirmação às traduções que as demonstram.

A identificação de tais regularidades permitiu não só concluir quanto à relação de

correlação existente entre as regularidades textuais encontradas e a função prospectiva,

como também confirmar o posicionamento marginal da cultura de chegada face à cultura

de partida e o papel que a tradução assumiu na renovação do discurso ficcional.

A ponderação da variável função provou ser particularmente reveladora na análise das

traduções para legendagem onde houve ainda oportunidade de confirmar a hipótese

levantada por estudos anteriores (Rosa, 1997, 1999) quanto à distinção a fazer entre canais

de televisão públicos e privados relativamente às estratégias tradutórias assumidas na

recriação de variedades ficcionais e o seu grau de inovação ou conformidade face à norma

dominante. Os dados apontam no sentido de uma opção por estratégias de consolidação

da norma dominante por canais públicos que entendem o seu papel como “serviço

público” e uma opção por estratégias de subversão e renovação da norma dominante por

canais privados que, não assumindo o compromisso de “serviço público” se sentirão

menos responsáveis por manter o nível do discurso valorizado como mais prestigiado. A

imagem de inovação e irreverência através da qual o canal privado SIC se procurou definir

terá certamente favorecido estratégias de descentralização por parte de tradutores a quem

um novo mercado se abria (a RTP conta com o seu próprio grupo de tradutores) e que

procuravam marcar a diferença entre o discurso da RTP e de outros canais de televisão.

Destaca-se como igualmente relevante o facto de os textos analisados parecerem

confirmar a posição de autores como Esslin (1976) ou Bennett (1997) que identificam a

representação teatral como o meio primordial de intervenção social (cf.II-2.1.2), tendo sido

possível distinguir as traduções para teatro por uma atitude crítica bastante activa a ser

279
concretizada não só na escolha dos textos a traduzir, mas também nas estratégicas

linguísticas e tradutórias assumidas.

Relembremos de momento as hipóteses norteadoras do presente estudo apresentadas no

capítulo introdutório, tendo em consideração a forma como estas foram ou não

confirmadas pelos dados obtidos.

Hipótese 1

A procura de manutenção dos significados socioculturalmente determinados relativamente

às variedades linguísticas e importados para o texto pela presença de marcas não-padrão

conduz o tradutor no sentido da aceitabilidade (em cumprimento das normas e expectativas

dominantes) ao contexto de chegada.

Esta primeira hipótese veio a ser confirmada no sentido em que é manifesta a opção por

marcas linguístico-textuais de fácil reconhecimento no contexto de chegada, afastando-se

o tradutor da preocupação em tirar partido do mesmo tipo de desvios linguísticos e nas

mesmas situações a reconhecer no texto de partida.

Hipótese 2

Face à necessidade de tradução de um discurso subpadrão num texto ficcional, meios

diferentes, porque com características distintas, levam ao escalonar das prioridades de

forma diversa e, consequentemente, à opção de estratégias particulares que se mostram

específicas de cada meio.

Apesar de ter sido possível confirmar o meio como uma variável correlata das

regularidades linguístico-textuais identificadas, não foi possível confirmar estratégias

específicas de cada meio, denunciando que as características inerentes do meio, embora

conduzam à consideração de elementos distintos e a uma hierarquização específica dos

elementos do texto, não condicionam de forma absoluta o processo de tradução.

280
Hipótese 3

O alinhamento cronológico das traduções, previamente agrupadas consoante o meio a que

se destinam, torna evidente não só a opção por diferentes estratégias tradutórias em

diferentes períodos, como também a mudança gradual do sistema linguístico no sentido de

uma cada vez maior aceitação da presença de variedades subpadrão no discurso ficcional

literário.

O presente estudo possibilitou confirmar não só a hipótese aqui formulada, como também

a década de 70 e de 90 como décadas de alteração de comportamento tradutório

relativamente às traduções para publicação (tal como identificado por estudos anteriores;

Rosa, 2004) e traduções para legendagem respectivamente.

Hipótese 4

Tendo em conta o período em estudo e a presença de uma censura institucional até 1974,

as traduções realizadas entre 1932 e 1974 manifestam estratégias de normalização do

discurso, denunciando uma estratégia de contracção das variedades oral e subpadrão que

selecciona preferencialmente marcas lexicais na recriação do discurso subpadrão.

Embora as regularidades reconhecidas nas traduções para publicação venham confirmar

esta hipótese, sendo possível reconhecer uma alteração de estratégia na década de 70, as

traduções para o palco apresentam regularidades que apontam noutro sentido, permitindo

concluir não só que a censura institucional em vigor durante o Estado Novo assumia

diferentes parâmetros de controlo consoante o meio, mas também que cada um dos

sistemas conhece tradições de recriação de variedades linguísticas distintas.

Hipótese 5

A opção tradutória seleccionada está em consonância com a função prospectiva definida

pelo agente promotor da tradução, pelo que é possível identificar relações de correlação

entre a função prospectiva e as estratégias tradutórias identificadas.

281
Não deixando de ter em consideração que a função prospectiva é definida relativamente à

ideologia e corpo de normas dominantes, as regularidades reconhecidas no corpus em

análise permitiu confirmar a hipótese acima apresentada, na medida em que os

procedimentos identificados nos permitiram identificar estratégias tradutórias que se

apresentavam em consonância com a função prospectiva reconhecida a cada uma das

traduções através da análise de elementos extratextuais.

