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P Avul n12 1969 Simões

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C O N S E L H O NACIONAL DE PESQUISAS

INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS DA AMAZONIA

MUSEU PARAENSE EMILIO GOELDI

ARQUEOLOGIA BRASILEIRA
EM 1968
UM RELATORIO PRELIMINAR SOBRE O PROGRAMA
NACIONAL DE PESQUISAS ARQUEOLÓGICAS

José Proenza BROCHADO, Universidade Federal do Rio Grande do


Sul; Valentin CALDERÓN, Universidade Federal da Bahia; Igor
CHMYZ, Universidade Federal do Paraná; Ondemar .F DIAS JR.,
Patrimônio Histórico e Artístico da Guanabara; Clifford EVANS,
Smithsonian Institution; Silvia MARANCA Museu Paulista; Betty

Universidade Federal de Santa Catarina: José Wilson RAUTH,


Universidade Federal do Paraná; e Mário .F SIMÕES, Muscu
P a r a e n s e Emilio Goeldi.

PUBLICAÇÕES AVULSAS N° 12

1969
BELÉM - PARÁ - BRASIL
Embora nos últimos 20 anos as pesquisas arqueológicas tenham
progredido consideravelmente em várias partes do Nôvo Mundo, no
Brasil pouca atenção receberain. No entanto, sendo o conheci-
m e n t o d e s t a vasta área essencial para a reconstruçao do desenvol-
vimento cultural pré-histórico e de sua difusão no continente, fazia-se
urgentemente necessário incrementar os trabalhos de campo. Con-
tudo, o Brasil, com cêrca de 8.500.000 km2, possui menos arqueó-
logos que um só estado norte-americano. Em tais condições, a
obtenção de informações completas a curto prazo e com mínimo de
financiamento apresentava, em têrmos de planejamento de pesquisa,
um verdadeiro desafio.
A primeira investida sistemática realizou-se em 1964, sob a
forma de um seminário de um mês organizado pela Universidade
Federal do Paraná e financiado pela Fulbright Commision e CAPES,
reunindo arqueólogos de diversas partes do Brasil. Durante êsse
encontro, foram discutidos processos padronizados para análise e
descrição de cerâmica, proposto um glossário de têrmos arqueoló-
gicos e revistas as condições da arqueologia brasileira quanto a pro-
blemas de pesquisas, bem como de facilidades institucionais e finan-
ciamento. Dessas discussões emergiu o Programa Nacional de Pes-
quisas Arqueológicas (PRONAPA), o qual representa um esfôrço
coordenado entre Pesquisadores e Professôres de 11 Universidades e
Museus brasileiros sob o co-patrocínio do Conselho Nacional de Pes-
quisas e da Smithsonian Institution, com a colaboração do Patri-
mônio Histórico e Artístico Nacional. O trabalho de campo teve
início em fins de 1965, com planejamento para 5 anos, dos quais 3
já se escoa ram.
O plano de pesquisa levou em consideração alguns fatôres.
Primeiro, apesar de ser nosso objetivo final o conhecimento dos pro-
cessos pelos quais os sucessivos grupos de imigrantes pré-europeus,
com diferentes padrões de subsistência, adaptaram-se às diversas
condições ecológicas do Brasil, fomos levamos a reconhecer que tais
estudos não poderiam ser empreendidos sem o estabelecimento pré-
vio de uma infra-estrutura cronológica fidedigna. Segundo, o pes-

~ 3 ー
soal qualificado era limitado. Terceiro, o trabalho de campo teria
que ser concentrado, pelo menos no início, naqueles Estados onde
residiam os arqueólogos, a saber: Rio Grande do Sul, Santa Ca-
tarina, Paraná, São Paulo, Guanabara, Rio de Janeiro, Bahia e Rio
Grande do Norte. A possibilidade de um único arqueólogo para a
bacia amazônica era, parcialmente, compensada pela maior quan-
tidade de informação existente para essa parte do Brasil (p.e.
Meggers & Evans, 1957; Hilbert, 1968) .
Como o PRONAPA fôra planejado para cinco anos, a primeira
tarefa consistiu em selecionar aquelas áreas nas quais a prospecção
arqueológica intensiva produzisse os mais significantes resultados
durante êsse período. Em cada Estado foram selecionadas 5 re-
giões, representando diferentes rêdes de drenagem e várias partes
do Estado, devendo cada uma ser pesquisada intensivamente cada
ano. Dentro dela, todos os sítios descobertos eram catalogados,
mapeados e amostrados através coleções superficiais ou escavações
estratigráficas. Na medida do possível foram obtidas amostras de
carvão para fins de datação por C-14, amostras de solo para análise
pedológica, além de fotos e notas suplem entares descrevendo a
localização do sítio em relação ao meio-ambiente. Sítios que podiam
servir para pesquisas mais detalhadas, foram também anotados
p a r a o futuro.
Após cada estada de campo, procedia-se a classificação de
todo material cultural coletado. Para o material pré-cerâmico, isto
implicou na separação de grupos distintos de tipos de artefatos que,
na maioria dos casos, se achavam correlacionados com diferenças
no padrão de povoamento. Para as amostras de fragmentos de
cerâmica a classificação seguiu o método de análise quantitativa,
desenvolvido principalmente por Ford (1962), como medida preli-
minar para a construção de sequências seriadas. Cada sequência
seriada representa uma fase arqueológica ou cultura, caracterizada
por tipos específicos de artefatos líticos, padrões de povoamento e
de sepultamento, bem como um complexo cerâmico distinto (i).
(1) - O têrmo "fase" foi adotado para designar complexos culturais arqueológicos,
visto não conter implicações de natureza etnológica. Embora uma fase ar-
queológica signifique sem dúvida um grupo social interatuante, por outro lado
não esclarece tratar-se de um bando, de uma tribo, de uma subtribo ou de
qualquer outra espécie de unidade sócio-política. A ênfase d a d a à c e r â m i c a
não implica em crermos que seja esta mais importante que outros aspectos da
cultura pré-histórica, simplesmente reflete o fato da cerâmica ser relativamente
mais abundante e sujeita a mudanças mais rápidas que outros tipos de artefatos,
tornando-a, por isso, particularmente útil para o estabelecimento de sequências
cronológicas relativas e para traçar difusão cultural.

ー 4 1
Na maioria das regiões, a antiquidade relativa de diversas
fases pre-cerâmicas e cerâmicas pôde ser estabelecida em função da
mudança nos tipos de artefatos, superposição estratigráfica, ou
ainda, evidências de comércio ou aculturação. Em diversos casos,

B
D

SACIA AMAZONICA PARÁ

‫مأ‬
i
BAHIA

MATO
CROSSO

\
IX
FA SÃO PAULO
FRITO SANTO

OR. D
E JANEIRO
PARAN GUANABARA

u l e
LP./ GRANDE
DO SUL

Fig. 1 - Limite entre a Bacia Amazônica e a Faixa Costeira em relação às regiões pes-
quisadas durante os 3 primeiros anos do Programa Nacional de Pesquisas Ar-
queológicas. Os números identificam os seguintes pesquisadores: 1 - 2, José
Proenza Brochado: 3-5, Eurico Th. Miller; 6 - 8 , Walter F. Piazza; 9, José
Wilson Rauth; 10 - 12, Igor Chmyz; 13, Fernando Altenfelder Silva; 14, Silvia
Maranca; 15 - 17, Ondemar Ferreira Dias Jr.; 18-21, Valentin Calderón;
22, Nássaro A. d e Souza Nasser; 23, Mário F Simões. Informação geo-
gráfica segundo ATLAS NACIONAL, IBGE : A, limite das regiões bioclimá-
ticas de clima equatorial e clima tropical quente e sub-sêco; B, limite da
Floresta Amazônica; C, limite da Grande Região Norte; D, uso da terra.

