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Diagnóstico Psicológico Multiaxial

O documento discute os quatro eixos do diagnóstico psicológico e as quatro posições que as pessoas podem assumir em relação à doença: negação, revolta, depressão e enfrentamento.
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Diagnóstico Psicológico Multiaxial

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O DIAGNÓSTICO

Dra. Sibeli Carla Garbin Zanin | Professora


 A principal razão pela qual os diagnósticos são feitos é eles facilitarem o
tratamento, de modo que diante de um diagnóstico bem feito a melhor estratégia
terapêutica se evidencie, naturalmente, na mente do psicólogo bem treinado.

 Em medicina, diagnóstico é o conhecimento da doença por meio de seus sintomas,


enquanto na psicologia hospitalar o diagnóstico é o conhecimento da situação
existencial e subjetiva da pessoa adoentada em sua relação com a doença.

 O Manual propõe um diagnóstico a partir de quatro eixos: reacional – o modo


como a pessoa reage à doença; médico – a sua condição médica; situacional –
análise das diversas áreas da vida do paciente; e transferencial – analise de suas
relações.
 Esses eixos encontram-se esquematizados no quadro abaixo.

DIAGNÓSTICO:
Eixo I – Reacional
Eixo II – Médico
Eixo III – Situacional
Eixo IV – Transferencial
QUADRO 2: DIAGNÓSTICO MULTIAXIAL
Eixo I – Diagnóstico Reacional
 Adoecer é como entrar em órbita. A doença é um evento que se instala de forma tão central na
vida da pessoa, que tudo o mais perde importância ou então passa a girar em torno dela, numa
espécie de órbita que apresenta quatro posições principais: negação, revolta, depressão e
enfrentamento (figura 3, abaixo).
NEGAÇÃO

DOENÇA

ENFRENTAMENTO REVOLTA

FIGURA 3: ÓRBITA EM TORNO DA DOENÇA

DEPRESSÃO

Essas posições não são específicas para a doença e constituem-se, isto sim, nas maneiras que os
humanos dispõe para enfrentar crises, receber notícias ruins, lidar com mudanças, encarar a
morte e, também, reagir a doenças.
Posição Negação

 Geralmente a primeira reação de uma pessoa diante da doença é o choque,


seguido de descrença, manifestada em frases do tipo “não é possível”, “isso não
está acontecendo comigo”, “deve ser engano”.

 O pensamento na negação é o do tipo onipotente: “sei o que estou fazendo”,


“sempre deu certo, e por isso não é agora que vai dar errado”, “no fim tudo dá
certo”.

 No caso de alguma doença com muita visibilidade, como doenças de pele ou


doenças deformantes, a única possibilidade de negação é o isolamento social, e
nesse caso a pessoa passa a ter dois problemas: a doença e uma certa solidão.
 Alguns pacientes recorrem ao sono como mecanismo de negação. Em pacientes
graves, sob efeito de muitos remédios, pode ser difícil distinguir esse sono de fuga
do sono provocado pela sedação medicamentosa.

 Negação é diferente de desconhecimento. Se um paciente não se dá conta da


gravidade de seu estado, devido, por exemplo, a um linguajar excessivamente
técnico usado pela equipe médica, isso não quer dizer que ele esteja na posição
negação.

 A negação não tem que ver com inteligência, cultura, nível intelectual ou social,
pois pessoas de todos os níveis sociais e econômicos podem vir a negar sua doença.
Posição Revolta
 Aqui a pessoa “cai na real”, enxerga a doença e enche-se de uma revolta que pode ser dirigida para
qualquer lado: contra a doença, contra o médico que a comunica, contra a equipe de enfermagem,
contra si mesmo, contra a família, contra o mundo ou contra quem aparecer por perto.

 A nossa cultura valoriza muito o trabalho, e as doenças costumam limitar a produtividade da


pessoa, temporária ou permanentemente. Além disso, o trabalho também exerce sua função de fuga
dos problemas pessoais, de modo que quando a doença limita o trabalho, pode estar jogando a
pessoa de cara com problemas que ela gostaria de evitar. Isso pode levar tanto à negação quanto à
revolta.

 O paciente difícil é o protótipo da pessoa na posição de revolta, embora alguns pacientes na


posição depressão também possam receber esse rótulo. Esses pacientes acabam sendo evitados pela
equipe de uma forma consciente: “ah, desse daí eu não cuido”; ou inconsciente, por meio de
pequenos esquecimentos dos horários de medicação, cuidados muito apressados, silêncio temeroso,
etc.
 Se na negação as soluções tentadas são mágicas, na revolta elas são do tipo impulsivo, muito mais
uma ação para descarregar tensão acumulada do que tentativas de solucionar qualquer problema.