Hipótese 6

Os textos de chegada apresentam uma frequência de ocorrência de marcas subpadrão

inferior à identificada no texto de partida.

A formulação desta hipótese teve por base estudos anteriores (Dimitrova, 1997;

Lippihalme, 2000a, 2000b e Rosa, 1999, 2004) que, identificando uma tendência global de

normalização dos textos de chegada, conduziram à formulação do universal de

normalização dialectal. O corpus aqui reunido não permite, no entanto, confirmar a

hipótese formulada ou o universal de tradução proposto, na medida em que o

reconhecimento de uma clara estratégia de descentralização e expansão das variedades

não-padrão em alguns dos textos de chegada vem comprovar que a recriação de

variedades ficcionais é governada pelas normas vigentes no contexto de chegada num

determinado momento histórico.

Hipótese 7

Tendo em conta o alinhamento das variedades ficcionais num sistema organizador das

diferentes variedades entre os extremos de prestígio e menor prestígio, os textos de

chegada denunciam uma preferência pela(s) variedade(s) posicionada(s) no meio termo do

contínuo em detrimento das variedades posicionadas nos extremos do alinhamento.

Considerando o facto de esta hipótese ter sido formulada com base em estudos em que

uma tendência global de normalização havia sido reconhecida, o presente estudo, além de

confirmar regularidades semelhantes nos textos de chegada que apresentavam estratégias

282
de normalização, teve oportunidade de confirmar o movimento contrário, isto é, a

associação de uma preferência pelos extremos do contínuo nos textos de chegada

denunciadores de uma estratégia de descentralização.

Hipótese 8 e 9

Nas traduções mais recentes (últimas décadas do séc. XX) é possível confirmar uma

presença mais significativa de discurso subpadrão do que nas traduções das primeiras

décadas do período em estudo. Nas traduções mais recentes (últimas décadas do séc. XX)

é possível reconhecer uma menor tolerância à interferência e uma maior valorização da

aceitabilidade.

A formulação de ambas as hipóteses teve por base o estudo de Rosa (2004) que, apesar

de identificar uma tendência global de normalização dos textos de chegada, não deixa de

reconhecer uma diminuição da recriação em contracção das variedades não-padrão nas

traduções publicadas nas últimas décadas do séc. XX. Apesar de ser necessário

reconhecer linhas de evolução distintas em cada um dos meios consideramos ser possível

confirmar a hipótese aqui formulada na medida em que não só as traduções para

publicação apresentarem o mesmo tipo de regularidades, mas porque em todos os três

sistemas foi possível reconhecer uma progressiva alteração de estratégias no sentido de

uma menor contracção ou expansão das variedades não-padrão. Neste sentido, foi

igualmente confirmada uma menor tolerância à interferência e uma maior valorização da

aceitabilidade nas últimas décadas do período em estudo.

Propostas de análise futura

Diversas são, portanto, as regularidades encontradas não apenas entre factores textuais,

mas entre factores textuais e contextuais. Múltiplos parecem ser os factores que participam

no processo tradutório e na opção por uma estratégia de centralização ou

descentralização. O presente estudo não pretende, nem assim deverá ser entendido, como

um projecto finalizado com conclusões definitivas sobre o tópico da tradução de

variedades ficcionais para português europeu no séc. XX. O que este estudo pretende de

283
facto é, por um lado, apresentar-se como uma primeira abordagem indicadora das

diferentes estratégias, normas e factores que participam na tradução de variedades

ficcionais para português europeu e, por outro, apresentar um modelo de análise

suficientemente flexível que no futuro possa dar conta de um corpus mais vasto, ser

desenvolvido ou receber novas categorias de modo a contemplar contextos distintos. O

desenvolvimento de um modelo de classificação semi-automática das unidades tradutórias

e o tratamento estatístico dos dados obtidos procurou confirmar a possível convivência e

complementaridade de uma análise de natureza quantitativa e uma análise de natureza

qualitativa. O recurso a dados quantitativos conhece a sua motivação não no ilusório ideal

de objectividade, mas antes na necessidade sentida de descrever e quantificar em certa

medida as opções manifestas nos textos, de forma a que, numa segunda fase, estas

pudessem ser alvo de uma análise qualitativa que procuraria dar conta tanto do que é

partilhado por todos os textos, como do que os distingue. Tal como Partington o coloca,

em estudos como o presente, a recolha e análise dos dados é um mero primeiro passo da

análise de corpora, na medida em que não há qualquer meio tecnológico de detecção do

inusitado - “that is the domain of the mind” (1998: 148). A vantagem primeira do recurso à

análise de corpora e do seu tratamento estatístico reside no facto de esta permitir o juízo

subjectivo com base no conhecimento mais lato das propriedades partilhadas por todos os

textos que possivelmente não seria possível de outra forma e que, certamente, não seria

possível atingir por um só investigador e num estudo desta dimensão.

