Educao Infantil
no Brasil
Contexto Histrico
Falar da creche ou da educao infantil muito
mais do que falar de uma instituio, de suas
qualidades e defeitos, da sua necessidade social ou
da sua importncia educacional. falar da criana.
De um ser humano, pequenino, mas exuberante de
vida. (DIDONET, 2001).
Do ponto de vista histrico, a educao da criana
esteve sob a responsabilidade exclusiva da famlia
durante sculos, porque era no convvio com os
adultos e outras crianas que ela participava das
tradies e aprendia as normas e regras da sua
cultura.
A educao da criana no
movimento universal
Na Europa, com a transio do feudalismo para o capitalismo, com
a substituio das ferramentas pelas mquinas e a substituio da
fora
humana
pela
fora
motriz,
provocando
toda
uma
reorganizao da sociedade. Isto fez com que toda a classe
operria se submetesse ao regime da fbrica e das mquinas.
Assim, possibilitou a entrada em massa da mulher no mercado de
trabalho, alterando a forma da famlia cuidar e educar seus filhos.
Criou-se uma nova oferta de emprego para as mulheres, mas
aumentaram os riscos de maus tratos s crianas, reunidas em
maior nmero, aos cuidados de uma nica, pobre e despreparada
mulher. Tudo isso, aliado a pouca comida e higiene, gerou um
quadro catico de confuso, que terminou no aumento de castigos e
muita pancadaria, a fim de tornar as crianas mais sossegadas e
passivas. Mais violncia e mortalidade infantil. (RIZZO, 2003, p. 31).
As primeiras instituies na Europa e Estados Unidos tinham
como objetivos cuidar e proteger as crianas enquanto s mes
saam para o trabalho. Desta maneira, sua origem e expanso
como instituio de cuidados criana esto associadas
transformao da famlia, de extensa para nuclear. Sua origem,
na sociedade ocidental, de acordo com Didonet (2001), baseiase no trinmio: mulher-trabalho-criana. As creches, escolas
maternais e jardins de infncia tiveram no seu incio o objetivo
assistencialista, cujo enfoque era a guarda, higiene, alimentao
e os cuidados fsicos das crianas.
A educao das crianas: a
particularidade brasileira
As famlias mais abastadas pagavam uma bab, as pobres ou
deixavam os filhos sozinhos ou os colocavam numa instituio que
deles cuidasse. Para os filhos das mulheres trabalhadoras, a creche
tinha que ser de tempo integral; para os filhos de operrias de baixa
renda, tinha que ser gratuita ou cobrar muito pouco; ou para cuidar da
criana enquanto a me estava trabalhando fora de casa, tinha que
zelar pela sade, ensinar hbitos de higiene e alimentar a criana. A
educao permanecia assunto de famlia. Essa origem determinou a
associao creche, criana pobre e o carter assistencial da creche.
(DIDONET, 2001, p. 13).
Uma das instituies brasileiras mais duradouras de atendimento
infncia, que teve seu incio antes da criao das creches, foi a roda
dos expostos ou roda dos excludos. Esse nome provm do dispositivo
onde se colocavam os bebs abandonados e era composto por uma
forma cilndrica, dividida ao meio por uma divisria e fixado na janela
da instituio ou das casas de misericrdia. Assim, a criana era
colocada no tabuleiro pela me ou qualquer outra pessoa da famlia;
essa, ao girar a roda, puxava uma corda para avisar a rodeira que um
beb acabava de ser abandonado, retirando-se do local e preservando
sua identidade.
Ainda no final do sculo XIX, perodo da abolio da escravatura no pas,
quando se acentuou a migrao para as grandes cidades e o incio da
Repblica, houve iniciativas isoladas de proteo infncia, no sentido
de combater os altos ndices de mortalidade infantil. Mesmo com o
trabalho desenvolvido nas casas de Misericrdia, por meio da roda dos
expostos, um nmero significativo de creches foi criado no pelo poder
pblico, mas exclusivamente por organizaes filantrpicas. Se, por um
lado, os programas de baixo custo, voltados para o atendimento s
crianas pobres, surgiam no sentido de atender s mes trabalhadoras
que no tinham onde deixar seus filhos, a criao dos jardins de infncia
foi defendida, por alguns setores da sociedade, por acreditarem que os
mesmos trariam vantagens para o desenvolvimento infantil.
