“E OS NOVE, ONDE ESTÃO?
Um deles, vendo que fora curado, voltou glorificando a Deus em alta voz; e prostrou-se com o rosto
em terra aos pés de Jesus, dando-lhe graças; e este era samaritano. Perguntou, pois, Jesus: Não
foram limpos os dez? E os nove, onde estão? Não se achou quem voltasse para dar glória a Deus,
senão este estrangeiro? E disse-lhe: Levanta-te, e vai; a tua fé te salvou (Lucas 17.15-19).
Você já ouviu muitas vezes a descrição da lepra, doença terrível, talvez a pior de
que a carne possa sofrer. A lepra, hoje conhecida como hanseníase, ainda existe, é
curável com tratamento antibiótico e novos casos são registados anualmente,
embora em menor número do que no passado. Cabo Verde regista anualmente
cerca de 10 novos casos diagnosticado de lepra, com maior incidência na ilha de
Santiago e na região Fogo e Brava. Maior incidência na cidade da Praia e cidade
Velha, o dia da luta contra lepra é no último domingo do mês de janeiro.
Devemos ser muito mais gratos do que somos pelo fato de essa horrível doença ser
pouco manifesta no nosso país. Você também já deve ter visto ou ouvido essa
enfermidade ser usada como símbolo daquilo que o pecado é para a alma, ou seja,
de como o pecado contamina e destrói a alma. Pela história que lemos, haviam
surgido diante do Salvador dez leprosos ao mesmo tempo! E quantos deles o
Senhor ainda vê hoje em dia, neste mundo contaminado pelo pecado! São os
pecadores — não apenas dez, nem mesmo 10 milhões, encontrados por todo o
mundo, mas, sim, milhares de milhões, enfermos em sua alma
No entanto, o que se destaca neste texto é a graça triunfante do nosso Senhor
Jesus sendo manifestada àqueles dez leprosos. Curar um desses enfermos era de
todo impossível naquela época. Contudo, nosso Senhor curou dez ao mesmo
tempo, e imediatamente! E Jesus Cristo é uma fonte tão cheia de graça e tão
generosamente dispensa o seu favor que ordena aos dez irem logo se mostrar aos
sacerdotes, por estarem curados, e somente no caminho rumo aos religiosos é que
eles descobrem estarem curados de verdade.
Porquê mostrar aos sacerdotes? No contexto bíblico, a lepra era considerada um
estado de impureza ritual que tornava a pessoa impura e a excluía do convívio
social e da adoração no templo.
Era o sacerdote quem tinha a função de examinar a pessoa e diagnosticar se ela
estava realmente impura (leprosa) e, portanto, deveria ser isolada fora do
acampamento/cidade (Levítico 13).
Da mesma forma, quando o leproso era curado, ele precisava se apresentar ao
sacerdote para que este confirmasse oficialmente a cura (Levítico 14:2-3).
Após a confirmação da cura pelo sacerdote, a pessoa curada passava por um
detalhado ritual de purificação que envolvia sacrifícios e ofertas (Levítico 14).
Esses rituais marcavam simbolicamente sua limpeza e sua volta à comunhão com
Deus e com o povo.
A confirmação do sacerdote era essencial para remover a impureza ritual e permitir
que a pessoa fosse reintegrada à comunidade e pudesse voltar a participar dos
ritos religiosos no templo.
Nenhum de nós poderá imaginar a alegria que eles devem ter sentido ao perceber
que estavam limpos. Deve ter sido para eles uma espécie de novo nascimento
constatar que sua carne fora restaurada ao mesmo estado de quando eram
crianças! Seria normal e maravilhoso, que, ao verem que já estavam limpos e
curados, todos os dez tivessem voltado imediatamente correndo e caído aos pés de
Jesus, agradecendo? A informação triste que consta, é que nove deles, mesmo
havendo constatado terem sido admiravelmente curados, seguiram em direção aos
sacerdotes da maneira mais fria possível.