 A raiva é positiva, é um sinal de luta pela vida, uma tentativa de afirmação subjetiva. O problema
da raiva, na revolta, é o seu exagero e sua constância, que a denunciam como tentativa de evitar
alguma outra coisa.

 A irritabilidade crônica de uma pessoa em revolta, além dos problemas de relacionamento que
acarreta, é também um sinal de que o colapso pode estar próximo.

 A revolta pode assumir a forma de hostilidade contra a instituição.

 Com muita frequência existe uma base de realidade nessas críticas, como nos casos de
reivindicações contra falta de vagas nos hospitais, demora na marcação de consultas, falta de
remédios e outros insumos hospitalares (Angerami, 1996).
Posição Depressão
 Na posição depressão a pessoa se entrega passivamente a sua doença. É como uma desistência,
nada espera do futuro e pode mesmo se negar a qualquer esforço quanto ao tratamento.

 O silêncio é a frase mais comum na posição depressão. Entretanto muitos outros ditos se fazem
ouvir “para quê?” “já sou muito velho”, “não adianta”, “não vai dar certo”, “você é quem sabe”.

 Tanto o luto como a melancolia são maneiras de lidar com a perda do objeto, objeto aqui
tomado no sentido psicanalítico, significando objeto de pulsão, objeto da libido, objeto de amor.
Embora na maioria das vezes o objeto seja uma pessoa, também pode ser uma coisa, um ideal
(liberdade, crença, etc.), ou ainda um aspecto da pessoa, o qual se transformou, como, por
exemplo, a juventude perdida, o estado civil, ou, o que nos interessa mais aqui, o estado de
saúde.
 Dessas considerações psicanalíticas extraímos as seguintes consequências para o
nosso trabalho em psicologia hospitalar: Diferentemente das outras três posições,
quando diagnosticamos que um paciente se entra na posição depressão, o trabalho
ainda não está completo, é preciso ir mais adiante e especificar o tipo, se depressão
reacional (luto) ou depressão melancólica.

 É preciso aprender a suportar por algum tempo a tristeza e a angústia no outro. A


experiencia mostra que tal só é possível quando o profissional já aprendeu a
enfrentar e a sustentar a angústia e tristeza referentes à perda de seus objetos
pulsionais.

 Outra distinção necessária ocorre entre tristeza e depressão. É certo que na doença
mental depressão e tristeza é um elemento presente e fundamental, mas nem toda
tristeza é uma doença.
 Ao contrário da posição negação, com seu pensamento onipotente, a posição
depressão evidencia um pensamento com conteúdo de impotência: é o pólo oposto.

 Se as soluções tentadas pelo paciente são mágicas na negação e impulsivas na revolta,


aqui elas são do tipo narcísica.

 Note-se como na depressão a palavra “eu” é insistente: “eu não consigo”, “eu não
tenho jeito”, “a vida continua igual”, eu que não encontro mais prazer em nada”.
Quando a pessoa puder, vai voltar sua atenção novamente para as coisas do mundo e
da doença, aí estará se iniciando o processo de enfrentamento: é a volta do pêndulo.

 Não ficar triste durante o processo de adoecimento é um estado a ser alcançado após
algum trabalho de elaboração psíquica, é um ponto de chegada, e nunca um ponto de
partida.
Posição Enfrentamento

 Se o encontro com a doença é uma espécie de tropeço no real, no enfrentamento


trata-se então de “fazer da queda um passo de dança” (Sabino, 1984).

 O homem não é livre para voar, mas é livre para inventar uma máquina que voe e
que o leve junto. É esse tipo de liberdade que o paciente precisa descobrir para
enfrentar o insuportável contido na doença.

 No enfrentamento, a pessoa busca soluções do tipo realista, mas o que é ser realista?
O que é o real? Não sabemos exatamente o que é a realidade, mas seja lá o que ela
for, tem no mínimo dois lados: um que podemos modificar e outro que não podemos
modificar, o primeiro correspondendo a nossa potência real e o segundo a nossa
impotência real.
 Realismo para nós significa a soma da potência mais a impotência. Quando a
pessoa não enxerga sua potencia, achando que nada pode fazer, temos a depressão
com sua impotência total. Se, ao contrário, a pessoa não se da conta de sua limites
achando que pode tudo, temos o onipotência característica da negação.

