Curso Técnico de Química Industrial
Análise Orgânica
Prof. Flávio de Almeida Violante ([email protected])
Nilópolis, 2023.
PARÂMETROS IMPORTANTES PARA ANÁLISE DE SUBSTÂNCIAS ORGÂNICAS DESCONHECIDAS
SOLUBILIDADE
“similia similibus solvuntur” (semelhante dissolve semelhante)
Os ensaios de solubilidade são uma importante ferramenta para análise e conhecimento das propriedades e
da natureza da molécula orgânica a qual desejamos conhecer. Além da eloquente resposta, estes ensaios são simples,
baratos e de fácil execução.
Por definição consensual, diz-se que uma substância é solúvel em água quando aproximadamente 3 gramas
são solúveis em 100 mL de água. De uma maneira mais prática, quando 30 mg de amostra são solúveis em 1 mL de
água, diz-se então que a amostra é solúvel em água.
Como já mencionado, diversas possibilidades podem ser aventadas com boa chance de êxito se a amostra
orgânica desconhecida é solúvel em água (com algumas exceções que discutiremos mais a frente):
- baixo peso molecular;
- cadeia carbônica com no máximo 4 ou 5 átomos de carbono (exemplos na tabela 1);
- a cadeia pode ser maior no caso da presença de grupos polares polifuncionais;
- em geral são moléculas que fazem ligação de hidrogênio através de grupos como OH, CO 2H, NH2 e C=O;
- ésteres (RCO2R’), amidas (RCONR’2) e nitrilas (RCN) são menos solúveis;
- cloretos de ácidos (RCOCl) e anidridos (RCOOCOR’) reagem com a água e por isso são solúveis;
- alcanos, alcenos, alcinos e compostos aromáticos são em geral insolúveis em água.
Tabela 1 – solubilidade de alguns ácidos carboxílicos (CONSTANTINO, 2005)
Nome comum Nome IUPAC Fórmula Solubilidade em H2O
ácido acético ácido etanóico CH3CO2H solúvel
ácido propiônico ácido propanóico CH3CH2CO2H solúvel
ácido butírico ácido butanóico CH3(CH2)2CO2H solúvel
ácido valérico ácido pentanóico CH3(CH2)3CO2H 3,3 g em 100 mL H2O
ácido capróico ácido hexanóico CH3(CH2)4CO2H 1,08 g em 100 mL H2O
ácido enântico ácido heptanóico CH3(CH2)5CO2H 0,24 g em 100 mL H2O
ácido cáprico ácido decanóico CH3(CH2)8CO2H 0,015 g em 100 mL H2O
ácido palmítico ácido hexadecanóico CH3(CH2)14CO2H insolúvel
Figura 1 – Resumo sobre a solubilidade das principais funções orgânicas em água
Para o caso de amostras solúveis em água, recomenda-se que a própria solução aquosa seja alvo do ensaio de
pH utilizando papel indicador (tornassol ou papel de pH universal), pois se a amostra desconhecida foi solúvel em
água, podemos agora, ao usar o papel de pH, classificá-la em uma das três categorias das substâncias orgânicas
polares:
- neutras (não alteram o papel de tornassol)
- ácidas (mudam a cor do papel de tornassol azul para vermelho)
- básicas (mudam a cor do papel de tornassol vermelho para azul)
As tabelas 2 e 3 e as figuras 1, 2 e 3 nos ajudarão a entender essas classificações.
