Psicologia e doenças crônicas
Professora Jamile Fontes Leite Botelho
Modelo biomédico x modelo biopsicossocial
Modelo biomédico: Vê o paciente como um resultado de suas funções biológicas
Modelo biopsicossocial: Vê o paciente como um todo e a soma de suas partes e pautados
nos seus determinantes sociais, além dos fatores biológicos
A doença crônica
É uma doença não transmissível que se prolonga, não se resolve espontaneamente e
raramente tem cura.
Envolve riscos biológicos, psicológico e social
Características
- Longa duração (diferente da doença aguda)
- Progressão Lenta
- Impacta diretamente na qualidade
- Carregada de representações sociais = impacto na pessoa que adoece e na
maneira em como se posiciona em relação à sua vida
- Envolve em transformações inevitáveis, inerentes à dinâmica do processo
saúde-doença
- O diagnóstico afeta a identidade do indivíduo
Aspectos subjetivos
- Vivência exigente
- implicações em alterações na vida social, familiar, ocupacional etc
- A partir do diagnóstico de DC, novas incunbências são geradas. A partir do
desenvolvimento de estudos, analisando os impactos desse diagnóstico na
qualidade de vida
O que é qualidade de vida?
É um conceito multidimensional, que envolve todos os componentes essenciais da
condição humana, cujo é mensurado a partir de uma avaliação subjetiva. Tendo fatores
psicossociais que a influenciam:
- Aspectos individuais (personalidade) : Otimismo disposicional, expectativas
positivas sobre o futuro, autoconhecimento, autoestima.
- Aspectos relacionados ao afeto: A experiência emocional constituída por dois
fatores. Afeto positivo e negativo, sendo os positivos, alegria, interesse,confiança e
agilidade. E os negativos: Medo tristeza, raiva e culpa
- Suporte social: Um processo interpessoal que é centrado no intercâmbio recíproco
em contexto específico, consiste em apoio emocional e instrumental. Traz
benefícios para indivíduos em crise, com efeito mediador entre os sintomas
angustiantes.
- Espiritualidade: Uma dimensão única em torno do qual os indivíduos organizam as
suas vidas, objetivos, valores e intenções. A espiritualidade pode oferecer
esperança, aumenta o apoio e facilita o ajuste emocional
- Status do tratamento
OBS:
No que se trata o ajustamento diante das doenças crônicas implica em:
- Refletir sobre a percepção do indivíduo sobre os diferentes domínios da sua vida;
- Sua história de vida/ personalidade
- Seus afetos frente a doença
- Suporte social e espiritual
- Sua relação com a doença e tratamento
- Sua avaliação cognitiva e emocional frente o contexto (bem estar subjetivo do
sujeito)
Por estes motivos, o modelo biopsicossocial se torna referência para o cuidado de
indivíduos
Enfrentamento e adesão ao tratamento
Adesão
- Se caracteriza como um processo colaborativo de corresponsabilidade.
- É um processo de longo prazo, requerendo que haja mudança de hábitos no estilo de
vida do indivíduo (prática de atividades,
- É necessário que haja uma harmonia entre o paciente, família e equipe
- Caráter subjetivo e complexo: comportamentos que vão desde ingerir medicamentos,
obter imunização, comparecer em consultas até adquirir hábitos de vida saudáveis
- Adesão ao tratamento x adesão à medicação
- “Adesão como o grau em que o comportamento de uma pessoa representando pela
ingestão de medicação, seguimento da dieta, as mudanças no estilo de vida
corresponde e concorda com as recomendações de um médico ou outro profissional
da saúde”
- “Adesão ao tratamento como um meio para se alcançar um fim, uma abordagem para
a manutenção ou melhora da saúde, visando os sinais (Sinais = manifestação da
doença que é perceptível em outro indivíduo) e sintomas (sintoma = a manifestações
que só o indivíduo é capaz de sentir) de uma doença”
Outras terminologias utilizadas como sinônimos
- Compliance: Estudo do relacionamento médico-paciente e todos os aspectos que
influenciam a confiança no tratamento e o correto cumprimento da prescrição
médica
Dimensões da adesão
- Socioeconômico: pobreza, baixo nível educacional, desemprego, falta de redes
eficazes de apoio social, condições de vida instáveis.
