Pós-verdade
• Em 2016, “post-truth” foi nomeada a palavra do ano pelo Dicionário Oxford. Este
acontecimento não deve surpreender a muitos, tendo sido 2016 um ano cheio de
surpresas polêmicas e eventos inesperados.
• O panorama político e social ao longo do ano de 2022 foi marcado por esta conjuntura
da pós-verdade, na qual o objetivo e o racional perdem peso diante do emocional ou da
vontade de sustentar crenças, apesar dos fatos demonstrarem o contrário.
• São consolidadas novas formas de relacionamento com a opinião pública e os meios de
comunicação alternativos. As tradicionais formas de jornalismo perdem peso diante do
auge dos novos canais de comunicação, como os blogs pessoais, o Youtube, os canais de
mensagens instantâneas, como o WhatsApp, Telegram e o Facebook Chat, ou as redes
sociais como Snapchat e Twitter. Um simples tweet pode mobilizar massas e causar
resultados impensáveis há alguns anos.
• A divulgação de falsas notícias conduz a uma banalização da mentira e, deste modo, à relativização da
verdade.
• O valor ou a credibilidade dos meios de comunicação se veem reduzidos diante das opiniões pessoais.
• Os acontecimentos passam a um segundo plano, enquanto o “como” se conta a história ganha
importância e se sobrepõe ao “o quê”.
• Não se trata, então, de saber o que ocorreu, mas de escutar, assistir, ver, ler a versão dos fatos que mais
concorda com as ideologias de cada um.
• A pós-verdade não é sinônimo de mentira, mas “descreve uma situação na qual, durante a criação e a
formação da opinião pública, os fatos objetivos têm menos influência do que os apelos às emoções e às
crenças pessoais”.
• A pós-verdade consiste na relativização da verdade, na banalização da objetividade dos dados e na
supremacia do discurso emocional.
• Tampouco é um fenômeno novo. Ralph Keyes já o citava, em 2004, no livro Dishonesty and Deception in
Contemparary Life, como relata Luis Meyer na revista Ethic, na edição de fevereiro deste ano (Não a
chame de pós-verdade, chame de pós-jornalismo).
• Seu colega, Eric Alterman, a descreveu, definitivamente, como a “arma política da desinformação”. O
mesmo autor cita Noam Chomsky que, referindo-se à palavra pós-verdade, elaborou uma célebre lista:
10 Estratégias de Manipulação, entre as quais se incluem técnicas para suavizar emotivamente as
mensagens, com o propósito de causar uma espécie de curto-circuito no senso crítico e analítico dos
cidadãos.
• Ao se combater as fakes-news, as verdades alternativas e as mentiras,
todos estes conceitos abarcados no guarda-chuva semântico da pós-
verdade: o fact-cheking (confira os fatos), que seria o antídoto contra a
palavra – melhor qualificá-la como conceito –, considerada pelo Dicionário
Oxford a mais nova e utilizada expressão durante o ano de 2016.
• Os Protocolos dos Sábios de Sião, uma fábula contra o judaísmo, escrita
durante o último período da Rússia czarista, resultou em uma das alavancas
mais falsárias empregadas por Hitler para introduzir, no período entre
guerras, o antissemitismo na Alemanha e em outros países europeus;
• No Brasil teríamos o “plano Cohen” tramado pelo governo de Getúlio
Vargas e o então ministro Gaspar Dutra, dando inicio ao Estado Novo;
• “a mentira política ganha porque tem as qualidades necessárias para triunfar,
convertendo-se no que Richard Dawkins chamou de “meme”.
• O meme é uma unidade de conhecimento viral, na visão deste autor, que se
dispersa à margem de seus atributos de veracidade.
• Vivemos no universo dos memes e necessitamos de critérios para distinguir o
verdadeiro do falso, o seguro do provável, o certo sobre o duvidoso.
• E nos fazemos perguntas cada vez mais angustiantes:
• seria o Photoshop, por exemplo, uma técnica da pós-verdade?
• Seria a contextualização de um recurso falsificador?
• O insulto poderia ser considerado uma mera descrição?
• Os efeitos especiais no cinema ou as experiências de realidade virtual, por exemplo,
são um atentado à integridade da verdade, tal como a temos entendido até agora?
• Certamente, na política, a mentira ou a meia-verdade sempre foram recursos
manejados com desenvoltura, mas agora, a resposta ao status quo político e
econômico introduziu elementos sentimentais, emotivos, em suas falsas
mensagens, enriquecendo-as de uma força arrasadora
• A pós-verdade não é apenas uma prática que se desenvolve no campo da
política. É feita também, de forma perigosa e arbitrária, no âmbito da
publicidade e no campo empresarial
• A comunicação de grandes empresas – especialmente dos setores
estratégicos como o da energia e o financeiro – deve rever seus protocolos
de atuação: sua comunicação não deve consistir apenas – quiçá,
principalmente – em transmitir conhecimentos, mas em desarmar mentiras,
versões alternativas, rumores e, em algumas ocasiões, falsidades aberta;
• Podemos afirma que a transição do papel para os meios digitais nunca foi
apenas uma questão tecnológica.
• foi essencialmente uma questão da perda da deontologia profissional, da
desistência do relato da verdade, da aceitação da mentira e dos rumores no
circuito informativo.
• A tecnologia, com o arrasamento da intermediação jornalística,
desmoralizou o relato jornalístico, fulminando os atributos que asseguravam
um papel social de controle e fidelidade da verdade.