Tabela 2 - solubilidade de moléculas polares e apolares em meios neutro, ácido e básico
Molécula Solubilidade
água HCl 10% v/v NaOH 10% p/v
polar com grupo ácido solúvel solúvel solúvel
polar com grupo básico solúvel solúvel solúvel
polar neutra solúvel solúvel solúvel
apolar com grupo ácido insolúvel insolúvel solúvel
apolar com grupo básico insolúvel solúvel insolúvel
apolar neutra insolúvel insolúvel insolúvel
Tabela 3 - efeito da força ácida na solubilidade de moléculas apolares em meios neutro, ácido e básico
Molécula Solubilidade
água HCl 10% v/v NaOH 10% p/v NaHCO3 10% p/v
apolar com grupo ácido forte insolúvel insolúvel solúvel solúvel
apolar com grupo ácido fraco insolúvel insolúvel solúvel insolúvel
apolar com grupo ácido fraco e insolúvel insolúvel solúvel solúvel
grupo retirador de elétrons
Figura 2 - Moléculas polares
Exemplos de moléculas polares
OH
NH2
OH O
1-propilamina ácido acético
2-propanol
H
OH N OH
O
etanol
dietilamina ácido propiônico
neutras básicas ácidas
Figura 3 - Moléculas apolares
Exemplos de moléculas apolares
NH2 CO2H
ácido benzóico
naftaleno anilina O
CH3
NH2 OH
HO
1-hexilamina
ácido tereftálico
O
tolueno NHNH2 O
OH
ácido esteárico
hexano fenilhidrazina (ácido hexadecanóico)
neutras básicas ácidas
Figura 4 - Moléculas apolares com grupos ácidos
Exemplos de moléculas apolares com grupos ácidos
OH
OH
CO2H CO2H
OH fenol
ácido benzóico
ácido salicílico (pKa ~ 10) 1-naftol
(pKa ~ 4,2)
pKa1 ~ 2,3 (pKa ~ 9,4)
pKa2 ~ 13,6
OH OH
OH
OH
O2N NO2
O
2,4-dinitrofenol ácido butírico 2-naftol o-cresol
(pKa ~ 4,1) (pKa ~ 4,8) (pKa ~ 9,6) (pKa ~ 10,3)
"fortes" "fracos"
Figura 5 – O anel aromático influenciando negativamente na solubilidade em água
O O
O O
OH H3C OH
OH H3C OH
solúvel em água interfere drasticamente
insolúvel em água na solubilidade em água pois
confere grande caráter apolar
Figura 6 – Demonstração da solubilidade reativa baseada em reações ácido base
O O
OH O Na
+ NaOH + H2O
ácido benzóico benzoato de sódio
insolúvel solúvel confere interações
em água em água muito fortes com a água
(interações íon-dipolo)
+ HCl
NH2 NH3 Cl
anilina cloridrato de anilínio
insolúvel solúvel
em água em água
Figura 7 – Solvatação de íons em água.
https://chem.libretexts.org/Courses/Purdue/Purdue%3A_Chem_26505%3A_Organic_Chemistry_I_(Lipton)/Chapter_4._Intermo
lecular_Forces_and_Physical_Properties/4.4_Solubility
Figura 8 – Solvatação de íons com cadeias apolares em água na forma de micelas
(KLEIN, 2017)
https://chem.libretexts.org/Courses/Purdue/Purdue%3A_Chem_26505%3A_Organic_Chemistry_I_(Lipton)/Chapter_4._Intermo
lecular_Forces_and_Physical_Properties/4.4_Solubility
O ensaio de solubilidade
A princípio, uma fronteira pode ser vislumbrada ao realizar o ensaio de solubilidade em água, de modo que
amostras solúveis em água podem ser classificadas como “polares” e aquelas que não são solúveis em água podem
ser classificadas em “apolares”. Logo, os grupos mais polares da tabela de ensaio de solubilidade são: S2, SA, SB e S1. E
os grupos menos polares são: A1, A2, B, N1, N2 e I conforme a figura 9 e a tabela 4.
Outro ponto importante diz respeito aos ensaios “reativos” de solubilidade, ou seja, aqueles que utilizam
soluções ácidas e básicas para a descrição do grupo de solubilidade. Nestes ensaios, é importante lembrar que
moléculas com grupos ácidos, mesmo que apolares, têm grande chance de serem solúveis em meio básico aquoso,
enquanto que moléculas com grupos ácidos, mesmo que apolares, têm grande chance de serem solúveis em meio
aquoso básico.
Grupos retiradores de elétrons aumentam a acidez das moléculas com grupos ácidos e grupos doadores de
elétrons diminuem a acidez de moléculas com grupos ácidos. A tabela abaixo faz um pequeno resumo do que acaba
de ser mencionado.
Figura 9 - Fluxograma da marcha de solubilidade.