Onipotência: Potência com impotência negada

Realismo: Potência + Impotência

Impotência: Impotência com potência negada

QUADRO 7: DIAGRAMA DO REALISMO


 Quando uma pessoa não tem nada a esconder de si mesmo, ou dos outros, sente-se livre e forte.
Essa talvez seja uma explicação para o dito religioso de que a verdade vos libertará. Essa verdade,
tão conhecida na psicoterapia, em geral também vale na psicologia hospitalar e se chama
enfrentamento.

 Outra característica do pensamento na posição de enfrentamento é que o paciente não está mais em
busca de sentido, de uma explicação para a má sorte.

 O enfrentamento é uma posição de fluidez emocional, contrastando com a estase da revolta


(cristalização da raiva) e da estase da depressão (cristalização da tristeza)m onde todas as emoções
se fazem presentes. A pessoa sente tudo: medo, raiva, tristeza, alegria, carinho, desânimo,
dependendo do momento.

 O dia-a-dia de uma pessoa pode ser bastante influenciado pela posição que ela assume em relação a
sua doença. Na negação ela se torna irritadiça e angustiada, na revolta fica estressada e solitária, na
depressão não vê graça em nada e faz as coisas por fazer; já no enfrentamento a pessoa aprende a
desfrutar o prazer das pequenas coisas, e tudo o que faz parece carregado de muita intensidade,
além do que ela vivencia certa serenidade, que à primeira vista pode ser paradoxal diante da sua
condição de enferma.
A esperança

 A esperança não é uma posição na órbita da doença, ela é, isto sim, o fio que
sustenta e conecta as quatro posições, conforme ilustrado na figura abaixo.

NEGAÇÃO FIO DE
ESPERANÇA

ENFRENTAMENTO DOENÇA REVOLTA

DEPRESSÃO
FIGURA 5: A ESPERANÇA
A angústia

 O senso comum dirá que é a possibilidade da morte, que isto é o que de pior pode
acontecer na doença, mas o suicídio de muitos pacientes desenganados vai nos
mostrar que não. Esses pacientes usam a morte para evitar alguma outra coisa, e
que coisa há de ser essa pior que a morte? É a dor e a angústia que também estão
presentes em doenças sem risco iminente de morte.
Eixo II – Diagnóstico Médico

 O diagnóstico médico em psicologia hospitalar é um resumo da situação clínica


do paciente e deve incluir, idealmente, as seguintes informações: o nome da
doença, sua condição aguda ou crônica, os sintomas principais, o tratamento
proposto, a medicação em uso, a aderência ao tratamento, ao prognóstico, o risco
de contágio e o nível de proteção requerido, além das comorbidades.

 A programação terapêutica pode fornecer uma ideia do tempo de duração da


internação, informação esta que orienta o psicólogo no estabelecimento de sua
estratégia terapêutica. Atender um paciente que terá alta hospitalar dentro de dois
ou três dias é algo bem diferente de atender um paciente que permanecera
internado por várias semanas (Angerami, 1984).
Eixo III – Diagnóstico Situacional

 O diagnóstico situacional em psicologia hospitalar constrói uma visão panorâmica


da vida do paciente, enfatizando as áreas não diretamente relacionadas a doença,
mas que a influenciam e são por ela influenciadas, a saber: vida psíquica, vida
social, vida cultural, e dimensão corporal. O diagrama abaixo esquematiza esses
vários aspectos.
Situação Vita Desencadeante (SVD)
Cultural
Ganho Secundário (GS)
Figuras (FG) Social

Psíquico

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Linguagem
Costumes
FIGURA 6: DIAGNÓSTICO SITUACIONAL
 O diagnóstico reacional (eixo I) focaliza a posição que a pessoa assume em relação
a doença, o diagnostico médico (eixo II) específica como é essa doença do ponto de
vista orgânico, e o diagnóstico situacional (eixo III) abre-se para a amplitude da
vida da pessoa.

 O diagnóstico situacional é um mapeamento dos pontos e problemas na vida diária


do paciente que dificultam o enfrentamento da doença, e também dos pontos de
apoio que ajudam nesse processo.
O físico
 Este primeiro nível do diagnóstico situacional avalia a constituição física da pessoa e a relação
que ela tem com seu próprio corpo.

Vida psíquica
 A personalidade de uma pessoa influencia muito a maneira como ela enfrenta a doença.
 No sentido inverso pode-se formular que a doença influi na personalidade, realçando ou
atenuando certos traços já existentes, mas muito raramente produz uma verdadeira mudança de
personalidade.

 Alguns estudos em psicologia hospitalar procuram determinar um perfil psicológico para cada
doença. O mais famoso deles é o que abordou a personalidade dos pacientes com problemas
coronarianos, e o resultado constatou que a maior parte se constituía de pessoas competitivas,
agressivas na profissão, e com alto nível de estresse, funcionamento segundo um padrão “mais e
mais em menos e menos.”
 O diagnóstico quanto à saúde mental visa identificar alterações psicopatológicas
atuais, bem como fazer uma investigação sumária sobre a história psiquiátrica do
paciente.