As tendncias que acompanharam a implantao de creches e jardins
de infncia, no final do sculo XIX e durante as primeiras dcadas do
sculo XX no Brasil, foram: a jurdico-policial, que defendia a infncia
moralmente abandonada, a mdico-higienista e a religiosa, ambas
tinham a inteno de combater o alto ndice de mortalidade infantil
tanto no interior da famlia como nas instituies de atendimento
infncia. Cada instituio [...] apresentava as suas justificativas para
a implantao de creches, asilos e jardins de infncia onde seus
agentes promoveram a constituio de associaes assistenciais
privadas (KUHLMANN Jr., 1998, p. 88).
Foi Instituto de Proteo Infncia do Rio de Janeiro pelo mdico
Arthur Moncorvo Filho, que tinha como objetivos no s atender
s mes grvidas pobres, mas dar assistncia aos recmnascidos, distribuio de leite, consulta de lactantes, vacinao
e higiene dos bebs. Outra instituio importante criada nesse
ano foi o Instituto de Proteo e Assistncia Infncia, este
precedeu, em 1919, a criao do Departamento da Criana, que
tinha como objetivo no s fiscalizar as instituies de
atendimento criana, mas combater o trabalho das mes
voluntrias que cuidavam, de maneira precria, dos filhos das
trabalhadoras (KUHLMANN Jr., 1998).
Os donos das fbricas, por seu lado, procurando diminuir a fora dos
movimentos operrios, foram concedendo certos benefcios sociais e
propondo novas formas de disciplinar seus trabalhadores. Eles buscavam
o controle do comportamento dos operrios, dentro e fora da fbrica.
Para tanto, vo sendo criadas vilas operrias, clubes esportivos e
tambm creches e escolas maternais para os filhos dos operrios. O fato
dos filhos das operrias estarem sendo atendidos em creches, escolas
maternais e jardins de infncia, montadas pelas fbricas, passou a ser
reconhecido
por
alguns
empresrios
como
vantajoso,
pois
mais
satisfeitas, as mes operrias produziam melhor. (OLIVEIRA, 1992, p. 18).
A ideia era que essas crianas [...] carentes, deficientes e
inferiores na medida em que no correspondem ao padro
estabelecido; privadas culturalmente, faltariam determinados
atributos ou contedos que deveriam ser nelas incutidos. Assim,
a fim de superar as deficincias de sade e nutrio, como as
deficincias escolares, so oferecidas diferentes propostas no
sentido de compensar tais carncias. Nessa perspectiva, a prescola funcionaria como mola propulsora da mudana social,
uma vez que possibilitaria a democratizao das oportunidades
educacionais.
Na realidade ao se considerar a educao como promotora da
melhoria social, seria uma maneira de esconder os reais
problemas da sociedade e de evitar a discusso dos aspectos
polticos e econmicos mais complexos. A proposta que
ressurge, de elaborar programas de educao pr-escolar a fim
de transformar a sociedade no futuro, uma forma de culpar o
passado pela situao de hoje e de focalizar no futuro quaisquer
possibilidades de mudana. Fica-se, assim, isento de realizar no
presente aes ou transformaes significativas que visem a
atender s necessidades sociais atuais (KRAMER, 1995, p. 30).
A educao infantil e a
legislao brasileira
Verifica-se que pouco se fez em termos de legislao que garantisse a oferta
desse nvel de ensino at a dcada de setenta. J na dcada de oitenta,
diferentes setores da sociedade, como organizaes no-governamentais,
pesquisadores na rea da infncia, comunidade acadmica, populao civil e
outros, uniram foras com o objetivo de sensibilizar a sociedade sobre o direito
da criana a uma educao de qualidade desde o nascimento. Do ponto de
vista histrico, foi preciso quase um sculo para que a criana tivesse
garantido seu direito educao na legislao, foi somente com a Carta
Constitucional de 1988 que esse direito foi efetivamente reconhecido.