1 5 -
as sequências relativas construídas por êsse processo tiveram con-
firmação através datação por C-14. Relatórios preliminares anuais
vêm sendo publicados em Português, numa das séries científicas do
Museu Paraense Emílio Goeldi (2) .
Durante os três primeiros anos do PRONAPA, foram pesqui-
sadas 22 regiões em 9 Estados, 8 dos quais pertencentes à Faixa
Costeira e um à Bacia Amazônica (fig. 1). Mais de 1000 sítios
foram catalogados, cobrindo um período de tempo, pelo menos, de
5310 # 100 a. C. (SI-440) à época pós-européia, representando di-
versos complexos pré-cerâmicos e 42 fases ceramistas. Somam-se,
também, 3 sambaquis ou concheiros, escavados intensivamente em
Paranaguá, no litoral do Paraná.
Decorrido mais da metade do PRONAPA, pareceu-nos opor-
tuno rever todo o progresso realizado, tentando alinhamentos cro-
nológicos entre as sequências regionais que pudessem revelar pro-
blemas que seriam abordados nos dois anos restantes da pesquisa.
Com essa finalidade foi realizado um seminário no Museu Paraense
Emílio Goeldi, em Belém, de 14 a 29 de julho de 1968, e êste artigo
é um dos resultados patentes das discussões do grupo. P a r a m a i o r
exatidão, a reconstrução cultural levou em consideração trabalhos
de outros pesquisadores onde os mesmos podiam ser relacionados
com aquêles realizados durante o PRONAPA.

***

A pré-história brasileira não pode ser entendida à parte das


caracteristicas do meio-ambiente. Há muito tempo tornou-se evi-
dente que, com exceção da pintura policroma sôbre engôbo branco
que ocorre em quase todo o país, os complexos cerâmicos da Bacia
Amazônica são distintos daqueles da Faixa Costeira. Em têrmos
gerais, essa divisão cultural tem correlações com os ambientes con-
trastantes com acentuadas diferenças em clima e vegetação. Apesar
da Bacia Amazônica ser muito vasta para, ser ecològicamente uni-
forme, há nesta um predomínio de planícies, inundações periódicas,
temperaturas elevadas e vegetação exuberante. Flora e fauna para
utilização do homem são semelhantes de um extremo a outro, e a
agricultura defronta-se por tôda a área com os mesmos tipos de
problemas. A Faixa Costeira é, geralmente, mais elevada e o clima
( 2 ) — Cf. Simões, ed., 1967 e 1969.

6— —
varia de temperado com invernos frios e chuvas distribuídas durante
todo o ano, ao sul, a tropical com estação chuvosa e maior pluvio-
sidade, ao norte. No sul predomina a floresta, embora esta se con-
traia na orla costeira, ao norte, cedendo lugar a grandes extensões
de "cerrados" e outros tipos de vegetação semi-árida de terrenos
elevados. Embora varie de norte a sul em flora, fauna e potencial
agricola, a área, como um todo, contrasta fortemente com a Bacia
Amazônica em clima, vegetação, fisiografia e utilização do solo
(fig. 1). Este contraste de ambiente criou uma barreira muito
mais impenetrável, ao movimento de povos ou elementos culturais,
que o impressionante obstáculo físico formado pela cordilheira an-
Conseqüentemente, a pré-história da Faixa Costeira deve ser
considerada em separado daquela da Bacia Amazônica.

A FA I X A C O S T E I R A

O período pré-cerâmico
Antes do PRONAPA iniciar seu trabalho, em 1965, a maioria
das pesquisas realizadas no sul do Brasil referia-se ao período pré-
-cerâmico. A presença de concheiros ou sambaquis é a nota domi-
nante ao longo de quase todo o litoral. Nos Estados do Rio Grande
do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo, não eram apenas nu-
merosos antes de sua destruição por atividades comerciais recentes,
mas também gigantescos. Sambaquis com mais de 27 m de altura
são relatados e aquêles com menos de 10 m eram considerados
"pequenos" (Emperaire & Laming, 1956 :36). Em compensação,
excetuando-se alguns abrigos-scb-rocha em Minas Gerais, pouca
atenção fôra dirigida para os sítios pré-cerâmicos do interior. Há
mais de um século, restos de fauna do Pleistoceno, como o lôbo-da-
-caverna, gliptodonte e tigre dente-de-sabre, estimularam a escavação
de cavernas na região de Lagoa Sunta, resultando no achado de
restos de esqueletos humanos. Embora a antiguidade do "Homem
de Lagoa Santa" tenha sido durante muito tempo matéria de con-
trovérsia, pesquisas recentes forneceram datações por C-14 que esta-
belecem a ocupação humana da região há mais de 9 000 anos (Hurt,
1964 :26).
Um projeto do PRONAPA devotou-se inteiramente à pesquisa
dos sambaquis das imediações da baía de Paranaguá, no litoral do
Paraná. D u r a n t e os três anos passados foram escavados os sam-
baquis de São João, Pôrto Maurício e Godo, e seus resultados podem

ー7 ー
ser comparados com os de Macedo, Saquarema e Gomes, pesquisa-
dos anteriormente na mesma região. Uma série de datas por C-14
dêstes últimos sambaquis indica para os mesmos um período de
tempo de 2937 ÷ 65 a. C. (P-915) a 1321 # 48 a. C. (P-485).
um predomínio de núcleos e utensílios lascados por percussão (ta-
lhadores, trituradores, picões, raspadores, facas), e são típicas gros-
seiras pontas-de-projétil de pedra com uma só aleta. Pontas de
conchas e osso, pingentes de pedra polidos, contas de vértebra de
peixe, machados de pedra polidos e semipolidos se fazem representar.
Sepultamentos são freqüentemerte encontrados. Os inventários
culturais dos três sítios escavados são similares, divergindo, contudo,
na ênfase das espécies malacológicas que compõem os refugos. Pela
predominância de ostra (Ostrea sp.), os sambaquis do Godo, Pôrto
Maurício e São João assemelham-se muito mais com o do Gomes e
camadas inferiores do Saquarema, que com o do Macedo e camadas
superiores do Saquarema, onde a espécie dominante é a Anomalo-
cardia brasiliana. No sambaqui da Ilha dos Ratos, datado de A.D.
410 ≤ 150 (Sa-48), a espécie preponderante também é a Anomalo-
car dia brasiliana. Em compensação, o sambaqui de Maratua, no
litoral de São Paulo, datado de 5853 ‡ 1300 a.C., é composto prin-
cipalmente de Modiolus brasiliensis (Emperaire & Laming, 1956 :
44, 92). Provavelmente essas mudanças na dieta alimentar refli-
tam alterações no habitat dêsses moluscos, provocadas por levan-
tamentos e abaixamentos do nível do mar d u r a n t e milhares de anos
passados. Todavia, a verificação desta hipótese requer estudo mais
intensivo da região do que o realizado até o momento.
Nos sítios pré-cerâmicos do interior predominam também ta-
lhadores, trituradores, raspadores e facas talhados por percussão,
e centenas dêstes sítios têm sido descobertos no Rio Grande do Sul
(onde parecem ser mais comuns), Santa Catarina, Paraná, São
Paulo e Bahia. Um número de fases e complexos foi experimen-
talmente reconhecido, resultando na divisão dos mesmos em duas
classes gerais. A maioria dos sítios - provavelmente os mais
antigos - produzem apenas pesados núcleos e utensílios talhados
por percussão. Um complexo desta classe caracteriza-se por um
biface bumerangóide, tipo de utensílio anteriormente identificado
no complexo Altoparanaense da Província de Misiones, na Argen-
tina (Bórmida, 1965 1:0 e fig. 7). Uma data de C-14 do oeste
de Santa Catarina registra para êsse complexo um mínimo de
5310 # 100 a.C. (SI-440). O grupo mais recente de complexos

ー 8 ー
inclui pontas-de-flecha pedunculadas e apedunculadas, implementos
de pedra polidos e bolas de pedra. Datações por C-14 de um abrigo-
-sob-rocha, no nordeste do Rio Grande do Sul, varia de 4 000 # 190
(SI-234) a 2330 # 180 a.C. (SI-233), enquanto um sítio aberto no
leste da Santa Catarina foi datado em 1050 = 120 a. C. (SI-441).
Se os sambaquis e os sítios pré-cerâmicos do interior foram
produzidos pelos mesmos grupos humanos que se alternavam entre
a caça e coleta no interior e a moradia no litoral, ou se êles repre-

Pedra Oco

VIEIRA
TAQUARA
ITARARÉ
CASA DE PEDRA
UNA
ARATU
PERIPERI

Itararé
Xaxim. •Açungül

• Ibirama

- Taquara

•Viaira

arritos

•. 2 — Distribuicao d a s tradicoes ceramistas regionais na Faixa Costeira e localizaç


de suas respectivas fases. isas-subterrâneas ocorrem através da área h
churada.