O presente estudo não pretende, como tal, reclamar o tratamento exaustivo deste tópico,

sendo possível identificar diversas avenidas de investigação de desenvolvimento e

continuação da análise das estratégias assumidas e dos contextos condicionadores da

tradução de variedades ficcionais. Contribuindo com dados adicionais numa linha de

investigação que se desenha plural e contínua e esperando que os dados obtidos, dotados

de significado pela identificação da repetição de comportamento em mais do que uma

situação ou texto, venham a ser testados no contexto de novos projectos de investigação,

o estudo que aqui se conclui desenha-se igualmente como um conjunto de sugestões para

futuros projectos baseados em corpora distintos ou mais latos. A selecção de um corpus

284
de maiores dimensões, representativo e distribuído equilibradamente pelas diferentes

décadas do séc. XX permitiria o testar fundamentado das hipóteses aqui levantadas em

textos diferentes, em situações diegéticas distintas (por exemplo a consideração da

tradução de variedades ficcionais em personagens secundárias) e em contextos distintos

(análise deste tópico com diferentes pares de línguas). A consideração de um corpus

comparável onde textos traduzidos para português seriam comparados com textos escritos

originalmente em português, permitiria o testar da hipótese de as regularidades

encontradas e de as opções de recriação assumidas serem características de textos

traduzidos ou, pelo contrário, seguirem a tradição inaugurada e mantida nos textos escritos

originalmente em português. A consideração de contínuos cronológicos num corpus como

o referido possibilitaria ainda averiguar se a alteração de estratégia se deve a uma atitude

de desafio iniciada pelos textos traduzidos ou se é possível apenas quando já mais

desenvolvida e comum em textos escritos originalmente na língua de chegada.

O corpus seleccionado para o presente estudo permite, no entanto, a prossecução de

diversas outras linhas de investigação que não foi possível desenvolver no âmbito deste

projecto. Entre elas podemos salientar a identificação específica e a categorização mais

refinada do tipo de marcas morfossintácticas, lexicais e gráficas de que os tradutores tiram

partido na recriação de variedades ficcionais, analisando o corpus quanto às relações de

correlação a existir entre o tipo de marcas seleccionadas e os meios a que se destinam as

traduções. Finalmente, a realização de um estudo de recepção permitiria testar as

hipóteses levantadas pelos tradutores aquando da tradução e que governam e

condicionam as escolhas feitas. Seria assim possível testar o grau de legibilidade e a

interferência do recurso a certas marcas textuais na legibilidade e inteligibilidade da

recriação de variedades ficcionais nas traduções para publicação e para legendagem, a

participação dos elementos extratextuais no caso das traduções para legendagem e para o

palco na interpretação da presença de variedades ficcionais, assim como a avaliação feita

pelos leitores/espectadores relativamente à presença de variedades ficcionais, tanto na

página como no ecrã ou em palco.

285
Tanto os textos como os dados recolhidos pelo presente estudo poderão, como tal, ser

recuperados para o desenvolvimento de novas linhas de investigação, assim como fazer

parte de estudos futuros pela inclusão dos textos seleccionados em corpora mais vastos,

ou pela recuperação para comparação dos dados aqui obtidos com os dados obtidos por

outros estudos. Esperamos com este projecto ter contribuído para o estudo da tradução

enquanto produto, identificando regularidades linguístico-textuais na tradução de

variedades linguísticas em textos ficcionais de língua inglesa (britânica) para português

europeu traduzidos no séc. XX, assim como o grau de correlação existente entre as

regularidades identificadas e as variáveis contextuais definidas. Reconhecendo as

limitações do presente estudo e as linhas de investigação que a partir daqui poderão ser

desenvolvidas, este é um projecto que esperamos poder continuar a desenvolver no futuro.

286
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309
Anexos - Bibliografia

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310
Anexos - Bibliografia

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311
Anexos - Bibliografia

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Zurbach, Christine (1997), Traduction et Pratique Théâtrales au Portugal entre 1975 et 1988:

une etude de cas, Évora: Universidade de Évora [Tese de Doutoramento].

312
ANEXO A. ATRIBUTOS EXTRATEXTUAIS

TEXTOS DE PARTIDA
(textos organizados cronologicamente por data de publicação do volume/ apresentação do
filme)

LÍNGUA Inglês britânico


MODO LITERÁRIO Dramático
GÉNERO LITERÁRIO Comédia
AUTOR George Bernard Shaw
TÍTULO Pygmalion
MEIO Publicação em volume
LOCAL DE PUBLICAÇÃO London
EDITORA Constable
DATA DE PUBLICAÇÃO 1916
NÚMERO DE PÁGINAS 205 páginas

LÍNGUA Inglês britânico


MODO LITERÁRIO Dramático
GÉNERO LITERÁRIO Comédia
REALIZADOR Antony Asquith
AUTOR George Bernard Shaw
TÍTULO Pygmalion
MEIO Publicado em volume
LOCAL DE PUBLICAÇÃO USA
EDITORA Loew's Incorporated
DATA DE ESTREIA 1938
NÚMERO DE PÁGINAS 99

LÍNGUA Inglês britânico


MODO LITERÁRIO Dramático
GÉNERO LITERÁRIO Comédia
AUTOR Alan Jay Lerner e Frederic Loewe
My Fair Lady: a musical play in two acts
TÍTULO
based on Pygmalion by Bernard Shaw
MEIO Publicação em volume
LOCAL DE PUBLICAÇÃO New York

313
EDITORA New American Library
DATA DE PUBLICAÇÃO 1956
NÚMERO DE PÁGINAS 97

LÍNGUA Inglês britânico


MODO LITERÁRIO Dramático
GÉNERO LITERÁRIO Comédia
AUTOR George Bernard Shaw
TÍTULO Pygmalion
MEIO Publicação em volume
LOCAL DE PUBLICAÇÃO London
EDITORA James Brodie
DATA DE PUBLICAÇÃO 1957
NÚMERO DE PÁGINAS 59 páginas