Tabela 4 - Grupos de solubilidade e as respectivas classes de compostos neles contidos *
S2 – Sais de ácidos orgânicos (RCO2Na, RSO3Na), cloridratos de aminas (RNH3Cl); aminoácidos; compostos
polifuncionais como açucares, compostos polihidroxilados, ácidos polipróticos, etc.
SA– Ácidos monocarboxílicos com cinco átomos de carbono ou menos; ácidos arenossulfônicos (até C 5).
SB – Aminas monofuncionais com seis átomos de carbono ou menos (até C6).
S1 – Álcoois, aldeídos, cetonas, ésteres, nitrilas e amidas com cinco átomos de carbono ou menos (até C 5).
A1 – Ácidos orgânicos fortes: ácidos carboxílicos com mais de seis átomos de carbono; fenóis com grupos
eletrofílicos em posição orto e para, β-dicetonas (acima de C6).
A2 – Ácidos orgânicos fracos como fenóis, enóis, oximas, imidas, sulfonamidas, tiofenóis, todos com mais
de cinco átomos de carbono. As β-dicetonas, os nitrocompostos com hidrogênio em α e as sulfonamidas.
B – Aminas alifáticas com oito ou mais carbonos, anilinas e alguns cetoéteres (acima de C8).
MN – Diversos compostos neutros com nitrogênio ou enxofre e mais de cinco átomos de carbono (amidas,
sulfetos etc) (acima de C5).
N1 – Álcoois, aldeídos, metilcetonas, cetonas cíclicas e ésteres com um só grupo funcional entre C5 e C9
átomos de carbono; éteres com menos de oito átomos de carbono, epóxidos (entre C5 e C8)
N2 – Alcenos, alcinos, éteres, alguns compostos aromáticos (especialmente os que têm grupos ativantes) e
cetonas (exceto as citadas na classe N1).
I – Hidrocarbonetos saturados, alcanos halogenados, halogenetos de arila, éteres diarílicos, compostos
aromáticos sem grupos ativantes.
* os cloretos de ácidos e os anidridos não foram incluídos por suas elevadas reatividades em soluções aquosas.
Casos de fronteira (borderline)
Moléculas orgânicas com grupos monofuncionais costumam ser solúveis com cadeias com até 4 átomos de
carbono. Por exemplo, o ácido butanóico (C4) é solúvel em água. O ácido pentanóico (C5) é um borderline, enquanto
que o ácido hexanóico (C6) é insolúvel em água.
O 1-butanol (C4) é sólúvel em água, o 1-pentanol (C5) é um borderline, enquanto que o 1-hexanol (C6) é
insolúvel em água.
Como em tudo, há exceções a esta regra. Em moléculas com maior número de átomos de carbono mas que
possuam o formato esférico, a solubilidade em água é mantida (t-butanol e t-pentanol).
Tabela 5 - Resumo das solubilidades das funções orgânicas
FUNÇÃO ORGÂNICA Solubilidade em água
Alcanos insolúveis
Alcenos insolúveis
Alcinos insolúveis
Álcoois até C4 solúveis; ≥ de C5 insolúveis
Éteres insolúveis
Aldeídos até C4 solúveis; ≥ de C5 insolúveis
Cetonas até C4 solúveis; ≥ de C5 insolúveis
Ácidos carboxílicos alifáticos: até C5 solúveis; ≥ de C6 insolúveis
aromáticos: insolúveis
Ésteres até 3 carbonos solúveis; 4 ou mais carbonos
insolúveis
Amidas até C3 solúveis; ≥ de C4 insolúveis
Dióis solúveis em geral
Glicóis solúveis em geral
Aminas até C5 solúveis; ≥ de C6 insolúveis
Nitrilas até C3 solúveis; ≥ de C4 insolúveis
Compostos insolúveis (exceto diidróxi compostos)
aromáticos
Fenóis Insolúveis em geral (exceto di ou trifenóis)
Tabela 6 – Solubilidade de álcoois
Composto Solubilidade em
água
metanol solúvel
etanol solúvel
1-propanol solúvel
2-propanol solúvel
1-butanol solúvel
2-butanol solúvel
1-pentanol pouco solúvel