9-
sentam adaptações independentes a diferentes tipos de fontes de
subsistência, isto não está ainda devidamente esclarecido. A maior
parte dos artefatos de ambos os sítios compõe-se de núcleos e uten-
sílios lascados por percussão, com pouca atenção no acabamento,
exceto no gume. Condições diferenciais de preservação complicam
o reconhecimento de outras semelhanças, como, por exemplo, pontas-
-de-projétil de osso que sobrevivem nos abrigos-sob-rocha e samba-
quis, mas desaparecem comumente em outras espécies de sítios. Se
os sambaquis e os sítios interioranos representam ocupações de
inverno e verão pelo mesmo grupo cultural, é provavel que as dife-
renças nos artefatos tenham uma explicação funcional ou reflitam
diferentes matérias-primas disponíveis, que propriamente diferenças
na tradição cultural. Quando a grande quantidade de artefatos
dos sítios pré-cerâmicos pesquisados durante o PRONAPA fôr mais
cuidadosamente analisada e classificada, então poderá ser possível
avaliar mais adequadamente alguns dêsses fatôres.

O período cerâmico
O reconhecimento de diferenças expressivas entre os com-
plexos cerâmicos foi mais satisfatório, em parte por não ser a pre-
servação diferencial fator principal e, por outra, por terem sido
nossas primeiras atenções dirigidas para o período cerâmico. A n t e s
do PRONAPA, a maioria dos sítios conhecidos era atribuída aos
Tupí ou Guaraní, os habitantes históricos do litoral brasileiro.
Agora, já é possível identificar algumas tradições regionais não Tu-
piguarani, como também subdividir a tradição Tupiguarani em três
variantes cronológicas (3). Cada tradição ou subtradição é repre-
sentada por diversas fases arqueológicas (de 2 a 13), tôdas definidas
por padrão de povoamento, sequências seriadas de cerâmica, arte-
fatos de pedra e outras evidências culturais, e, em alguns casos, tam-
bém por padrão de sepultamento.

AS TRADIÇÕES REGIONAIS

Sete tradições regionais ceramistas de filiação não Tupigua-


rani foram identificadas, e a informação preliminar de áreas ainda
(3) — Após a consideração de possíveis alternativas, não obstante suas conotações
lingüísticas, foi decidido rotular como "Tupiguarani" (escrito numa só palavra)
esta tradição ceramista tardia amplamente difundida, considerando já ter sido
o têrmo consagrado pela bibliografia e também a informação etno-histórica es-
tabelecer correlação entre as evidências arqueológicas e os falantes de línguas
Tupi e Guarani, ao longo de quase todo litoral brasileiro.

— 10 —
— II —
aWWHTISEA
omz i r i r i

Wwdlc
SwOM08
fl i l t
não incluídas na pesquisa indica que êste número poderá ser au-
mentado com trabalho posterior. Com exceção da tradição Peri-
peri, do litoral da Bahia, as datações por C-14 existentes são con-
temporâneas às fases locais de tradição Tupiguarani, como também
evidências de comércio ou aculturação na cerâmica conduzem à
mesma conclusão. Em geral, essas tradições caracterizam-se, com
relação à cerâmica, pela raridade ou ausência de decoração e por
pequenos vasos de formas simples; a decoração, quando presente, é
feita por incisão, ponteado, ungulado, pinçado ou polido-estriado.
Uma breve descrição de cada uma destas tradições será apresen-
tada geograficamente do sul para o norte.
TRADIÇÃO VIEIRA - Três fases arqueológicas descritas por
Schmitz e seus colaboradores (1967 :10-17), do sudoeste do Rio
Grande do Sul e adjacências do Uruguai, foram agrupadas na tra-
dição Vieira: fases Cerritos, Vieira e uma terceira ainda sem de-
signação (fig. 2). Tôdas três ocupam regiões sujeitas a inundações
periódicas extensivas durante a estação chuvosa, enquanto na es-
tação sêca são abundantes as lagoas, banhados e arroios. Nenhuma
data por C-14 foi ainda conseguida e Schmitz tenta correlacionar
as evidências culturais encontradas com os Charrua, os ocupantes
históricos da área. Os sítios consistem de grupos de 2 a 8 (rara-
mente 1) aterros de forma oval ou circular, de 20 - 100 m de
diâmetro máximo e entre 0.30 e 3 m de altura. O refugo continha
abundância de ossos de animais e peixes, cerâmica, artefatos de
pedra e pequenas lascas não retocadas de quartzo. Sepultamentos
primários ocorrem em alguns aterros.
Machados com garganta, bolas, quebra-cocos e pontas-de-
-flecha pedunculadas, são os artefatos líticos característicos. A ce-
râmica é temperada com areia e, predominantemente, não decorada.
Rara decoração consistindo de uma ou duas fileiras de marcas m i-
pressas abaixo da borda, executadas por instrumento com 2, 3 ou 4
dentes. Os vasos têm larga base plana, paredes inclinadas interna-
mente e borda apontada. Orifícios para suspensão ocorrem abaixo
do lábio em dois ou mais lados opostos.
TRADIÇÃO TAQUARA - Três fases arqueológicas foram filiadas
a esta tradição: fase Taquaruçu, no oeste do Rio Grande do Sul;
fase Taquara, no nordeste do Rio Grande do Sul; e fase Xaxim, no
sudoeste de Santa Catarina (fig. 2). Os sítios-habitações são pe-
quenos e o refugo de cacos é tão esparso que poucas coleções con-

— 12 —
têm mais de uma dezena de cacos. Duas datas por C-14, obtidas
para a fase Taquara, indicaram A.D. 570 # 110 (SI-414) e A.D.
7 60 ⼟ 100 (S T-409 )

Os tipos de utensílios de pedra são os mesmos do período
pré-cerâmico precedente, acrescidos de talhadores unifaciais e bi-
faciais, lascas com sinais de uso, batedores, raspadores em núcleos
e lascas e, possivelmente, mãos-de-pilão. P o n t a s - d e - fl e c h a de osso

11011
1 ١NC
VASILHAME

BORDAS

Fig. 4 — Perfis característicos das bordas e formas reconstruídas dos vasos da tra-
dição C a s a d e P e d r a .

e contas de concha são também características. A cerâmica é tem-


perada com areia fina e as superfícies são bem alisadas e de côr
marrom-escuro a médio. As técnicas decorativas diagnósticas com-
preendem : ponteado, ungulado (numa variedade de combinações),
pinçado e inciso, às vêzes, cobrindo tôda superfície exterior (est. 1) .
Os vasos são pequenos (altura máxima 35 cm) e de paredes del-

- 13 -
٢٢٢٢٢

٢٦١١١٢١

VASILHAME

BORDAS

Fig. 5- Perfis característicos das bordas e formas reconstruídas dos vasos da tra-
dição Itararé.