 Nesse campo existem três situações bastante frequentes. A primeira é o caso do


paciente psiquiátrico que vem a adoecer fisicamente, a segunda é o paciente sem
histórico psiquiátrico que passa a apresentar alguma psicopatologia em razão de
causas orgânicas, e por último o paciente com sintomas físicos em razão de
conflitos psíquicos.
CONSCIÊNCIA
 Delirium: Flutuação no nível de consciência acompanhada de confusão,
desorientação, ansiedade, agitação, podendo estar associada com delírios e
alucinações. Sempre tem causa orgânica. (Não é a mesma coisa que delírio).

 Delirium tremens: Delirium que surge como agravamento da síndrome de


abstinência do álcool.

 Confusão: Diminuição do nível de consciência com consequente perda da


capacidade de identificar e reconhecer com clareza as pessoas, lugares e situações.

 Desorientação: Perturbação na capacidade de situar-se adequadamente em relação


ao tempo, aos lugares e a si mesmo.
 Sedação: Sonolência anormal vista mais comumente nos processos orgânicos, ou por
efeito de psicotrópicos.

 Esturpor: Ausência de resposta a estímulos externos.

 Coma: Grau profundo de inconsciência.

 Coma vigil: Coma no qual os olhos do paciente estão abertos.

 Distrabilidade: Incapacidade para concentrar a atenção, que é facilmente desviada


para estímulos sem importância ou irrelevantes.

 Desatenção seletiva: Bloqueio somente dos temas que geram ansiedade.


PERCEPÇÃO E MEMÓRIA
 Alucinação: Percepção na ausência de estímulo sensorial (percepção sem objeto), podendo ser visual,
auditiva, olfativa, gustativa ou cinestésica, e só indica psicose se o teste de realidade estiver
comprometido.

 Alucinose: Alucinação, mais comumente auditiva, associada ao abuso crônico do álcool e ocorrendo
sem diminuição do nível de consciência.

 Ilusão: Percepção falsa, ou deformada, de um objeto real e presente.

 Amnésia: Incapacidade total ou parcial para recordar experiências passadas, podendo ter origem
orgânica ou emocional.

 Confabulação: Preenchimento inconsciente de lacunas na memória por experiências imaginadas ou


falsas, nas quais o paciente crê sem ter base sólida.
EMOÇÃO E PENSAMENTO

 Delírio: Pensamento falso, acompanhado de convicção extraordinária e que não pode ser corrigido
pela argumentação nem pelo teste de realidade.

 Labilidade emocional: Mudanças bruscas no tom emocional sem relação com estímulos externos.

 Disforia: Estado de ânimo desagradável e muito irritável, facilmente chegando à raiva.

 Depressão: Estado cujos sentimentos apresentam tonalidade afetiva negativa, com tristeza, falta de
prazer.

 Euforia: Sentimento de bem estar intenso com expansividade efetiva e sentimento de grandeza.
 Alextimia: Incapacidade ou dificuldade para descrever ou conscientizar-se das
próprias emoções.

 Ansiedade: Angústia ou ansiedade é um estado de medo, tormentoso e indeterminado


direcionado ao futuro.

 Ambivalência: Coexistência simultânea de dois impulsos opostos com relação a


mesma coisa ou pessoa.

 Hipocondria: Relação angustiosa com o próprio corpo caracterizada por temores de


estar, ou vir a estar, doente sem fundamentos objetivos.

 Somatização: Desenvolvimento de sintomas físicos não explicados por distúrbios


orgânicos e atribuídos a sentimentos reprimidos.
Vida social

 Por vida social entendemos a rede de relacionamentos interpessoais que


caracterizam o dia-a-dia da pessoa, e para maior clareza vamos dividi-la em
quatro áreas: par, família, financeira e profissional. O objetivo do diagnóstico é
identificar em cada área uma situação vital desencadeante SVD, o ganho
secundário GS, as figuras vitais FV.

 Situação vital desencadeante SVD é qualquer acontecimento na vida do sujeito


que, ao lhe apresentar uma exigência quanto a posicionamento social ao quanto a
trabalho psíquico, cria um estresse que, somado a uma presumível predisposição
biológica, coloca em andamento o processo de adoecimento.
 A SVD (situação vital desencadeante) não é a causa da doença, mas sim um precipitador.