LÍNGUA Inglês britânico


GÉNERO Comédia
REALIZADOR George Cukor
AUTOR Alan Jay Lerner
TÍTULO My Fair Lady
MEIO Dactiloescrito
LOCAL DE PUBLICAÇÃO
EDITORA
DATA DE ESTREIA 1964
NÚMERO DE PÁGINAS

LÍNGUA Inglês britânico


GÉNERO Comédia
REALIZADOR Alan Cook
AUTOR George Bernard Shaw
TÍTULO Pygmalion
MEIO Publicado em volume
LOCAL DE PUBLICAÇÃO London
EDITORA George Prior Publishers
DATA DE ESTREIA 1983
NÚMERO DE PÁGINAS 23

314
TEXTOS DE CHEGADA: TRADUÇÕES ORIENTADAS PARA A PUBLICAÇÃO
(textos organizados cronologicamente por data de tradução)

LÍNGUA Português europeu


MODO LITERÁRIO Dramático
GÉNERO LITERÁRIO Comédia
AUTOR George Bernard Shaw
Pigmalião: análise da peça de Bernard Shaw,
TÍTULO
precedida da respectiva tradução portuguesa
MEIO Publicação em Volume
LOCAL DE PUBLICAÇÃO Lisboa
EDITORA [Edição de Autor]
DATA DE TRADUÇÃO 1961
DATA DE PUBLICAÇÃO 1963
PUBLICAÇÃO EM COLECÇÃO
TÍTULO DA COLECÇÃO
NÚMERO DE VOLUMES DA COLECÇÃO
NÚMERO DO VOLUME
NÚMERO DE PÁGINAS DO VOLUME 192 páginas
NÚMERO DE PÁGINAS DA TRADUÇÃO 136 páginas
CARACTERÍSTICAS ESPECIAIS
PUBLICAÇÃO DO NOME DO TRADUTOR Sim
NOME DO(S) TRADUTOR(ES) Marina Brum Lopes Prieto
TIRAGEM 500 exemplares
RE-EDIÇÕES E REPUBLICAÇÕES

LÍNGUA Português europeu


MODO LITERÁRIO Dramático
GÉNERO LITERÁRIO Comédia
AUTOR Alan Jay Lerner e Frederic Loewe
My Fair Lady: Comédia musical em dois actos
TÍTULO
baseada no Pygmalion de Bernard Shaw
MEIO Publicação em Volume
LOCAL DE PUBLICAÇÃO Lisboa
EDITORA Portugália Editora
DATA DE TRADUÇÃO 1966
DATA DE PUBLICAÇÃO 1966
PUBLICAÇÃO EM COLECÇÃO Sim

315
TÍTULO DA COLECÇÃO Colecção cinema
NÚMERO DE VOLUMES DA COLECÇÃO [não foi possível apurar]
NÚMERO DO VOLUME
NÚMERO DE PÁGINAS DO VOLUME 163 páginas
NÚMERO DE PÁGINAS DA TRADUÇÃO 130 páginas
CARACTERÍSTICAS ESPECIAIS Photoprints de cenas do filme My Fair Lady
de George Cukor (1964)
PUBLICAÇÃO DO NOME DO TRADUTOR Sim
NOME DO(S) TRADUTOR(ES) H. Silva Letra (texto) Gervásio Lopes (versos)
TIRAGEM
RE-EDIÇÕES E REPUBLICAÇÕES

LÍNGUA Português europeu


MODO LITERÁRIO Dramático
GÉNERO LITERÁRIO Comédia
AUTOR George Bernard Shaw
TÍTULO Pigmalião: romance em cinco actos
MEIO Publicação em Volume
LOCAL DE PUBLICAÇÃO Lisboa
EDITORA Editorial Verbo
DATA DE TRADUÇÃO 1972
DATA DE PUBLICAÇÃO 1972
PUBLICAÇÃO EM COLECÇÃO Sim
TÍTULO DA COLECÇÃO Biblioteca Básica Verbo
483 volumes em 1987, mas em constante
NÚMERO DE VOLUMES DA COLECÇÃO
crescimento (conta com 542 em 2008)
NÚMERO DO VOLUME Volume nº 74
NÚMERO DE PÁGINAS DO VOLUME 186 páginas
NÚMERO DE PÁGINAS DA TRADUÇÃO 178 páginas
CARACTERÍSTICAS ESPECIAIS
PUBLICAÇÃO DO NOME DO TRADUTOR Sim
NOME DO(S) TRADUTOR(ES) Fernando de Mello Moser
TIRAGEM 120 000 exemplares
RE-EDIÇÕES E REPUBLICAÇÕES

LÍNGUA Português europeu


MODO LITERÁRIO Dramático

316
GÉNERO LITERÁRIO Comédia
AUTOR George Bernard Shaw
TÍTULO Pigmalião
MEIO Publicação em volume
LOCAL DE PUBLICAÇÃO Mem Martins
EDITORA Publicações Europa-América
DATA DE TRADUÇÃO 1987
DATA DE PUBLICAÇÃO 1987
PUBLICAÇÃO EM COLECÇÃO Sim
TÍTULO DA COLECÇÃO Clássicos Europa-América: Livros de Bolso
NÚMERO DE VOLUMES DA COLECÇÃO 498 volumes (até Junho 2005)
NÚMERO DO VOLUME Volume nº 483
NÚMERO DE PÁGINAS DO VOLUME 304 páginas
NÚMERO DE PÁGINAS DA TRADUÇÃO 126 páginas
CARACTERÍSTICAS ESPECIAIS Desenhos de Felix Tolpolski
PUBLICAÇÃO DO NOME DO TRADUTOR Sim
NOME DO(S) TRADUTOR(ES) Mário de Abreu
TIRAGEM
Pigmalião, Lisboa: Jornal Diário de Notícias,
RE-EDIÇÕES E REPUBLICAÇÕES
Colecção Prémios Nobel da Literatura.