- Equipe e ao sistema de saúde: Serviços de saúde mal desenvolvidos, sistemas
precários de distribuição de medicamentos, falta de conhecimento e treinamento
sobre o gerenciamento de doenças crônicas, sobrecarga profissional
- Relacionamento à doença: Gravidade dos sintomas, Nível de incapacidade que
proporciona, taxa de progressão disponibilidade de tratamentos eficazes
- Tratamento: Complexidade, duração, falhas prévias, mudanças frequentes, efeitos
colaterais e disponibilidade de apoio médico para lidar com eles.
- Relacionadas ao paciente
Fatores protetivos e de risco para adesão
- O sujeito e seu mundo interno: O estigma da doença,
dor/sofrimento/morte/invalidez, exigências impostas pela doença.
- Os impactos na qualidade de vida
- Sujeito, família e equipe de saúde: Boa relação médico-paciente ou equipe
paciente. Pode ser afetada pela substituição dos profissionais responsáveis. A
equipe e a família como rede de apoio no tratamento do indivíduo
- Sistema de saúde e seu condicionantes: Acesso e o percurso de tratamento dos
sujeitos, dificuldade na realização de exames, desemprego e o afastamento laboral
- Recursos protetivos: conhecimento e entendimento da doença/tratamento,
compreensão sobre as possibilidades, significados atribuídos, família enquanto
fonte de expectativas de luta pela vida. Fé e espiritualidade, relações sociais e
comunitárias grande valia para a adesão
Estratégias macro para maior aderência
- Estar disponível como profissional
- Fornecer materiais educacionais disponível
- Ser atencioso
- Respeitar individualidades
- Informar adequadamente
- Atentar-se à rotina
- Conhecer de modo integral
Educação para o autocuidado
A convivência com a DC diariamente por toda a vida de necessidade de estarem bem
informadas e capacitadas
Precisam compreender sua enfermidade, reconhecer os sinais de alerta das possíveis
complicações e saber como e onde recorrer para responder a isso
Aspectos históricos
- Cuidado da saúde fazia parte do cuidado que as pessoas tinham do cuidar de si,
da sua família e da sua comunidade.
- Responsabilidade das mulheres.
- Século XIX, e o avanço de tecnologias > cuidado centrado no médico e nas
instituições de saúde.
- Profissionalização do cuidado> maior uso de tecnologia dura> privação
progressiva dos direitos de informação, a decisão unilateral e a quase total
ausência de participação nas decisões.
- Mudanças em 1978 > na declaração de Alma-ata
- Necessidade de participação dos indivíduos, famílias e comunidades nas
decisões que dizem respeito ao seu cuidado. Direito à informação, ao
conhecimento, aos recursos necessários para o autocuidado visto como
direito básico.
Nesse contexto nasce o conceito de autocuidado onde se incluem as “observações sobre
o que as pessoas fazem em benefício da sua saúde, o que a família ou os amigos
oferecem para cuidar de um doente e o que os grupos sociais e/ou comunidades
desenvolvem em benefício da saúde coletiva, assim como a parte que cabe às diferentes
instituições sanitárias e profissionais de saúde
- O autocuidado não deve ser entendido como exclusiva responsabilidade do
indivíduo e de sua família, mesmo que estes tenham que compreender e aprender
a desenvolver atividades
- O autocuidado é também responsabilidade do profissional e das instituições de
saúde > envolve dialogar sobre as necessidades de cuidado
Pode-se desenvolver o autocuidado apoiado de várias formas:
- Individualmente no contexto da consulta clínica ou da visita domiciliar
- Nos grupos
- Em consultas coletivas.
- A distância, por telefone e ou meios virtuais.
- E inclusive, pode incluir no seu processo pacientes experientes.
Pilares da educação para o autocuidado
- Três pilares a serem desenvolvidos ao longo do tempo com o usuário
- São grupos de prioridades ou mudanças
Primeiro grupo
- Envolve diretamente o manejo clínico.
- Os conhecimentos necessários sobre a doença , o conceito, o diagnóstico, os
sinais e os sintomas de descompensação.