 Alguns exemplos de SVD: separação amorosa, traição conjugal, gravidez indesejada, aborto,
casamento próximo, falecimento de alguma pessoa querida, conflitos familiares, filhos saindo de
casa, nascimento de filhos, doença grave na família, separação dos pais, mudança de cidade,
aposentadoria, desemprego...

 É importante mencionar que em muitos casos não há SVD alguma. Ela não é um fator obrigatório
no processo de adoecimento.

 Ganho secundário GS é um privilégio que a pessoa passa a desfrutar após ficar doente, e pode ser
de ordem material, afetiva, ou psicológica.

 Denominamos essas situações e pessoas “figuras vitais FV” e as classificamos em positivas ou


negativas à medida que são vivenciadas como problemas ou como fonte de energia ou motivação
pelo paciente.
Vida cultural
 O diagnóstico, da dimensão cultural, visa identificar elementos culturais relacionados
ao adoecimento à medida que esses se evidenciam no discurso e no comportamento
do paciente.

 Na psicologia hospitalar os elementos culturais mais proeminentes são a religião, a


medicina popular, a linguagem e a questão social.

 A fé é uma força que age no sentido da cura e do enfrentamento da doença, e não


costuma ser um problema na psicologia hospitalar. Entretanto, existem duas situações
em que a religião passa a ser um agravante no processo de adoecimento. Isso se dá
quando o paciente interpreta a doença como um castigo divino e mergulha em um
sentimento de culpa e depressão, e quando entente que procurar recursos na medicina
seria um sinal de pouca fé, passando a recusar tratamento.
 O psicólogo hospitalar não precisa aderir à cultura do paciente; basta que mantenha
uma postura aberta, inclusiva, capaz de levar em conta os valores culturais do
paciente, reconhecendo a importância desses valores no processo de adoecimento.

 Do ponto de vista social, o psicólogo hospitalar não pode ignorar o significado do


adoecimento em uma sociedade competitiva e mercantilista como a nossa. Pita
(1990) afirma que adoecer nessa sociedade “é deixar de produzir e, portanto, de ser;
é algo vergonhoso, logo deve ser ocultado e excluído, até porque dificulta que
outros, familiares e amigos, também produzam”.
Eixo IV – Diagnóstico Transferencial

 O diagnóstico transferencial avalia as relações que a pessoa estabelece a partir de


seu lugar no adoecimento. Enquanto no diagnóstico reacional estudamos o modo
como a pessoa reage diante da doença, aqui buscamos compreender como a
pessoa se relaciona em meio ao adoecimento.

Transferência
 O paciente estabelece então cinco relações fundamentais: com a família, com o
médico, com a enfermagem e outros técnicos, com a instituição e com o
psicólogo. Essas relações são chamadas “transferenciais” porque o adoecimento,
como fenômeno regressivo, leva a pessoa a estabelecer vínculos segundo modelos
já experimentados anteriormente em sua história pessoal.
Relações paralelas
 A psicologia hospitalar cuida dos aspectos psicológicos que envolvem o
adoecimento, e muitas vezes tais aspectos surgem mais problematizados na família,
no médico, na equipe de enfermagem e no próprio psicólogo hospitalar, ou nas
relações que se estabelecem entre eles e que não envolvem diretamente o paciente.
Assim, além das cinco relações fundamentais envolvendo o paciente, o diagnóstico
transferencial também avalia as relações que se estabelecem entre os outros
participantes da rede de relacionamentos, conforme o ilustrado na figura abaixo:
Equipe Médico

Paciente _______
relações
fundamentais
----------
relações
Instituição paralelas
Família
Psicólogo
FIGURA 9: REDE DE RELAÇÕES
FUNDAMENTAIS E PARALELAS
 Chiattone (2000) chama a atenção para o fato de que muitos psicólogos escolhem a
psicologia hospitalar como tentativa de resolução do luto referente a vivências de
perdas e doenças na família, ou como forma de controle imaginário sobre a morte,
que tanto temem.

 Trabalhar no hospital, com o adoecimento, é um “dar-de-cara” com a condição de


desemparo existencial constituinte da condição humana, e ninguém passa por isso
sem se abalar. Assim, o psicólogo não precisa se constranger ou negar seus
sentimentos; basta que, consciente de que são “seus”, não os projete sobre o
paciente.
A doença como linguagem

 A doença é portadora de muitos significados. Para a medicina cientifica, o sintoma


significa alterações fisiológicas, anatômicas, para a medicina oriental significa
alterações sutis na dimensão energética do paciente que se relacionam com sua vida
afetiva e espiritual. Já para a psicossomática o sintoma seria a maneira que o sujeito
encontrou para expressar conteúdos que não puderam ser simbolizados em palavras.
Esse último aspecto é bastante atraente para a psicologia hospitalar, pois coloca em
relevo a palavra, que é o próprio campo de trabalho do psicólogo hospitalar.