LÍNGUA Português europeu


MODO LITERÁRIO Dramático
GÉNERO LITERÁRIO Comédia
AUTOR Alan Jay Lerner e Frederic Loewe
TÍTULO My Fair Lady, Minha Linda Senhora
MEIO Publicação em Volume
LOCAL DE PUBLICAÇÃO Lisboa
EDITORA Publicações Europa-América
DATA DE TRADUÇÃO 2001
DATA DE PUBLICAÇÃO 2003
PUBLICAÇÃO EM COLECÇÃO Sim
TÍTULO DA COLECÇÃO Grandes Clássicos do Teatro
NÚMERO DE VOLUMES DA COLECÇÃO 22 volumes
NÚMERO DO VOLUME 18
NÚMERO DE PÁGINAS DO VOLUME 148 páginas
NÚMERO DE PÁGINAS DA TRADUÇÃO 137 páginas

317
CARACTERÍSTICAS ESPECIAIS
PUBLICAÇÃO DO NOME DO TRADUTOR Sim
NOME DO(S) TRADUTOR(ES) Filipe La Feria e Helena Rocha
TIRAGEM
RE-EDIÇÕES E REPUBLICAÇÕES

318
TEXTOS DE CHEGADA: TRADUÇÕES ORIENTADAS PARA A REPRESENTAÇÃO TEATRAL
(textos organizados cronologicamente por data de tradução)

LÍNGUA Português europeu


GÉNERO Comédia
AUTOR George Bernard Shaw
TÍTULO Pigmalião
MEIO Dactiloescrito [exemplar de autor]
António Lopes Ribeiro e Francisco Lopes
ENCENADORE(S)
Ribeiro
LOCAL DE REPRESENTAÇÃO Teatro da Trindade
HORA DE REPRESENTAÇÃO 21:00
DATA DE TRADUÇÃO 1944
DATA DE ENCENAÇÃO 1945
NÚMERO DE PÁGINAS 36
NOME DO(S) TRADUTOR(ES) António Lopes Ribeiro
RE-ENCENAÇÕES

LÍNGUA Português europeu


MODO LITERÁRIO Dramático
GÉNERO LITERÁRIO Comédia
AUTOR George Bernard Shaw
TÍTULO Pigmalião
MEIO Dactiloescrito [exemplar de autor]
ENCENADORE(S) Artur Ramos
LOCAL DE REPRESENTAÇÃO Teatro Maria Matos [nunca chegou a estrear]
HORA DE REPRESENTAÇÃO
DATA DE TRADUÇÃO 1974
DATA DE ENCENAÇÃO
NÚMERO DE PÁGINAS 25
NOME DO(S) TRADUTOR(ES) Luís Francisco Rebelo e José Palma e Carmo
RE-ENCENAÇÕES

319
LÍNGUA Português europeu
MODO LITERÁRIO Dramático
GÉNERO LITERÁRIO Comédia
AUTOR Alan Jay Lerner e Frederic Loewe
TÍTULO My Fair Lady, Minha Linda Senhora
MEIO Dactiloescrito [exemplar de autor]
ENCENADORE(S) Filipe La Feria
LOCAL DE REPRESENTAÇÃO Teatro Politeama
HORA DE REPRESENTAÇÃO 21:00
DATA DE TRADUÇÃO 2001
DATA DE ENCENAÇÃO 2003
NÚMERO DE PÁGINAS 30
NOME DO(S) TRADUTOR(ES) Filipe La Feria e Helena Rocha
RE-ENCENAÇÕES

320
TEXTOS DE CHEGADA: TRADUÇÕES ORIENTADAS PARA A LEGENDAGEM
(organizados cronologicamente por data de emissão/ comercialização)

LÍNGUA Português europeu


GÉNERO Comédia
REALIZADOR George Cukor
AUTOR Alan Jay Lerner e Frederic Loewe
TÍTULO Minha Linda Lady
Dactiloescrito [texto transcrito manualmente a
MEIO
partir da versão em VHS]
TRADUÇÃO COMERCIALIZADA Não
FORMATO DE COMERCIALIZAÇÃO
LOCAL DE EMISSÃO Canal 1, RTP
DATA DE TRADUÇÃO 1987
DATA DE COMERCIALIZAÇÃO/ EMISSÃO 8 de Abril de 1987
HORA DE EMISSÃO 14:00
"Lotação Esgotada" (rubrica diária de 2ª a 6ª
QUADRO DE PROGRAMAÇÃO
feira)
NOME DO(S) TRADUTOR(ES) J. Nunes de Carvalho

RE-EMISSÕES 6 de Outubro de 1991 no Canal 2 da RTP


(Ciclo “Noites de Cinema”, 22.05)