— 14 —
gadas. São típicos as tigelas rasas e jarros cilíndricos fundos, com
base arredondada ou ligeiramente aplanada. As bordas reforçadas ex-
ternamente são típicas, com lábio apontado (fig. 3).
Cerâmica da tradição Taquara foi também encontrada em
casas-subterrâneas que ocorrem às centenas sôbre o planalto, es-
tendendo-se desde o norte do Rio Grande do Sul até o sul do Paraná
(fig. 2). Pesquisas preliminares indicam que as casas-subterrâneas
variam de 1 a 13 m de diâmetro e entre 2.8 e 5.0 m de profun-
didade. Ocorrem isoladas ou distribuídas em grupos regulares ou
irregulares, contendo alguns dêsses agrupamentos cêrca de 36 casas-
-subterrâneas de diferentes tamanhos (Schmitz et alii, 1967 : 2-10 e
fig. 2-4). Sua área de distribuição coincide com a da Mata da Arau-
cária e foram ocupadas, evidentemente, durante a época que os
pinhões eram mais abundantes. Apenas algumas destas casas fo-
ram escavadas, não se encontrando em tôdas restos de cerâmica.
Conseqüentemente, não está ainda devidamente esclarecido se tôdas
as casas-subterrâneas devem ser incluídas na tradição Taquara.
Nos cumes das colinas do planalto, dentro da área de distri-
buição das casas-subterrâneas, ocorrem pequenos aterros de pouca
altura. Grupos de aterros são por vêzes circundados por um baixo
muro de terra, variando a altura dos aterros e dos muros de 40 a
50 cm. Os poucos examinados não mostraram artefatos ou restos
de esqueletos, muito embora o tamanho e a forma sugiram sepul-
tamentos.

E PEDRA - Cerâmica não decorada vem sendo


TRADIÇÃO CASA D
encontrada em diversos sítios do nordeste do Rio Grande do Sul,
centro e sudoeste do Paraná e sul de Santa Catarina (fig. 2), um
dos quais datado por C-14 em A.D. 1150 # 50 (SI-141). Cacos
intrusivos ocorrem na fase Umuarama de tradição Tupiguarani.
A cerâmica apresenta as superfícies bem alisadas e polidas e a côr
varia de amarelada, marrom ou preta. A forma típica é de grandes
tigelas arredondadas, com paredes delgadas e base espêssa. Os lá-
bios são biselados pela face externa (fig. 4) .
TRADIÇÃO ITARARÉ - As fases Itararé e Açangüi, no leste do
Paraná, foram incluídas nesta tradição e dois sítios no litoral norte
de Santa. Catarina representam provavelmente uma terceira fase
desta tradição (fig. 2). A intrusão de cacos desta tradição em sítios
das fases Cambará, Condor, Guajuvira, Imbituva, Tamboara e Caloré
indica sua contemporaneidade com a tradição Tupiguarani, inferên-

_ 15 --
cia esta também apoiada por uma data de C-14 de A.D. 1070 ÷ 100
(M-1202), de um dos sítios de Santa Catarina.
Os sítios-habitações são pequenos, variando de 15 x 20 a
25 x 30m, e o refugo raramente atinge a profundidade de 30 cm.
Padrões de sepultamentos são desconhecidos. Com exceção de pe-
quenos núcleos e lascas sem retoque, nenhum artefato de pedra
foi encontrado. A cerâmica, embora não seja polida, é bem alisada,
de côr marrom-avermelhado a cinza escuro, e temperada com areia
fina e quartzo moído. A única técnica decorativa é um fino engôbo
vermelho que ocorre em menos de 8% dos cacos. Os recipientes
são pequenos (diâmetro na borda menor que 12 cm), compreen-
dendo tigelas arredondadas ou jarros de bôca ampliada, com base
arredondada, plana ou côncava (fig. 5).
TRADIÇÃO UNA — É esta tradição ceramista representada por
duas fases arqueológicas no Estado do Rio de Janeiro. A fase
Mucuri não possui datação, porém uma data de C-14 de A.D.
890 ≤ 90 (SI-436) foi conseguida para a fase Una. Cerâmica se-
melhante é relatada no vale do Jacu, no Estado do Espírito Santo
(fig. 2). A ocorrência esporádica de cacos com decoração pintada
ou corrugada implica contato desta tradição com grupos próximos
de tradição Tupiguarani.
Os sítios-habitações variam de 50 m de diâmetro a 30 x 100 m,
com refugo estendendo-se a uma profundidade de 40 a 140 cm.
Abrigos-sob-rocha foram ocupados pela fase Mucuri e também utili-
zados para deposição de urnas funerárias. Alternadamente, as
urnas eram enterradas no sítio-habitação, acompanhadas de contas
de osso e pequenos vasos de cerâmica. Os artefatos de pedra in-
cluem bifaces polidos e trituradores.
A cerâmica é temperada com areia e a decoração limita-se a
pequenas ocorrências de incisões e estrias polidas. Tigelas arre-
dondadas e jarros com borda direta ou ligeiramente extrovertida,
são as formas predominantes (fig. 6) .
TRADIÇÃO PERIPERI - Numerosos sambaquis do litoral da Bahia
contêm cerâmica da tradição Periperi. O único sítio escavado é o
sambaqui da Pedra Ôca (Calderón, 1964), no lado leste da baía de
Todos os Santos (fig. 2), que forneceu uma data de C-14 de
880 ≤ 130 a. C. (SI-470). O depósito é composto de Ostrea sp.,
Anomalocardia brasiliana, cinza e areia. Buracos de estacas fo-
ram observados, implicando na construção de abrigos.

1 16 -
٠١١‫ار‬
VASILHAME

٠١١٠١١١
SYO808

٠١١٠٠٠٧
Fig. 6 - Perfis característicos das bordas e formas reconstruídas dos vasos da tra-
dição Una.

— 17 -
Artefatos líticos são predominantemente seixos rolados usados
como martelos, trituradores, quebra-côcos e moedores. Ocorrem
ainda pontas de osso, contas de vértebra de peixe e conchas per-
furadas. De todos os níveis do sítio obteve-se cerâmica simples,
temperada com areia e de côr marrom-escuro a negro. A decoração
limitou-se a um fragmento de borda em que os roletes foram dei-
xados externamente sem obliteração. Tigelas arredondadas com
16 — 18 cm de altura e 23 - 28 de diâmetro na borda, compre-
endem a única forma de vaso encontrada. A borda é direta, com
lábio apontado e a espessura da parede do corpo varia de 8 - 12 mm.
TRADIÇÃO ARATU - Apesar da existência de grandes sítios-
-habitações, com refugo estendendo-se até 90 cm de profundidade,
e de cemitérios com mais de 100 urnas em diversos locais da costa
e interior da Bahia e Estados vizinhos de Goiás, Sergipe e Alagoas,
apenas 3 sítios na Bahia foram pesquisados. Um dêles foi datado
em A.D. 870 # 90 (SI-542). A cerâmica contém abundante tem-
pêro de grafite e é de tipo simples, exceto pela ocorrência esporádica
de incisão, modelado, roletes não obliterados e corrugação. As for-
mas dos vasos incluem jarros globulares, tigelas com 4 pequenos
lóbulos verticais na borda e urnas funerárias pirifomes com 75 cm
de altura e 60 cm de diâmetro no ombro (fig. 7). Bifaces polidos
são os únicos artefatos líticos até agora encontrados.