 O que importa é exatamente isto: o sentido que o sintoma tem para o paciente, e não o
sentido que ele tem em determinada tradição cultural ou esotérica. O sentido é dado pelo
paciente, não pelo sintoma, que é como uma garrafa vazia que pode ser preenchida por
diferentes líquidos. Sim, a doença é uma mensagem, mas o único tradutor autorizado
quanto ao psíquico é o próprio doente.
A Terapêutica

 O psicólogo não é, a priori, um modificador de comportamentos desadaptativos,


como poderia supor a medicina, ele é um facilitador do trabalho de elaboração
psíquica, trabalho esse que pode levar a uma mudança ou não. Na psicologia
hospitalar a mudança vem como resultado, não como objetivo. O compromisso do
psicólogo hospitalar é com a verdade do sujeito, e não com a mudança de
comportamento.
Situações clínicas

O Paciente Desenganado
 Diz-se que o paciente foi desenganado quando ele se encontra fora das possibilidades
terapêuticas oferecidas pela medicina, quando não há mais possibilidade de cura ou de
mantê-lo vivo. É um momento terrível, tanto para o paciente como para os familiares e
médicos, mas esse não é o final da história. Acontece muita coisa relacionada à
psicologia hospitalar depois desse veredicto.

 Em psicologia hospitalar, tratamos do desejo, e não do prognóstico, e por definição no


desejo há esperança sempre.

 O prognóstico é uma análise baseada em dados estatísticos, enquanto a esperança é um


desejo, e como tal deve ser bancado por quem o tem.
Risco de suicídio

 Os pacientes que mais frequentemente se encontram em situações de risco aumentado


para suicídio são os seguintes: paciente com depressão tipo melancólica, paciente
com histórico de doença psiquiátrica grave, paciente com histórico de tentativa de
suicídio anterior, paciente etilista crônico ou com quadro de dependência química
grave, pacientes sem apoio familiar consistente, paciente em estado terminal ou com
doença grave recém diagnóstica, e pacientes com graves problemas sociais e
financeiros (Kaplan & Sadock, 1995).
 Mas se tal ideia se torna muito frequente, se a pessoa passa a considerá-la
seriamente, se quando inquirido diz estar pensando em se matar, então dizemos
que existe, sim, ideação suicida, e esse é o primeiro nível de gravidade. Se além de
ter tal ideia a pessoa estiver fazendo um plano, considerando como, quando e onde
consumaria o fato e tomando providências concretas nesse sentido, dizemos que
existe plano suicida, e esse é o segundo nível de gravidade. Se além da ideia e do
plano, a pessoa dispõe de meios efetivos para consumar o plano, tais como fácil
acesso a armas de fogo, venenos, acesso a lugares altos, etc., dizemos que existe
ideação, plano e meios suicidas e esse é, naturalmente, o nível mais grave de
todos.
Ao fazer o diagnóstico de situação de risco aumentado para suicídio, o psicólogo deve
tomar as seguintes providências:
 Comunicar sua avaliação de imediato, sem nenhum tipo de adiamento, à enfermagem,
à equipe médica e, em momento oportuno, aos familiares e ao próprio paciente.
 Registrar sua avaliação e as providencias tomadas no prontuário do paciente.
 Recomendar que a partir daquele instante o paciente não seja deixado sozinho, seja
mantido sob observação 24 horas por dia, até nova avaliação.
 Recomendar a retirada imediata dos meios disponíveis para a realização de atos
suicidas pelo paciente, tais como bloquear janelas, retirar armas de fogo, se estiverem
disponíveis, retirar cordas e instrumentos cortantes...
 Solicitar interconsulta psiquiátrica.
 Programar as sessões de atendimentos psicológicos o mais amiúde possível, e fazer
reavaliações frequentes do quadro.
O paciente religioso

 A fé ajuda as pessoas a atravessarem os momentos difíceis da vida, sendo a


doença e a morte os maiores dentre eles. Assim, na prática da psicologia
hospitalar, a fé raramente se opõe à ciência, constituindo-se mesmo em uma força
de superação a ser incentivada pelo psicólogo. Entretanto, pode vir acontecer de o
paciente recusar o atendimento psicológico alegando que a fé lhe é o bastante.
O paciente que não pediu para ser atendido

 A solicitação de atendimento psicológico em geral parte do médico, da


enfermagem ou da família. Se o paciente concorda com esse pedido o trabalho do
psicólogo fluirá sem muitos problemas, mas se o paciente não foi consultado, ou
se demonstrar ser contrário a tal solicitação, aí o psicólogo estará diante de um
grande desafio: atender alguém que não pediu para ser atendido.