10 de Janeiro de 1998 no Canal 2 da RTP


(passaram apenas excertos do filme no
programa “O Filme da Minha Vida”, com
Maria Elisa Domingues como convidada de
Inês de Medeiros)

LÍNGUA Português europeu


GÉNERO Comédia
REALIZADOR Antony Asquith
AUTOR George Bernard Shaw
TÍTULO Pigmalião
Dactiloescrito [texto transcrito manualmente a
MEIO partir da versão em VHS]

321
TRADUÇÃO COMERCIALIZADA Não
FORMATO DE COMERCIALIZAÇÃO
LOCAL DE EMISSÃO Canal 1, RTP
DATA DE TRADUÇÃO 1994
DATA DE COMERCIALIZAÇÃO/ EMISSÃO 9 de Fevereiro de 1994
HORA DE EMISSÃO 14:00
QUADRO DE PROGRAMAÇÃO
NOME DO(S) TRADUTOR(ES) Ruth Saraiva
RE-EMISSÕES

LÍNGUA Português europeu


GÉNERO Comédia
REALIZADOR George Cukor
AUTOR Alan Jay Lerner e Frederic Loewe
TÍTULO My Fair Lady, Minha Linda Lady
Dactiloescrito [texto transcrito manualmente a
MEIO partir da versão em DVD]
TRADUÇÃO COMERCIALIZADA Sim
FORMATO DE COMERCIALIZAÇÃO DVD
LOCAL DE EMISSÃO
DATA DE TRADUÇÃO 1994
DATA DE COMERCIALIZAÇÃO/ EMISSÃO 1994
HORA DE EMISSÃO
QUADRO DE PROGRAMAÇÃO
NOME DO(S) TRADUTOR(ES) SOFTITLER
RE-EMISSÕES

LÍNGUA Português europeu


GÉNERO Comédia
REALIZADOR Alan Cook
AUTOR George Bernard Shaw
TÍTULO Pigmalião
Dactiloescrito [texto transcrito manualmente a
MEIO
partir da versão em VHS]
TRADUÇÃO COMERCIALIZADA Não

322
FORMATO DE COMERCIALIZAÇÃO
LOCAL DE EMISSÃO SIC
DATA DE TRADUÇÃO 1995
DATA DE COMERCIALIZAÇÃO/ EMISSÃO 28 de Março de 1995
HORA DE EMISSÃO 14:00
"Tardes de Cinema" (rubrica diária de 2ª a 6ª
QUADRO DE PROGRAMAÇÃO feira)
NOME DO(S) TRADUTOR(ES) Rosário Vieira
RE-EMISSÕES

LÍNGUA Português europeu


GÉNERO Comédia
REALIZADOR George Cukor
AUTOR Alan Jay Lerner and My Fair Lady
TÍTULO Minha Linda Lady
Dactiloescrito [texto transcrito manualmente a
MEIO partir da versão em VHS]
TRADUÇÃO COMERCIALIZADA Não
FORMATO DE COMERCIALIZAÇÃO
LOCAL DE EMISSÃO SIC
DATA DE TRADUÇÃO 1996
DATA DE COMERCIALIZAÇÃO/ EMISSÃO 24 de Dezembro de 1996
HORA DE EMISSÃO 14:00
QUADRO DE PROGRAMAÇÃO "Sessões Especiais de Natal"
NOME DO(S) TRADUTOR(ES) Eulália Ramos
RE-EMISSÕES

323
324
ANEXO B. ELEMENTOS CONTEXTUAIS

1. Capa de rosto da edição de


Pigmalião pela Editorial
Europa-América

2. Capa de rosto da edição de


My Fair Lady pela Editorial
Europa-América

3. Anúncio da representação
de 1964 no Teatro Monumental

325
4. Fotos da representação de 1945 no Teatro da Trindade

326
5. Selecção de alguns dos anúncios e cabeçalhos de jornais relativos à
representação de 1945 no Teatro da Trindade

Anúncio publicado
n’ O Século, 29/10/1945

Anúncio publicado
n’ O Século, 30/10/1945

Artigo publicado
n’ O Século, 30/10/1945

Artigo publicado
n’ O Século, 31/10/194

327
Anúncio publicado
n’ O Século, 02/11/1945
Anúncio publicado
n’ O Século, 03/11/1945

Anúncio publicado
n’ O Século, 06/11/1945

Anúncio publicado
n’ O Século, 10/11/1945

Artigo publicado
n’ O Século, 17/11/1945

328
ANEXO C. QUESTIONÁRIO

Idade: _____ anos Data: _____/_____/_____

Sexo: F M

Curso Universitário que frequenta:_____________________________________________________


__________________________________________________________________________________
Ano que Frequenta: _____ ano

__________________________________________________________________________________________

Questionário

Grupo I
No discurso de um qualquer falante somos diversas vezes surpreendidos por erros ou desvios de
natureza gráfica, morfossintáctica ou lexical face ao que assumimos como norma-padrão.

Todas as frases seguintes exibem erros/desvios de naturezas diferentes. Ordene as frases do


erro que considera mais grave para o menos grave, utilizando uma escala de 1 (muito grave),
2 (grave) a 3 (pouco grave).

Grupo A
I.A.1 Espero que o João se despache. …………………..…………………………………..
I.A.2 Para que é que ele quer ir a Santarém? ……………………………………………….
I.A.3 O que 'stão pr'aí a dizer? ………………………………………………………………..