Somente um deles — um desprezado samaritano — voltou para expressar sua
gratidão. Justamente este, por mais surpreendente que poderia parecer, foi o único
que, tomado de um repentino impulso de gratidão, voltou ao seu Benfeitor, caiu aos
seus pés e começou a glorificar a Deus.
I. A singularidade da gratidão.
Existem mais pessoas que recebem benefícios do que as que agradecem por eles.
Nove pessoas curadas por Deus, e somente uma pessoa glorificando a ele; nove
pessoas curadas, da incurável lepra, e apenas uma pessoa se ajoelhando aos pés
de Jesus em atitude de gratidão!
Muitas vezes não louvamos a Deus de maneira adequada, de maneira
proporcional, de maneira intensa. Recebemos as muitas misericórdias e retornamos
apenas com uma pequena forma de louvor. Ele nos derrama bênçãos novas a cada
manhã e frescas a cada noite, pois grande é a sua fidelidade.
Existe aqui, porém, algo ainda mais espantoso: o número dos que suplicam a Deus
é bem maior do que o número dos que o louvam. Todos aqueles dez homens
leprosos rogaram a cura. Por mais tênues e frágeis que suas vozes pudessem ter-
se tornado por causa da doença, ainda assim levantaram a voz em súplica e juntos
clamaram: Jesus, Mestre, tem compaixão de nós! (Lc 17.13). Todos eles se uniram
dizendo: “Senhor, tem misericórdia de nós! Cristo tem misericórdia nós!”
Quando Jesus diz aos leprosos: “Ide, e mostrai-vos aos sacerdotes”, lá se vão
todos eles, os dez. Nenhum fica para trás. Apenas um, no entanto, retoma para
adorar o Salvador pessoal e louvar o seu nome. Do mesmo modo, você hoje vai à
igreja, ao culto, lê a Bíblia, realiza atos de devoção externos, mas quão pouco louva
interiormente a Deus, quão pouco se lança realmente a seus pés, sentindo aquilo
que pode fazer sua alma cantar de gratidão àquele que lhe tem feito coisas tão
grandes! Práticas piedosas exteriores são bem fáceis e comuns; a questão é o
interior, o tirar de dentro do coração um amor agradecido! De dez, nove obedecem
a um simples ritual, enquanto apenas um louva verdadeiramente ao Senhor.
Para chegarmos ainda mais perto do cerne da questão, existem mais pessoas que
creem do que pessoas que louvam. Aqueles dez homens creram em Jesus, mas
apenas um louvou ao Senhor. A fé de todos relacionava-se à cura de sua doença e,
segundo sua fé, assim lhes aconteceu. Embora relacionada apenas à necessidade
de cura, era uma fé maravilhosa. É notável o fato de haverem acreditado no Senhor
Jesus, apesar dele não lhes ter dito “sejam curados”, tampouco qualquer outra
palavra que causasse esse efeito, mas apenas “Ide, e mostrai-vos aos sacerdotes”.
obedecendo, eles se foram corajosamente, na confiança total de que Jesus iria
abençoá-los. Uma fé, sem dúvida, admirável. Contudo, nove dos que mostraram
tanta fé não voltaram nem para agradecer nem louvar a Cristo pela graça recebida.
II. As características da verdadeira gratidão. O simples ato daquele homem bem
pode demonstrar o carácter do louvor.
Aquele homem era um de dez que sofriam do mesmo mal, mas estava sozinho
quando voltou para louvar a Deus.
Que toda língua e nação Se una em louvor a ti, ó Deus, com gratidão Por teu
imenso amor.
A segunda principal característica da gratidão daquele homem foi sua prontidão.
Ele voltou a Cristo imediatamente, pois não é de supor que o Salvador haja
permanecido ali onde estava por muito tempo. O homem, então, deve ter voltado
logo para expressar sua gratidão a Deus.