 Com a oferta se cria a demanda, diria Lacan (Moretto, 2001). Se o paciente


assumir uma postura do tipo “tanto faz, se você quiser voltar amanhã...você é
quem sabe”, o psicólogo deve entender isto como um “sim” e aproveitar a
oportunidade. O trabalho começa por onde é possível, e não por onde seria
melhor.
O paciente silencioso

 As condições clínicas que mais impedem o paciente de falar são as seguintes: coma, fraqueza
extrema, sedação, lesão na região oral, entubação para respiração por aparelhos e sequelas de
AVC. Nessas condições o psicólogo deve buscar formas alternativas de comunicação, tais
como gestos ou comunicação escrita.

 Quando a razão do silêncio for um mutismo voluntário, convém tomar esse mutismo como
sintoma e avalia-lo em termos de saúde mental. O mutismo se deve a uma rebeldia? Ou é
sinal de depressão? Sugere um distúrbio psicótico? O trabalho do psicólogo se fará no
sentido de falar para o paciente, ou falar sobre o paciente.

 Também é uma boa estratégia aceitar a recusa do paciente , ficar pouco tempo com ele e
dizer que voltará outro dia. Além de demonstrar respeito pelo desejo do paciente mantém
aberta a possibilidade do tratamento.
Contar ou não contar

 Tradicionalmente essa responsabilidade de anunciar as más notícias tem sido dos


médicos, mas cada vez mais, em função da formação de equipes
multidisciplinares, o psicólogo vem sendo solicitado para participar destas
situações.

 O que mais os confortava era o sentimento de empatia, um sentimento mais forte


do que o sentimento da tragédia imediata da notícia, era a afirmação de que se
faria tudo o que fosse possível, de que não seriam largados, de que existiam
tratamentos válidos, de que sempre havia um fio de esperança, até mesmo nos
casos mais avançados.
Assistência ao paciente terminal

 Quando a doença avança, consumindo a vida, e alcança um estágio em que a cura já não é
mais possível e a morte assoma inexorável no horizonte, outra medicina vem em auxílio
do paciente: a medicina paliativa.
 TRATAMENTO INDIVIDUALIZADO: Para o profissional de saúde, talvez mais
importante do que qualquer outro princípio ao tratar os pacientes terminais, é de crucial
importância tornar o tratamento individualizado.

 MORTE DIGNA: Weisman e Hackett (Cassem, 2001) listam as principais diretrizes para
ajudar um paciente a enfrentar a morte de forma digna: 1 – Estar relativamente livre de
dor; 2 – Ter suas funções corporais funcionando o melhor possível, dentro dos limites de
sua possibilidade; 3 – Reconhecer e resolver os conflitos interpessoais passíveis de serem
manejados; 4 – Realizar os desejos restantes que sejam compatíveis com seu ideal de ego;
5 – Passar o controle das coisas práticas para outros em que tenha confiança.
 DEPRESSÃO: A depressão em sua forma de luto, caracterizada pelo
desinvestimento libidinal dos objetos externos seguida de um trabalho de
elaboração das perdas é bastante compreensível em pacientes terminais, e como tal
deve ser respeitada. Entretanto, se a depressão assumir um caráter melancólico,
em especial com ideação suicida, o paciente deve ser reavaliado considerando-se a
possibilidade de intervenção ou psiquiátrica, até mesmo com uso de medicação
antidepressiva.

 ALÍVIO DA DOR: O alívio da dor é básico em todos os planos de assistência


paliativa a pacientes terminais e deve ser atingível na maioria dos casos, já que a
medicina dispõe de amplos recursos para isso: analgésicos, anestésicos e cirurgias.

 FAMÍLIA: Quando o paciente entra na fase terminal, a família inteira se torna o


foco mais adequado para os cuidados dos profissionais de saúde.
 CRIANÇAS: Muito frequentemente se coloca a questão de recomendar ou
desaconselhar a visita de crianças a pacientes terminais. Para o paciente é bem
estabelecido que a presença das crianças da família são uma fonte de alívio e
consolo. Já em relação à própria criança, a melhor regra para se determinar se ela
deve ou não visitar um parente em estado terminal é perguntar-lhe se ela quer fazer
a visita ou não. Não se encontrou critério melhor.

 NÃO ABANDONO: As relações interpessoais são a força de suporte psicológico


mais poderosa no final da vida. Por isso os profissionais de saúde devem se
lembrar que sua própria presença é valiosa.