A TRADIÇÃO TUPIGUARANI

Cerâmica, destacando tratamento de superfície sob forma de


pintura, corrugado e escovado, ocorre ao longo da Faixa Costeira.
27 fases arqueológicas de filiação Tupiguarani foram identificadas,
podendo ser agrupadas em 3 subtradições com significação crono-
lógica e distribucional (fig. 8). Os sítios ocupam elevações de pouca
altura e sua distribuição relaciona-se com aquela de vegetação flo-
restal. O fato das tradições regionais terem se adaptado a outros
tipos de zonas ecológicas permitiu, provavelmente, a coexistência
das duas tradições, apesar da proximidade geográfica.
Apesar das fases componentes desta tradição divergirem na
presença, frequência relativa e combinação de traços, tôdas mos-
tram a mesma cultura geral. Os sítios são superficiais, implicando
em curta permanência da aldeia, e sepultamento secundário em
urnas foi praticado no próprio sítio-habitação ou em sua proximi-

— 18 —
VASILHAME

6173 от
BORDAS

Fig. 7 - Perfis característicos das bordas e formas reconstruídas dos vasos da tra-
dição Aratu.

— 19 —
dade. Artefatos líticos, de ocorrência quase universal, compreen-
dem lascas, talhadores, abrasadores e grandes bifaces polidos.
O tembetá é o ornamento característico e são comuns os cachimbos.
As técnicas diagnósticas de decoração da cerâmica compreendem a
pintura sôbre engôbo branco, o corrugado, o escovado e o ungulado.
Engôbo vermelho, acanalado, borda entalhada, incisão, ponteado e
serrungulado são também outras técnicas de ampla dispersão
(est. 2-3). Há uma grande variedade de formas de vasos, compor-
tando desde tigelas arredondadas até grandes urnas funerárias de
ombros angulares. As tigelas são por vêzes quadradas ou elípticas
que propriamente circulares.
Apesar dêste complexo cultural básico ser participado por to-
dos os membros da tradição Tupiguarani, a popularidade absoluta e
relativa das várias técnicas de decoração da cerâmica varia notada-
mente. Em algumas fases uma das técnicas diagnósticas é domi-
nante; em outras, a popularidade combinada é aproximadamente
igual àquela dos tipos simples; e, em outras ainda, a decoração é
pouco representada. Há ainda uma variação considerável na for-
ma dos vasos, nos perfis de borda e na abundância e tipo de artefa-
tos não cerâmicos. Foram feitas diversas tentativas para distin-
guir subtradições, sendo a da separação em têrmos da técnica deco-
rativa mais popular a que obteve maior sucesso. Três subtradições
resultaram, caracterizadas, respectivamente pela dominância das
técnicas pintada, corrugada e escovada. Embora baseada primà-
riamente sôbre evidência cerâmica, o exame revelou diversos outros
traços que são associados principalmente com uma das subtradições.
SUBTRADIÇÃO PINTADA - Fases em que a pintura vermelha
e/ou preta sôbre engôbo branco é a técnica decorativa dominante,
são as mais antigas em tôdas as seqüências regionais onde esta
subtradição é representada (fig. 9). Até o momento foram reco-
nhecidas as seguintes fases : Irapuã, no Rio Grande do Sul; Umua-
rama, Condor, Guajuvira e Cambará, no Paraná; Itapicuru, na Ba-
hia; e Curimataú, no Rio Grande do Norte. As fases Imbituva
(Paraná), Ipuca e Guaratiba (Guanabara) exibem frequências iguais
de decoração pintada e corrugada, tornando-as fases de transição
entre a primeira e segunda subtradição. Datações iniciais por
C-14 indicam A.D. 570 # 150 (Gsy-81) para a fase Umuarama,
A.D. 980 ≤ 100 (SI-433) para a fase Guaratiba e A.D. 1270 ≤ 130
para a fase Itapicuru, sugerindo difusão do sul para o norte.

— 20 —
Quando são comparadas as técnicas decorativas da cerâmica
com aquelas diagnósticas da tradição Taquara, torna-se evidente
que, com exceção das fases localizadas mais ao sul e mais ao norte,
tôdas as fases incluídas na subtradição Pintada são híbridas no sen-
tido que cêrca de 50% das técnicas decorativas são repartidos com
a tradição Taquara. O fato de que a mais antiga data existente
para esta subtradição é a mesma que a mais antiga também obtida
para a tradição Taquara, e que a concentração da subtradição
Pintada no Paraná é contígua à área ocupada pela tradição Taquara
(fig. 2 e 8), tudo isso parece sugerir aculturação. Embora esta

SUBTRADIÇÃO PINTADA
SUBTRADIÇÃO CORRUGADA
SUBTRADIÇÃO ESCOVADA

Cambard
Tibag :
Tamboara
Condor - :I 1aocer a - 盒
*Sernambitiba
Calorá
Guaratiba
Im bituro
Comonda
Guajuvirg
Irapuõ - I nd u&์
Ljui — Missões
• Paranhano
Icamaqua
Maqu ind
•Vacacaí
" Toropi

Fig. 8 — Localização das fases componentes das subtradições Pintada, Corrugada e


Escovada, da tradição cerâmica Tupiguarani.

—21 -
inferência requeira maiores exames, a possibilidade de aculturação
deverá ser levada em consideração como uma tentativa para traçar
a origem da tradição Tupiguarani.
Entre as formas dos vasos, é o assador ou grelha mais comum
que nas outras subtradições. Com poucas exceções, os sítios-
-habitações estão compreendidos entre 10 e 30 m de diâmetro.
SUBTRADIÇÃO CORRUGADA — Em tôdas as sequências regionais, as
fases enfatizando o corrugado seguem aquelas dominadas por pintura
e precedem as caracterizadas por escovado (fig. 9). A subtradição
Corrugada é, até o momento, representada por 13 fases: Vacacaí,
Toropi, Ijuí, Induá, Icamaquã, Comandaí e Maquiné, no Rio Grande
do Sul; Mondaí, em Santa Catarina; Tamboara, no Paraná; Itaocara
e Sernambitiba, no Rio de Janeiro; e Cabrobó e Coribe, na Bahia
(fig. 4). As fases Paranhana (Rio Grande do Sul) e Itabapoana
(Rio de Janeiro) são de transição entre as subtradições Corrugada
e Escovada. A fase Maquiné foi datada por C-14 em A.D. 880 ÷ 110
(SI-413), a fase Mondaí em A.D. 1180 + 100 (SI-439) e a fase
Sernambitiba em A.D. 1380 ≤ 100 (SI-438), sugerindo que a sub-
tradição desenvolveu-se no Rio Grande do Sul e se difundiu em
direção norte. Cêrca de metade das fases desta subtradição exibe
forte influência da tradição Taquara, enquanto no restante predo-
minam as técnicas decorativas Tupiguarani. Apesar de fazer-se
presente do Rio Grande do Sul até a Bahia, esta subtradição é muito
difundida no sul, onde inclui 8 das 10 fases Tupiguarani conhecidas
no Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
Entre os artefatos líticos, são característicos os quebra-côcos,
batedores, mãos-de-pilão, pequenos bifaces polidos (comp. 5 - 10 cm)
e pingentes triangulóides polidos. Não obstante haver um predo-
mínio de sítios com menos de 50 m de diâmetro, aquêles com mais
de 100 m são mais freqüentes que na subtradição Pintada.
SUBTRADIÇÃO ESCOVADA - Fases Tupiguarani, em que o esco-
vado é o tratamento de superfície mais popular, são as mais re-
centes nas cronologias regionais (fig. 9), podendo a substituição
do corrugado pelo escovado ser observada em diversas sequências
seriadas. Exemplo disso são as fases Tibagi e Caloré, no Paraná,
contendo artefatos de origem européia. A fase Missões, associada
com as missões espanholas do oeste do Rio Grande do Sul, é uma
transição entre as tradições Tupiguarani e Neo-brasileira.