• A nova comunicação e o novo jornalismo devem concentrar-se, de agora em
diante, não tanto em contar – isto já o fazem os cidadãos, por conta própria,
por meio do enorme cardápio de tecnologias digitais à sua disposição – mas
em verificar, em realizar o fact-checking de maneira sistemática, por meio de
muitas plataformas que já existem (dezenas nos Estados Unidos).
• Borja Echevarría recorda que uma das mais recentes pesquisas da Gallup
aponta para uma cifra surpreendente sobre os mass media: apenas 32% dos
entrevistados mantêm sua confiança nestes.
• A única maneira de conceber o jornalismo e a comunicação corporativa
consiste em fazer uso da verificação dos dados, das teses dos discursos e da
proatividade informativa para detectar as falsidades e destruí-las,
destituindo as inverdades de qualquer reputação.
• Ou seja, o jornalismo, por um lado, e a comunicação deontológica, por
outro, devem voltar a resgatar o relato verossímil, conter o sentimentalismo,
apaziguar e moldar os piores instintos e proclamar a superioridade da
inteligência sobre a visceralidade. Este é o fact-checking
Bolha Social e as redes
• A ideia de uma bolha representa uma demarcação de espaço para se proteger e se distanciar do ambiente
externo.
• Dessa forma, uma bolha social é entendida como um grupo de pessoas que se unem por interesses
semelhantes e acabam por excluir a participação de quem tem pensamentos contrários.
• Assim, a bolha é algo que limita as relações e, de certa forma, protege o grupo, mantendo um equilíbrio.
• Afinal, não existem muitas oportunidades de conflito ou discordância. A existência de uma bolha social
não é, simplesmente boa ou ruim.
• Mas algo novo apareceu nesse contexto nos últimos anos: as redes sociais. O avanço da internet marcou
uma nova forma de se relacionar não só com as pessoas, mas também com as notícias e os fatos. Com
isso, estar em uma bolha social pode representar alguns riscos.
• Atualmente, não é raro ver pessoas interrompendo a relação com quem toma posicionamentos
divergentes. Isso vai desde “deixar de seguir” a rede social de alguém ou até mesmo vivenciar grandes
brigas e romper amizades íntimas.
• Apesar de ser uma escolha válida quando você sente que seus amigos não compartilham valores que
considera importantes, isso também denota a dificuldade em lidar com as diferenças. Assim, pode-se
transformar em um problema.
• O fenômeno das “bolhas sociais” impede que se prossiga de forma completamente livre, numa
toada de decisão direta ou pelo menos autônoma , visto que tais bolhas mostram somente os
conteúdos das ideias compartilhadas, ou o conteúdo de amigos cujas postagens mais se curtiu, ou,
ainda, o daqueles com quem mais se conversou pelos aplicativos de mensagens.
• Esse fenômeno é causado por um algoritmo que mostra somente o conteúdo que se quer ver e
quando se quer ver, o que é muito prejudicial, visto que inibe um possível debate a respeito de
ideais, o qual poderia ajudar a fortalecer um ponto de vista pessoal, fazer com que se alterasse
uma opinião com relação a determinado assunto, ou, até mesmo, pesquisar sobre um produto em
um site, o que poderia levar a ver-se o mesmo produto em vários outros lugares que, em teoria,
não teriam ligação alguma com o site utilizado para fazer a pesquisa.
• As bolhas sociais afetam os direitos que o indivíduo tem de se informar, de ser informado e de se
comunicar, já que somente vai ver aquilo por cujo tema já tem certa simpatia.
• Dessa forma, nega o conteúdo que é o contrário do que pensa e, com isso, acaba fechado em
círculos de amizades e informações, vivendo, assim, uma espécie de sua própria versão de mundo.
• Até mesmo os mecanismos de sites de pesquisa usam um algoritmo para mostrar, nas primeiras
páginas, o conteúdo que se está predisposto a aceitar, uma vez que a pesquisa, muito raramente,
vai mostrar os mesmos resultados para duas pessoas distintas.
• Assim, até o que se pesquisa nos navegadores entra para o algoritmo das bolhas. As pesquisas
realizadas em sites tendem a mostrar resultados parecidos para um grupo de pessoas que
compartilham diversos interesses em comum.
• Existe uma forte ligação entre as bolhas sociais e a disseminação de fake news. Uma
vez que determinado grupo A de pessoas recebe uma notícia falsa, e essa mesma
notícia tem a capacidade de afetar seu lado emocional –seja pela raiva ou pela
tristeza, por exemplo –, esse mesmo indivíduo, parte do grupo A, vai repassar a notícia
para o grupo B e assim por diante.
• As bolhas sociais facilitam essa propagação de fake news, justamente, por fecharem
determinado grupo em um círculo, a ponto de grande parte do que eles receberem via
WhatsApp ou virem nas postagens de amigos no Facebook serem mentiras que são
repassadas e compartilhadas, repetindo o processo inúmeras vezes, até que o alcance
tomado pela mentira seja imenso e uma boa parte da população já a tenha recebido.
• As fake news que são espalhadas vão desde imagens editadas, utilizadas para
denegrir a reputação de uma pessoa, vídeos que podem ser editados de algo que foi
dito e então tirado completamente de contexto, até notícias falsas provenientes de
sites que são pagos para escrever notícias falsas sobre pessoas, e transformam
informações em mercadorias intercambiáveis num arranjo cujos agentes são reduzidos
ao denominador comum de consumidores e cuja lógica operante é a de produção e de
circulação mercantil (GIACOIA, 2017). O caso mais comum em que as fake news
acontecem é com relação a políticos, seja para mudar a opinião da população ou até
mesmo reafirmar uma posição duvidosa