2-pentanol pouco solúvel
3-pentanol pouco solúvel
1-hexanol pouco solúvel
2-hexanol pouco solúvel
3-hexanol pouco solúvel
1-heptanol pouco solúvel
2-heptanol pouco solúvel
3-heptanol pouco solúvel
1-octanol pouco solúvel
2-octanol pouco solúvel
3-octanol pouco solúvel
Tabela 7 – Solubilidade de alcanos
Composto Solubilidade em
água
metano insolúvel
etano insolúvel
propano insolúvel
butano insolúvel
pentano insolúvel
hexano insolúvel
heptano insolúvel
Tabela 8 – Solubilidade de alcenos
Composto Solubilidade em
água
eteno insolúvel
propeno insolúvel
1-buteno insolúvel
2-buteno insolúvel
1-penteno insolúvel
2-penteno insolúvel
3-penteno insolúvel
1-hexeno insolúvel
2-hexeno insolúvel
3-hexeno insolúvel
1-hepteno insolúvel
Tabela 9 – Solubilidade de alcinos
Composto Solubilidade em
água
etino (acetileno) pouco solúvel
propino pouco solúvel
1-butino insolúvel
2-butino insolúvel
1-pentino insolúvel
2-pentino insolúvel
1-hexino insolúvel
2-hexino insolúvel
3-hexino insolúvel
1-heptino insolúvel
2-heptino insolúvel
3-heptino insolúvel
Tabela 10 – Solubilidade de aldeídos
Composto Solubilidade em
água
metanal solúvel
etanal solúvel
propanal solúvel
butanal solúvel
pentanal insolúvel
hexanal insolúvel
heptanal insolúvel
octanal insolúvel
Tabela 11 – Solubilidade de cetonas
Composto Solubilidade em
água
propanona solúvel
butanona solúvel
2-pentanona insolúvel
3-pentanona insolúvel
2-hexanona insolúvel
3-hexanona insolúvel
2-heptanona insolúvel
3-heptanona insolúvel
4-heptanona insolúvel
2-octanona insolúvel
3-octanona insolúvel
4-octanona insolúvel
Tabela 12 – Solubilidade de éteres
Composto Solubilidade em
água
éter dimetílico solúvel
éter dietílico insolúvel
éter dipropílico Insolúvel
éter dibutílico Insolúvel
éter dipentílico insolúvel
éter diexílico insolúvel
Tabela 13 – Solubilidade de ésteres
Composto Solubilidade em
água
formiato de metila solúvel
acetato de metila solúvel
propanoato de metila insolúvel
pentanoato de metila insolúvel
hexanoato de metila insolúvel
formiato de etila solúvel
acetato de etila insolúvel
propanoato de etila insolúvel
pentanoato de etila insolúvel
hexanoato de etila insolúvel
Tabela 14 – Solubilidade de aminas
Composto Solubilidade em
água
metilamina solúvel
etilamina solúvel
1-propilamina solúvel
2-propilamina solúvel
1-butilamina solúvel
2-butilamina solúvel
1-pentilamina solúvel
1-hexilamina insolúvel
2-hexilamina Insolúvel
3-hexilamina insolúvel
Tabela 15 – Solubilidade de nitrilas
Composto Solubilidade em
água
etanonitrila (acetonitrila) solúvel
propanonitrila solúvel
butanonitrila insolúvel
pentanonitrila insolúvel
hexanonitrila insolúvel
heptanonitrila insolúvel
Tabela 16 – Solubilidade de amidas
Composto Solubilidade em
água
acetamida (etanamida) solúvel
propanamida solúvel
butanamida insolúvel
pentanamida insolúvel
hexanamida insolúvel
heptanamida insolúvel
Tabela 17 – Solubilidade de compostos aromáticos diversos
Composto Solubilidade em
água
benzeno insolúvel
tolueno insolúvel
etilbenzeno insolúvel
flúor-benzeno insolúvel
cloro-benzeno insolúvel
bromo-benzeno insolúvel
iodo-benzeno insolúvel
fenol insolúvel
ácido benzóico insolúvel
benzaldeído insolúvel
acetofenona insolúvel
benzenonitrila insolúvel
1,2-diidróxi-benzeno (catecol) solúvel
1,3-diidróxi-benzeno (resorcinol) solúvel
1,4-diidróxi-benzeno (hidroquinona) solúvel