Art. 227. dever da famlia, da sociedade e do Estado assegurar
criana, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o
direito vida, sade, alimentao, educao, ao lazer,
profissionalizao, cultura, dignidade, ao respeito, liberdade e
convivncia familiar e comunitria, alm de coloc-los a salvo de
toda forma de negligncia, discriminao, explorao, violncia,
crueldade e opresso. (Redao dada Pela Emenda Constitucional n
65, de 2010)
Este artigo possui quatro pargrafos e diversos incisos que sero
posteriormente estudados.
Dois anos aps a aprovao da Constituio Federal de 1988, foi
aprovado o Estatuto da Criana e do Adolescente5 Lei 8.069/90,
que, ao regulamentar o art. 227 da Constituio Federal, inseriu
as crianas no mundo dos direitos humanos. De acordo com seu
artigo 3, a criana e o adolescente devem ter assegurados os
direitos fundamentais inerentes pessoa humana, para que seja
possvel, desse modo, ter acesso s oportunidades de [...]
desenvolvimento fsico, mental, moral, espiritual e social, em
condies de liberdade e dignidade (BRASIL, 1994a).
A Constituio Federal de 1988, o Estatuto da Criana e do
Adolescente de 1990, garantiram direitos amplos, mas s a Lei
de Diretrizes e Bases da Educao Nacional de 1996 inseriu a
educao infantil como primeira etapa da Educao Bsica.
Essa Lei define que a finalidade da educao infantil promover
o desenvolvimento integral da criana at seis anos de idade,
complementando a ao da famlia e da comunidade.
Houve um grande avano no que diz respeito aos direitos da
criana pequena, uma vez que a educao infantil, alm de ser
considerada a primeira etapa da Educao Bsica, embora no
obrigatria, um direito da criana e tem o objetivo de
proporcionar condies adequadas para o desenvolvimento do
bem-estar
infantil,
como
desenvolvimento
fsico,
motor,
emocional, social, intelectual e a ampliao de suas experincias.
Diante dessa nova perspectiva, trs importantes objetivos, devem,
necessariamente, coroar essa nova modalidade educacional:
Objetivo Social: associado questo da mulher enquanto
participante da vida social, econmica, cultural e poltica;
Objetivo Educativo: organizado para promover a construo de
novos conhecimentos e habilidades da criana;
Objetivo Poltico: associado formao da cidadania infantil,
em que, por meio deste, a criana tem o direito de falar e de
ouvir, de colaborar e de respeitar e ser respeitada pelos outros
(DIDONET, 2001).
Referncias:
BRASIL. Constituio da Repblica Federativa do Brasil. Braslia, DF: Senado Federal, 1988, 305
______. Estatuto da Criana e do Adolescente. Lei n 8.069, de 13 de junho de 1990.
_____. Plano Nacional de Educao. Lei n 10.172/2001, de 09 de janeiro de 2001.
DIDONET, Vital. Creche: a que veio, para onde vai. In: Educao Infantil: a creche, um bom
comeo. Em Aberto/Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais. v 18, n. 73. Braslia,
2001.
KRAMER, Sonia. A poltica do pr-escolar no Brasil: a arte do disfarce. 5. ed. So Paulo:
Cortez,1995.
KUHLMANN JR., Moiss. Infncia e educao infantil: uma abordagem histrica. Porto Alegre:
Mediao, 1998.
OLIVEIRA, Zilma Moraes R. Creches: Crianas, faz de conta & Cia. Petrpolis, RJ: Vozes, 1992.
RIZZO, Gilda. Creche: organizao, currculo, montagem e funcionamento. 3. ed. Rio de Janeiro:
Bertrand Brasil, 2003.