 INTERESSE: Em situações-limite como a de um paciente terminal, quando não há


mais nada a fazer do ponto de vista técnico, ser empático é de grande valia para o
paciente.
 COMUNICAÇÃO: Conversar com quem está morrendo é uma atividade angustiante e
paradoxal. A maioria das pessoas, profissionais ou familiares, deseja encontrar a coisa certa
a ser dita, mas infelizmente parece que tal coisa não existe a priori. Além disso, a prática
tem ensinado que a capacidade de ouvir é mais importante que a capacidade de dizer.

 FÉ: As pessoas que possuem uma fé religiosa consistente e interiorizada dispõem de um


recurso de grande valia no enfrentamento de uma doença terminal.

 EUTANÁSIA: Pacientes com doenças fatais, em como irreversível, em estado vegetativo


persistente ou em situação de vida assistida por aparelhos costumam colocar a equipe de
profissionais e a família diante de questões bastante difíceis, tais como continuar ou
interromper o tratamento, desligar ou não os aparelhos, quem tem que decidir sobre tais
coisas, a família, o paciente, o médico ou o estado, doar ou não doar órgãos. Infelizmente,
ainda não existem diretrizes claras e objetivas sobre como lidar com tais situações, a não ser
a de que nenhum profissional deve se arvorar ao direito de conduzir sozinho tais casos, até
porque existem questões jurídicas envolvidas. Será de muita valia para seu trabalho o
psicólogo procurar se manter atualizado sobre o tema da bioética.
O psicólogo no pronto-socorro

 O objetivo do pronto-socorro é a estabilidade das funções vitais do paciente e o


alívio da dor. Ficam excluídos, portanto, objetivos mais a longo prazo, como a
cura completa da doença, ou o tratamento dos aspectos psicológicos a ela
relacionados.

 Sterian (2000) recomenda que nas situações de emergência se distinga o sujeito na


urgência do sujeito da urgência. O primeiro é o sujeito que se torna o foco das
atenções terapêuticas, e o segundo, o sujeito que demanda, que solicita o
atendimento em caráter de urgência.
O paciente histérico

 No pronto-socorro a situação que mais demanda a atenção do psicólogo hospitalar


é a histeria (síndrome do pânico, ansiedade, estresse pós-traumático, transtorno
dissociativo, transtorno conversivo, somatizações e hipocondria).

QUADRO CLÍNICO DA HISTERIA: os sintomas mais frequentemente vistos no


pronto-socorro são os seguintes:
 Convulsões e crises psicomotoras semelhante a uma crise epiléptica, mas sem
achado neurológico e com alto grau de teatralidade.
 Paralisia, fraqueza muscular, distúrbios da marcha e anestesiais que raramente
provocam queda e danos sérios.
 Pseudociese (gravidez psicológica)
 Paciente apresenta uma atitude de certa indiferença que é inadequada quando
relacionada com a suposta gravidade dos sintomas alegados (“La Belle
Indifference”).
 Um estado de estupor caracterizado pela ausência de respostas ao meio ambiente,
acompanhada de mutismo e ausência de movimentos voluntários.
 Hipocondria que é a preocupação exagerada, repetitiva, sem bases objetivas, com
o próprio corpo, ou com a possibilidade de se vir a ficar doente, geralmente
acompanhada de solicitação intensa de cuidados médicos.
 Ataques de pânico, definidos como crise de ansiedade extrema, repentina e
incontrolável.
 Dores crônicas, geralmente cefaleia ou dores musculares, sem nenhum achado
médico que as justifique.
 O TRATAMENTO: O tratamento emergencial da histeria no pronto-socorro tem
duplo objetivo: resolver a crise atual e facilitar a aderência do paciente a um
tratamento ambulatorial subsequente que possa evitar nova crises.

 VOCÊ NÃO TEM NADA: Nunca diga para um paciente com quadro histérico
frases do tipo “você não tem nada”, “isso é emocional”, ou “é da sua cabeça”. Não
o diga porque não é verdade e porque não ajuda em nada, servindo apenas de
desmoralização psicológica.
Alta psicológica?

 Quando se pode dar por concluído o trabalho da psicologia hospitalar? O que


determina a conclusão do processo de atendimento psicológico na psicologia
hospitalar não é nenhuma condição clínica do paciente, do tipo “cura da doença”,
e também não é a ascensão do paciente a um estado ideal de perfeição psicológica
em que ele seja capaz de enfrentar perfeitamente a doença. O que determina o
final do tratamento psicológico é a cessação da demanda.
Simonetti, A. (2018). Manual de Psicologia Hospitalar: o mapa da doença. Belo
Horizonte: Artesã Editora.

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