Grupo B
I.B.1 Claro que vim, atão porque não viria? …………………………………………………
I.B.2 Elas não são raparigas como a mim. …………………………………………………..
I.B.3 Vem cá ó pechepego! ……………………………………………………………………

329
Grupo II
Numa situação de diálogo, os falantes tendem a ser hierarquizados em termos dos factores
contextuais que o seu discurso codifica (oralidade, estatuto sociocultural, origem geográfica).

Em cada um dos grupos seguintes, ordene as frases da que considera traduzir um uso menos
correcto da língua para a que considera traduzir o uso mais correcto da língua, utilizando uma escala
de 1 (menos correcto), 2 (razoável) a 3 (mais correcto).

Grupo A
II.A.1 Se te vais armar em bom, é melhor nem vires. ………………………………………
II.A.2 Vossemecê podia ir antes à outra loja. …..…………………………………………...
II.A.3 Calça esse coturnos para não teres frio nos pés. …………………………………..

Grupo B
II.B.1 Não quero que ninguém não veja o que faço. ……………………………………….
II.B.2 O que é que fazes aqui? ………………………………………………………………..
II.B.3. Nunca se aqui conheceu nada. ……………………………………………......……..

Grupo C
II.C.1 Tenho de ir botar no presidente no próximo Domingo. ….………………………….
II.C.2 Ele é um rapaz muito inducado. ……………………………………………………….
II.C.3 Os alunos 'screveram o que a professora ditou. …………………………………….

Grupo III
Nesta última tabela são descritos três grupos: um primeiro que faz a distinção entre tipos de desvio
codificadores de classe sociocultural baixa, pertença a uma região específica ou de oralidade; um
segundo que distingue entre desvio de natureza morfossintáctica, lexical e gráfica; e, um terceiro,
que classifica as frases em termos da gravidade do desvio que apresentam face à norma-padrão.

Assinale com um X, em cada um dos grupos anteriormente identificados, a situação que as frases
apresentadas à esquerda parecem traduzir.

330
Classe Regional Oral Morfossi Lexical Gráfico Muito Grave Pouco
Sociocultural ntáctico grave grave
baixa

III.a. Para que é que vens com


tantos livros?

III.b. Eu ajudo vossemecê a levar


essas coisas.

III.c. Bamos ber se consigo levar


isto tudo.

III.d. A Joana tava com o Ricardo


quando o acidente aconteceu.

III.e. A gente vamos ao mesmo


café de ontem

III.f. Estandem juntos os dois. lá


pensaram o que fazer.

III.g. Aquela quinta especializou-se


na criação de bocarinhos.

III.h. Num seja tão apressado.

III.i. Tenho de ir meter os miúdos


na ordem!
ANEXO D
ANÁLISE DESCRITIVA DOS RESULTADOS DO QUESTIONÁRIO

Data de Realização: 27 de Junho de 2006


Local: Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa
Número de Inquiridos: 40

Idade dos inquiridos: Sexo dos inquiridos:

19 anos 7 Feminino 29
20 anos 2 Masculino 8
21 anos 7 Sem resposta 3
22 anos 9
23 anos 6
24 anos 4
25 anos
26 anos 3
27 anos 1
28 anos 1

Licenciatura que frequenta: Ano de Licenciatura que frequenta:

LLM: Inglês/Português 18 2º Ano 15


LLM: Inglês/Espanhol 2 4º Ano 25
LLM: Francês/Inglês 3

Artes do Espectáculo 4

Comunicação e Cultura 9

Tradução 3

Sem resposta 1

332
Grupo I A [34 respostas válidas] Grupo I B [32 respostas válidas]

Muito grave 12% Muito grave 16%


1. Oral-Lexical Grave 9% 1. Social-Gráfico Grave 41%
Pouco grave 79% Pouco grave 44%

Muito grave 12% Muito grave 72%


2. Oral-Morfossintáctico Grave 82% 2. Social-Morfossintáctico Grave 13%
Pouco grave 6% Pouco grave 16%

Muito grave 76% Muito grave 13%


3. Oral-Gráfico Grave 9% 3. Social-Lexical Grave 47%
Pouco grave 15% Pouco grave 41%

Grupo II A [34 respostas válidas] Grupo II B [32 respostas válidas]

Menos correcto 18% Menos correcto 78%


1. Lexical-Oral Razoável 35% 1. Morfossintáctico-Social Razoável 16%
Mais correcto 47% Mais Correcto 6%

Menos correcto 32% Menos correcto 6%


2. Lexical-Social Razoável 50% 2. Morfossintáctico-Oral Razoável 13%
Mais correcto 18% Mais Correcto 81%

Menos correcto 50% Menos correcto 16%


3. Lexical-Regional Razoável 15% 3. Morfossintáctico-Regional Razoável 72%
Mais correcto 35% Mais Correcto 13%

Grupo II C [34 respostas válidas]

Menos correcto 6%
1. Gráfico-Regional Razoável 50%
Mais correcto 44%

Menos correcto 76%


2. Gráfico-Social Razoável 18%
Mais correcto 6%

Menos correcto 18%


3. Gráfico-Oral Razoável 32%
Mais correcto 50%

333
Grupo III

Para que é que vens com tantos livros. [37 respostas válidas]

Social 14%
Regional
Oral 86%

Morfossintáctico 70%
Lexical 14%
Gráfico 16%

Muito grave 3%
Grave 5%
Pouco grave 92%

Eu ajudo vossemecê a levar essas coisas. [34 respostas válidas]