—22 —
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200
TRADIÇÃO TUPIGUARANI TRADIÇÃO NEO-BRASILEIRA
IÃO PN
SUBTRADÇ ITADA E CARBONO - 14
DATAÇÃO D
----- SUBTRADIÇÃO CORRUGADA CONTATO EUROPEU
11111111/ SUBTRADIÇÃO ESCOVADA
Fgi. 9- Caretas em sica das ames e ramitas meconhecdias por c-ra intoração históriosOn alto de sotra oine afer para si cacas duradas das fases individuais menots
está baseado em seriação, comércio de cerâmica, datação por C-14 e informação histórica.
das quais, provávelmente, com várias centenas de anos.
A subtradição Escovada representa o final da cultura aborí-
gene, antes da influência européia afetar a forma e a decoração das
cerâmicas indígenas. Contudo, o contato europeu reflete-se na re-
dução da frequência e na variedade dos artefatos líticos, sendo au-
sentes os furadores, mãos-de-pilão, alisadores de meia-cana e bifaces
polidos. A extensão geográfica desta subtradição é muito menor
que as anteriores e nenhuma fase desta subtradição foi, até o mo-
mento, reconhecida ao norte do Paraná. Considerando o tempo que
as subtradições Pintada e Corrugada gastaram em sua difusão para
o norte, esta ausência provavelmente significa ser a mesma recente
e, portanto, sem tempo para difundir-se.

TRADIÇÃO NEO-BRASILEIRA
Em meados do século XVI, uma tradição ceramista, combi-
nando técnicas indígenas de manufatura e decoração com elementos
de forma europeus, desenvolveu-se no litoral brasileiro. A fase Mon-
jolo, no Rio Grande do Sul; a fase Lavrinha, no Paraná; e a fase
Calundu, no Rio de Janeiro, pertencem a esta tradição Neo-brasi-
leira, além de ter sido também informada na Bahia. O escovado é
comum, ocorrendo também o corrugado, embora a pintura seja
ausente. As técnicas típicas decorativas incluem digitado sôbre
frizos aplicados ou sôbre o lábio, ponteado zonado e incisão pro-
funda nas superfícies alisadas ou através grossos roletes não obli-
terados. Asas curvadas nos ombros, bases planas e em pedestal são
elementos característicos de origem européia (est. 4). Quebra-
-côcos são os principais artefatos líticos. Cachimbos angulares de
cerâmica, às vêzes elaboradamente esculpidos, são também carac-
terísticos.

A BACIA AMAZONICA

O período pré-cerâmico
Nenhum grupo pré-cerâmico foi ainda reconhecido na Bacia
Amazônica e alguns fatôres podem ser apontados para explicar tal
situação: um, é a densa vegetação que torna difícil a localização
dos sítios; outro, a escassez de pedra, implicando em ser a maioria
dos artefatos confeccionada de materiais perecíveis, não sobrevivendo
arqueològicamente; outro, ainda, a falta de pesquisas intensivas.


23 ー
Portanto, quanto a possibilidade da Floresta Tropical ter sido evi-
tada por antigos grupos de caçadores e coletores, é um assunto que
não estamos no momento atual em condições de negar ou confirmar.
O período cerâmico
A manufatura da cerâmica parece ter sido introduzida na
Bacia Amazônica, aproximadamente, ao mesmo tempo em que esta
também aparece nos sambaquis do litoral da Bahia. A mais antiga
data por C-14, obtida para a fase Ananatuba, na ilha de Marajó,
aponta a introdução da cerâmica na foz do Amazonas em 980 ≤ 200
a.C. (SI-385). A partir de então, evolução local e influências de
complexos cerâmicos notadamente diferentes e originários da Ve-
nezuela, Colômbia, Equador e Peru resultaram no aparecimento de
um mosaico de culturas regionais.
Há alguns anos foi tentada uma padronização nesta variação
aparentemente desordenada, utilizando o mesmo método de tabu-
lação de traços aplicado para agrupar as fases arqueológicas do
litoral em classes gerais. Ainda que numerosos complexos cerâ-
micos escapassem à classificação, quer por seu conteúdo inédito,
quer por sua natureza híbrida, foram reconhecidos 4 Estilos-Ho-
rizontes caracterizados pela reunião de elementos distintos na de-
coração da cerâmica, correspondendo, de modo geral, a uma seqüên-
cia cronológica (Meggers & Evans, 1961). Um dos objetivos do
PRONAPA na área amazônica é examinar a validade dessa classi-
ficação e aclarar a distribuição geográfica dos vários estilos ou tra-
dições. Uma descrição ligeira servirá como base para a comparação
da pré-história da Amazônia com aquela da Faixa Costeira.
TRADIÇÃO HACHURADA ZONADA - A mais antiga tradição cerâ-
mica foi identificada em apenas duas localidades (fig. 10) : uma
na margem do rio Amazonas, à montante de Alenquer (Hilbert,
1959); e outra na ilha de Marajó (Meggers & Evans, 1957 :174-94) .
A decoração principal, além do engôbo vermelho e do escovado, é
feita por largas linhas incisas, quer isoladas ou definindo zonas de
fino hachurado (est. 5). Recentemente foi assinalado (Evans &
Meggers, 1968:88-92), que êste complexo partilha muitos traços
com antigos complexos formativos da área norte-andina, e uma data
por C-14 de 980 = 200 a.C. (SI-385) coloca-o, cronològicamente,
dentro do Período Formativo (Simões, 1969).
Os sítios-habitações são pequenos, embora os depósitos de
refugo da fase Ananatuba sejam mais espessos que aquêles de datas

24 ー

mais recentes, implicando numa permanência mais prolongada num
local que aquela que tem sido caracterizada para a maioria dos
grupos subseqüentes amazônicos. Cachimbos tubulares de cerâ-
mica são também associados.
TRADIÇÃO BORDA INCISA - Um número de complexos cerâmicos
descritos ao longo do Amazosas e alto rio Orinoco enfatizam motivos
incisos sôbre as largas bordas horizontais das tigelas (fig. 10). Na
ilha de Marajó, a fase Mangueiras, representando essa tradição,
chegou à ilha durante a parte mais tardia da ocupação Ananatuba.

Naricagua

a n a t ub a

HACHURADA ZONADA
BORDA INCISA

POLI CROMA
INCISA PONTEADA

Fig. 10 - Localização na Bacia Amazônica das fases e sítios das tradições Hachurada
Zonada, Borda Incisa, Policroma e Incisa Ponteada.

ー 25 ー
Datações por C-14 incluem A.D. 425 # 58 (P-406) para Manaca-
puru e A.D. 761 # 93 (P-161) para a fase Nericagua, no sul da
Venezuela.
Raras estatuetas, cachimbos tubulares, batoques auriculares
e labiais e carimbos planos e circulares de cerâmica são associados
a esta tradição. Não há evidência de práticas funerárias.
TRADIÇÃO POLICROMA - Sítios com cerâmica pintada ocorrem
ao longo de todo Amazonas, no Brasil (fig. 10). Ainda que a pin-
tura vermelha e/ou preta sôbre engôbo branco seja a decoração
mais popular, isto não significa a única técnica representada. D e
fato, a tradição caracteriza-se por uma grande proliferação de deco-
ração, quer em variedade de técnicas, quer na complexidade dos
padrões e motivos (est. 6). Incisão, excisão e acanalado sôbre
superfícies simples ou engobadas de vermelho ou branco, são típicas,
embora ponteado e modelado sejam também representados freqüen-
temente. Datações por C-14 para a tradição Policroma são alta-
mente inconsistentes, refletindo o fato da maior parte das amostras
ter sido obtida de sítios superficiais com mais de uma ocupação, ou
ainda de aterros artificiais, nos quais o carvão mais antigo poderia
ter sido transportado com a terra para construção dos mesmos.
Uma área de ocupação aparentemente "pura", próxima à foz do rio
Coari, proporcionou uma data de A.D. 1150 ≤ 47 (P-373), bem
como outras datas semelhantes foram obtidas da fase Napo, no les-
te do Equador. Três datas da fase Marajoara, na foz do Ama-
zonas estendem-se de A.D. 480 ≤ 200 (SI-386) a A.D. 690 ÷ 200
(SI-199) .
Os sítios-habitações desta tradição ceramista são extensos em
área, porém com refugos superficiais, sugerindo grandes populações
com pequena permanência de estabelecimento nos mesmos. Uma
nova prática é o sepultamento secundário em urnas depositadas em
locais isolados na floresta, dentro da própria aldeia, ou ainda em
cemitérios. Na ilha de Marajó, os portadores da tradição Policroma
construíram grandes aterros e, com exceção do leste da Bolívia,
construções dêsse tipo não foram ainda encontradas na região.
De artefatos de cerâmica, incluem-se estatuetas, rodelas-de-fuso,
colheres, bancos e suportes-de-panelas.
TRADIÇÃO INCISA PONTEADA - Por conveniência, esta tradição
como a tradição Policroma, foi designada apenas por uma de suas
técnicas decorativas diagnósticas. Salienta-se igualmente, na maior
parte dos complexos componentes, a modelagem, seja sob a forma