- São identificados como “comportamentais” e demandam aquisição de novas
habilidades.
- Pode incluir familiares, amigos, outras pessoas da rede de apoio
- “Aprender a conhecer e aprender a fazer”.
- Exemplos: uso de medicação, cuidado com os pés das pessoas diabéticas, auto
aferição de pressão arterial
Segundo grupo
- Mudanças necessárias no estilo de vida > os novos papeis e as novas
perspectivas
- Foco: realização e manutenção de mudanças diante de novos comportamentos e
novos papeis que a DC Impõem
- Predominam os conteúdos atitudinais
- “Aprender a ser e aprender a conviver”
- Exemplos: Uma pessoa com diabete que cozinhava para a família e como ela fará
isso daqui para frente. Esposa idosa que cuida do marido doente e que se
descobre também doente e precisa cuidar de si mesma. Pessoa com Hipertensão
que precisa reduzir o sal e as gorduras da sua dieta
Terceiro grupo
- Refere-se ao aspectos emocionais do paciente
- A mudança de visão de futuro
- Como ele lida e enfrenta a condição crônica e suas adversidades
- As reações emocionais esperadas e/ou patológicas frente contexto
- “Aprender a ser e aprender a conviver”
Não há como focar em apenas um pilar a ser desenvolvido, é necessário avaliar no
percurso quais são as prioridades para o paciente naquele momento. Logo, as
prioridades podem mudar.
Alguns são solucionados e outros permanecem ao longo de toda a condição crônica
Ex: Inicialmente, pode-se escolher um problema que faz parte do grupo de “Habilidade
clínicas” (Aprender a medir glicemia) > ao longo do tempo muda, e outro problema passa
a ser a prioridade relacionado ao grupo de aspectos emocionais (problemas sexuais entre
homens diabéticos)
A educação para o autocuidado prioriza a escolha de necessidades, problemas e
prioridades definidos pela pessoa e consenso com o profissional de saúde.
Diagrama passo a passo metodológico do autocuidado.
Condição crônica > Fazer lista de problemas > Escolher 1 ou 2 prioridades > escolher um
aspecto da prioridade a ser modificada (Aspecto clínico, mudanças de estilo de vida e
aspectos psicossociais) > Elaborar plano conjunto de cuidado.
A percepção da pessoa com DC: O autocuidado e como trabalhar com
problemas e necessidades
O primeiro passo a ser dado em uma ação de educação em saúde para o autocuidado é:
Uma avaliação detalhada das necessidades e prioridades de cada pessoa e sua condição
crônica.
A proposta é uma construção conjunta do plano de cuidado detalhando problemas,
prioridades, objetivos e papeis
Diabetes e doenças cardiovasculares
Diabetes
- Definição: Incapacidade do corpo de produzir ou utilizar de forma adequada a
insulina, o hormônio que ajuda a converter os açúcares e os amidos dos alimentos
em energia
- Causa: Ainda são um mistério. Fatores relacionados = hereditariedade e estilo de
vida
- Fator de risco para diversas doenças como cegueira, amputação, cardiopatia,
doença renal, câncer etc…
- se divide em 2 tipos:
- Tipo 1: O corpo é incapaz de produzir insulina (Costuma iniciar na infância),
indivíduo não é capaz de regular os níveis de açúcar no sangue. afeta homem
e mulheres igualmente
- Sintomas frequentes: Fome frequente, sede constante, vontade de urinar
diversas vezes ao dia, perda de peso, fraqueza, fadiga, mudança de
humor.
