2.4.
O poder régio –
fator estruturante da
coesão interna do reino
Módulo 2
Da monarquia feudal à centralização do poder
Na época medieval, Portugal era um reino
composto por senhorios e concelhos, cabendo
aos reis, o papel de criar coesão interna.
Nos primeiros tempos da independência do
reino, Portugal era uma monarquia feudal em
que o rei exercia o poder na qualidade de
suserano dos suseranos (senhor supremo), a
quem os nobres prestavam vassalagem e
prometiam fidelidade e serviço e, em troca, o rei, Pág. 97
lhes concedia, benefícios.
O rei considerava-se o proprietário do reino e
este era transmitido para o filho primogénito
como um bem pessoal, não havendo diferença
entre o que era privado (do rei) e os poderes
públicos (do reino).
Da monarquia feudal à centralização do poder
O prestígio da monarquia portuguesa foi aumentado com a reconquista,
cuja direção cabia ao rei. Para reforçar a sua autoridade, impedir os
abusos senhoriais e assegurar o pagamento de impostos à Coroa, o rei
baseou o seu poder na teoria do direito divino, considerando-se
representante de Deus na terra (na documentação intitulavam-se “rei
por graça de Deus”).
A monarquia portuguesa conseguiu manter uma relativa centralização
do poder, reservando para o rei a:
• Chefia militar: o rei assumia-se como responsável máximo da
manutenção da paz e o chefe militar nas guerras contras os
inimigos externos (castelhanos, mouros…), podendo definir as
estratégias militares e convocar homens do reino para a guerra;
• Justiça suprema: desde sempre os monarcas portugueses
tiveram o cuidado de chamar a si o exercício da justiça maior
(condenação à morte e talhamento de membros);
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Da monarquia feudal à centralização do poder
• Legislação geral aplicada a todo o reino: os reis portugueses reforçaram o poder legislativo e D. Afonso II
definiu de um conjunto de leis, as primeiras Leis Gerais (aplicadas em todo o reino e a todos os súbditos)
que evidenciaram um poder régio fortalecido, capaz de se sobrepor aos particularismos e poderes locais e
evidenciando o reino como um todo nacional. O corpo de leis uniforme foi um importante meio de
impedir os abusos senhoriais;
• Cunhagem da moeda: cabia ao rei em exclusivo a cunhagem da moeda e sua manipulação (valorização
ou desvalorização);
• Fiscalidade: os reis criaram um corpo de funcionários (os almoxarifes) encarregados de cobrar os foros e
rendas nas terras da Coroa, assim como os encargos exigidos aos concelhos, conforme era estabelecido
nas cartas de foral.
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A restruturação da administração central
O rei, apesar de centralizar o seu poder, tinha um órgão que o apoiava na tomadas das decisões mais
importantes – a Cúria Régia – composta por membros da família real, altos dignatários eclesiásticos, membros
da nobreza e das ordens de cavalaria e altos funcionários da Corte:
• Mordomo-mor – administração civil do reino. Inicialmente, este cargo era vitalício. Era superintendido
pelo dapífero que se dedicava aos assunto privados do rei;
• Alferes-mor – chefe do exército real, chefiava o exército na ausência do Rei;
• Chanceler - dirigia a Chancelaria, competindo-lhe a redação dos diplomas régios e a guarda do selo
real. Tem na sua dependência um vasto conjunto de funcionários: notários, escrivães…
A Cúria Régia era um órgão consultivo que apoiava o rei na governação.
Aí se debatiam todos os problemas relativos à administração do reino:
assuntos da governação quotidiana; questões económicas, como o
lançamento de impostos, questões judiciais como a aplicação das penas
maiores ou julgamento de nobres, confirmação das doações régias, e
questões militares (paz e da guerra).
Este órgão político sofreu no reinado de D. Afonso III uma evolução que é
sintomática do reforço do poder real: Administração central – síntese esquemática
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A restruturação da administração central
• As reuniões ordinárias da Cúria evoluíram para um Conselho
Régio e as extraordinárias para uma outra assembleia designada
de Cortes. Criaram-se também Tribunais Superiores aos quais
ficaram reservadas as funções judiciais, antes pertencentes à
Cúria.
• O Conselho Régio, era um órgão consultivo que auxiliava o
rei em questões justiça e de governo em geral, cujos
membros eram legistas que tinham preparação vastíssima
em matéria jurídica (Ex. Pedro Hispano foi conselheiro de
Afonso III e viria a ser Papa em 1276);
• As Cortes eram mais representativas que as anteriores
Cúrias régias extraordinárias pois tinham representantes do Administração central – síntese esquemática
clero, da nobreza e do povo (homens-bons dos concelhos).
Eram o local onde o rei ouvia as queixas e os pedidos dos
diferentes grupos sociais.