Social 9%
Regional 89%
Oral 3%

Morfossintáctico 14%
Lexical 80%
Gráfico 6%

Muito grave
Grave 14%
Pouco grave 86%

Bamos ber se consigo levar isto tudo. [38 respostas válidas]

Social 3%
Regional 88%
Oral 12%

Morfossintáctico 32%
Lexical 9%
Gráfico 62%

Muito grave 9%
Grave 15%
Pouco grave 79%

334
A Joana tava com o Ricardo quando o acidente aconteceu. [34 respostas válidas]

Social 3%
Regional 13%
Oral 84%

Morfossintáctico 26%
Lexical 29%
Gráfico 45%

Muito grave 13%


Grave 26%
Pouco grave 61%

A gente vamos ao mesmo café de ontem. [37 respostas válidas]

Social 79%
Regional 6%
Oral 15%

Morfossintáctico 68%
Lexical 21%
Gráfico 12%

Muito grave 68%


Grave 26%
Pouco grave 6%

Estandem juntos os dois, lá pensaram o que fazer. [33 respostas válidas]

social 84%
Regional 16%
Oral

Morfossintáctico 76%
Lexical 22%
Gráfico 3%

Muito grave 76%


Grave 22%
Pouco grave 3%

335
Aquela quinta especializou-se na criação de bocarinhos. [33 respostas válidas]

Social 3%
Regional 76%
Oral 18%

Morfossintáctico 3%
Lexical 88%
Gráfico 9%

Muito grave
Grave 24%
Pouco grave 73%

Num seja tão apressado. [34 respostas válidas]

Social 26%
Regional 38%
Oral 35%

Morfossintáctico 38%
Lexical 38%
Gráfico 24%

Muito grave 15%


Grave 29%
Pouco grave 56%

Tenho de ir meter os miúdos na ordem! [37 respostas válidas]

Social 22%
Regional 5%
Oral 73%

Morfossintáctico 41%
Lexical 54%
Gráfico 5%

Muito grave 11%


Grave 19%
Pouco grave 70%

336
337
ANEXO E. Dados da análise quantitativa dos
sub-corpora não translato e translato

1. Sub-corpus não translato

1.1. Valores absolutos relativos à recriação de variedades ficcionais

Variedade Variedade pouco Variedades não prestigiadas


prestigiada prestigiada

Sub-corpus Padrão Oral Subpadrão Subpadrão Subpadrão Social Número total de UTP
não translato Regional Social Específico

Pyg16 248 103 0 136 0 487

Pyg38 175 77 0 96 0 348

MFL56 157 94 0 97 0 348

Pyg57 292 98 0 155 0 586

MFL64 178 98 0 116 0 392

Pyg83 250 102 0 133 0 485

1.2. Valores absolutos relativos às marcas linguístico-textuais distintivas do


discurso como oral ou subpadrão

Sub-corpus Morfossintaxe Grafia Escolha Lexical Número total de Número total


não UTP de marcas
translato utp-m-o utp-m-s utp-g-o utp-g-s utp-l-o utp-l-s não-padrão identificadas

Pyg16 76 87 107 53 25 74 239 422

Pyg38 47 39 76 46 17 45 173 270

MFL56 65 64 97 51 14 48 191 339

Pyg57 92 93 139 57 33 80 253 494

MFL64 61 73 102 61 19 58 214 374

Pyg83 80 77 103 64 24 72 235 420

338
2. Sub-corpus translato

2.1. Valores absolutos relativos à recriação de variedades ficcionais

Variedade Variedade pouco Variedades não prestigiadas


prestigiada prestigiada

Sub-corpus Padrão Oral Subpadrão Subpadrão Subpadrão Social Número total de UTC
translato Regional Social Específico

TC1 324 105 6 59 0 488

TC2 229 81 0 31 0 341

TC3 310 106 0 177 0 593

TC4 319 73 31 178 0 601

TC5 188 71 1 104 0 364

TC6 260 66 7 188 0 521

TC7 283 73 0 164 0 520

TC8 177 52 0 121 0 350

TC9 237 47 0 29 0 313

TC10 261 33 0 31 0 320

TC11 315 53 0 110 0 478

TC12 214 38 0 109 0 361

339
1.2. Valores absolutos relativos às marcas linguístico-textuais distintivas do
discurso como oral ou subpadrão

Morfossintaxe Grafia Escolha Lexical Número


Sub- Número
total de
corpus total de
marcas
translato utc-m-o utc-m-r utc-m-s utc-g-o utc-g-r utc-g-s utc-l-o utc-l-r utc-l-s UTC
identificadas

TC1 55 0 19 27 6 72 107 11 26 488 323

TC2 25 0 0 3 0 32 43 0 15 341 118

TC3 97 0 22 73 3 204 42 0 84 593 525

TC4 78 0 10 28 9 314 24 29 67 601 559

TC5 73 0 22 8 0 256 20 2 112 364 493

TC6 115 0 41 109 0 438 40 24 58 261 825

TC7 103 0 46 65 0 177 33 0 98 237 522

TC8 63 0 20 9 0 206 59 2 82 173 441

TC9 25 0 3 22 0 18 23 0 21 76 113

TC10 11 0 1 10 0 8 22 0 12 64 64

TC11 14 0 0 59 0 121 22 0 24 163 240

TC12 20 0 6 60 0 132 21 0 29 147 267

340

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