—2 6 —
de baixos-relevos ou de adornos biomorfos sôbre a borda ou parede
do vaso. A pintura também ocorre. A incisão é predominante-
mente retilínea e, às vêzes, os padrões são desenhados com precisão
em delgadas linhas paralelas, uniformemente espaçadas. 0 pon-
teado é associado freqüentemente. Os sítios estão concentrados ao
longo do Amazonas, a leste do rio Negro (fig. 10). Onde a infor-
mação cronológica é possível, como na área de Santarém e Terri-
tório do Amapá, os sítios são mais recentes na sequência relativa e,
em alguns casos, contêm objetos de origem européia.
Há pouca informação específica sôbre o t a m a n h o dos sítios
ou de permanência das aldeias. Sepultamento em urna foi pra-
ticado em diversos locais. As urnas são pequenas e às vêzes con-
têm restos cremados. Artefatos de cerâmica não foram ainda cata-
logados devidamente, embora estatuetas sejam associadas.
ÁREA DO ALTO-XINGU

A única área amazônica pesquisada durante os três primeiros


anos do PRONAPA foi o Alto Xingu, em Mato Grosso, próximo ao
limite ecológico da Bacia Amazônica. Esta área foi escolhida pela
falta de informações precisas e porque, sendo relativamente acessível
a Faixa Costeira, poderia mostrar influências desta região que não
penetraram na própria Amazônia.
Coleções de cerâmica de 12 sítios-habitações foram classifi-
cadas em duas fases - Diauarum e Ipavu (fig. 10). As técnicas
decorativas consistem de incisão, ponteado, pintura vermelha-sôbre-
-branco, engôbo vermelho, entalhado e modelado, esta sob a forma
de pequenos apliques ou de adornos de borda. Em técnica e mo-
tivo, estas se ajustam à tradição Incisa Ponteada.
A acumulação do depósito de refugo em alguns sítios-habi-
ções estende-se a uma profundidade ed 120 cm, embora os cacos
sejam esparsos. O padrão de sepultamento era de enterramento
direto, acompanhado por oferendas, localizado na área de habitação.
Os artefatos compreendem suportes-de-panela, cacos perfurados e
arredondados como rodelas-de-fuso, machados de pedra lascados e
semipolidos.
PROBLEMAS E POSTULAÇÕES

Uma análise crítica do estado atual da arqueologia brasi-


leira leva-nos a uma realidade. Até 1965 a região do Brasil melhor

— 27 -
conhecida e r a a Bacia Amazônica; hoje a situação é inversa. A abor-
dagem sistemática e o trabalho coordenado da equipe, durante os três
anos passados, produziram uma extraordinária quantidade de dados
específicos sôbre contexto cultural, distribuição de traços culturais,
cronologia relativa e absoluta e padrão de povoamento de áreas
selecionadas da Faixa Costeira. Ao contrário, a informação exis-
tente da Bacia Amazônica é esporádica, incompleta no inventário
cultural e, às vêzes, sem contrôle cronológico. Apesar dessa dife-
rença na precisão dos dados tornar a comparação da pré-história
das d u a s áreas uma simples tentativa, várias observações podem ser
feitas. Desde que a ocupação pré-cerâmica da Bacia Amazônica é
desconhecida, esta dirá apenas respeito ao período ceramista.
Não obstante a ausência de qualquer evidência de intercâmbio
cultural entre a Bacia Amazônica e a Faixa Costeira, a pré-história
das duas regiões segue um curso geralmente paralelo. A manufa-
tura da cerâmica surgiu na foz do Amazonas e no litoral da Bahia
em cêrca de 1000 a.C., porém em nenhum dos dois exemplos esta
inovação parece ter causado qualquer impacto além da área ime-
diatamente próxima. De várias centenas de sítios conhecidos do
baixo Amazonas, apenas duas localidades forneceram cerâmica da
tradição Hachurada Zonada. Da mesma maneira, nada comparável
à tradição Periperi foi até agora encontrado na costa brasileira ao
sul da Bahia. Salvo as exceções já apontadas, tôdas as datas por
C-14 disponíveis para os complexos cerâmicos da Bacia Amazônica
e Faixa Costeira, alinham-se acima de A.D. 500, aproximadamente.
A história subseqüente, em ambas as áreas, involve a interação de
grupos empregando técnicas plásticas na decoração da cerâmica e
representantes locais de uma ampla tradição pintada. Em ambas,
essa tradição pintada está associada com sepultamentos secundários
e m urnas.
A vasta distância sôbre a qual as duas tradições pintadas es
dispersaram, é outra forte semelhança entre as pré-histórias das
duas áreas. Na Bacia Amazônica, a tradição Policroma estende-se
desde as bases dos Andes até a ilha de Marajó, numa distância de
mais de 4800 km. A tradição Tupiguarani cobre distância equiva-
lente ao longo do litoral. Mesmo que seja reconhecido que as fases
arqueológicas que compõem estas duas amplas tradições estejam longe
de ser idênticas em conteúdo específico, sua distribuição torna-se
ainda mais notável porque sua magnitude raramente foi igualada
em outras partes do mundo. Aqui novamente, fatôres ecológicos

- 28 -
devem ser relevantes e, quando todos os dados coletados durante
o PRONAPA forem revistos e analisados, esperamos estar em con-
dições de isolar fatôres geográficos, topográficos, climáticos e de
subsistência que contribuiram para essas dispersões de longo al-
cance, bem como determinar o período de tempo em que ocorreram.
Na Faixa Costeira, onde o meio ambiente varia acentuadamente do
sul para o norte, esperamos observar se as alterações na subsistência
e no padrão de povoamento acompanharam a dispersão da tradição
cerâmista.
A acessibilidade diferente da Faixa Costeira e da Bacia Ama-
zônica a centros de desenvolvimento cultural do continente, é clara-
mente refletido nas histórias de suas cerâmicas. A Faixa Costeira,
isolada por barreiras ecológicas naturais da área andina, apresenta
um quadro relativamente simples. Por outro lado, a Bacia Ama-
zônica foi o receptáculo de influências de diversas culturas do norte
e do oeste. Conseqüentemente, as tradições ceramistas gerais são
muito menos homogêneas que aquelas da Faixa Costeira. Com-
plexos de transição e híbridos são muito mais a regra que as ex-
ceções, e as características associadas às tradições ceramistas gerais
servem mais como elementos auxiliares, pondo uma certa ordem
nesta confusão, que propriamente como descrições de conteúdo ce-
râmico e cronologia.