- Tipo 2: O corpo se torna resistente à insulina. Afeta mais mulheres do que
homens, vulnerabilidade socioeconômica (alimentação)
- Fome e sede frequente, formigamento nos pés e nas mãos
- Fatores de influência no surgimento:
- Infecções que prejudicam
- Estresse > fator precipitante
- Redução em atividades físicas
- Dieta ricas em gordura e produtos processados
- Fatores psicossociais da diabete
- Caráter invasivo também afeta o bem-estar
- Diretamente: Prejudica atividades e interesses valorizados
- Indiretamente: Implica na percepção de redução do controle pessoal,
autoeficácia, e autoestima
Hipertensão
- Definição: Elevação prolongada da pressão arterial (excedendo 140/90 mmHg) /
Normal abaixo de 120/80 mmHg
- Causa: Pode ser influenciada por condições de vida, desigualdades sociais e
hereditariedade
- Fator de risco para diversas doenças: Cardiopatia / obesidade
- Aspectos psicossociais da hipertensão:
- Muito correlacionada com a ansiedade e a raiva: Homens entre 45 a 59 anos
que apresentaram valores altos do traço de ansiedade tinham duas vezes mais
probabilidade de desenvolver HAS.
- Relacionada a condições de vulnerabilidade social: Crianças e adolescentes
expostos a situações estressoras como moradia, alimentação,
disfuncionalidade familiar etc. Indivíduos que sofrem de situações de racismo.
Apresentam maior chance de desenvolver HAS na sua vida
- Relacionada a aspectos do trabalho: O estresse ocupacional favorece o
desenvolvimento e manutenção da HAS
Obesidade
- Definição: Acúmulo excessivo de gordura no corpo. Utilizando do IMC como
principal indicador
- Causa: Genéticas e ambientais (Estilo de vida)
- Fatores de risco para diversas outras doenças: Diabetes, HAS, Doenças
cardiovasculares e câncer
- Obs: É considerada uma doença crônica pois é progressiva, recidivante e exige
acompanhamento por toda a vida
- Aspectos psicossociais da obesidade:
- Ambiente familiar percebido como pouco aberto à expressão de sentimentos e
emoções pode influenciar na relação com a alimentação do indivíduo.
- Modo como o indivíduo se vê no mundo > autoconceito, autoestima >
manutenção da obesidade. Baixo valor pessoal desencadeia sentimentos e
comportamentos inadequados para lidar com essas problemáticas.
- A pressão social para a perda de peso e aderência aos padrões de beleza,
interferência na conduta médica dos profissionais de saúde
- Alimento sendo usado como forma de redução temporária de angústia
- Associado a transtornos mentais.
- Contribuições da psicologia
- Compreender os fatores que contribuem ou dificultam a adaptação do sujeito à
essa condição.
HIV E AIDS
Aspectos clínicos
- A síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS) é uma doença fatal causada pelo
vírus da imunodeficiência humana (HIV)
- Impacta o sistema imune deixando o organismo vulnerável a infecções
- O vírus pode entrar no corpo por qualquer arranhão na pele ou nas mucosas
Sintomas e estágios
- Estágio 1: 1 a 8 semanas. dor na garganta, febre, diarreia, dor óssea, infecções
ginecológicas, problemas neurológicos
- Estágio 2: Pode durar meses ou anos (não tem sintomas óbvios)
- Estágios 3: Em cinco anos, 30% das pessoas infectadas passam para esse
estágio. (funcionamento imunológico reduzido, infecções oportunistas mais
frequente)
- Estágio 4: Quase toda a imunidade natural é perdida. Sem tratamento, a morte
costuma ocorrer em 1 ou 2 anos.
Meios de transmissão e tratamento
- O principal meio de transmissão: Comportamentos sexuais e atividades
relacionadas ao uso de substâncias
- Rota menos comum: Transfusão de sangue infectado. Crianças costumam ser
infectadas durante o trabalho de parto, nascimento ou aleitamento.
- Tratamento: medicamentos anti-hrv (reduz a velocidade de reprodução do vírus)
Aspectos psicossociais
- Estresse
- Emoções negativas
- Menor autoestima
- Perspectiva pessimista
- Depressão crônica
- Negação da doença
- Isolamento social
- Menor apoio social
Estas variáveis influenciam a velocidade com que a doença progride pelo corpo, devido
às alterações hormonais e imunológicas que reduzem a resistência para defesa.
- Pessoas esperançosas
- Atribuições de significado positivo à experiência
Variáveis que também influenciam a velocidade de avanço da doença. Apresentando
lento declínio das células T e uma maior probabilidade do exercício
Diabetes, Hipertensão e Obesidade
Doenças Cardiovasculares
Doença Renal Crônica
HIV e AIDS