A qualidade seguinte do louvor daquele homem era a espiritualidade. Percebemos
isso no fato de que ele certamente deu uma breve parada em seu caminho rumo
aos sacerdotes. Sua obrigação era ir até os sacerdotes. Recebeu uma ordem para
fazer isso. Mas existe uma proporção em todas as coisas, e algumas tarefas são
maiores do que outras. Ele então deve ter pensado: “Fui mandado ir até os
sacerdotes, mas estou curado. A primeira coisa a fazer agora é voltar e dar meu
testemunho de gratidão, glorificar a Deus no meio de todas as pessoas, caindo aos
pés daquele Mestre, que me curou”. Desse modo, aquele leproso curado foi em
primeiro lugar a Jesus. Na vida daquele homem, o espiritual venceu o cerimonial.
Percebeu que sua principal tarefa era adorar em pessoa a pessoa divina que o
havia libertado de sua terrível doença. Devemos ir primeiramente a Jesus. Que, em
espírito, nos curvemos diante dele.
A verdadeira gratidão também se manifesta em intensidade. A intensidade é
perceptível no presente exemplo: o homem voltou e, em voz alta, glorificou a Deus.
Poderia ter louvado de uma maneira contida, não? Talvez; mas quando você acaba
de ser curado de lepra e sua voz, que se tomara tão frágil, lhe é restituída, não
consegue sussurrar de modo algum o seu louvor. Você sabe, irmão, que, quando se
é salvo, é impossível comportar-se friamente! Esse homem glorificou a Deus em
voz alta, e você também se sentiria levado a fazer o mesmo, declarando: Em alta
voz eu cantarei para que terra e céu possam ouvir. Que nós também pudéssemos
todos começar a louvar a Deus com o coração e a voz, com alma e substância,
com poder e força! Aleluia! Que o nosso coração possa sentir esta paixão.
Na verdadeira gratidão, existe, também, humildade. Aquele homem caiu aos pés
de Jesus. Ele não entenderia inteiramente a posição que lhe competia enquanto
não estivesse prostrado ali. “Não sou ninguém, Senhor”, parecia dizer, e, por isso,
caiu com o rosto em terra. O lugar certo de sua prostração era ali, “aos pés de
Jesus”. Prefiro ser ninguém aos pés de Cristo a ser qualquer pessoa em qualquer
outro lugar! Não há lugar tão honroso quanto o de estar aos pés de Jesus. Ah,
quem nos dera estar ali sempre e apenas amá-lo plenamente, deixando que o
nosso eu morresse! Oh, que ventura ter Cristo de pé acima de nós, a nos fazer
sombra por toda a nossa vida, de agora em diante! A verdadeira gratidão, de fato,
se coloca abaixo do Senhor.
Além de tudo isso, havia ainda adoração. O homem se prostrou aos pés de Jesus,
dando-lhe graças, glorificando a Deus. Que possamos sempre adorar nosso
Salvador. Que os outros pensem o que quiserem sobre Jesus; nós colocaremos
sempre nossos dedos na marca dos cravos em suas mãos e diremos: Senhor meu,
e Deus meu! (Jo 20.28). Ele é, para nós, Deus em Cristo. Não deixemos jamais de
adorar aquele que provou sua divindade ao nos libertar da lepra do pecado. Toda
adoração seja dada à Ele!
Há uma coisa mais sobre este homem que gostaria de observar: juntamente com
a sua gratidão, seu silêncio como que censurando os outros. Quando o
Salvador lhe perguntou: E os nove, onde estão? (Lc 17.17), aquele homem não
respondeu. O Mestre disse ainda: Não se achou quem voltasse para dar glória a
Deus, senão este estrangeiro? (Lc 17.18). Mas o adorador estrangeiro não se
levantou para dizer: “Ó Senhor, eles foram até os sacerdotes. Estou surpreso com o
fato de não terem voltado para te louvar!” Irmãos, temos coisas a fazer suficientes
com que estejamos ocupados, ao sentirmos a graça de Deus em nosso coração!
Se o que eu tenho a fazer é proclamar o meu louvor, não há por que nem como me
preocupar em acusar qualquer outro que possa estar sendo ingrato. O Mestre
indaga: E os nove, onde estão? (Lc 17.17), mas o pobre homem que fora curado e
estava aos seus pés não tem palavra alguma a dizer contra aqueles outros nove
mal-agradecidos, pois se encontra muito ocupado com sua adoração pessoal.