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A restruturação da administração local
O poder régio também foi reforçado ao nível da
administração local. D. Afonso III dividiu as regiões sob
dependência direta da Coroa. Surgiram:
• As comarcas subdividias em julgados e estes
em almoxarifados, onde os funcionários régios
cobravam as rendas fundiárias e zelavam pelos
direitos militares, judiciais e ficais devidos à co
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Em síntese…
O combate à expansão senhorial e a promoção das elites urbanas
• Apesar da posição privilegiada que os monarcas
portugueses ocupavam no contexto da sociedade e política
feudais (inegável superioridade da função régia), o poder e
privilégios dos grandes senhores eram também
significativos. Assim, o fortalecimento da autoridade régia
passou pelo combate aos abusos do poder senhorial.
Muitos nobres e clérigos vinham, há muito, a ampliar os
seus bens à custa dos reguengos.
• Os monarcas portugueses, desde D. Afonso II, vão tomar
medidas no sentido de impedir o crescimento desenfreado
da propriedade nobre e eclesiástica. Nesse sentido
publicaram-se:
• as Leis de Desamortização;
• as Confirmações;
• as Inquirições.
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O combate à expansão senhorial e a promoção das elites urbanas
• Leis de Desamortização: procuravam impedir o crescimento da propriedade
eclesiástica, através da proibição de os mosteiros e igrejas adquirirem bens de raiz e de
os herdarem dos seus professos. Evitava-se, deste modo, a fuga ao fisco de bens que,
uma vez na posse do clero, eram considerados «mortos» para a fazenda régia porque
passavam a gozar de imunidade.
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O combate à expansão senhorial e a promoção das elites urbanas
• Confirmações: representavam o reconhecimento, pelo rei dos títulos de posse de terras e
direitos doados pelo rei à nobreza e ao clero. Estes tinham de fazer prova dos seus direitos
sobre os senhorios, sob pena dos seus bens regressarem à coroa.
• Inquirições: era um processo de verificação do estado dos bens do rei e da coroa. As
averiguações feitas permitiram descobrir que os fidalgos, as ordens militares, os bispos e
os abades haviam cometido inúmeras usurpações. As propriedades régias usurpadas
deveriam voltar à posse da Coroa.
Resistências:
Não foi fácil aos monarcas implementarem a legislação antissenhorial, encontrando
poderosas resistências, tendo a luta adquirido contornos violentos:
• Os senhores prestavam falsas declarações, dizendo aos funcionários régios, que as terras
alvo de averiguações sempre tinham sido imunes. Caso eles não acreditassem e insistissem
na cobrança de direitos reais, expulsavam-nos e até os assassinavam.
O combate à expansão senhorial e a promoção das elites urbanas
• Os prelados e bispos, frequentemente, queixavam-se ao Papa dos reis
de Portugal atentarem contra a liberdade da Igreja, violando os seus
foros e imunidades. Sobre alguns monarcas penderam as
excomunhões (expulsava o visado, neste caso o rei, da comunidade dos
fiéis, não podendo entrar numa igreja, assistir aos ofícios divinos,
receber os sacramentos) e, sobre o reino, os interditos (proibia a
celebração da missa e a administração dos sacramentos no reino, na
totalidade ou em algumas dioceses).
• D. Sancho II perdeu mesmo o trono. O monarca foi deposto
pelo Papa Inocêncio IV, que, na Bula de Deposição, não perdeu a
oportunidade de lembrar que o papado era a autoridade suprema
de Portugal, em virtude da encomendação de Afonso Henriques.
Ao mesmo tempo…
Os monarcas procuraram-se apoiar nas elites urbanas, as quais foram
promovidas e passaram a integrar as cortes.
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A afirmação de Portugal no quadro político ibérico
O desafogo económico vivido em Portugal, entre os séculos XIII e XIV contribuiu para a
afirmação de Portugal e reforço da imagem do país junto dos reinos peninsulares:
• Ao longo da segunda metade do séc. XIII os monarcas aumentaram a sua riqueza. Com o avanço para
sul, o território possuía menos honras e coutos, integrando vários concelhos que asseguravam à Coroa
rendimentos. O aumento da produção refletiu-se na criação de mercados e feiras e na consolidação da
economia.
• Durante o reinado de D. Dinis desenvolveram-se as atividades culturais. Os documentos oficiais
deixaram de ser redigidos em latim, e passaram a ser publicados em português. A procura pelo saber e
pelo gosto cultural levou à criação de uma universidade – os Estudos Gerais (1290).
• O reino de Portugal torna-se reconhecido pelos seus pares europeus. Realizaram-se alianças políticas a
nível peninsular, como o casamento de D. Dinis com Isabel de Aragão e a ajuda militar de Afonso IV ao rei
Afonso XI de Castela (seu genro) contra os mouros de Granada cuja valentia do monarca português lhe
valeu o título de “O Bravo”. D. João I casou-se com a inglesa D. Filipa de Lencastre permitindo também
uma importante aliança política com a Inglaterra.