Apesar das tradições Policroma e Tupiguarani serem distintas,


parece improvável que os traços comuns que repartem fôssem inven-
tados independentemente. Desde que a pintura policroma e a
urna funerária foram amplamente dispersas no leste da área andina
- estendendo-se da Colômbia ao noroeste da Argentina — uma
derivação comum não implica necessariamente num ponto comum
de dispersão para as tradições que estamos interessados. Contudo,
em vista de nosso profundo desconhecimento com relação aos acha-
dos arqueológicos da maior parte do leste da Colômbia, Equador,
Peru, Bolívia e Paraguai, a compreensão dos processos de dinâmica
cultural provocando essas difusões parece improvável aperfeiçoar-se
em futuro próximo. Entrementes, a identificação de seus locais
de origem e rotas de dispersão permanecem entre os mais empol-
gantes problemas da arqueologia das terras baixas da América
do Sul.
Durante os dois anos restantes do PRONAPA, pelo menos uma
dúzia de cronologias regionais será adicionada, principalmente na
Faixa Costeira. A cobertura será expandida, incluindo partes do

— 29 —
Espírito Santo, Minas Gerais e Amazonas. Aguardamos também
obter datações por C-14 adicionais para ajudarem na correlação das
sequências regionais e para preparar uma base mais sólida de
inferências sôbre a velocidade de difusão das tradições e subtra-
dições. Embora tenhamos enfatizado neste relatório um amplo
quadro geral, estamos cientes que a realidade é muito mais com-
plexa. O estabelecimento de uma infra-estrutura geral é, contudo,
pré-requisito para deslindar situações locais complicadas, em que
grupos de origens culturais similares ou diversas encontraram-se,
misturaram-se ou se substituiram uns aos outros, em ambientes e
tempos diferentes. De fato, cada participante está acumulando um
amontoado de problemas excitantes de pesquisa, os quais aguardam
sua atenção após o esfôrço coordenado do PRONAPA encerrar-se
em 1970.

AGRADECIMENTOS

O trabalho de campo foi financiado pela Smithsonian Institu-


tion Research Foundation, enquanto as publicações e a concessão
de bôlsas de pesquisas estiveram a cargo do Conselho Nacional de
Pesquisas. Vários outros tipos de auxílio foram proporcionados
pelas instituições com que os participantes estão filiados. Estamos
profundamente agradecidos a tôdas essas instituições por seu con-
tínuo interêsse e apoio. Desejamos também mostrar nosso apreço
à Diretoria do Patrimônio Artístico e Nacional por sua colaboração.
Finalmente, nossa gratidão ao corpo técnico do Museu Paraense
Emílio Goeldi, especialmente a Dalcy Albuquerque, então Diretor,
por sua cooperação constante e acolhida hospitaleira por ocasião
do II Seminário do PRONAPA.

S U M M A RY

Although Brazil includes a variety of landscapes and climates,


two large general divisions can be recognized: the Amazon Basin
and the Coastal Strip. These bioclimatic regions have independent
prehistories, implying the existence of a strong • n a t u r a l barrier
between t h e m .
Along the Coastal Strip, the Preceramic Period lasted until
about A.D. 500 except for an enclave on the Bahia coast. The
earliest lithic complexes from the interior appear to lack stone

— 30 -
projectile points, but crude types occur in contemporary sambaquis.
Otherwise, gross typology reveals little change in artifact types.
The earliest known pottery comes from sambaquis on the
Bahia coast, where the Periperi tradition dates from the 9th century
In the south, existing carbon-14 dates place the Taquara
tradition of Rio Grande do Sul and the Tupiguarani tradition of
Paraná in the 6th century A.D. The Vieira, Casa de Pedra, Itararé,
Una, and Aratu traditions precede representatives of the Tupiguarani
tradition in eastern Paraná, Rio de Janeiro, and Bahia, but their
origins cannot be traced as yet. Except for the Aratu tradition,
which may have evolved out of the Periperi tradition, these
traditions show no affiliations with one another. The fact that
they generally occupy habitats avoided by groups of the Tupiguarani
tradition permitted their persistence in close proximity to members
of the latter tradition, and there is ceramic evidence both of trade
a n d of acculturation.
The Tupiguarani tradition contrasts with the Regional t r a -
ditions in its pan-coastal distribution. The earliest occurrence is in
Paraná, adjacent to the area occupied by the Taquara tradition,
and most Tupiguarani ceramic complexes incorporate several
decorative techniques characteristic of that tradition. In the
earliest Tupiguarani phases, painted decoration predominates, and
this Painted subtradition had spread to northeastern Brazil by the
13th century. With the passage of time, corrugation replaces
painting as the most popular decorative technique. The Corrugated
subtradition appears to be earliest in Rio Grande do Sul and is
found as far north as Bahia. About the time of European contact,
brushing replaces corrugation as the dominant surface treatment,
creating the Brushed subtradition. Amalgamation of European
ceramic elements with complexes of the Brushed subtradition gave
rise to the Neo-Brazilian ceramic tradition, which persists in
simplified form until the present day in rural areas.
In the Amazon Basin, prece amic complexes have not been
identified and the archeological record begins with the introduction
of pottery making around 1000 B.C. The earliest tradition, termed
the Zoned Hachure Style, spread to the mouth of the Amazon but
apparently exerted little influence on most of the non-pottery
making inhabitants of the area. Sites of the succeeding Incised
Rim style are more numerous and widely distributed, and also
exhibit greater variation in ceramic features. The pan-Amazonian


31 ー
Polychrome style has been dated between about A.D. 500 and 1200.
The final Incised a n d P u n c t a t e style persited until European
contact. Perhaps as a consequence of European encroachment on
the Amazon river, groups representing this late tradition have been
found far up the Rio Xingu close to the ecological border of the
Amazon Basin. In addition to these general traditions, there are
many local ceramic complexes with distinctive features, but too
little is known about them to evaluate their chronological relation-
ships or their role in Amazonian prehistory.

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— 33 —
ESTAMPA 1

1 2 3 CM U

Decoração típica da cerâmica da fase Taquara. a - b , Ponteado em linhas. -c e, Pon-


f - g , Ponteado irregularmente espaçado. h, Denteado carimbado.
etado arrastado ,-n-p, Ungulado.
i - k, Pinçado. m, Ungulado raspado. q ,r- Inciso. s, Marca-
do com corda. ,1 Impressão positiva da corda. «, Inciso ungulado.
E S TA M PA 2

0 1 2 3 4 5 CM

Decoração típica da tradição Tupiguarani. a - b , Pintura vermelha sôbre engôbo bran-


co. ,c Pintura branca sôbre engôbo vermelho. d-g, Pintura vermelha e preta sôbre
engôbo branco. h-i, Ungulado irregular. -j ,1 Serrungulado, m-o, Ungulado re-
gular. p-*. Escovado.
ESTAMPA 3

2 3 4 5 CM

Tratamento c o r r u g a d o tradição Tupiguarani. a-f, Corrugado complicado.


g-i, C o r r u g a d o e ungulado.
ESTAMPA 4

EMA S

⼀ 2 3 CM

Decoração típica da tradição Neo-brasileira. a - d, Inciso. c - h , Ponteado zonado.


-i o, Incisão sôbre roletes não obliterados. P, Incisão e ponteado sôbre roletes não
obliterados. q, Pinçado sôbre roletes não obliterados. ,r Pinçado e inciso sóbre esco-
vado. ,s Frizo marcado com dêdo e escovado. 1, Pinçado. i, Digitado e escovado.
v. Asa marcada com dêdo. **, Asa simples.
E S TA M PA 5

3 CM•

e
d

j
h

Decoração típica da tradição Hachurada Zonada, a, d, i , Hachurado paralelo zonado.


b - c, Hachurado fino cruzado zonado. ,e Hachurado largo cruzado zonado.
e círculos incisos. g, Linhas paralelas em ziguezague. h , Hachurado largo cruzado.
j, Inciso arrastado.
ESTAMPA 6

to
eN lore

a
b

Decoração típica da tradição Policroma. a-c, Pintura vermelha sôbre engôbo branco.
d - ,f Pintura vermelha e preta sôbre engôbo branco. g - i , Excisão. j -I. Incisão.

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